Acórdão nº 834/09.0TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Novembro de 2011
Magistrado Responsável | CARLOS QUERIDO |
Data da Resolução | 29 de Novembro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório H (…) e M (…) intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra a “P (…), Lda.”, pedindo a sua condenação na quantia global de € 30.000,00, correspondente a: € 17.500,00 a titulo de danos patrimoniais pelo não uso da casa construída pela ré; € 2.750,00 a titulo de danos patrimoniais pela inutilização de cortinados; e 10.000,00 € a titulo de danos morais.
Alegaram, para tanto, e em síntese que: em Março de 2003 propuseram contra a ré uma acção declarativa condenatória que correu termos no 2.º juízo deste mesmo tribunal com o n.º 385/03.7TBTMR, onde foi proferida sentença, confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, a condenar a ré a proceder na reparação dos defeitos existentes na casa que construiu para os autores no (...) , Freguesia de Beselga, nos termos alegados em 4) e 5) da petição inicial, a que só foi dada integral cumprimento a 10.03.2008; em virtude dos defeitos existentes viram-se obrigados a sair de casa em Julho de 2002, levando consigo a sua filha mais velha que viu agravado o seu estado de saúde com as humidades e os bolores detectados na construção, e a residir na casa dos pais da autora onde nasceu o segundo filho, dormindo os quatro no mesmo quarto; durante esse período de tempo, 69 meses, tiveram que garantir as prestações bancárias associadas à construção da casa, sem dela tirar proveito; os cortinados, roupas de cama e colchões ficaram inutilizados pela humidade, tendo o valor global de 2.750,00 €; os autores ficaram privados de saúde e qualidade de vida com os seus filhos.
A ré, em sede de contestação, defende-se por excepção alegando a prescrição do direito de indemnização dos autores e a caducidade do correspondente direito de acção, bem como a violação de caso julgado. Por fim, impugnam os danos que alegadamente os autores sofreram e de que se pretendem ressarcir e peticionam a sua condenação como litigantes de má-fé, nomeadamente por exercício abusivo de direito na modalidade de venire contra factum proprium.
Em sede de resposta os autores contestaram a aplicação do regime jurídico da empreitada à causa de pedir desta acção, nos termos que o réu pretende fazer.
Foi proferido despacho saneador, no qual: foi julgada improcedente a excepção dilatória de caso julgado[1]; foi remetida para a sentença a apreciação das excepções peremptórias de caducidade e de prescrição; foi feita a condensação do thema decidendum com definição dos factos assentes e organização da base instrutória.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi decidida a matéria de facto, sem reclamações, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Em face do exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência condeno a ré P (…), Lda., a pagar aos autores a quantia de 10.350,00 € (dez mil trezentos e cinquenta euros) a título de danos patrimoniais pela privação do uso do imóvel construído por esta, e na quantia de 5.000,00 € (cinco mil euros) a titulo de danos não patrimoniais, indo no mais absolvida do pedido.» Não se conformando, a ré interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, onde formula as seguintes conclusões: (…) Os autores apresentaram contra-alegações, nas quais preconizam a manutenção do julgado.
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Do mérito do recurso 1. Definição do objecto do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A n.ºs 1 e 3 do CPC), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660º, nº 2, in fine), consubstancia-se nas seguintes questões: i) apreciação sobre se o pedido de indemnização por danos sequenciais decorrentes dos defeitos da obra (danos por privação de uso e os danos não patrimoniais) está sujeito aos prazos de caducidade previstos nos artigos 1224.º e 1225.º do CC; ii) apreciação sobre qual o regime aplicável, numa situação de concurso de responsabilidade contratual e extracontratual, nomeadamente no que concerne ao prazo de prescrição; averiguação sobre se estão presentes os pressupostos da obrigação de indemnizar.
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Fundamentos de facto Está provada a seguinte factualidade relevante: 1. Em Março de 2003 os AA, propuseram contra a Ré, no 2.º Juízo deste Tribunal, a acção com processo sumário n.º 385/03.7 TBTMR, na qual pediam que esta fosse condenada a eliminar os defeitos existentes na casa que construíra para eles, no (...) , freguesia da Beselga neste concelho registado na Conservatória do Registo Predial de Tomar, em nome do marido sob o na 00 (...) /200290 (A da MFA).
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A acção foi julgada procedente por sentença inteiramente confirmada pela Relação de Coimbra (B da MFA).
