Acórdão nº 1279/10.5T2AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Novembro de 2013
Magistrado Responsável | ANABELA LUNA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I A Autora A...
, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. intentou a presente ação de processo ordinário, contra o Réu P (…), pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de €38.701,47 acrescida juros de mora a partir da citação até integral pagamento.
Alegou, para tanto, que, no exercício da sua atividade, celebrou com o proprietário do veículo (...)DS, futuramente «DS» um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice nº 45/421199, pelo qual assumiu a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com a circulação do mesmo.
No dia 20/11/2001, pelas 19h.45 min., o veículo «DS» conduzido de forma desatenta pelo Réu, foi causador de um acidente, depois de ter invadido a hemifaixa por onde circulava um motociclo com a matrícula 2-ALB-01-12, doravante «ALB».
Após o acidente, o Réu apressou-se a fugir do local, apesar de ter provocado lesões visíveis no condutor do «ALB».
Como consequência do acidente, o condutor do «ALB» esteve internado, tendo recebido tratamento às lesões, necessitou de tratamentos de fisioterapia e recuperação funcional, esteve incapacitado para o trabalho desde 20/11/2001 até 21/02/2002, e sofreu sequelas permanentes que lhe determinaram uma IPG de 5%.
Correu termos no 1º Juízo do extinto Tribunal de Comarca de Albergaria-a-Velha o processo nº 816/03.6, por via do qual a Autora foi condenada a indemnizar o condutor do «ALB» pelos danos patrimoniais e não patrimoniais no valor global de €38.701,47, o que a Autora fez.
Correu também o processo-crime sob o nº 106/02.1 GAALB, do 2º Juízo da extinta Comarca atrás referida, contra o Réu, à ordem do qual este foi condenado, em concurso real, pela prática de um crime de ofensas corporais negligente e de um crime de omissão de auxílio.
Assim, porque o Réu, após o acidente, prosseguiu a sua marcha, abandonando o sinistrado, tem a Autora contra ele direito de regresso, nos termos do disposto na al. c) do art. 19º do Dec. Lei nº 522/85, de 31/12.
O M.P., em representação do Réu (ausente) P (…), ao abrigo do art. 15º do C.P.C., deduziu contestação, defendendo-se por mera negação direta.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida decisão que julgou a ação improcedente, por não provada, e consequentemente, foi o Réu P (…) absolvido do pedido.
Inconformada com tal decisão veio a Autora recorrer, concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: I – Os autos têm origem num acidente ocorrido em Albergaria-a-Velha no qual o R., que conduzia o seu veículo no sentido E.N. 1 – Centro de Albergaria, chegado ao entroncamento com a Rua Padre Matos, à sua esquerda, atento o seu sentido de marcha, para lá mudou de direção de forma inopinada, sem sequer reparar que, no sentido contrário ao seu e pretendendo seguir em frente, seguia o motociclo ALB cujo condutor, uma vez embatido pelo ligeiro conduzido pelo R., caiu desamparado ao chão, ferindo-se com gravidade.
II – Após o acidente, o Réu apressou-se a fugir do local do acidente, apesar das lesões provocadas no condutor do ALB serem visíveis.
III – Como consequência do acidente, o condutor do ALB esteve internado onde recebeu tratamento às lesões, necessitou de tratamentos de fisioterapia e recuperação funcional e esteve incapacitado para o trabalho desde 20/11/2001 até 21/02/2002, e sofreu sequelas permanentes que lhe determinaram uma IPG de 5%.
IV – Em consequência do acidente, correu termos no 1º Juízo do extinto Tribunal de Comarca de Albergaria-a-Velha o processo nº 816/03.6, por via do qual se condenou a Autora a indemnizar, nos termos aí constantes, o condutor do ALB. Em cumprimento da dita condenação cível, a Autora indemnizou o condutor do ALB pelos danos patrimoniais e não patrimoniais no valor global de 38.701,47 €.
V – Também, por causa do acidente, correu o processo-crime sob o nº 106/02.1 GAALB, do 2º Juízo da extinta Comarca atrás aludida, contra o Réu, à ordem do qual este foi condenado, em concurso real, pela prática de um crime de ofensas corporais negligentes (p. e p. pelo art.º 148º, nº1 do C.P.) e de um crime de omissão de auxílio (p. e p. pelo art.º 200º, nº 1 e 2 do C.P.).
VI – Assim, porque o Réu, após o acidente, prosseguiu a sua marcha, abandonando o sinistrado, tem a Autora contra ele direito de regresso, nos termos do disposto na al. c) do art.º 19º do Dec. Lei nº 522/85, de 31/12, em vigor à data dos factos.
VII – Na sentença proferida nos presentes autos, e da qual se recorre, o Tribunal a quo, socorrendo-se de uma determinada tendência jurisprudencial infere, de entre outras conclusões, que “no momento em que o condutor voluntariamente decide omitir o auxílio à vítima e afastar-se sem o socorrer, já os danos resultantes do acidente, cobertos pelo seguro, estão, efetiva ou potencialmente, provocados, existindo já, relativamente a eles (ainda que futuros), responsabilidade civil da Seguradora.” VIII – Por outro lado, a sentença em crise reconhece que, nesses danos, estão necessariamente incluídos, todos aqueles que decorreram “do respetivo agravamento, causalmente conexionados com o abandono, já que os mesmos não estão abrangidos pelo contrato de seguro” – mas foram, ainda assim, pagos pela Seguradora, acrescentamos nós! IX – Ora, a concluir-se conforme antecede, não vê a A. / Apelante razão para que o Tribunal não decida segundo critérios de equidade (tão usada, v.g., na atribuição de valores relativos a danos não patrimoniais), e considere pelo menos uma percentagem de danos necessariamente produzidos por via do agravamento derivado do abandono, i.é, os tais que “não estão abrangidos pelo contrato de seguro”.
X – Bem pelo contrário, perante a consideração que “a Seguradora só teria direito de regresso contra o condutor, em caso de abandono de sinistrado, se de tal abandono tivessem resultado danos específicos ou o agravamento dos decorrentes do acidente e relativamente à indemnização dos mesmos”, os Acórdãos-referência chamados à colação pelo Tribunal a quo (bem como outros conhecidos na Jurisprudência) decidem, invariavelmente, pela improcedência total do pedido da Seguradora que, nos termos da lei, invoca o seu direito de regresso.
XI – Na vigência do D.L. 522/85, de 31 de Dezembro, e concretamente depois da fixação de Jurisprudência através do Acórdão 6/2002 ocorria, nos diversos Tribunais, a natural tendência não só para o aplicar a todos os casos de direito de regresso das Seguradoras, com base na alínea c) do art.º 19º do referido diploma legal (caso em que tivesse o condutor agido sob a influência do álcool) – o que é compreensível, face à natureza uniformizadora do Acórdão – como era também habitual estender-se o âmbito de aplicação também a quase todas as situações previstas no referido art.º 19º, como sejam, a condução sem habilitação legal, a não sujeição do veículo à inspeção legal obrigatória, aos casos de deficiência de acondicionamento da...
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