Acórdão nº 2167/09.3TBPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução05 de Novembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório.

A… pediu ao Sr. Juiz de Direito do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Pombal, em acção declarativa de condenação, com processo comum, ordinário pelo valor, que condenasse, solidariamente, o Município de Pombal e C…, Lda.: 1) A realizar as obras necessárias, tanto na Rua da …, como no prédio pertencente à 2ª Ré, de modo a que as águas das chuvas que aí caem não invadam o prédio pertencente à Autora, tendo em conta tudo o que acima se alegou.

2) A levarem a efeito todas as obras necessárias no imóvel pertencente à Autora, de modo a que este fique em condições de ser utilizado para arrendamento, como o vinha sendo antes da inundação acima relatada.

3) A levarem a efeito todas as obras necessárias no imóvel pertencente à 2ª Ré e na Rua da …, de modo a que as águas das chuvas que aí caiam não invadam o imóvel pertencente à Autora, como sucedia antes das obras levadas a efeito pela 2ª Ré, com a autorização da 1ª Ré.

4) A levarem a efeito todas as obras necessárias na Rua da V…, de modo a que a parcela de 1 metro de largura, com 57 metros de comprimento, que ocupara, fique no mesmo estado antes da ocupação e de modo a que a Autora a possa utilizar como o fazia antes dessa ocupação.

5) A pagar à Autora todas as quantias referentes às rendas que a Autora deixou de receber, desde a data da resolução do contrato de arrendamento, em virtude da inundação do seu prédio, até à data em que o imóvel estiver em condições de poder ser arrendado, acrescido ainda das respectivas actualizações anuais e dos juros moratórios, desde a data vencimento de cada mensalidade, até ao dia em que a Autora possa utilizar o seu barracão para arrendamento urbano.

Alegou, como fundamento destas pretensões, que é dona do prédio urbano, com barracão, destinado a indústria, sito em …, situado a sul do prédio rústico da ré C…, Lda. tendo a separá-los a Rua da …, relativamente à qual o seu prédio se encontra num nível mais baixo, que na frente prédio daquela existia, há 50 anos ou mais, uma vala de drenagem que recebia a água das chuvas que dele provinham para a Rua da …, que, em Março de 2005, a mesma ré, loteou o seu prédio, tendo pedido a respectiva licença à Câmara Municipal de Pombal, tapando, com as obras de infra-estruturas, a vala de drenagem e ocupando, em todo o cumprimento, 1 metro de largura do logradouro do seu prédio, pelo que a água das chuvas que cai no prédio da mesma ré, por o sistema de águas pluviais que instalou não estar suficientemente dimensionado e em condições de as receber todas, caminham em direcção àquela Rua e depois entram no seu prédio, que na noite de 24 para 25 de Outubro de 2006, choveu, no local, durante várias horas, tendo as águas provenientes do prédio da ré C…, Lda. circulado directamente para o seu prédio, destruindo parcialmente o muro do barracão voltado para a Rua da …, que o seu prédio voltou a ser inundado várias vezes e que o seu barracão estava arrendado, por € 300,00 mensais a …, que o usava como oficina da reparação de automóveis, e que, desde a queda parcial do muro, ocorrida no dia 25 de Outubro de 2006, resolveu, nesse mesmo mês, o contrato de arrendamento, tendo deixado de receber aquela renda e os aumentos anuais.

O Município de Pombal defendeu-se por excepção dilatória, invocado a incompetência, em razão da matéria do tribunal, e, por impugnação, alegando desconhecer parte dos factos articulados pela autora e afirmando que não autorizou nem licenciou a construção do barracão, que o projecto de loteamento foi aprovado após a verificação das normas urbanísticas aplicáveis, que recepcionou provisoriamente a obra, estando as soluções adoptadas para o escoamento de águas pluviais de acordo com a regulamentação aplicável, que os prejuízos sofridos pela autora resultarem de circunstâncias excepcionais, e que o alargamento da Rua da …. não foi feito através da ocupação de parte do seu prédio, mas por cedências feitas pela co-demandada no âmbito do processo de loteamento.

A ré C…, Lda., defendeu-se também por excepção dilatória, invocando a sua ilegitimidade, por ter executado o loteamento de acordo com o projecto aprovado, sendo a responsabilidade do emitente da licença de alvará de loteamento, e, por impugnação, alegando ignorar parte dos factos articulados pela autora, afirmando que não foi a execução do loteamento que originou o escoamento das águas para a Rua da … e a invasão e a inundação do prédio daquela, que o desabamento do prédio foi consequência de condições atmosféricas anormais e excepcionais e que nenhuma parte desse prédio foi ocupado com o alargamento da Rua da … Oferecida a réplica, o despacho saneador julgou improcedente a excepção dilatória da sua ilegitimidade ad causam, invocada pela ré C…, Lda., mas procedente a da incompetência material do tribunal, alegada pelo Município de Pombal, que, com esse fundamento, foi absolvido da instância – decisão que não foi logo objecto de impugnação, através da interposição de apelação autónoma.