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Na sentença acabada de referir foram considerados provados, além de outros, os seguintes factos com interesse para esta acção: a) Os autores celebraram um acordo com a Ré, P (…) Lda., nos termos do qual esta última se obrigou a construir uma casa de habitação de rés-do-chão para os primeiros, no prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o na 00 (...) /200290 da freguesia da Beselga; b) A Ré construiu essa casa de habitação; c) Ultimamente nos tectos e nas paredes dessa casa de rés-do-chão surgiram manchas negras de bolores; d) Na cozinha - manchas de bolor, na zona de encontro do tecto com as paredes e descasque da pintura no tecto por cima da conduta de exaustão; e) Na sala de jantar manchas de bolor dispostas de forma generalizada no tecto e na parte superior das paredes; f) No quarto Nascente manchas de bolor no tecto, na parede, nas pontes térmicas, junto à janela e ao rodapé; g) No quarto simples Poente - manchas de bolor generalizadas no tecto e na parte superior das paredes; h) No quarto duplo Poente - manchas de bolor generalizadas no tecto, na parede Norte de forma mais acentuada do que na parede Poente e também nas pontes térmicas; i) Na casa de banho privativa deste quarto - manchas de bolor no tecto: j) Na casa de banho principal _ formações de bolores no tecto e nas juntas dos azulejos; k) Do lado do sótão sobreposição de telhas com tamanho inferior ao previsto: orifícios na parte superior da laje do tecto e na parede exterior para passagem de cabos de telefone e antena e 1) Do lado exterior orifício com grelha, na parede Norte, na zona do sótão (C da MFA).
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A Ré, pela sentença em causa, foi condenada a eliminar os seguintes defeitos existentes na casa de habitação dos autores: a) - Na sala de estar - fissuras na parede junto à chaminé da lareira; algumas manchas de bolor no remate da chaminé com o tecto abaixo do parapeito de uma janela; fissuração linear, no tecto, na zona de uma vigota; manchas de bolor em todo o tecto; b) Na cozinha - manchas de bolor, na zona de encontro do tecto com as paredes e descasque da pintura do tecto por cima da conduta de exaustão; c) - Na sala de jantar - manchas de bolor dispostas de forma generalizada no tecto e na parte superior das paredes; d) - No quarto Nascente - manchas de bolor no tecto, na parede, nas pontes térmicas, junto à janela e ao rodapé; e) No quarto simples Poente - manchas de bolor generalizadas no tecto e na parte superior das paredes; f) - No quarto duplo Poente - manchas de bolor generalizadas no tecto, na parede Norte de forma mais acentuada do que na parede Poente e também nas pontes térmicas. Na casa de banho privativa deste quarto - manchas de bolor no tecto; g) - Na casa de banho principal - formações de bolores no tecto e nas janelas dos azulejos; h) - Do lado do sótão sobreposição de telhas com tamanho inferior ao previsto; orifícios na parte superior da laje do tecto e na parede exterior para passagem de cabos de telefone e antena. Do lado exterior orifício com grelha, na parede Norte, na zona do sótão (D da MFA).
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Mediante a realização dos seguintes trabalhos: a) - Lavagem, com lixívia, do revestimento do tecto de toda a habitação e das paredes que apresentem manchas de bolores, sendo que, nos pontos em que o bolor se encontre em profundidade no reboco ou em que existam fissuras, o reboco deverá ser picado, mecanicamente; b) - Aplicação de gesso, no tecto, na forma tradicional e nunca por meios mecânicos; c) - Aplicação de uma tinta especial para tectos, no acabamento de qualidade superior e aditivada com anti-fungos; d) – Aplicação de reboco à base de cimento e cal hidráulica nas paredes, na forma tradicional e nunca por meios de projecção mecânicos; e) - Aplicação de uma tinta, no acabamento de qualidade superior e aditivada com anti-fungos, em toda a área das paredes interiores, quer estejam afectadas pelas manchas de bolores, quer não; f) - Tapagem de todos os orifícios na parte superior da laje do tecto, onde passem cabos eléctricos ou não, assim como do orifício na parede do sótão onde se faz a entrada do cabo telefónico com argamassa cerizitada; g) - Retirada da grelha exterior colocada na parede do sótão e tapagem do respectivo buraco com argamassa e pintado; h) - Remoção de todas as telhas e ripas da cobertura e sua recolocação nas vigotas com a distância que permita efectuar a sobreposição das telhas nos encaixes das próprias telhas: i) - Colocação, em toda a área da laje da cobertura e pela sua face superior, de uma manta de lã de rocha com 4 cm de espessura, para o seu isolamento térmico; j) - Aplicação de uma grelha de ventilação na zona inferior de cada porta das duas casas de banho e dos roupeiros (E da MFA).
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Após o trânsito em julgado desta decisão os AA, executaram-na no apenso aos autos principais (F da MFA).
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Obras essas, que no processo executivo a Ré deu por concluídas a 08.02.08, conforme ao requerimento junto aos autos a 10.03.08 (G da MFA).
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A 22.11.2001, a requerimento do autor marido, a Comissão de Vistorias da Câmara Municipal de Tomar, constituída, por um Eng. Técnico Civil, uma Arquitecta, o Comandante do Corpo de Salvação Pública de Tomar e uma Técnica de Saúde Ambiental da Delegação de Saúde, deslocaram-se ao referido edifício onde elaboraram e assinaram o Auto de Vistoria n.º...
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