Acórdão nº 221/12.3TBTMR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Outubro de 2013
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...
, residente na Rua (...), Ourém, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe moveu B...
, residente na Rua (...), Tomar – para haver dele a quantia global de € 54.586,98 (sendo € 35.000,00 do capital de dois mútuos e € 19.586,98 de juros vencidos) e juros vincendos – veio deduzir oposição à execução, alegando, em síntese e no que aqui interessa: que o valor/taxa convencionado a título de juros moratórios no contrato de mútuo subjacente à declaração de 22/02/2006 dada à execução é usurário, por exceder os juros legais acrescidos de 5%; e que tais juros prescrevem no prazo de cinco anos, pelo que apenas são exigíveis os juros relativos aos últimos cinco anos.
que assinou a “declaração” datada de 15/03/2006 na qualidade de sócio da empresa “C...
, Lda.”, não resultando de tal declaração qualquer assunção de dívida, a título pessoal, por qualquer dos seus subscritores, designadamente pelo oponente; e que o contrato de mútuo subjacente à “declaração” datada de 15/03/2006 é nulo, por vício de forma, por não ter sido celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado.
Contestou o exequente, afirmando, em resumo e de mais relevante, que assiste razão ao oponente no que respeita ao valor/taxa de juros, mas que, quanto à prescrição, a mesma não se verifica uma vez que no ano de 2007 não foram devidos juros (e de 2008 à instauração da execução decorreram não mais do que 5 anos); que, quanto à “declaração” datada de 15-03-2006, o oponente assumiu pessoalmente a obrigação de pagamento da quantia emprestada à sociedade de que o oponente é sócio e que a eventual nulidade do contrato de mútuo não contamina a validade do título dado à execução.
Conclusos os autos, a Ex.ma Juíza entendeu estar em condições, sem mais, de decidir do “mérito” e passou a proferir saneador/sentença em que – após determinar o desentranhamento dum pretenso articulado superveniente e após declarar a instância totalmente regular – julgou parcialmente procedente a oposição, tendo, em consequência, determinado: “ (…) a) o prosseguimento da instância executiva para pagamento coercivo do capital de 90.000,00 € e juros, à taxa legal prevista para os juros civis, contados desde a propositura da execução; b) o prosseguimento da instância executiva para pagamento coercivo do capital de 12.500,00 € e juros, à taxa de 9% ao ano, relativos aos últimos cinco anos por referência à data da propositura da execução.
“ (…)” Inconformado com tal decisão, o executado/oponente interpôs recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que “reconheça que a obrigação contra a qual se deduziu oposição é inexigível, devendo o recorrente ser absolvido do pedido. Se assim não se entender (o que só por mero dever de patrocínio se admite), deverá ser declarada nula a sentença, por exceder o pedido.
Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:
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Constando no requerimento executivo, título em que três sócios reconhecem em nome da sociedade sua representada uma dívida ao restante sócio, no valor de 90.000,00, e este apenas peticiona 22.500,00 € (mais juros), não pode o tribunal condenar no prosseguimento da instância executiva para cobrança coerciva de 90.000,00 €, porquanto está limitado ao pedido que lhe foi apresentado. O Juiz que condene, em sentença, em quantidade superior ao pedido, inquina a sua decisão, tornando nula a sentença, por via do disposto na al. e) do n.º 1 do art.º 668.º e n.º 1 do art.º 661.º do C.P.C..
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A deliberação tomada em assembleia geral de sócios que aceita o empréstimo efectuado por um dos seus sócios (em montante que foi definido, por prazo estabelecido, superior a um ano, convencionando juros e sem obedecer a forma especial), constitui um contrato de suprimento, nos termos do disposto nos art.ºs 243.º e ss. do C.S.C..
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A obrigação de restituição, nos termos do art.º 243.º do C.S.C. cabe à sociedade, a qual é a devedora, e não os sócios que a constituam.
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Instaurada que foi a acção executiva para cobrança de um valor correspondente a ¼ do total do capital mutuado, a um dos três sócios subscritores do documento particular que reconhece que a sociedade é a devedora e que é ela que se obriga a pagar a quantia mutuada ao sócio mutuante, torna a obrigação inexigível.
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De acordo com o disposto no art.º 244.º n.º 3 do C.S.C., a celebração de contrato de suprimento não depende de prévia deliberação dos sócios. Contudo, existindo acta em que exequente, executado e demais sócios reconhecem que o exequente é credor da sociedade C..., Lda, não subsiste qualquer dúvida sobre a vontade real expressa na declaração.
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Existindo dúvida quanto ao conteúdo e alcance do título executivo, nomeadamente quanto à interpretação sobre o sujeito obrigado a pagamento, impunha-se a produção de prova, para além da análise do documento, tendo em vista apurar a real vontade das partes que presidiu à sua redacção, tendo em vista a descoberta da verdade material e boa decisão da causa.
Não foi apresentada qualquer resposta pelo exequente.
Dispensados os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
* II – Fundamentação de Facto São os seguintes os factos com relevo para a apreciação do recurso:
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O recorrido deu à execução 2 documentos particulares, ambos com a epígrafe “declaração” e subscritos pelo oponente, sendo um datado de 22-02-2006 e outro de 15-03-2006.
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Consta da “declaração” datada de 22-02-2006 o seguinte: «Eu, A... [oponente] (…), declaro para os devidos efeitos, que fico em débito (fico a dever) ao senhor B... [oponido] (…); (digo que lhe fico a dever por me ter emprestado) a quantia em dinheiro € de 12.500€ (doze mil e quinhentos euros) que pagarei no prazo de um ano sem qualquer juro a acrescentar; mas findo este prazo, pagarei uma taxa de 10% de juro por cada ano a mais.
Por se verdade, e por ter sido feito este acordo entre as duas partes, vou em baixo assinar, tornando-se válido a partir desta data.» - cfr. documento de fls. 3 da execução.
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