Acórdão nº 374/10.5 TBMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIMÕES
Data da Resolução25 de Junho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

No Tribunal Judicial da Marinha Grande, A..., divorciada, desempregada, residente na Rua (...), Marinha Grande, na qualidade de legal representante de seus filhos menores B...

, com o NIF (...) e C...

, com o NIF (...), Veio instaurar contra D...

, com agência da (...), Marinha Grande, acção declarativa de condenação, a seguir a forma sumária do processo comum, pedindo a final a condenação da ré a restituir aos menores a quantia de € 10 560,00 (dez mil, quinhentos e sessenta euros), acrescida dos juros de mora que se venceram desde a data em que tal quantia foi indevidamente removida da conta, que computa em € 633,02, e nos vincendos até à regularização final da situação, e ainda no pagamento da quantia de € 5 000,00 a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial, sobre a qual reclama igualmente juros desde a data da citação.

Em fundamento alegou, em síntese útil, ser a mãe dos menores B... e C..., cabendo-lhe o exercício do poder paternal respectivo. Na qualidade de legal representante dos menores celebrou com a ré, na agência da Marinha Grande, a abertura de contas poupança tituladas por cada um dos seus identificados filhos, nas condições de movimentação que especifica. Sucede, porém, que tendo consultado as contas dos menores no dia 1/9/2008, verificou que as mesmas haviam sido irregularmente movimentadas, tendo sido retirado da conta de seu filho B... o montante de € 7 560,00 e da conta titulada por sua filha C... a quantia de € 3 000,00. Porque tais movimentos não foram por si efectuados ou autorizados, a ocorrência dos mesmos ficou a dever-se a fragilidades do sistema informático da demandada, sobre quem recai a obrigação de proceder à respectiva reposição por força do vínculo contratual estabelecido com os demandantes. Porque a situação vem causando ansiedade, preocupações e perturbações no sono, quer da autora, quer dos seus representados, estamos perante dano de natureza não patrimonial, cujo ressarcimento igualmente reclama.

* Citada a ré, apresentou a contestação que consta de fls. 39 a 51, peça na qual se defendeu por impugnação e também por excepção.

Em sede exceptiva arguiu a incompetência territorial do Tribunal judicial da comarca da Marinha Grande, defendendo a competência dos juízos cíveis da comarca de Lisboa, e ainda a irregularidade da representação dos menores, dada a ausência na lide do seu progenitor e atento o disposto no art.º 10.º, n.º 2 do CPC.

Por impugnação, alegou que os movimentos em causa foram, todos eles, efectuados com recurso à utilização do serviço D... Directa on-line, ao qual a autora aderiu em Dezembro de 2006. Deste modo, porque as transferências foram validadas com o nr. de contrato, código de acesso e números do cartão matriz solicitados, o que só foi possível por inserção da própria autora ou por outrem a quem tivesse, voluntária ou involuntariamente, divulgado tais elementos, inexiste responsabilidade por banda da contestante.

A autora replicou, respondendo à matéria das excepções (e não só).

* Afirmada a competência territorial do TJ da Marinha Grande, foi proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a aí (incorrectamente) denominada excepção dilatória “da ilegitimidade de B... e C...” e, tendo sido dispensada a organização da base instrutória, prosseguiram os autos para julgamento.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, tendo o Tribunal proferido a decisão sobre a matéria de facto constante de fls.143 a 149, sem reclamação das partes. Foi depois proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a ré do pedido.

Inconformados, os AA interpuseram o presente recurso e, tendo produzido as alegações, delas extraíram as necessárias conclusões de que se destacam, por relevantes, as seguintes: “I. Não há sistemas informáticos perfeitos e imunes a devassas por intrusos e a sabotagens, sendo certo que cabe, exclusivamente, à Ré implementar os seus meios informáticos, escolher os seus sistemas operativos, fiscalizando, alterando, e vigiando os seus sistemas antivírus e anti introdução abusiva nesse sistema, pelo que lhe cabe suportar o ónus de furtos feitos informaticamente, salvo se provar que foi o cliente que dolosamente a isso deu azo, o que no caso dos autos não provou e a culpa não se presume; ii. A Ré age no mercado de forma profissional altamente organizada, que supostamente domina em alto grau as tecnologias de ponta da informática, cabendo-lhe assegurar a regularidade do funcionamento do sistema, para além do controlo dos meios técnicos utilizados, compreendendo-se assim que sobre ela recaia o risco de esse mesmo sistema gerar danos não imputáveis a culpa dos seus utilizadores. A prestação feita, ainda que indevidamente, a terceiros, não dispensa a Ré de uma nova prestação, agora perante o credor.

