Acórdão nº 2445/05.0TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução15 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...

, residente em (...) Monte Redondo, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “B..., Lda.”, com sede em (...), Porto de Mós, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 21.794,53, acrescida de juros de mora vencidos à taxa de 12% (desde o vencimento das 2 facturas) no montante de € 4.529,73 e dos juros que se vencerem até efectivo e integral pagamento.

Alegou que, no exercício da sua actividade de execução de trabalhos de construção, a pedido da R., executou os serviços descriminados nas facturas n.º 018 e 042, datadas de 4/06/2002 e de 10/12/2003, das quais resultou um saldo credor de € 21.794,53, que a R. não pagou.

A R. contestou, começando por admitir que o A. lhe prestou os serviços descriminados nas facturas n.º 018 e 042, sustentando, porém, que efectuou pagamentos não só para “liquidar” a totalidade de tais facturas como, inclusivamente, para além da globalidade dos serviços prestados pelo A. no âmbito da relação de subempreitada (em 3 obras) havida entre ambos; razão porque, a título reconvencional, pediu a condenação do A. a devolver-lhe a quantia de € 6.522,24, entregue por conta de serviços que o A. nunca efectuou.

Ainda em reconvenção, alegou que o A. não concluiu os serviços identificados nas facturas juntas com a PI (uma vez que abandonou as subempreitadas) e que o que executou padece de imperfeições e defeitos que não eliminou, razão porque a R. está a sofrer prejuízos, cuja liquidação remete para execução de sentença por ainda continuar a executar alguns desses trabalhos deficientemente realizados pelo A.

Finalmente, ainda em reconvenção, invoca ter fornecido ao A. mercadoria diversa do seu comércio, a que se reportam as facturas que junta, do que resultou um saldo credor a favor da R. de € 6.714,50.

Concluiu pois “pedindo” a total improcedência da acção, a condenação do A. como litigante de má-fé; e, a título reconvencional, pediu que o A. seja condenado: A pagar-lhe a quantia de € 6.522,24 (a título de pagamentos respeitantes a serviços não efectuados), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos, no valor de € 1.061,38, e vincendos até integral pagamento; A pagar-lhe uma indemnização respeitante aos prejuízos resultantes dos trabalhos incorrectamente realizados, cuja liquidação remeteu para execução de sentença; A pagar-lhe a quantia de € 6.714,54 (da mercadoria entregue e não paga pelo A.), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos, no valor de € 2.369,43, e vincendos até integral pagamento Replicou o A., impugnando os pagamentos em excesso (mantendo que as facturas 018 e 042 se encontram em dívida); negando o abandono das obras, quaisquer defeitos e imperfeições nas mesmas, acrescendo que nunca os mesmos lhe foram denunciados e invocando expressamente a caducidade dum pretenso e eventual direito indemnizatório; e, quanto à mercadoria que a R. lhe forneceu, alegou ter procedido ao seu pagamento.

Concluiu pois do mesmo modo que na PI e, ainda, pela total improcedência do pedido reconvencional; “pedindo” ainda que a R. seja condenada como litigante de má fé, no pagamento de “multa e indemnização exemplares”.

A R. treplicou, mantendo a posição assumida na contestação/reconvenção.

Foi admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador – em que se julgou a instância totalmente regular, estado em que se mantém, e em que nada se disse (relegando-se implicitamente para final o seu conhecimento) sobre a caducidade do direito indemnizatório invocada pelo A. – foi organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa e foi instruído o processo e realizada a audiência; após o que a Exma. Juíza proferiu sentença em que concluiu do seguinte modo: “ (…) a) julgo improcedente, a acção e, em consequência, absolvo a R. do pedido de condenação contra ela formulada pelo A.

  1. julgo parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condeno o A. a pagar à R.: - a quantia de € 6.522,24, acrescida de juros à taxa que resultar da aplicação da Portaria 597/2005, de 19.7, nos termos antes fixados, desde 27/5/2005 até integral e efectivo pagamento; - a quantia de € 6.655,79 (seis mil, seiscentos e cinquenta e cinco Euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora calculados - sobre o montante de € 966,84 desde 15/5/2002; - sobre o montante de € 258,44 desde 20/5/2002; - sobre o montante de € 490,60 desde 21/5/2002; - sobre o montante de € 747,88 desde 25/5/2002; - sobre o montante de € 911,42 desde 1/6/2002; - sobre o montante de € 44,52 desde 21/6/2002; - sobre o montante de € 1.317,65 desde 4/7/2002; - sobre o montante de € 777,74 desde 15/7/2002; - sobre o montante de € 93,49 desde 22/7/2002; - sobre o montante de € 188,44 desde 23/7/2002; - sobre o montante de € 446,28 desde 19/8/2002; - sobre o montante de € 91,53 desde 20/8/2002; - sobre o montante de € 141,69 desde 18/10/2002; - sobre o montante de € 179,27 desde 20/3/2003.

