Acórdão nº 988/12.9TMCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução02 de Julho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório.

    1. O presente recurso insere-se num procedimento cautelar de arrolamento instaurado pela recorrida P (…) contra o recorrente R (…) no qual a requerente mulher pediu o arrolamento de alguns bens (…), bens que foram efectivamente arrolados sem prévia audiência do requerido.

      Na oposição ao arrolamento decretado o recorrido sustentou que o arrolamento devia ser levantado porque os bens foram adquiridos com dinheiro próprio do recorrente após a separação de facto do casal, com dinheiro que recebeu a título de indemnização por cessação do seu contrato de trabalho, cessação que também ocorreu após a separação de facto.

      Na sentença decidiu-se que a quantia recebida a título de indemnização era bem comum do casal e, por essa razão, a oposição foi julgada improcedente.

    2. É desta decisão que vem interposto o recurso, pretendendo com ele obter o levantamento do arrolamento dos bens referidos nos n.º 10 a 15, inclusive, dos factos provados abaixo indicados no ponto «III», com fundamento nas seguintes conclusões: «a) Deverá ser considerado bem próprio o montante correspondente à indemnização recebida pelo Recorrente por cessação do contrato de trabalho, celebrado antes do seu casamento com a recorrida ocorrido após a separação dos cônjuges; b) Deverá ser considerado bem próprio a indemnização em apreço, ao menos na medida em que, para o seu cálculo, foi levado em contra um período anterior à celebração do casamento já que, por definição, nenhuma participação no esforço conjunto de formação do rendimento pode ser reconhecido à recorrida; c) Ao menos, por aplicação de regras de proporcionalidade deverá ser subtraído ao montante global da indemnização recebida por cessação do contrato de trabalho, o valor correspondente aos 14 anos, que corresponde a um valor ilíquido de 116.457,00 €, em que o Recorrente não teve qualquer relacionamento com a Requerente; d) Deverão ser considerados bens próprios: o veículo BMW Z 4 2.2 de matricula 77-22-XG, a moto Ducati Monster S2R 800 com a matricula 22-EG-09, o veículo Jaguar S-Type 2.7 DSL Executive com a matricula 46-22-ZQ, um Televisor LCD Samsung 22 B2230HD, uma impressora Multifunções Epson Stylus SX420W, um computador Packard Bell, One Two, MA5011 PO, por sub-rogação, porque, comprados com o montante da indemnização correspondente aos 14 anos anteriores ao casamento com a requerente.

    3. Deverá ser levantado o arrolamento decretado pelo douto Despacho do Juiz a quo em relação aos bens referidos em c).

      Termos em que, revogando o douto Despacho no que concerne ao valor considerado bem comum, e concomitantemente, ordenando o levantamento do arrolamento em relação aos bens adquiridos por sub-rogação, …» c) A recorrida contra-alegou, concluindo desta forma: «

    4. Inconformada com a decisão que julgou improcedente a oposição formulada aqui recorrente veio o mesmo dela interpor recurso de Apelação, colocando-a em causa, em síntese, quanto aos seguintes aspetos: - que deverá ser considerado bem próprio o montante correspondente à indemnização recebida pelo Recorrente, por cessação do contrato de trabalho, celebrado antes do seu casamento com a recorrida, ocorrido após a separação dos cônjuges; - que deverá ser considerado bem próprio a indemnização em apreço, ao menos na medida em que, para o seu cálculo, foi levado em conta um período anterior à celebração do casamento, já que, por definição, nenhuma participação no esforço conjunto de formação do rendimento pode ser reconhecido à recorrida; - que deverão ser considerados bens próprios o veículo BMW Z4 2.2 matrícula 77-22-XG, a moto Ducati Monter S2R 800, com a matrícula 22-EG-09, o veículo Jaguar SType 2.7 DSL Executive, com a matrícula 46-22-ZQ, um televisor LCD Samsung 22 B2230 HD, uma impressora Multifunções Epson Stulus SX420W, um computador Packard Bell, One Two, MA5011 PO, sub sub-rogação, porque, comprados com o montante da indemnização correspondente aos 14 anos anteriores ao casamento com a requerente; - que deverá ser levantado o arrolamento decretado pelo douto despacho do Juiz a quo em relação aos bens supra referidos.

    5. Como resulta indiciariamente provado na decisão recorrida, a Recorrida instaurou ação de divórcio litigioso, sem consentimento do outro cônjuge em 27.12.2012, sendo que Recorrente e Recorrida se encontram divorciados desde 06.03.2013, por sentença já transitada em julgado, após convolação dos autos para mútuo consentimento.

