Acórdão nº 1428/10.3TBPMS-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Junho de 2013
Magistrado Responsável | LUÍS CRAVO |
Data da Resolução | 25 de Junho de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO Por apenso aos autos em que era Exequente “T (…)– Comércio de Máquinas e Equipamentos, Ld.ª” e executados “S (…) Ld.ª” e J (…) veio este executado deduzir oposição à execução, alegando, em síntese, que não foi por si declarada expressamente a fiança e que a obrigação principal se extinguiu, atenta a reserva de propriedade prevista no contrato de compra e venda celebrado com a co-executada sociedade.
* A Exequente contestou, sustentando que o Opoente vendeu a máquina escavadora a terceiros e que a obrigação de pagar o preço acordado e a extinção da fiança não se extinguiram.
* Na sequência foi proferido despacho saneador, com a afirmação tabelar dos pressupostos processuais, finalizando-se por dispensar a selecção da matéria de facto, dada a simplicidade da causa, tudo sem reclamação.
* Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância do formalismo legal, tendo sido na oportuna sequência proferido despacho de resposta à matéria de facto (cf. fls. 58-60), do qual não coube qualquer reclamação.
Veio finalmente a ser proferida sentença através da qual se julgou improcedente quer o fundamento da oposição consistente na falta de assunção de fiança pelo Opoente, quer o fundamento da alegada extinção da obrigação principal (donde e concomitantemente, da obrigação acessória do fiador), em face da reserva de propriedade prevista no contrato, termos em que, na total improcedência da oposição deduzida, se determinou o normal prosseguimento da execução para pagamento da quantia exequenda.
* Inconformada com essa sentença, apresentou o Opoente/Executado recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: «1 – Os factos provados com relevo para a boa decisão da causa.
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O vendedor, Tecma, ora exequente, declarou vender a máquina, mas transferindo a respetiva posse para o comprador, declarou reservar para si o direito de propriedade até ao integral pagamento do preço, declaração de vontade que foi assinada pelo seu legal representante, conforme resulta das cláusulas 1.ª, 3ª e 5.ª.
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Provado ficou que no escrito designado por contrato de compra e venda não consta qualquer declaração de vontade reduzida a escrito e que se limitou a assinar por baixo da palavra fiador.
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Acordado ficou entre comprador e vendedor que a falta de pagamento de uma das prestações fazia vencer as restantes, clausula 4.ª do aludida escrito.
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A Exequente notificou o executado, ora Recorrente do vencimento da totalidade das prestações por falta de pagamento de três prestações.
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Acordado entre comprador e vendedor ficou que o vendedor fica com plenos direitos sem necessidade de outra formalidade para entrar na posse da máquina e seus acessórios logo que o comprador não proceda ao pagamento voluntários e pontual das prestações, clausula 5.ª.
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Ficou acordado entre vendedor e comprador que no caso de incumprimento do contrato, o comprador ficava obrigado a indemnizar o vendedor de todos os prejuízos causados, conforme melhor resulta da cláusula 8.ª.
2 - Violação das normas dos artigos 628.º, n.º1 e 217.º do Código Civil.
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O Apelante não produziu qualquer declaração de vontade; não consta qualquer declaração reduzida a escrito no documento designado por documento de compra e venda onde se possa ler que o J (…), ou sequer, que o Fiador declarou que garante o pagamento do preço da máquina ou que garante o pagamento da indemnização pelos prejuízos resultantes do incumprimento do contrato, apenas constando a sua assinatura sob a palavra fiador.
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O Apelante não produziu declaração expressa no sentido de garantir o pagamento do preço da máquina ou de indemnização pelos prejuízos resultantes do incumprimento do contrato.
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Declaração expressa é a declaração feita por palavras, escrito ou outro meio direto de manifestação de vontade, conforme dispõe o artigo 217.º do Código Civil, mas não obstante “... a regra geral da liberdade declarativa, há casos em que o Código exige declarações expressas ...” como é o caso do número 1 do artigo 628.º do Código Civil( in Código Civil Anotado Pires de Lima/Antunes Varela, em anotação ao artigo).
