Acórdão nº 816/09.2TBAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelJUDITE PIRES
Data da Resolução06 de Setembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I.RELATÓRIO 1. E (…) propôs acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra “J (…) & Filhos, Ldª”, AF (…), JR (…), AO (…)[1], JÁ (…), AA (…), AS (…) PM (…), AV (…), LG (…) , MM (…), pedindo, em síntese, que os RR sejam condenados solidariamente a indemnizá-lo dos custos que teve e tem que suportar por causa da acção nº 577/2000, do extinto 3º Juízo do Tribunal Judicial de Águeda e processo-crime comum colectivo nº 267/2000, do extinto 1º Juízo do mesmo Tribunal, que lhe foram movidos pela 1ª Ré (Ré sociedade), bem como do que tiver que pagar em resultado das sentenças condenatórias proferidas nos referidos processos, e os danos extra-patrimoniais sofridos.

Alega, para tanto, o Autor que, tendo sido condenado na primeira daqueles processos, por decisão de 9 de Outubro de 2006, confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra e pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pagar à 1ª Ré sociedade a quantia global de 31.876.700$40, equivalente ao valor de € 150,000,31, pelos prejuízos que dolosamente lhe causou e que se traduziram na abertura de duas valas no prédio da mesma Ré e na lavragem de uma área de cerca de 12.400 m2 e subsequente plantação dessa área com eucaliptos, pinheiros e carvalhos, e no segundo processo, parcialmente por factos da primeira (lavragem do terreno), por decisão também transitada em julgado, na pena de dois anos e seis meses de prisão, com execução suspensa por igual período, por prática de crime de dano qualificado, essas decisões condenatórias fundamentaram-se em documentos falsos, designadamente no auto de ratificação de obra nova de 20 de Outubro de 2000, e depoimentos falsos, que criaram nos julgadores que intervieram nos referidos processos a convicção acerca da verificação dos factos materiais que ditaram tais condenações.

Citados, contestaram os Réus (…), que, designadamente, invocaram a excepção dilatória de caso julgado entre a acção agora proposta e os dois mencionados processos, referindo que o Autor ao propor esta acção pretende infirmar a motivação e os factos que serviram de fundamento às decisões judiciais proferidas nos aludidos processos, visando obter decisão diversa daquelas.

O Autor não respondeu à matéria da excepção.

Proferido despacho saneador, foi nele conhecida, entre o mais, a referida excepção dilatória de ofensa ao caso julgado material, absolvendo os Réus da instância, condenando nas custas o Autor.

  1. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso de apelação o Autor, apresentando com as suas alegações as seguintes conclusões: “A -Entre a acção destes autos e as identificadas outras (a cível e a criminal) inexiste qualquer uma das três identidades que constituem requisitos legais do caso julgado; B. O efeito do caso julgado opera sobre a decisão, que não deve ser repetida ou contraditada, e às questões preliminares que foram o seu antecedente lógico, mas não se projecta sobre a motivação, sobre a valoração das provas e, em geral, sobre os elementos de formação da convicção do julgador; C. A douta sentença recorrida viola o artigo 498º do Código de Processo Civil.

    Termos em que, dando provimento às conclusões desta apelação, revogando a douta sentença recorrida e mandando condensar o processo, farão Vossas Excelências a habitual Justiça”.

    A apelada “(…) contra-alegou, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.

    II.OBJECTO DO RECURSO A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras[2], importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito[3].

    1. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar se existe ou não excepção de caso julgado em relação à acção nº 577/2000, do extinto 3º Juízo do Tribunal Judicial de Águeda e ao processo-crime comum colectivo nº 267/2000, do extinto 1º Juízo do mesmo Tribunal, III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Além dos factos descritos no relatório supra, mostram-se comprovados os seguintes factos relevantes à apreciação do objecto do recurso: 1. O processo onde foi interposto o presente recurso deu entrada em juízo a 07.04.2009.

  2. A acção nº 577/2000 foi proposta por J (…) & Filhos, Ldª” contra o aqui apelante e contra a esposa deste.

  3. A decisão nela proferida foi confirmada por acórdão da Relação de Coimbra de 25.09.2007 e do Supremo Tribunal de Justiça de 28.02.2008.

  4. O acórdão proferido no processo nº 267/00.4GNAGD foi confirmado por acórdão desta Relação de 01.07.2009.

    IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO O caso julgado constitui excepção dilatória[4], de conhecimento oficioso[5], que, a verificar-se, obsta que o tribunal conheça do mérito da causa e conduz à absolvição da instância[6].

    De acordo com o nº1 do artigo 497º do Código de Processo Civil, “as excepções de litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à listispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado”.

    Para o Prof. Manuel de Andrade[7] a excepção do caso julgado traduz-se em “a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais quando lhes seja submetida a mesma relação, todos tendo de acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão e de modo absoluto, com vista não só à realização do direito objectivo ou à actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes, mas também à paz social”.

    O instituto do caso julgado encerra em si duas vertentes, que, embora distintas, se complementam: uma, de natureza positiva, quando faz valer a sua força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; a outra, de natureza negativa, quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo mesmo ou por outro tribunal[8].

    A autoridade do caso julgado justifica-se/impõe-se pela necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas. E essa autoridade não é retirada, nem posta em causa mesmo que a decisão transitada em julgado não tenha apreciado correctamente os factos ou haja interpretado e aplicado erradamente a lei: no mundo do Direito tudo se passa como se a sentença fosse a expressão fiel da verdade e da justiça[9].

    De extrema pertinência, para a discussão da situação em análise, se revelam os ensinamentos do Prof. Castro Mendes[10], a propósito do efeito preclusivo do caso julgado: “Fora da hipótese de factos objectivamente supervenientes – e esta hipótese reconduz-se à ideia dos limites temporais do caso julgado: a sentença só é válida «rebus sic stantibus» - cremos que os «contradireitos» que o réu podia fazer valer são ininvocáveis contra o caso julgado. O fundamento essencial do...

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