    6. Ao contrário do que o Recorrente quer dar a entender, na decisão proferida no processo de divórcio a que os presentes autos se encontram apensos, não foi fixada qualquer data de separação de facto entre Recorrente e Recorrido, o que nem sequer seria possível, uma vez que a data do início da separação de facto tem de ser fixada, imperativamente, na sentença proferida no âmbito do processo de divórcio na sua modalidade sem consentimento do outro cônjuge (Veja-se neste sentido os Acs. do STJ, de 22.01.1997, de 16.03.2011 e de 22.05.2012 in www.dgsi.pt, ps. 96A567, 261-C/2001.L1.S1 e 601/2002.C1.S1.) d) Por outro lado, esquece-se o Recorrente que a prova produzida nos presentes autos, que constituem um procedimento cautelar de arrolamento, designadamente no que respeita à data da separação de facto entre os então cônjuges, é meramente indiciária! e) Assim, pese embora se tenha indiciariamente provado nos presentes autos que, tendo-se o Recorrente desentendido com a Recorrida, em 01.08.2010 passou a viver em Cernache, tal prova é ineficaz/irrelevante, não sendo possível, com base na mesma, retroagir a tal data os efeitos do divórcio decretado nos autos principais a que estes se encontram apensos.

    7. Pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao ter considerado irrelevante, para a decisão a proferir quanto a oposição deduzida pelo Recorrente, que na data de aquisição dos bens aqui em causa, o Recorrente e a Recorrida estivessem separados de facto, atento do disposto no n.º 2 do art. 1789.º do C.C., decisão esta que deverá ser mantida para todos os efeitos legais.

    8. Alega ainda o Recorrente que, a considerar-se a indemnização recebida pelo mesmo, por acordo de revogação de contrato de trabalho, como bem comum do ex casal, então a mesma deverá ser proporcionalmente reduzida ao tempo em que vigorou, em simultâneo, o seu vínculo laboral com a sua ex-entidade patronal e o seu casamento com a aqui Recorrida.

    9. Alegando, em consequência, que deverá ser levantado o arrolamento dos bens arrolados nos presentes autos, por os mesmos terem sido adquiridos com a parte da indemnização referente ao período de vínculo laboral anterior ao seu casamento com a ora Recorrida!!!!! i) Porém, não se mostra provado nos presentes autos, com que parte da indemnização foram adquiridos os bens cujo arrolamento o Recorrente pretende ver levantado, nem sequer tal foi alegado pelo mesmo na sua oposição!!! j) Pelo que, não se vê como se poderá levantar o arrolamento dos bens aqui em causa, com base na sub-rogação, na hipótese de a indemnização do Recorrido ser considerada, simultaneamente bem comum (na parte referente ao tempo em que vigorou, em simultâneo, o seu vínculo laboral com a sua ex-entidade patronal e o seu casamento com a aqui Recorrida) e bem próprio (na parte referente ao tempo em que vigorou o seu vinculo laboral com a sua ex-entidade patronal até ao seu casamento com a aqui Recorrida)!! k) Por outro lado, resulta dos presentes autos, que o regime de casamento que vigorava entre os então cônjuges era o regime da comunhão de adquiridos e que a indemnização auferida pelo Recorrido, em virtude da revogação do seu contrato de trabalho, foi auferida na constância do casamento com a aqui Recorrida, bem como que foi com a mesma que foram adquiridos os bens arrolados e aqui em causa.

    10. Nos termos do disposto na alínea a) do art. 1724.º do C.C., no regime da comunhão de adquiridos, o produto do trabalho dos cônjuges faz parte da comunhão.

    11. Porém, o “produto do trabalho” não é constituído apenas pela retribuição, tal como se encontra prevista no art. 349.º do C.T. de 2003, tendo a doutrina maioritária vindo a entender que as indemnizações recebidas por acidente de trabalho, doenças profissionais, reforma antecipada e despedimento têm qualidade de bens comuns, entendimento que tem sido sufragado pela maioria da jurisprudência (veja-se neste sentido Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, in “Curso de Direito da Família”, Vol. I, 4.ª ed., pág. 538) n) No caso vertido nos presentes autos, o Recorrido recebeu a título de compensação pecuniária de natureza global a quantia de 166.367,00, aquando da revogação do seu contrato de trabalho com a sua ex-entidade patronal, a qual não visou a proteção da pessoa do Recorrido, constituindo, antes, uma compensação pela perda dos proventos que o mesmo deixou de auferir a partir de tal cessação.

    12. Pelo que, como aliás refere o Recorrente nas suas Alegações, o direito a tal indemnização/compensação nasce no momento em que ocorre a cessação do contrato de trabalho. (Veja-se neste sentido, para além da jurisprudência citada na douta decisão recorrida, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25.10.2011 e de 22.01.2008 e o Acórdão da Relação do Porto, de 22.01.1996, todos publicados in www.dgsi.pt.) p) Pelo que, atento o momento do nascimento do direito à compensação recebida pelo Recorrente, que ocorreu na constância do seu casamento com a aqui Recorrida, é irrelevante que a mesma tenha ou não em consideração o número de anos que o Recorrente trabalhou para a sua ex-entidade patronal.

    13. Assim, dúvidas não restam que, tendo em conta tudo o supra exposto, a resposta a dar a todas as hipóteses colocadas pelo Recorrente terá de ser a mesma: a compensação auferida pelo Recorrente é bem comum do casal, integrando os bens arrolados nos presentes autos o património comum do Recorrente e da Recorrida, em consequência e via por de sub-rogação.

    14. Assim, bem andou o Tribunal a quo ao ter julgado improcedente a oposição deduzida pelo Recorrente, não merecendo a decisão...

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