Acórdão nº 669/08.8TBTNV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelLUIS CRAVO
Data da Resolução21 de Março de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra * 1 – RELATÓRIO “D (…), S.A.” intentou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “CAIXA CENTRAL DE CRÉDITO AGRÍCOLA MÚTUO, C.R.L.

” e “CAIXA DE CRÉDITO AGRÍCOLA MÚTUO DO RIBATEJO NORTE, CRL”, pedindo que estas fossem condenadas, solidariamente: - “A Indemnizar a autora pelo montante correspondente ao valor do cheque cujo pagamento recusou, de €49.877,79; - Nos lucros cessantes decorrentes da privação do investimento e que ascendem a quantia nunca inferior a 29.250,00€; - Nos juros de mora vencidos de 26 de Dezembro de 2003 até à presente data, no montante de 26.941,34€; - Nos juros de mora vincendos sobre a quantia de €49.877,79, à taxa legal em vigor, desde a data da propositura da acção até efectivo e integral pagamento; (…)”.

Para tanto, alegou, em síntese, que é dona e legítima portadora de 1 cheque, sacado sobre a conta de “A (…) – Unipessoal, Ldª, com o n.º ... do Banco “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Ribatejo Norte, CRL, por si titulada; que tal cheque foi entregue à A., para pagamento parcial de um estabelecimento comercial denominado de “ P...”, destinado a padaria, pastelaria, café e fabrico próprio de pão, bolos e produtos similares, cujo preço total era de 149.633,37€; que por exigência da Autora, e por forma a que lhe fosse entregue a posse do estabelecimento comercial, C (…) ordenou à segunda Ré a aposição de um “visto” sobre o aludido cheque; que o referido cheque foi subscrito pela única sócia-gerente C (…), com poderes para o acto, que firmou o cheque com o nome abreviado de C (…), e o emitiu à ordem e a favor da Autora; sucedeu que, apresentado tal cheque a pagamento nos oito dias posteriores à data da respectiva emissão, o mesmo foi devolvido com a indicação de que foi revogado por extravio do mesmo; que esta devolução ocorreu em consequência do sacador ter dado ao Banco 2ºR. ordem de revogação do cheques o que este veio a aceitar e a cumprir, razão pela qual a A. nunca recebeu a quantia titulada pelo cheque, estando, por conseguinte, desembolsada da quantia de €49.877,79, correspondente ao valor do cheque; acrescenta a A. que pretendia aplicar tal quantia no negócio de importação e exportação de veículos automóveis usados, e com um investimento de 50.000,00€, a participada da A.. D (…), Ldª, retira de lucro líquido a quantia média mensal de 750,00€, pelo que assim de Janeiro de 2004, até à data da propositura da acção a A. ficou desapossada da quantia de €49.877,79, e do subsequente lucro que retiraria em negócios que pertencem exclusivamente à A., e que cifra em 29.250,00€.

* Citadas regularmente as Rés contestaram, sendo a 1ª delas por excepção (alegando a prescrição do direito de indemnização reclamado pela A. e a ilegitimidade da própria) e, por impugnação, sustentando ser completamente alheia às eventuais relações existentes entre a A. e a dita C (…), quando é certo que o titular da conta bancária sobre a qual o cheque ajuizado foi sacado era uma sociedade e não a dita, acrescendo que o cheque por ser visado não perde as suas características, sendo que de acordo com a regras e procedimentos aplicáveis às instituições bancárias, enquanto instituição bancária sacada era legítima a recusa de pagamento do cheque desde que fundada em justa causa, por exemplo extravio [como sucedeu no caso vertente], donde não ter ocorrido nenhum acto ilícito da sua parte quando aceitou a ordem de revogação fundada em justa causa, nem por conseguinte culpa, nem também se verifica qualquer nexo de causalidade entre o alegado facto ilícito e os alegados danos sofridos, termos em que pugna pela sua absolvição do pedido (sendo-o da instância, a dar-se acolhimento à excepção da ilegitimidade.

