Acórdão nº 894/11.4TBPBL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução06 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra os juízes abaixo assinados: A assembleia geral da sociedade anónima A (…) (= ADM) deliberou, em 19/03/2011, i) eleger um novo presidente da mesa e uma nova secretária da AG, que assumiram de imediato as respectivas funções, cessando as até aí desempenhadas pelos anteriores, ii) alterar os estatutos da sociedade, iii) destituir os membros do conselho de administração, e, iv) designar novos membros do Conselho de Administração.

J (…), que é um accionista da ADM com, segundo ele, 3,08% do capital social, e que é também um dos administradores destituídos, veio requerer a suspensão de tais deliberações, em antecipação à sua impugnação, alegando, para o preenchimento do requisito perigo de “dano apreciável” que o art. 396 do CPC exige para a concessão da suspensão, que (sintetizam-se os mais de 100 artigos dedicados ao assunto): Em consequência da execução de tais deliberações a ADM poderá passar a ser gerida de forma contrária ao interesse social e a favor do accionista C (…), nomeado para o CA, o qual poderá passar a ser o presidente de uma comissão executiva ou administrador delegado, com poderes para gerir a ADM como bem quiser; este accionista é titular, directa ou indirectamente, de várias sociedades concorrentes da ADM, que apresentam situações financeiras bastante debilitadas ou problemas de gestão de tesouraria ou dívidas avultadas; este accionista poderá vir a gerir a ADM de forma a favorecer tais sociedades, e/ou de modo a esvaziar a ADM e/ou ainda de modo a prejudicar as sociedades de que o requerente é parte; existe, tendo em conta as sociedades em que o accionista C (…) é titular e exerce igualmente funções de administração, uma situação de concorrência material e geográfica e uma actuação concorrente não autorizada; verifica-se o risco de, de forma directa ou indirecta, se criarem situações de benefício ou proveito próprio dos administradores, em prejuízo e sem consideração dos interesses comuns dos sócios enquanto tais e dos credores sociais; como deixou de ser administrador não poderá acompanhar e sindicar o exercício da administração por parte do accionista C (…).

Este pedido de suspensão foi indeferido, depois da contestação da requerida, por se ter entendido que tudo o que requerente traz a juízo milita no terreno da abstracção, do que logo seria sintoma o facto de não ter avançado o valor do dano que pretende evitar; todo o pedido radicaria numa construção marcadamente especulativa e sem um claro substrato factual; o requerente teria construído múltiplos cenários passíveis de causar prejuízo, a ele requerente, ou à ADM, erigidos, apenas, com base em especulações, já que não alega um único facto passível de tornar mais ou menos denso o perigo que visa evitar; nesta decisão salienta-se que o requerente admite que a situação/actuação de concorrência já existia anteriormente e que contra ela não reagiu; em suma, o acervo factual narrado pelo requerente não contém eventos concretos susceptíveis de possibilitar a aferição da existência de prejuízo significativo decorrente da execução da deliberação social qualificada de ilegal. Ora, como se refere no ac. do TRL de 28/02/2008 [920/2008-6 da base de dados do ITIJ], as meras hipóteses, previsões ou suposições antecipadas daquilo que poderá suceder não constitui a alegação de factos concretos consubstanciadores do dano apreciável.

A 08/07/2011, o requerente recorreu deste despacho considerando que alegou o necessário para se poder dar como preenchido o requisito do dano apreciável exigido pelo art. 396 do CPC.

A ADM defende posição contrária nas contra-alegações que apresentou a 22/07/2011.

* A questão que importa resolver é apenas a de saber se o requerente alegou factos suficientes ao preenchimento do requisito “dano apreciável” exigido por lei (art. 396/1 do CPC) para a concessão da providência cautelar da suspensão de deliberações sociais.

* Tendo em conta o resumo feito acima da alegações de facto do requerente dá-se razão à decisão recorrida. De facto, se se reparar bem, tudo aquilo que o requerente alega são coisas possíveis de ocorrer, mas o requerente não diz por que é que pensa que elas vão ocorrer.

Antes de continuar diga-se que a ADM tinha 5 accionistas: pai, mãe e três filhos. O pai e a mãe, diz o requerente, tinham 90,76%. Ele e cada um dos outros dois irmãos tinham 3,08% cada. A mãe morreu e o requerente diz que ainda não foi partilhado o património comum. Na AG só estiveram presentes, como accionistas, ele e o irmão (…) com o total, segundo o requerente, de 6,16% do capital.

Voltando ao que se estava a dizer, veja-se, em pormenor, cada um dos receios invocados pelo requerente: - a possibilidade de a ADM passar a ser gerida de forma contrária ao interesse social e a favor do accionista/administrador irmão C (…), é uma possibilidade real; mas não deixa de ser isso mesmo, uma simples possibilidade, que existe em relação a qualquer administrador em qualquer sociedade; o que o requerente não diz é por que é que pensa que o irmão vai passar a fazer isso; ou seja, não se diz qual é o facto concreto que, provado, pode levar a crer que a ADM vai passar a ser administrada do modo como o requerente diz que é possível vir a acontecer; - o facto de o accionista C (…) ser titular, directa ou indirectamente, de várias sociedades concorrentes da ADM, que apresentam situações financeiras bastante debilitadas ou problemas de gestão de tesouraria ou dívidas avultadas, é especulação parcial, pois que nem sequer se diz, mesmo que se aceitasse que tais situações se possam analisar da forma como o requerente o faz, que elas se devam à actuação dolosa ou negligente daquele accionista; por outro lado, não é alegado nenhum facto concreto que, provado, possa levar a crer que, devido a tais situações, aquele accionista iria gerir a ADM de forma a favorecer tais sociedades, e/ou de modo a esvaziar a ADM; - o requerente também não diz qual o facto que o leva a crer que aquele accionista irá gerir a ADM de modo a prejudicar as sociedades de que o requerente é parte; - por outro lado, a situação/actuação de concorrência que ele invoca já existia, na própria lógica da construção do requerente, há 2 anos; ela não vai passar a existir na sequência das deliberações…; - ainda: o risco de, de forma directa ou indirecta, se criarem situações de benefício ou proveito próprio dos administradores, em prejuízo e sem consideração...

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