Acórdão nº 278/10.1TBFND-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelJAIME CARLOS FERREIRA
Data da Resolução28 de Junho de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I No Tribunal Judicial da Comarca do Fundão corre termos o processo de insolvência com o nº 278/10.1TBFND, em que foi declarada insolvente, por sentença de 17/09/2010, transitada em julgado em 14/10/2010, a sociedade “C…, L.dª “, com sede em...

Instaurado o respectivo apenso de reclamação de créditos, foi nele proferida sentença de verificação e de graduação dos ditos e a propósito do que nela se escreveu o seguinte: “No presente processo de insolvência, por despacho proferido na tentativa de conciliação que antecedeu, foram julgados verificados todos os créditos reclamados.

Subsiste, todavia, a questão do privilégio creditório reconhecido pelo Sr. Administrador aos trabalhadores por reporte ao imóvel da insolvente, verba 1 dos bens apreendidos.

É esta questão que ora nos cumpre decidir.

Assim, pelo credor Banco…, foi sustentado, em síntese, que foi atribuído ao conjunto dos créditos laborais o privilégio creditório imobiliário especial constante do artigo 333º do Código de Trabalho (certamente referente ao único imóvel apreendido à insolvente), sendo que tal entendimento não deve merecer deferimento; primeiro, não se mostra alegado que todos esses trabalhadores, cujos créditos foram reclamados, trabalhavam no imóvel apreendido e identificado no inventário de bens apreendidos à insolvente como verba 1; segundo importa lembrar que o privilégio creditório imobiliário especial surge com o Código de Trabalho de 2003 – Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto, que entrou em vigor em 1 de Dezembro desse mesmo ano, sendo que tal entendimento legislativo não deve prevalecer sobre o valor da segurança jurídica sem a qual o necessário tráfego negocial ficaria posto em causa; é que a reclamante celebrou com a insolvente contrato de hipoteca que registou em 19 de Dezembro de 2002 (cfr. certidão predial com o código PP-0359-90198-050417-000722), sendo que nessa data a exponente não poderia prever a alteração legislativa que se avizinhava nem tal lhe seria exigível, pelo que não pode assim ser aplicada à situação aqui em apreço qualquer norma que institui o privilégio creditório imobiliário especial aqui em causa, pois estas só se deverão aplicar a situações constituídas após a sua vigência; assim se tem igualmente entendido a questão jurisprudencialmente (cfr. Acórdão da Relação de Coimbra do processo 412-A/2000.C1, datado de 20 de Abril de 2010, in www.dgsi.pt).

Conclui referindo que os créditos laborais reconhecidos nos presentes autos, por reporte ao bem imóvel, devem ser graduados depois do crédito hipotecário reconhecido à requerente.

Respondeu apenas o Sr. Administrador, alegando que é certo que o contrato de hipoteca foi celebrado em 19 de Dezembro de 2002, enquanto que os privilégios dos créditos emergentes do contrato de trabalho gozam de privilegio mobiliário e imobiliário geral, nos termos do disposto no n° 1 do artigo 4° da Lei 96/2001, de 20 de Agosto, alíneas a) e b).

* Não foi apresentada qualquer impugnação destes (ou de outros) créditos.

* Para a massa insolvente foram apreendidos um bem imóvel e bens móveis (cfr. respectivo apenso).

* O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

Não há nulidades que invalidem todo o processo.

As partes gozam de personalidade, de capacidade judiciária e são legítimas.

Não há outras excepções, nulidades ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

* Estipula o nº 3 do artigo 130º do C.I.R.E. que “se não houver impugnações, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação dos créditos, em que, salvo o caso de erro manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos em atenção ao que conste dessa lista”.

No caso em apreço, uma vez que os créditos que constam da lista de créditos reconhecidos não foram impugnados, já foi homologada a lista de credores reconhecidos.

* Aqui chegados cumpre proferir sentença que gradue os créditos reconhecidos em harmonia com as disposições legais.

Uma vez indicados os créditos verificados, cumpre proceder à graduação dos mesmos, sendo certo que a massa insolvente é constituída por bens móveis e um imóvel.

Ora, em regra, todos os credores estão em situação de igualdade perante o património do devedor, sendo este o denominado princípio da par conditio creditorum.

Esse princípio corporiza-se no artigo 604º, nº 1 do Código Civil (C.C.): «Não existindo causas legítimas de preferência, os credores têm o direito de ser pagos proporcionalmente pelo preço dos bens do devedor, quando ele não chegue para integral satisfação dos débitos».

Porém, é muito frequente que um ou mais credores tenham direito a ser pagos preferencialmente por alguns dos bens ou por todos os bens do insolvente.

Deve, especialmente, enfatizar-se que as garantias e privilégios creditórios constituem excepções àquele princípio de igualdade dos credores perante o património do devedor, pelo que as normas que os tutelam devem ser interpretadas de acordo com a regra enunciada no artigo 11º do Código Civil.

A repartição dos credores por classes no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa (C.I.R.E.) é justificada pela consideração da diversidade de situações em que podem encontrar-se os titulares dos créditos sobre o insolvente e na necessidade de lhes dar um tratamento adequado à sua natureza.

E a definição da prioridade dos créditos para serem pagos opera-se através da verificação e graduação dos créditos, procedimentos estes de natureza declarativa, previstos no Capítulo I do Título V do aludido Código.

De forma inovadora, o C.I.R.E. introduz as «classes de créditos».

Declarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência e tais créditos são denominados como créditos sobre a insolvência (artigo 47º nºs 1 e 2).

Os “créditos sobre a insolvência” não se confundem com os “créditos sobre a massa insolvente”, previstos no artigo 51º.

Os créditos sobre a insolvência são: - Créditos «garantidos» e «privilegiados», os créditos e respectivos juros que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais e de privilégios creditórios gerais sobre os bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalentes (artigo 47º, nº 4, alínea a)); - Créditos «subordinados», os créditos enumerados no artigo 48º, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência (alínea b)); - Créditos «comuns», os demais créditos (alínea c)).

Dito de outro modo: - Os créditos garantidos são os que beneficiam de garantias reais, neles se incluindo os créditos...

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