Acórdão nº 2603/10.6TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelFREITAS NETO
Data da Resolução04 de Junho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: A..., B...

e C...

propuseram na Vara de Competência Mista de Coimbra (2ª Secção) uma acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra D...

. LDA, pedindo a condenação da Ré a despejar determinado imóvel, em consequência da resolução do arrendamento existente, por a mesma ter promovido uma alteração não permitida do fim a que contratualmente o locado se encontra destinado (que é apenas de mercearia e que aquela passou a usar como café-bar) e, bem assim, modificado a disposição e planificação do respectivo interior, igualmente sem consentimento dos senhorios.

Citada, a Ré contestou alegando, quanto à invocada alteração de fim, que o contrato permite a utilização do locado para qualquer ramo de comércio e a realização de obras com essa amplitude, sendo em consonância com essa possibilidade que desde 1988 nele vem a Ré explorando a actividade de bar para os clientes do minimercado; quanto às obras, aduziu que, tendo sido efectivamente levadas a cabo, ou produziram uma melhoria das precárias infra-estruturas existentes, ou de todo o modo são facilmente removíveis, não consubstanciando fundamento para a resolução contratual. Termina com a improcedência da acção e, deduzindo reconvenção, pede que, em caso de procedência da acção, os AA. sejam condenados a pagar-lhe o valor das benfeitorias que efectuaram no locado e lhe aumentaram o valor.

Houve réplica em que os AA.

responderam à matéria da reconvenção, à qual se seguiu tréplica da Ré. No entanto, os pedidos e causas de pedir já formulados mantiveram-se.

A final foi a acção julgada improcedente por não provada, a reconvenção prejudicada, e em função disso, Ré e AA. foram absolvidos dos correspondentes pedidos.

Inconformados, deste veredicto recorreram os AA., recurso admitido como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

* A apelação.

Os apelantes fecham a respectiva alegação com o seguinte enunciado conclusivo: 1- O Dig.o Tribunal a quo cometeu erros na avaliação da prova produzida nos autos, tendo por consequência a decisão proferida que levou à total improcedência da acção; 2- Nomeadamente quanto à avaliação do ramo de comércio praticado no locado bem como a avaliação das obras ali realizadas pela arrendatária ora recorrida; 3- Os comportamentos da arrendatária configuram um grave incumprimento do contrato de arrendamento bem como uma lesão grave do direito de propriedade dos senhorios; 4- Sendo certo que, nessa medida, não se pode exigir aos ora recorrentes que mantenham o arrendamento; 5- Caso assim se venha a entender, deverá o tribunal a quo clarificar os montantes e qualificação das benfeitorias, bem como o direito ou não ao respectivo pagamento; 6- A sentença ora em crise violou os art.ºs 1074, 1083 e 1111 do C. Civil, 668, nº 1, al.ª c) do CPC.

Contra-alegando, a Ré respondeu, batendo-se pela confirmação do sentenciado.

Sobre a impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

Embora se escusem de reproduzir nas conclusões do recurso os pontos de facto que têm por incorrectamente julgados, fazem os recorrentes a menção desses pontos no corpo das alegações recursivas, insurgindo-se contra as respostas dadas aos nºs 20, 25, 8, 28, 29, 31 e 32 da base instrutória. Propõem resposta positiva aos nºs 20 e 25; aos restantes referem apenas que “existe erro na sua apreciação (…) porquanto a sua resposta não corresponde à prova produzida nos autos”.

Para a manifestação desta discordância, e uma vez que procederam à junção da integral transcrição de todos os depoimentos prestados em audiência, vão os apelantes remetendo os seus fundamentos para segmentos da aludida transcrição por mera referência às páginas respectivas (cfr. fls. 334 a 343).

Não se nos afigura que desta forma se possa dizer devida e cabalmente cumprido o ónus que está a cargo do recorrente enquanto impugnante da matéria de facto, tal como esse ónus se mostra prescrito nos nºs 1 e 2 do art.º 685-B do CPC.

Se não vejamos.

Nos termos do art.° 712, nº l do CPC, "A decisão do tribunal de 1ª Instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690. °-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir aprova em que a decisão assentou.

A propósito do recurso em matéria de facto importa lembrar que no preâmbulo do diploma conformador do registo da prova nos moldes que hoje no essencial subsistem (o DL 39/95 de 15/02) foi traçado do seguinte modo o objectivo que com essa reforma processual se quis alcançar no que concerne à garantia do 2º grau de jurisdição na apreciação daquela matéria: (a garantia) "nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência — visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso".

Nos termos do nº 1 do novo art.º 685-B do CPC, aditado pelo art.º 2º do DL 303/2007, de 24/08 (aplicável aos vertentes autos ex vi do nº1 do respectivo art.º 12) deve o recorrente que pretender reagir contra a decisão proferida sobre a matéria de facto, não só especificar os pontos que considera incorrectamente julgados como discriminar os meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham uma resposta diversa da recorrida.

E, de harmonia com o disposto no nº 2 do mesmo artigo, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no nº 2 do art.º 522-C, incumbe ao recorrente, sob pena de rejeição (…) “indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição”.

Ora temos por insofismável que quanto aos nºs 8, 28, 29, 31 e 32 os recorrentes não apontam a resposta diversa de que fala a lei, não indicando o que para eles é o sentido do correcto julgamento. Outra coisa não se pode retirar da insondável e ambígua expressão de que o julgamento dos aludidos pontos enferma de erro “porquanto a sua resposta não corresponde à prova produzida nos autos”.

É que tais pontos mereceram respostas restritivas de “provado apenas” e de “não provado”, pelo que não sendo os recorrentes necessariamente assertivos na impugnação destas respostas – como a nosso ver é exigência que decorre do mencionado comando legal do art.º 685, nº1, alínea b), do CPC, na parte em que se refere à indicação dos meios probatórios a “impor decisão diversa da proferida” – em homenagem à verdade processual também não pode este tribunal de recurso prescrutar a vontade dos impugnantes, no que toca a saber se querem que sejam agora proferidas, quanto a todos pontos em questão, ou só a alguns deles, respostas mais ou menos restritivas, restritivas noutro sentido, apenas explicativas ou simplesmente de “provado”.

Isto é, não se verifica uma verdadeira e própria impugnação da decisão daqueles cinco pontos.

Pelo que, ao abrigo do disposto no art,º 685-B, nºs 1, alíneas a) e b) e nº 2, vai o recurso nessa parte rejeitado.

Queda assim por apreciar o segmento impugnatório atinente aos nºs 20 e 25 da b.i., cujo teor é o seguinte: 20 Tal alteração de actividade e consequente alteração do diferente ramo do negócio provoca alteração total da clientela que é completamente diferente da que frequentava o minimercado? 25 As obras realizadas destinaram-se à alteração do ramo de negócio existente? A estes...

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