iii. A A. não agiu com culpa, nem com negligência, pois não está provado ter sido ela quem procedeu, ou ordenou, ou autorizou, ou permitiu, que fossem efectuados movimentos nas contas dos filhos, sendo que o ónus de o provar pertencia à Ré; iv. Não basta à Ré tentar impor a um cliente proposições pré-elaboradas para a generalidade de candidatos a clientes. Cabe-lhe o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva à parte que utilize essas cláusulas gerais, quer as iniciais, quer as subsequentes alterações. E para além da exigência de comunicação adequada e efectiva, surge ainda a exigência de informar a outra parte, de acordo com as circunstâncias, de todos os aspectos compreendidos nas cláusulas contratuais gerais cuja aclaração se justifique. E a Ré não fez essa prova; v. Só as contas bancárias de depósitos à ordem podem ser movimentadas a débito e a crédito sem limitações, desde que não se ultrapasse o valor do que está depositado; consequentemente, nas contas de depósito a prazo, os movimentos a débito só podem ser feitos nos prazos acordados, salvo acordo com a Ré, e neste caso com penalizações; vi. As contas dos autos dos filhos da A., embora denominadas contas poupança, eram “contratos de contas a prazo” (,,,) e, por isso – pois a Ré não os forneceu - não podiam ser movimentadas através de cheque, de cartão de débito, ou de caderneta com PIN nas máquinas que a Ré coloca à disposição (pontos 5 a 7 dos factos assentes); assim, as contas só podem ser movimentadas a débito ou a crédito pela presença pessoal no balcão de quem as possa movimentar (ponto 8. dos factos assentes) e cláusulas 17.1 e 18 das condições gerais); vii. Nos termos da cláusula 20 das ditas condições gerais para abertura e movimentação das contas dos filhos da A. “ a utilização de meios telefónicos ou telemáticos na movimentação da conta rege-se por contratos especiais”. E a Ré não fez prova, e esse ónus cabia-lhe, de ter havido algum contrato especial, que não fez, ou ter havido alteração das cláusulas 17.1 e 18; viii. A A., mãe dos menores, aderiu em 21/12/2006 a um contrato de utilização do serviço D... directa, mas fê-lo exclusivamente para uma sua conta pessoal de que é titular. No ponto 1 deste contrato de adesão consta expressamente que só funciona para “ a aquisição de serviços, realização de consultas e de operações bancárias relativamente a contas de que seja a única titular, ou co-titular em regime de solidariedade e que possa livremente movimentar utilizando, para o efeito, canais telemáticos…internet… ou outras formas de acesso a ser definidas pela D...”; ix. A Ré não é titular ou co-titular da conta dos filhos, pelo que se há acesso telemático, através da conta de que a A. é titular, pelo sistema do D... directa, à conta dos filhos, ao arrepio manifesto e claro do que dispõem as cláusulas 17.1, 18 e 20 das condições gerais e de movimentação (conclusões 7.ª e 8.ª acima), é clamorosa falha do sistema da Ré, a ela exclusivamente imputável; x. A Ré não provou documentalmente quem devassou e como devassou o seu sistema informático e movimentou abusivamente as contas dos filhos da A., e não lhe é legítimo presumir que tenha sido feito através do computador da A; xi. Tendo em conta os documentos juntos aos autos, e de acordo com as citadas cláusulas das condições gerais dos contratos de adesão, devem em conformidade ser alteradas as seguintes respostas dos factos dados como provados sob os pontos 7., 8. e 25., introduzindo-se sob os n.ºs 26 e 27 os factos que propõe.

xii. Como a resposta ao ponto 26. dos factos assentes está em manifesta contradição com o ponto 1 das cláusulas do contrato de adesão da D... directa e cláusula 20 das condições da abertura e movimentação das contas dos menores, ambos juntos aos autos e aceites pelas partes, esta resposta deve ser eliminada; xiii. As respostas dadas aos pontos 27. a 31. dos factos assentes referem-se a obrigações existentes entre a Ré e a A exclusivamente enquanto titular de uma conta de depósito à ordem que tinha na Ré e não como mãe dos menores dos autos, pelo que devem ser eliminadas; xiv. Não havendo contrato especial para utilização de meios telemáticos para movimentação das contas dos menores filhos da A. e não tendo a Ré demonstrado, como era seu ónus, culpa da A, pois não se provou que foi a A quem procedeu, ou ordenou, ou autorizou, ou permitiu que fossem efectuados movimentos nas contas de seus filhos, é a Ré responsável pela reposição inteira nas contas a prazo dos filhos da A das quantias de que ficaram privadas, acrescidas dos juros devidos calculados à taxa então em vigor; Conforme ao disposto nos artigos 476.º- 2 e 770.º do Cód. Civil.

xv. A descrita situação [de desapossamento dos menores das suas economias] tem causado à A. e a seus filhos, preocupações, tristeza, perdas de sono, stress à A e aos filhos, que são danos não patrimoniais que tem a tutela do direito e, como tal devem ser indemnizados; xvi. O tribunal a quo não valorou, nem sopesou, o teor das cláusulas aplicáveis aos factos dos autos, constantes das “condições de abertura e movimentação de contas de menores e de utilização do sistema de D... directa on line”, de que não é admissível prova em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT