Acórdão nº 65/12.2TAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelCORREIA PINTO
Data da Resolução03 de Julho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I) Relatório 1.

O Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, através da Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, lavrou auto de notícia relativamente à sociedade arguida, A..., L.da, melhor identificada nos autos, por alegada prática de contra ordenação ambiental grave, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 59.º, n.º 6, do Decreto-lei n.º 270/2001, de 6 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 340/2007, de 12 de Outubro, e 22.º, n.º 3, alínea b), da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, alterada e republicada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de Agosto.

No prosseguimento do processo de contra-ordenação n.º CO/001030/10, a entidade administrativa – Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território – proferiu decisão, em 27 de Outubro de 2011 (fls. 104 a 118); aí, considerando que a arguida praticou, de forma negligente, a contra-ordenação que determinou a instauração do procedimento, aplicou à mesma uma coima no valor de € 15.000,00.

A arguida, não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso de impugnação judicial, dando origem ao processo n.º 65/12.2TAMMV, do Tribunal Judicial de Montemor-o-Velho. Aí concluiu afirmando não se verificar a infracção em causa, pelo que deveria ser absolvida; sem prescindir e a não se entender assim, requereu a aplicação da sanção de admoestação; afirmou a inconstitucionalidade da norma que determina a coima, por violação do princípio da proporcionalidade, equidade, necessidade e adequação.

Admitido o recurso e realizada audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença, na qual o tribunal decidiu julgar totalmente improcedente o recurso de contra-ordenação e, consequentemente, manter nos seus precisos termos a decisão administrativa.

  1. A arguida, não se conformando também com esta decisão, interpôs o presente recurso.

    Na respectiva motivação, formula as seguintes conclusões: 1) Por decisão da entidade administrativa, foi a recorrente condenada ao pagamento de uma coima de 15.000,00€ pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo artigo nº 6 do artigo 59º do DL270/2001 de 6 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo DL340/2007, de 12 de Outubro, sancionável com coima de 15.000,00€ a 30.000,00€.

    2) A autoridade administrativa, totalmente desprovida de razão, alicerça a condenação da arguida na putativa violação do PARP ao modelar o terreno com o enchimento parcial da corta com outros materiais, nomeadamente outros resíduos para além dos estéreis da exploração.

    3) Ora, apesar do enchimento parcial da corta dever ser efectuado mediante a utilização de estéreis resultantes da exploração das massas minerais arenosas como consta do PARP, o certo é que não está vedado o recurso a outro tipo de materiais que, perante o caso concreto, se revelem mais adequados ao fim visado.

    4) Com efeito, prescreve o ponto 7.5.3 do PARP que «todos os restantes materiais a utilizar na obra não previstos no caderno de encargos deverão apresentar as características definidas pela legislação que lhes for aplicável, ou, na falta desta, as que melhor satisfaçam os fins em vista».

    5) Ou seja, o próprio plano prevê a possibilidade de serem utilizados outros materiais não descritos no aludido caderno de encargos.

    6) E porque assim é, a arguida utilizou os materiais adequados para o enchimento da corta, além dos descritos no PARP.

    7) Na verdade, o recurso a estes materiais (resíduos resultantes da queima de biomassa florestal) é um procedimento aprovado e recomendado pela CCDR no que toca à recuperação de pedreiras.

    8) Mais, a referida operação tratou-se sim da primeira fase da valorização com vista a reestruturar o solo ao nível das camadas existentes dos terrenos adjacentes, de forma a permitir uma reabilitação e reestruturação agrícola correcta.

    9) E a utilização dos referidos materiais em espaços de anteriores explorações mineiras é – repete-se – o tecnicamente adequado por se tratar de resíduos submetidos a processos térmicos de altas temperaturas que os tornam inócuos e potencialmente inertes.

    10) O que a Autora efectivamente fez – e em seu entender bem – foi repor a estrutura interna do solo, devolvendo-lhe a sua integridade e conferindo-lhe a homogeneidade geológica que inicialmente existia.

    11) Por outro lado, o enchimento da corta visa também a criação de uma base de sustentação para as plantas que serão colocadas naquele local, conforme continua a constar do Plano Ambiental e de Recuperação Paisagística aprovado pela entidade recorrida.

    12) Tais procedimentos, repete-se, além de serem aprovados e recomendados pela entidade recorrida para a recuperação de pedreiras, constam do pedido de autorização que deu originem ao alvará de licença em causa nos autos.

    13) Tal actuação constitui um abuso do direito, na sua vertente venire contra factum proprium.

    14) Ora, se as operações realizadas e procedimentos utilizados foram apresentados à entidade recorrida aquando do pedido de licença e não mereceram nessa altura qualquer oposição, não pode a entidade administrativa vir alegar – como alega – que foi utilizado qualquer material não autorizado no Plano e que deveria ter sido comunicada qualquer alteração ao PARP.

    15) Alteração ao PARP essa que, aliás não existiu, uma vez que, como se disse já, nele se encontra prevista a possibilidade de utilização de outros materiais.

    16) Ou seja, a conduta da arguida não se afasta dos propósitos do PARP, estando completamente alinhada com os objectivos deste.

    17) Não se vislumbrando factos merecedores de censurabilidade, visto as medidas adoptadas serem totalmente compatíveis com os objectivos do PARP.

    18) A tudo acresce que o Plano Ambiental e de Recuperação Paisagística se encontra actualmente praticamente concluído, estando toda a zona do areeiro reabilitada, com plantas e árvores de fruto.

    19) A aplicação de um montante tão elevado de coima poderá estar a pôr em causa a sobrevivência da recorrente, sendo para a mesma incomportável o pagamento de tal valor.

    20) A recorrente nunca cometeu outra contra-ordenação.

    21) Não se descortinando factos censuráveis que possam consubstanciar qualquer comportamento ilícito, não lhe podendo ser imputada qualquer contra-ordenação, nem aplicada qualquer coima.

    22) Mas, ainda que assim não fosse – e é – o que apenas por mera cautela de patrocínio se aflora, não há sanção mais adequada para o caso sub iudice, do que a pena de admoestação.

    23) De facto, a gravidade da contra-ordenação imputada à recorrente é praticamente nula, na medida em que o método utilizado foi o mais adequado, não prejudicou de qualquer forma o meio ambiente, e a conduta não foi dolosa.

    24) Mais, a aplicação de uma coima no montante de 15.000,00€ é desproporcional, injusta, podendo mesmo conduzir ao encerramento da recorrente, não se descortinando como pode ver-se cumprido o objectivo do DL n.º 340/2007 – equilíbrio entre os interesses públicos do desenvolvimento económico e a protecção do ambiente.

    25) Sendo a norma que determina tal coima para a prática da contra-ordenação em causa nos autos manifestamente violadora do Princípio da proporcionalidade, da equidade, da necessidade e da adequação constitucionalmente consagrados.

    26) Não sendo compreensível para o cidadão comum que a falta de comunicação de um facto, ainda que não provoque qualquer prejuízo ao ambiente ou a quem quer que seja, determine o pagamento de uma coima de 15.000,00€ a 30.000,00€.

    27) O que, diga-se é sintomático, aliás, de uma evidente incongruência do ordenamento jurídico.

    28) O legislador desconsiderou, relativamente às contra-ordenações ambientais, as enormes diferenças quanto à ofensividade e necessidade de tutela existentes entre o direito penal e o direito contra-ordenacional, conferindo à tutela contra-ordenacional uma eficácia preventiva muito superior à tutela penal, o que não é admissível no ordenamento jurídico, já que configura uma drástica e distorcida alteração da hierarquia da ofensividade dos bens jurídicos, logo contrária à Lei Fundamental.

    29) O legislador não deveria poder punir de forma mais gravosa quem pratica uma contra-ordenação em relação a quem pratica um crime. Ora, com o montante de coima a que a recorrente foi condenada, está a fazê-lo, pois atribui-se maior desvalor à conduta do agente que pratique uma contra-ordenação do que à daquele que pratique um crime.

    30) Não podendo deixar de se considerar que a norma em causa é violadora da Constituição da República Portuguesa, o que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.

    31) Ora, tendo em vista a gravidade da contra-ordenação, que é diminuta, bem como a gravidade da culpa, que é reduzida, uma vez que não se pode afirmar a respondente actuou dolosamente, é manifesta a aplicabilidade da sanção de admoestação.

    32) Na realidade, como se disse já, a gravidade da contra-ordenação tout court depende do bem ou interesse que tutela e do benefício retirado e do resultado ou prejuízo causado pelo agente.

    33) E o certo é que a actuação da recorrente – ou omissão – não revestiu particular gravidade, em nada prejudicando a qualidade ambiental, sendo diminuta a sua culpa e sendo certo que nenhum benefício retirou com a sua conduta.

    34) Acresce que a sanção a aplicar à ora recorrente deverá pautar-se pelo estrito cumprimento dos Princípios da Culpa, da Proporcionalidade e da Legalidade constitucionalmente consagrados.

    35) Sendo a admoestação a medida justa, equilibrada e proporcional para a actuação em causa.

    36) A tudo acresce que a respondente sempre julgou que estava a agir a coberto da legalidade.

    37) A ora recorrente sempre foi uma empresa responsável e conscienciosa em termos ambientais, sendo cuidadosa e respeitadora das normas legais e nada faz prever que volte a praticar a infracção por que vem acusada.

    38) Face ao exposto, é notório que a autoridade administrativa ao reger-se de acordo com a...

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