Acórdão nº 2022/08.4TBFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório C (…), O (…), E (…), M (…) e mulher, L (…), instauraram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra J (…), pedindo, a título principal, que o réu seja condenado: a executar as obras referidas no artigo 18º, da petição inicial, ou a pagar o custo das mesmas, pelo valor que se vier a apurar em execução de sentença; a pagar o montante de €: 16.874,55, correspondente às rendas vencidas e não pagas entre Janeiro de 2005 e Junho de 2007 e respectiva indemnização legal de 50%; a pagar o montante a liquidar no adequado incidente, correspondente ao que os autores normalmente receberiam pelo arrendamento do rés-do-chão, desde Julho de 2007 até à efectiva execução das obras. Subsidiariamente, para a eventualidade da improcedência do primeiro pedido formulado a título principal, pediram ainda a condenação do réu no pagamento do valor das rendas não pagas, face à acordada realização de obras, no montante de €: 16161,05, devidamente actualizado pelos índices (acumulados) de preços no consumidor publicados pelo INE.

Alegaram, para tanto, que, em 19 de Julho de 2000, a sua mãe (entretanto falecida, em 2.11.2006) e eles próprios, todos como proprietários e promitentes senhorios, e o réu, como promitente arrendatário, outorgaram um contrato escrito, relativo a um prédio urbano, sito nas ..., freguesia de ..., deste concelho, que denominaram de “Contrato de Promessa de Arrendamento e Contrato de Empreitada”, segundo o qual, os primeiros prometiam dar de arrendamento ao ora réu todo o rés-do-chão desse prédio, outrora destinado a comércio de mercearias e vinhos e a habitação, bem como o respectivo logradouro (pátio com cerca de 120m²), sendo que tal arrendamento seria pelo prazo de um ano, renovando-se por iguais e sucessivos períodos, com início no primeiro dia do mês seguinte ao da conclusão das obras que o ora réu, previamente, iria realizar no prédio, e que deveriam estar concluídas no dia 31 de Dezembro de 2000, destinando-se o arrendamento a habitação, escritório, oficina e armazém de materiais de refrigeração e climatização da indústria hoteleira, tendo ficado acordado que a renda a pagar pelo ora réu seria de 60.000$00 mensais, no ano de 2001, 65.000$00 mensais, no ano de 2002, 70.000$00 mensais, no ano de 2003, e 75.000$00 mensais, no ano de 2004, sendo actualizada, nos anos de 2005 e seguintes, pela aplicação dos coeficientes legais.

Acrescentaram que, previamente, e com vista ao arrendamento prometido, deveria o ora réu efectuar as obras elencadas na Cláusula 12ª, ou seja, as obras de restauro ou de adaptação necessárias para que a Câmara Municipal, em vistoria prévia a realizar, emitisse a competente licença de utilização para outorga do arrendamento, bem como proceder à limpeza e pintura exterior de todo o edifício, i.e., não só do rés-do-chão objecto do contrato, mas também do 1º andar e restantes partes do prédio, quer das que dão para a Rua do Rancho Folclórico “As Salineiras de ...” e Rua dos Barranhos, quer das que dão para o interior do pátio, obras que foram, ao tempo, avaliadas pelas partes outorgantes, nomeadamente para efeitos do disposto na Cláusula 6ª, em 3.240.000$00 (equivalentes a €16161,05), ou seja, o valor correspondente às rendas dos quatro primeiros anos de vigência do contrato e que o ora réu estaria dispensado de pagar.

Mais, alegaram que, a despeito do que ficou acordado, o réu apenas efectuou uma pequena parte das obras acordadas e não providenciou pela devida vistoria e licenciamento camarário (nem teria condições de licenciamento, atenta a incompletude das obras feitas e estado de devastação em que deixou o imóvel), tendo-se logo instalado no locado, ali passando a exercer a sua actividade comercial, em nome individual ou da sua empresa M..., aproveitando todas as utilidades que o dito rés-do-chão era susceptível de proporcionar, designadamente, utilizando o escritório, a única parte do acordado que executou em condições, sendo que, como tal, todo o rés-do-chão se encontra inutilizado e inutilizável, sem licença de utilização e inapto para ser dado de arrendamento.

Disseram, também, que o réu se manteve na posse do imóvel até Junho de 2007, data em que entregou as chaves por meio de carta registada enviada ao autor C (…), sem pagar as rendas que, a partir de 1 de Janeiro de 2005, eram devidas, pelo que se encontra em mora em relação ao respectivo pagamento, ao que acresce a circunstância de o rés-do-chão, tal como está, se mostrar inadequado para arrendamento, o que os impede de receber o montante mensal correspondente ao seu valor locativo, desde Julho de 2007 até à efectivação das obras, valor que, de forma razoavelmente previsível, receberiam e não estão a receber, pelo que dele devem ser indemnizados.

Regularmente citado, o réu apresentou contestação, na qual pugnou pela improcedência da acção, e deduziu reconvenção, pedindo que se declare o incumprimento do contrato junto aos autos por culpa exclusiva dos autores, os quais deverão ser condenados na restituição da quantia de €: 28.974,33, correspondente ao montante que o réu investiu no prédio e corresponde à sua valorização, bem como no pagamento da quantia de €: 19.400,00, a título de indemnização pelos danos sofridos com aquele incumprimento do contrato.

Alegou, para tanto, que após a assinatura do contrato e já depois de ter iniciado as obras de limpeza e lavagem do edifício, demolição da parede divisória entre as duas cozinhas existentes na habitação, instalação da rede eléctrica na zona de comércio e na cozinha existente no pátio, demolição das paredes interiores dos estábulos existentes, constatou que as obras que tinham sido acordadas entre as partes careciam de um projecto aprovado pela Câmara Municipal, sendo que, nessa sequência constatou que o que estava no processo camarário não correspondia à construção existente no local, circunstância que inviabilizava a apresentação e aprovação de qualquer projecto e tornava impossível a legalização de qualquer obra e consequentemente a emissão de licença de utilização para celebração do contrato de arrendamento.

Acrescentou que, como entretanto necessitasse do espaço para de imediato desenvolver a sua actividade comercial e os autores não apresentassem qualquer solução para aquele problema e porque já tinha empatado dinheiro nas obras efectuadas, desde logo tratou de concluir as obras na parte de escritório e foi efectuando outras obras que tinham sido acordadas, algumas inesperadas, que se mostravam imperiosas em face da degradação do prédio, e posteriormente obras não definidas no contrato mas que foram efectuadas a pedido dos próprios autores, sem que outra contrapartida retirasse disso que não a ocupação do escritório e a utilização do pátio para guarda dos veículos, sendo que na compra de materiais, serviços e mão-de-obra para estas obras fez um investimento global que ascende a 28.974.33€, montante esse em que, no mínimo, o prédio dos autores ficou valorizado e superior àquele que se tinha contratualmente obrigado a despender na realização das obras e superior a este montante acrescido das rendas que eventualmente tivesse que pagar no período de Janeiro de 2005 a Junho de 2007, altura em que procedeu à entrega das chaves, sendo certo que se não foram efectuadas todas as obras definidas no contrato celebrado, a verdade é que o valor ali estipulado para as referidas obras foi largamente ultrapassado pelo investimento efectuado, sendo inquestionável que as partes ao contratar nos moldes que o fizeram tinham como objectivo que os montantes que deveriam ser pagos a título de renda nos anos de 2001 a 2005 seriam canalizadas para a requalificação dos edifícios, sendo o valor das rendas a pagar nos anos atrás definidos o limite máximo do investimento do réu no referido prédio.

Alegou, ainda, que o incumprimento do contrato se dá por única e exclusiva culpa dos autores, que ao contratarem consigo bem sabiam que o que estava implantado no terreno não coincidia de forma alguma com o que estava licenciado na Câmara Municipal e que para a realização das obras seria necessário apresentar um projecto de alterações e um projecto de licenciamento que implicaria diversos e avultados custos, nomeadamente, com honorários do projectista e do técnico responsável peja obra, factos esses desconhecidos do réu, que na altura em que contratou com os autores era um jovem de 22 anos, sem qualquer experiência neste tipo de situações, confiante que apenas teria que realizar as obras e posteriormente pedir as respectivas licenças, sendo que as obras que vieram a revelar-se necessárias para requalificar o espaço ultrapassavam largamente os custos estimados pelas partes, pelo que, também por isso, o réu se sentiu desobrigado à sua integral realização, tanto mais que ele próprio nunca pôde usufruir do espaço prometido arrendar, nunca tendo esperado que após todos estes anos – quase oito – os autores viessem pretender que requalifique todo o espaço com obras orçadas em valor superior a trinta mil euros, o que configura um abuso de direito que expressamente invocou.

Mais alegou o réu, que, para além do dinheiro que empatou na realização das descritas obras, a situação em apreço lhe causou prejuízos de diversa monta, pois desde a data em que os autores lhe deveriam ter proporcionado o gozo do prédio até Dezembro de 2006, foi obrigado a efectuar um gasto adicional no arrendamento e posterior compra de habitação própria e local de armazenagem, não inferior a €: 200,00/mês, num total de €: 14.000,00, a que acrescem os incómodos, gastos extraordinários, perdas de tempo com deslocações entre a sua habitação, estabelecimento comercial e local de armazenagem, a que globalmente atribuiu um valor não inferior a €: 5.000,00.

Os autores apresentaram réplica, na qual impugnaram os factos alegados pelo réu, pugnando pela improcedência da reconvenção, reiteraram a procedência do pedido formulado nesta acção, nos termos referidos na petição...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT