Acórdão nº 584/09.8TBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução23 de Abril de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. L (…) e mulher A (…), residentes em (...), Guarda, intentaram a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra MC (…) e marido AJ (…), residentes em (...), Guarda, peticionando que: I) Se declare que são proprietários do prédio identificado no artigo 4º da petição inicial e que os réus são proprietários do prédio identificado nos artigos 9º e 10º do mesmo articulado.

II) Se declare que a favor do seu prédio e onerando aquele prédio dos réus se encontra constituída por usucapião uma servidão de passagem com o conteúdo descrito no artigo 24º da petição inicial, passagem essa que tem a largura de 3 metros.

III) Se declare que através dessa passagem, os autores acedem ao seu prédio pelo prédio dos réus e vice-versa, para os fins referidos nos artigos 21º e 32º da petição inicial.

IV) Se decrete a alteração do modo e local de exercício dessa servidão pelos autores, nos termos referidos nos artigos 54º a 57º da petição inicial, permitindo e ordenando que a passagem ou portaleira limitada pelos dois postes metálicos a que se refere o artigo 26º da petição inicial, actualmente com a largura de 3 metros, passe a ter a largura de 6 metros, sendo os réus condenados a reconhecerem-no.

V) Para tal fim, deverá o poste metálico implantado no lado nascente da portaleira ser retirado do local e implantando a uma distância de 3 metros no sentido nascente e na mesma linha limite dos prédios dos autores e dos réus, de forma a que essa passagem ou portaleira passe a ter a largura de 6 metros, sendo estes últimos condenados a reconhecerem-no.

Alegaram, em síntese, que são donos e legítimos proprietários do prédio rústico, sito em Tapada da Sardinha, (...), freguesia da (...), concelho da Guarda, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 1338º. Desde Março/Abril de 1966 até hoje, os autores vêm estando na posse contínua, pública, pacífica e de boa fé do referido prédio, pelo que, sempre o adquiriram por usucapião. Tal prédio não é confinante com a via pública em qualquer das suas confrontações. Por seu turno, os réus são donos e legítimos proprietários de um prédio misto, sito em Tapada da Sardinha, (...), freguesia da (...), concelho da Guarda, o qual confronta a norte com os autores, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 1339º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2226/19950612. A partir do lado poente, a entrada, acesso e passagem a pé, com animais e de carro para os prédios dos autores e dos réus é e sempre foi feita pelo prédio destes últimos através de uma faixa de terreno com 3 metros de largura, a qual se inicia numa portaleira/entrada aberta no limite poente do prédio dos RR, que dá acesso à estrada que liga (...) à Quinta do Noéme, e se desenvolve no sentido poente/nascente ao longo e paralelamente ao terreno dos autores, na confinância com o prédio dos réus. A referida entrada para a dita passagem sempre foi feita por uma portaleira com cerca de 4 m de largura, tendo os RR colocado no lugar dessa portaleira um portão metálico cujas extremidades fixaram em dois pilares de cimento. O leito dessa passagem na faixa de terreno dos réus desde há cerca de 3 anos e por iniciativa dos destes está pavimentada, assim como está delimitada a sul por uma vedação de arame e a norte por cômoros e muro de pedra na maior parte da sua extensão, numa largura de 3,60 m. Há mais de 25 anos, os autores vêm utilizando tal faixa de terreno para acederem e passarem do seu prédio para a via pública e vice-versa a pé, com animais e com carros com atrelado, transportando o leite produzido pelas vacas que guardam no seu prédio, feno para alimentação e cama dos animais, lenhas, estrumes e outros produtos, o que sempre fizeram na convicção de exercerem um direito próprio de servidão de passagem, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de boa fé e ininterruptamente, achando-se constituída por usucapião uma servidão de passagem, com as indicadas características e para os aludidos fins. Correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal da Guarda a acção 2360/03.2TBGRD, tendo sido proferida sentença a reconhecer a existência, por usucapião, de uma servidão de passagem de carro, a favor do prédio dos autores sobre o prédio dos réus, através da dita faixa de terreno com 3 m de largura, com a entrada de 4 m. Após o trânsito em julgado da sentença, os réus colocaram no limite entre ambos os prédios e no local onde os autores acedem ao seu prédio, uma espécie de portaleira delimitada por dois postes metálicos, que espetaram no solo, afastados 3 metros entre si, o que impossibilitou os autores de acederem, com tractor com reboque com cerca de 7 metros, que habitualmente utilizam no transporte de produtos, lenhas, estrumes, fenos e leite, ao seu prédio a partir da passagem aludida, já que ao virarem à esquerda para entrarem no seu prédio, a parte lateral do tractor e o reboque embatem nos postes metálicos. Do que decorre que a servidão de passagem com uma largura de 3 metros, tal como foi reconhecida, já não satisfaz as necessidades do prédio dos autores, porquanto a utilização de um carro puxado a animais acarreta graves inconvenientes na actividade agro-pecuária, devido à lentidão do transporte e, por outro lado, o mesmo se verifica com a utilização de um tractor agrícola de pequenas dimensões acoplado a um reboque com 1 ou 2 metros, dada a menor capacidade de carga que possui, pelo que para que os autores consigam entrar e sair do seu prédio a partir da faixa de terreno em causa, necessário se torna que os postes metálicos sejam colocados a uma distância de 6 metros entre si, bastando para o efeito arrancar o que se situa a nascente e implantá-lo a 3 metros de distância nessa direcção e na mesma linha limite de ambos os prédios, não ultrapassando os custos das obras necessárias a essa alteração €50,00, quantia que os autores se comprometem a pagar. Esta alteração não constitui para o prédio dos réus qualquer inconveniente ou prejuízo ou sequer acarreta qualquer diminuição das suas utilidades, trazendo, ao invés, para o prédio dos autores inequívocas vantagens, permitindo-lhes o acesso/saída do seu prédio com tractor e reboque de médias dimensões.

Contestou a ré, defendendo-se por impugnação e deduziu pedido reconvencional Assim, aceitando que os autores e os réus são donos e legítimos proprietários dos prédios que os autores identificaram, alegam, contudo, por um lado, que o prédio dos primeiros confronta a poente com caminho público, tal como o seu prédio confronta a norte com tal caminho público. Na sentença constitutiva da servidão de passagem, esta apenas diz respeito à passagem de carro, não abrangendo a passagem a pé ou com tractores, que não existe nem foi constituída. A dita passagem de 3 metros permite a entrada e acesso ao prédio dos autores de um carro e até de um tractor com reboque de médias dimensões. Alargar a passagem para 6 metros com incidência para nascente é aumentar, sem necessidade, a passagem e a entrada no prédio dos réus, devendo a mesma, caso venha a ser deferida, o que por mera hipótese admitem, incidir sobre a parte poente.

Reconvindo, e tendo em conta que o prédio dos autores confronta a poente com caminho público, que já existe desde tempos imemoriais, foi usado e é usado por toda a gente, incluindo os autores, sem oposição de quem quer que seja, então os autores não têm necessidade da servidão de passagem decretada na anterior acção judicial. Com efeito, desde o início do prédio e até às edificações que os mesmos construíram, existe espaço livre na confrontação com o caminho público, onde os autores podem abrir um acesso normal e satisfatório às necessidades de exploração agrícola do seu prédio, através de obras de acesso consistentes apenas na abertura de uma entrada/portaleira, o que não custará mais de €150,00, que se comprometem a pagar. Os autores pretendem utilizar a passagem com tractores e com uma largura de 6 metros na entrada para o seu prédio, o que representa a constituição de uma nova servidão, pelo que lhes assiste o direito de se eximirem ao ónus de ceder a passagem nos termos agora requeridos, adquirindo o prédio dos autores pelo seu justo valor, nos termos do artigo 1551º, do Código Civil.

Concluíram, pugnando pela improcedência da acção e peticionam:

  1. A declaração de extinção por desnecessidade da servidão de passagem decretada na acção 2360/03.2TBGRD, do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Guarda.

  2. Subsidiariamente, na hipótese de o pedido referido não proceder, a declaração de que os réus têm direito a se subtraírem ao encargo de ceder a passagem requerida pelos autores e, consequentemente, serem estes condenados a venderem aos réus o seu prédio dominante (prédio rústico com o artigo 1338º e identificado no artigo 4º da petição inicial), pelo preço que vier a ser fixado judicialmente, uma vez que não existe acordo.

    Os autores deduziram resposta, pugnando pela inadmissibilidade legal da reconvenção e impugnando os factos alegados pelos réus em abono da sua pretensão. Referiram, consequentemente, que o poente do seu prédio confronta com caminho particular, que apenas dá acesso à casa de habitação do Eng.º (…) e a um terreno denominado Carvalheira, de que é possuidor (…), conforme...

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