    à taxa de 12% até 30/9/2004 e desde aí à que resultar da aplicação da Portaria 597/2005, de 19.7, nos termos antes fixados, até integral e efectivo pagamento; - absolvo o A. do demais peticionado em sede reconvencional.

  2. condeno o A. como litigante de má fé no pagamento de uma multa que fixo em 20 (vinte) U.C.; d) mais absolvo a R. do pedido de condenação como litigante de má fé. (…)” Inconformado, interpôs o A. recurso de apelação, visando a revogação parcial da sentença e a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente procedente, que julgue improcedente o primeiro pedido reconvencional, que proceda à compensação entre o pedido formulado na acção e o terceiro pedido reconvencional e que o absolva da condenação como litigante de má fé.

    Terminou a sua alegação com uma “segunda alegação” a que chamou “conclusões”[1], que pela sua redundância e extensão (19 páginas e 99 “conclusões”) nos dispensamos de aqui reproduzir.

    A R. não apresentou qualquer resposta.

    Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

    * II – “Reapreciação” da decisão de facto Como “questão prévia” à enunciação dos factos provados, importa – atento o âmbito do recurso dos AA/apelantes, delimitado pelas respectivas conclusões (art. 684º/3 e 690º/1 do CPC) – analisar as questões a propósito da decisão de facto colocadas a este Tribunal.

    No caso vertente, os diversos depoimentos prestados em audiência, nos quais a 1ª instância se baseou para decidir a matéria de facto, foram gravados; constando assim do processo todos os elementos probatórios com que aquela instância se confrontou, quando decidiu a matéria de facto, pelo que é possível modificar aquela decisão, se enfermar de erro de julgamento[2].

    Faculdade – de modificar a decisão de facto – em cujo uso, costumamos “avisar”, é nosso dever ser contidos, cautelosos e prudentes, uma vez que existem elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo de exteriorização e verbalização dos depoentes, não importados para a gravação, susceptíveis de influir, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhes. O que, porém – salienta-se e enfatiza-se, para que não haja quaisquer equívocos interpretativos sobre o que se acabou de dizer – não significa que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto apenas envolve a correcção de pontuais, concretas e excepcionais erros de julgamento; efectivamente, a Relação, quando aprecia as provas – e pode para tal atender a quaisquer elementos probatórios (cfr. art. 712.º/2 do CPC) – faz um novo julgamento da matéria de facto, vai à procura da sua própria convicção, assegura o duplo grau de jurisdição em relação à matéria de facto (ou seja, a actividade da Relação não se pode/deve circunscrever a um mero controlo formal da motivação efectuada na 1.ª Instância).

    Efectuado tal prévio e “tabelar” esclarecimento, debruçando-nos sobre as concretas questões – tendo presente as posições assumidas pelas partes nos articulados, analisados os documentos juntos aos autos e ouvido o registo, efectuado em CD, das sessões de julgamento – concluímos, antecipando a solução, que não existe na parte decisiva e essencial razão ao A/apelante.

    Vejamos: Segundo o A/apelante, foram incorrectamente julgados os factos constantes dos quesitos 2.º, 3.º, 12.º, 13.º, 14.º, 17.º, 18.º, 21.º, 26.º, 28.º e 31.º da base instrutória.

    Só na aparência, porém, são 11 as questões de facto colocadas em crise; como relevante e essencial, temos efectivamente uma única questão de facto, representando vários dos quesitos facticidade meramente instrumental e explicativa/justificativa da questão de facto realmente essencial.

    E a questão de facto, realmente essencial e decisiva, circunscreve-se ao modo como se devem imputar os pagamentos efectuados pela R. ao A.

    ; sendo tudo o resto acessório e instrumental[3].

    Questão esta, essencial e decisiva, a que, como já o antecipámos, respondemos do mesmo modo que a 1.ª Instância.

    Pelo seguinte: Começando pelo princípio, registemos o modo como o A. apresenta o litígio, a R. lhe “responde” e o A. lhe replica.

    Numa PI de 9 artigos e página e meia[4], diz o A. que prestou os serviços descriminados nas facturas 18 e 42 (em que a descriminação é bastante vaga e genérica) e pede que a R. seja condenada a pagar-lhe o montante inscrito em tais duas facturas e os respectivos juros de mora.

    Ao que a R. “responde”, dizendo, no que aqui releva, que admite a prestação dos serviços (genericamente descriminados nas facturas 18 e 42), acrescentando que já pagou o preço de tais serviços, assim como fez/antecipou pagamentos de serviços que não chegaram a ser efectuados.

    E ao que o A. por sua vez replica, mantendo o não pagamento das facturas 18 e 42, dizendo que não recebeu quaisquer pagamentos por conta de serviços ainda por executar e que os pagamentos a que a R. se refere foram para pagar as facturas anteriores 15, 16 e 17.

    Ou seja, toda a questão está marcada pela congénita insuficiência e escassez da PI/réplica na...

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