Acórdão nº 1957/07.6TBMGR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução31 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra os juízes abaixo assinados: A (…) requereu execução contra J (…).

Fundamenta a pretensão executiva em letra de câmbio, emitida em 03/05/2007, com vencimento em 03/08/2007, na importância de 30.000€, aceite pelo executado; nomeou à penhora o prédio inscrito na matriz sob os artigos (...) (urbano) e (...) (rústico) e descrito na conservatória do registo predial de (...) sob o nº (...)/20080603; a penhora foi efectivada e registada.

M A (…) e mulher, M E (…) vieram então deduzir os presentes embargos, dizendo que pese embora a propriedade do prédio penhorado esteja inscrita a favor do executado, a verdade é que são eles, embargantes, os seus donos e legítimos possuidores, tendo-o adquirido por compra nos anos de 1975 e 1976. Antes da outorga das escrituras públicas de compra e venda foram investidos na sua posse pelos vendedores e neles construíram a sua casa de habitação e anexos. Em 29/07/1986, no âmbito da execução intentada contra os ora embargantes, o executado, que era amigo íntimo deles, arrematou o prédio em causa a pedido destes, para evitar que o mesmo fosse arrematado por qualquer interessado, já que era a casa onde viviam com a respectiva família. Foram os ora embargantes (ali executados) que entregaram ao arrematante (aqui executado) as quantias por ele alegadamente suportadas com a arrematação. Acordando, então, arrematante e ora embargantes, que aquele nunca usaria o título (auto de arrematação) para inscrever o direito a seu favor. Os embargantes, por diversos motivos, continuaram durante alguns anos em situação de ameaça de insolvência, razão pela qual mantiveram o sobredito prédio na detenção jurídica aparente do ora executado e, assim, a salvo dos seus credores; não oferecendo o executado, aparentemente, qualquer perigo de ver penhorado o seu património. Porém, sem que disso se tenham apercebido, o executado viu rapidamente esgotado o seu património, e sem que nada o fizesse prever, ele, ou alguém a seu mando, em 23/03/2005, quase 20 anos depois da referida arrematação, procedeu à inscrição da propriedade do prédio a seu favor. Sucede que os embargantes nunca, por um instante, desde a sua aquisição, deixaram de habitar a sobredita casa, de cultivar o seu quintal, de usar os jardins a seu bel prazer, de fazer obras de conservação, mesmo depois de 29/07/1986, data da arrematação feita à sua exclusiva custa, dando-lhe a configuração física que hoje tem, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, convictos de serem seus donos; o que conduz à sua aquisição originária, por usucapião.

Dizem mais: ainda que, por força do art. 1264 do CC, se considere transferida, pela venda judicial, a posse sobre o imóvel, ficando os embargantes meros detentores do imóvel, em nenhum momento o executado obstaculizou ou contestou os actos de posse dos embargantes sobre o prédio em questão, nem mesmo após ter promovido o registo do mesmo a seu favor.

Assim, a entender-se que os embargantes foram convertidos em meros detentores (art. 1264 do CC), eles, logo após a venda, inverteram tal animus.

Concluem pedindo que seja reconhecido e declarado que são os embargantes os únicos e exclu-sivos donos e possuidores do prédio misto penhorado nos autos de execu-ção; e, consequentemente, que seja ordenado o levantamento da penhora so-bre ele incidente (ap. nº 22 de 2008/06/03) e o cancelamento da respectiva inscrição; que seja ordenado o cancelamento da inscrição da propriedade de tal prédio a favor do executado (ap. nº 22 de 2005/03/23).

Procedeu-se à inquirição de testemunhas, nos termos e para os efeitos previstos no art. 354º do CPC e os embargos foram admitidos e determinada a suspensão da execução quanto ao imóvel penhorado.

O exequente contestou, impugnando, dizendo, em suma, que o prédio penhorado é pertença do executado, tendo-lhe sido adjudicado em processo de execução, pagando o seu preço, com dinheiro seu; porém, na ocasião foi seduzido por um amigo comum dos embargantes e executado, para consentir que aqueles ficassem algum tempo a viver na casa vendida; o executado vivia então em Macau, onde permaneceu até 1982, e era proprie-tário de um boa fortuna; regressado a Portugal, esses valores foram-se degradando, restando-lhe agora um património imobiliário ainda valioso, mas vivendo com grandes dificuldades financeiras; os embargantes têm ocupado o prédio em causa por mero favor, gentileza e tolerância do executado, que desde há muitos anos lhes vem solicitando que encontrem soluções para as suas vidas e lhe entreguem o bem que é seu; nunca os embargantes se assumiram como donos do prédio, e sempre, ao longo destes anos, foram dizendo que um dia haveriam de negociar a sua compra ao executado; durante estes anos, os embargantes limitaram-se a zelar e manter o prédio em causa, sendo essa uma das exigências que o executado lhes impôs para a cedência, e se algumas obras nele realizaram, elas não são visíveis. Conclui pela improcedência dos embargos.

Notificado, o executado não contestou.

(utilizou-se, até aqui, no essencial, quase todo o relatório da sentença recorrida, apenas se acrescentando mais algumas linhas, em itálico, na síntese da petição de embargos) Depois do julgamento foi proferida sentença, julgando os embar-gos procedentes e, em consequência, ordenando o levantamento da penho-ra realizada em 03/06/2008, incidente sobre o bem imóvel penhorado; declarando-se que os embargantes adquiriram, por usucapião, o prédio em causa e ordenando-se o cancelamento das inscrições correspondentes à ap. 22 de 2008/06/03 e ap. 22 de 2005/03/23.

O exequente interpôs recurso da sentença – para que seja substituí-da por outra que decida pela improcedência dos embargos - terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A decisão de decretou a procedência dos embargos de ter-ceiros considerou justificada a posse desses terceiros embargantes sobre o prédio dado à penhora nos autos de execução de que estes embargos são apenso.

2. É verdade que os embargantes adquiriram o prédio por compra em 1974 e que mantiveram posse sobre ele até ao dia em que o mesmo foi vendido em hasta pública no âmbito do processo executivo nº 104-A/81 do tribunal judicial de Figueira da Foz que o adjudicou ao agora executado nos autos de execução apensos aos presentes embargos.

3. O...

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