Seleccionada a matéria de facto e concluída a perícia colegial procedeu-se à audiência de discussão e julgamento – com registo sonoro dos actos de prova levados a cabo oralmente – no terminus da qual se decidiu, sem reclamação, a matéria de facto seleccionada para a base instrutória.

A sentença final, julgando a acção parcialmente procedente: a) Declarou o direito de propriedade da A. sobre o prédio referido em 1. dos factos provados e condenou a R. a entregar-lhe a parcela que do mesmo prédio ocupou com as obras de repavimentação da Rua da … e referida em 36. dos mesmos factos provados, livre e desocupada do que ali colocou e a efectuar as obras de remoção para tal necessárias; b) Condenou a R. a realizar as obras necessárias, no empreendimento que levou a cabo no prédio dito em 4. dos factos provados, mormente no seu limite junto à Rua da …, complementando o sistema de drenagem que ali implantou, com a colocação de uma grelha, nos termos mencionados em 28. dos ditos factos, por forma a substituir a vala de escoamento antes existente no local e impedindo que as águas das chuvas que antes por ela era conduzidas, voltem a invadir o prédio da A. supra mencionado, excepção feita ás que, já antes, levavam esse encaminhamento, por extravasarem a capacidade da dita vala; c) No demais peticionado absolveu a R. dos pedidos contra si deduzidos.

É esta sentença que a autora impugna no recurso ordinário de apelação, no qual pede a sua revogação, na parte de que se recorre, tendo rematado a sua alegação com estas conclusões: … Não foi oferecida resposta.

  1. Factos provados.

    … 3.

    Fundamentos.

    3.1.

    Delimitação do âmbito objectivo do recurso.

    Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC de 1961, e 635 nº 2, 2ª parte, e 3 do NCPC).

    Em face do trânsito em julgado da decisão que absolveu o Município de Pombal da instância – resultante da não interposição da apelação autónoma – da instância, esta encontra-se subjectivamente reduzida, do lado passivo, à demandada, C…, Lda. (artº 677 do CPC de 1961 e 628 do NCPC).

    Um largo troço da alegação da recorrente é ocupado com a transcrição dos depoimentos de três das testemunhas inquiridas na audiência final. Pareceria, por isso, que a impugnação da recorrente se dirigiria, também, contra a decisão da questão de facto. Porém, se era aquela a finalidade visada pela recorrente com aquela transcrição, a verdade é que a recorrente não cumpriu, com a pontualidade devida, o ónus de impugnação da decisão da matéria de facto que a lei é terminante em adstringi-la.

    Realmente, a recorrente em lado da sua alegação especifica ou individualiza os pontos de facto que, no seu ver, foram erroneamente julgados (artº 685-B nº 1 a) do CPC de 1961).

    Nestas condições, ainda que se devesse entender que a impugnação tem também, por objecto, a decisão da matéria de facto, sempre se imporia, face à insatisfação, pela recorrente, do mencionado ónus, a rejeição, nessa parte, do recurso (artº 685-B nº 1, in fine, do CPC de 1961). Mas isso não impede, evidentemente, o exercício por esta Relação dos poderes oficiosos de rescisão ou de cassação da decisão da matéria de facto da 1ª instância que a lei lhe reconhece, designadamente no caso de erro sobre o objecto da prova (artº 712º, nº 4, 1ª parte, do CPC de 1961).

    Portanto, o recurso terá por objecto tanto o controlo sobre a matéria de facto, por erro sobre o objecto da prova, como o controlo sobre a matéria de direito, i.e., a correcção da sentença impugnada no tocante à escolha da norma aplicável para enquadrar o caso concreto, à integração dos factos apurados na norma aplicável e à aplicação, aquele caso, da consequência jurídica definida por essa norma. Ao objecto relativo ao error in iudicando da questão de direito, soma-se o error in procedendo, representado pela invalidade da decisão impugnada, resultante da sua nulidade substancial.

    Dos vários pedidos condenatórios formulados pela recorrente, a sentença impugnada desamparou dois: a) O de condenação da recorrida a levar a efeito todas as obras necessárias no imóvel pertencente à Autora, de modo a que este fique em condições de ser utilizado para arrendamento, como o vinha sendo antes da inundação acima relatada; b) O de condenação da apelada a pagar à Autora, todas as quantias referentes às rendas que a Autora deixou de receber, desde a data da resolução do contrato de arrendamento, em virtude da inundação do seu prédio, até à data em que o imóvel estiver em condições de poder ser arrendado, acrescido ainda das respectivas actualizações anuais e dos juros moratórios, desde a data vencimento de cada mensalidade, até ao...

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