Por sua vez, a 2ª Ré contestou reproduzindo, no essencial os argumentos da sua co-Ré, designadamente que a “declaração de extravio” foi enviada por fax e depois recebida em mão na agência, mas tudo isso foi precedido de uma manifestação de exaltação e correspondente alegação de extravio do cheque por parte de V (…)(mãe da dita C(…)) que era pessoa autorizada a movimentar aquela conta quando se apercebeu da emissão de um cheque visado e correspondente cativação do montante em causa, sendo certo que face a esta comunicação de extravio, não cabia nem podia a “Caixa” fazer investigações sobre o caso, tendo decidido ao tempo que o cheque não fosse pago por esse motivo (extravio), termos em que concluiu pugnando pela improcedência da acção.

Replicou na sequência a A., pugnando pela improcedência das excepções deduzidas pela 2ª Ré e finalizando por requerer a ampliação da causa de pedir, sustentando neste particular que ambas as RR. sabiam, sem poder desconhecer, que o cheque ajuizado não havia sido extraviado, ou pelo menos souberam-no no dia da sua apresentação a pagamento, donde terem ficado bem cientes de que a comunicação de extravio havia sido um expediente utilizado por aquela titular da conta para evitar pagamento do cheque, assim defraudando a A. que era detentora de um cheque “visado”, devendo ser também por isso responsáveis pelos prejuízos que lhe resultaram.

Em articulados de “resposta”, pugnaram ambas as RR., designadamente, pela não admissão da requerida ampliação da causa de pedir.

Por despacho judicial de fls. 153 foi admitida a referenciada ampliação da causa de pedir requerida pela A..

* Foi proferido oportunamente despacho saneador, através do qual se julgaram improcedentes todas as excepções deduzidas, prosseguindo-se com a afirmação tabelar dos demais pressupostos processuais e procedendo-se ainda à devida condensação da matéria de facto, mediante a especificação dos factos assentes e a quesitação em base instrutória dos factos controvertidos, objecto de reclamações pela A. e 2ª Ré, apenas atendidas quanto a um lapso de escrita que se reconheceu existir na redacção do quesito 20º da base instrutória.

* Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, dentro do formalismo legal, e que culminou nas respostas à base instrutória que constam do despacho de fls. 582 a 585, sem reclamação.

Na sentença, considerou-se, em suma, não ter ficado demonstrada a ilicitude da conduta das RR., em consequência do que se absolveram as RR. dos pedidos formulados pela A..

* Inconformada com essa sentença, apresentou a A. recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: «(…) * Ambas as RR. contra-alegaram, pugnando por que seja negado provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida (cf. fls. 646 e 651-658).

* Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela Recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 684º, nº3 e 685º-A, nºs 1 e 3, ambos do C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no art. 3º, nº3 do C.P.Civil - incorrecta valoração da prova produzida, que levou ao incorrecto julgamento dos quesitos 8º, 13º, 14º, 18 e 19º (que deviam ter tido resposta diversa da de “não provado” que lhes foi dada, sendo que relativamente ao quesito 8º está concretamente em causa o segmento “sem qualquer motivo justificativo”); - incorrecto julgamento de direito quanto ao entendimento perfilhado de não existir no caso responsabilidade civil por facto ilícito da instituição bancária sacada (e bem assim da instituição bancária co-ré que é o organismo central do sistema de crédito agrícola mútuo e enquanto tal co-responsável com aquela e garante da mesma) decorrente da recusa no pagamento do cheque dentro do prazo de apresentação a pagamento (aspecto de poder ou não o banco sacado conceder eficácia à ordem de não pagamento dada pelo sacador no prazo de apresentação a pagamento invocando “justa causa” fundada em “extravio” declarado/comunicado pelo sacador; aspecto de o cheque visado conceder ou não uma garantia acrescida ao tomador de que os fundos estavam cativos e ao seu dispor para o pagamento; aspecto de dever operar-se a aferição positiva dos pressupostos da responsabilidade civil do banco sacado, diversamente do efectuado na sentença recorrida).

* 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado/fixado pelo tribunal a quo, o que naturalmente contempla a conjugação da condensação dos factos assentes com os decorrentes das respostas dadas aos quesitos da base instrutória elaborada, obviamente sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, são os seguintes os factos que se consideraram provados na 1ª instância: I – A Autora é uma sociedade anónima, matriculada na 1.ª Secção da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º 12.865 e titular do número de identificação fiscal 980 293 944. [al.A) dos Factos Assentes]; II – A...

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