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Não existe declaração de vontade expressa do Apelante a garantir a satisfação do crédito do Exequente, como impõe o número 1 do artigo 628.º do Código Civil, norma que exige que a declaração da vontade de prestar fiança seja expressa; que a vontade de cobrir a obrigação do comprador, obrigando-se perante o credor, a realizar a mesma prestação tem que resultar diretamente da declaração do fiador e não através deduções, inferências ou presunções ...”, razão porque não há fiança.
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A Douta Sentença qualificando a factualidade descrita como fiança e obrigando o Executado ora Apelante a pagar a quantia exequenda viola o disposto nos artigos 628.º, n.º1 e 217.º ambos do Código Civil. Se assim se não entender, 3 – Violação das normas dos artigos 409.º, 405.º e 334.º todos do Código Civil.
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Reservada a propriedade da máquina e ressalvada por acordo a possibilidade de ir buscar a máquina na falta de pagamento pontual das prestações, o acordado na cláusula 5.ª, ficou contratualmente afastada possibilidade de cobrança do preço no caso de falta de pagamento de uma das prestações, porquanto o vendedor não pode ter a possibilidade de ir buscar a máquina e ter direito ao preço.
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O vendedor reservou para si a propriedade da coisa, compra e venda sob a condição suspensiva, da transferência da propriedade, do pagamento do preço, acontecimento futuro e incerto, evento do qual dependia a produção daquele efeito jurídico.
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Tendo as partes acordado que a falta de pagamento do pagamento voluntário e pontual das prestações, facultava ao vendedor a possibilidade de ir, de imediato e sem formalidade, buscar a máquina e o direito a ser ressarcido pelos prejuízos resultantes pela falta de pagamento das prestações, a comunicação de vencimento da totalidade das prestações, extinguiu o direito do vendedor de cobrar a totalidade do preço e a obrigação de o pagar, pois o vendedor não pode exigir o preço e simultaneamente manter a propriedade da máquina, cláusulas 5.ª e 8.ª.
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O vendedor, ao reservar para si direito de propriedade sobre a máquina, ao acordar na faculdade de ir a buscar sem qualquer formalidade no caso de falta de pagamento pontual das prestações, renunciou ao direito ao preço em caso de incumprimento, pois o vendedor não pode manter a propriedade e ter direito a receber o preço da sua transmissão.
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A comunicação sobre a falta de pagamento de três prestações fez extinguir o direito ao preço e revivescer o direito à entrega da máquina, com o que se extinguiu a obrigação de pagar o preço, que era a obrigação principal, nos termos do disposto no artigo 651.º do Código Civil, com o que se extinguiu assim a fiança, obrigação acessória.
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Tendo a presente execução por objeto o pagamento da quantia certa correspondente ao preço e extinguindo-se a obrigação de o pagar, extinguiu-se a obrigação acessória, a do alegado fiador, que, além dos meios de defesa que lhe são próprios, tem o direito de opor ao credor aqueles que competem ao devedor, nos termos do artigo 637.º do Código Civil.
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Da factualidade provada resultar para o comprador, o dever de indemnizar por incumprimento e o dever de entregar a coisa, mas não pode resultar o dever de pagar o preço pois a propriedade foi reservada pelo vendedor.
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A Douta Sentença viola o disposto no artigo 409.º do Código Civil, porquanto não reconhece a natureza condicional da da transmissão do direito de propriedade, no contrato de compra e venda com reserva de propriedade e a sua manutenção na titularidade do vendedor.
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A Douta Sentença viola o disposto no artigo 405.º do Código Civil, porquanto não reconhece o contratualmente estabelecido pelas partes quanto ao incumprimento do contrato, concretamente, quanto aos efeitos contratualmente...
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