Acórdão nº 294/10.3TBVNO-G.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Janeiro de 2011
Data | 18 Janeiro 2011 |
Órgão | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM O SEGUINTE: I - Relatório: Por sentença proferida aos 24.02.2010, foi a “A (…), Lda” declarada insolvente, tendo posteriormente sido apresentado pela devedora um plano de insolvência contendo medidas relativamente aos créditos do Estado (Fazenda Pública), de 103.627,27 euros, propondo o seu pagamento em 40 prestações trimestrais, com perdão de juros vincendos, bem como aos créditos da Segurança Social e aos créditos comuns.
O plano, com as alterações entretanto introduzidas pela insolvente, foi posto à votação da assembleia de credores de 15.7.2010, tendo a Segurança Social e alguns outros credores votado contra. O Ministério Público, em representação da Fazenda Pública, e o (…) requereram prazo para apresentação dos seus votos por escrito, o que lhes foi deferido.
O Ministério Público votou contra o plano e requereu a sua não homologação, nos termos do disposto no artº 215º do CIRE, por entender que o mesmo viola normas imperativas aplicáveis ao seu conteúdo (cfr. fls. 663), nomeadamente as constantes dos artigos 30º, nº 2, 36º, nº 3, da Lei Geral Tributária e artigos 196º, nº 3, e 199º do CPPT. Também o credor Instituto da Segurança Social, IP, a fls. 558, requereu a recusa da homologação do plano de insolvência, alegando que o plano não se coaduna com o regime geral de regularização de dívidas à Segurança Social e viola normas imperativas, designadamente a Lei Geral Tributária e o Decreto-Lei nº 411/91, de 17.10.
O despacho de 27.7.2010 considerou aprovado o plano, face ao quórum deliberativo.
A sentença, proferida aos 02-09-2010, indeferiu a pretensão dos credores Instituto de Solidariedade e Segurança Social e Fazenda Nacional e homologou o plano de insolvência aprovado em Assembleia de Credores, condenando «as partes» a cumpri-lo nos seus precisos termos. Inconformado com a sentença, recorre apenas o Ministério Público, em representação da Fazenda Pública, concluindo a sua alegação: 1ª O Ministério Público exarou voto por escrito no sentido de não ser homologado o Plano de Insolvência uma vez que, no que respeita aos créditos fiscais, esse Plano viola normas de natureza imperativa, designadamente o disposto no art. 215º do CIRE, bem como, os arts. 30º, nº2, 36º, nº3 da LGT e os artigos 196º e 199º do CPPT.
2ª Com efeito, embora o Plano de Insolvência homologado preveja o pagamento de 100% da dívida fiscal estabelece que tal pagamento será trimestral, em prestações iguais e sucessivas, com perdão de juros vincendos, vencendo-se a primeira dessas prestações em 31/12/10, após trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de insolvência, o que implica a perda de juros e dilação no pagamento.
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A questão que se coloca é a de saber se as mencionadas normas entendidas como imperativas podem ou não ser postergadas pelo espírito inerente ao Código de Insolvência e pelo vertido no Plano de Insolvência, bem como, pela aprovação maioritária por parte dos credores desse plano.
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Na perspectiva da Fazenda Pública a injuntividade das normas em apreço é inultrapassável em virtude do que não se pode abdicar da observância das mesmas no âmbito da regularização dos créditos fiscais.
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Desde logo, nos arts. 30º, nº2 e 36º, nº3 da LGT, bem como, nos arts. 85º, nº3, 196º e 199º do CPPT consubstancia-se o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, da proibição de moratória e o da regularização prestacional.
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O princípio da indisponibilidade acolhido no art. 30º, nº2 da LGT é derrogado pelo perdão de juros de mora vincendos fixado no Plano de Insolvência que não observa o princípio da equiparação das renúncias estabelecido no art. 3º, nº5 do DL. nº 73/99, de 16/03.
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Acresce, que o Plano de Insolvência ao não prever a substituição ou destituição do gerente responsável pela constituição das dívidas viola o estabelecido no art. 196º, nº3 do CPPT.
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O Plano de Insolvência não prevê a constituição de garantias idóneas e suficientes para a salvaguarda dos créditos tributários, tal como não assegurou a não redução de coimas e de custas, nem o princípio da estabilização do passivo com a demonstração do pagamento integral de todas as obrigações fiscais da empresa, após a declaração de insolvência.
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O regime da regularização dos créditos fiscais está sujeito ao princípio da legalidade, do qual decorrem os princípios da proibição de moratórias e da indisponibilidade, pelo que, tal regime não é susceptível de negociação ou flexibilização ou, em ultima análise de afastamento.
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Toda a regularização dos créditos fiscais deve ser feita com observância dos aludidos princípios sob pena de não ser válida por não ser legalmente admissível.
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Nem a Insolvente nem a Assembleia de Credores podem alterar o regime vigente para a regularização dos créditos fiscais e apresentar um que não observe as exigências legais.
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Tudo isto decorre do disposto no art. 103º, nº2 da Constituição da República Portuguesa que consagra o princípio da legalidade tributária.
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Não só as normas de determinação da matéria colectável são estabelecidas por lei, como também as normas respeitantes à liquidação e cobrança, desde que, determinem montantes de imposto a pagar.
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Só por acto legislativo podem ser alteradas as circunstâncias da regularização da dívida fiscal.
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Essas circunstâncias não podem ser alterados pela vontade das partes quanto aos elementos essenciais da relação tributária, quer quanto aos sujeitos, quer no que tange à prestação do imposto e às garantias (arts.30º, nº2 e 36º, nº2 da LGT).
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Por maioria de razão, não podem os credores, no âmbito da insolvência, estranhos a essa relação, alterar os respectivos elementos.
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O art. 192º, nº1 do CIRE apenas permite a derrogação das normas do CIRE para efeitos da regulação do pagamento dos créditos sobre a insolvência, mas não a derrogação de outras normas, de carácter imperativo.
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Por não observar os arts. 36º, nº2 e 30º, nº2, ambos da LGT nem os arts. 196º e 199º, ambos do CPPT está o Plano de Insolvência concretamente aprovado a violar normas que, por um lado, não constam do CIRE e...
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