Acórdão nº 3819/04.0TBLRA-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Fevereiro de 2013
Magistrado Responsável | ALBERTO RUÇO |
Data da Resolução | 19 de Fevereiro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Recorrente………Ministério Público em representação do menor F (…), nascido em 06 de Março de 2002, melhor identificado nos autos.
Recorrido……….
Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.
* I. Relatório.
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O presente recurso respeita a um pedido de aumento da prestação de alimentos devidos ao menor F (…) que se encontra presentemente a ser paga pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (doravante designado apenas por Fundo) em substituição do pai do menor, nos termos previstos no artigo 1.º, da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro (Garantia de Alimentos Devidos a Menores).
O Ministério Público requereu o aumento da prestação mensal de €125,00 euros para €170,00 euros mensais, argumentando que a prestação foi fixada em Abril de 2005 e se encontra desactualizada devido ao crescimento do menor e consequente aumento do rol das suas necessidades de subsistência.
Este pedido foi rejeitado pelo tribunal com fundamento no facto da lei não permitir tal aumento.
Argumentou-se que a prestação a pagar pelo Fundo não pode exceder a prestação de alimentos que vincula a pessoa obrigada a prestá-los, no caso, o pai do menor.
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O Ministério Público discorda desta decisão e pretende a sua revogação através do presente recurso.
Formulou estas conclusões: «1. O Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegura as condições de subsistência alimentícias, imediatas, do menor quando a pessoa judicialmente obrigada não possa prestá-las e o menor ou seu agregado não disponham de rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional, nos termos do disposto do disposto no Decreto-Lei n.º 164/99 e na Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, 2. A prestação fixada ao abrigo dos mencionados diplomas legais é independente ou autónoma da anteriormente fixada ao devedor dos alimentos, 3. Pois, o apuramento do montante a pagar pelo FGADM tem em conta não só o valor fixado ao devedor de alimentos, como também as condições sociais e económicas actuais do menor e do seu agregado familiar, nos termos do disposto nos artigos 2.º, da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, e 3.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio; 4. Assim, o valor da prestação a cargo do referido Fundo não tem de coincidir (por excesso ou por defeito) com a prestação fixada ao devedor, quando aquela prestação se revelar manifestamente desadequada às necessidades do menor; 5. Sempre que isso ocorrer deve a prestação alimentar, a cargo do FGADM, ser actualizada, independentemente do apuramento das condições sociais e económicas do devedor de alimentos (cfr. Acórdão da Relação do Porto de 08-09-2011, disponível em www.dgsi.pt); 6. A prestação de 125,00€ (cento e vinte e cinco euros), fixada judicialmente em 11 de Abril de 2005, é manifestamente insuficiente - tendo em atenção as necessidades crescentes do menor, ao longo destes sete anos, e à situação de desemprego que a progenitora vive, desde 2008, para fazer face à satisfação das suas necessidades básicas; 7. É manifestamente impossível assegurar a satisfação das necessidades básicas de do Francisco Batista, actualmente com 10 anos de idade, com quantia inferior a 170,00€ (cento e setenta euros) e 8. Ao manter a prestação de alimentos nos €125,00 (cento e vinte e cinco euros), a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 69.º, n.º1, da Constituição da República Portuguesa, 186.º, n.º 1 e 150.º, da Organização Tutelar de Menores, 3.º, da Convenção dos Direitos da Criança de Nova Iorque, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 20/90, o 2 n.º 2 da lei 75/98 de 19 de Novembro, 3 n.º 3 e 4 n.º 5 do Decreto-Lei n.º 164/99 de 13 de Maio.
Pelo exposto, a sentença do tribunal "a quo" deve ser revogada e substituída por outra e, em consequência, deve ser fixada a pensão de alimentos, pelo menos, no valor de €170,00 (cento e setenta euros), a pagar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, desde a data do mês seguinte ao da notificação da decisão do Tribunal ad quem».
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O Fundo contra-alegou defendendo a manutenção da sentença com base nas seguintes razões: «1.
Para que sejam atribuídas as prestações de alimentos nos termos dos artºs 1º e 2º da Lei 5/98 de 19/11, é necessário que se verifiquem vários requisitos cumulativos.
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Mesmo que assim se não entendesse, o que só por mera hipótese se admite, o FGADM não poderá ser condenado a pagar uma prestação de valor superior à fixada aos devedores originários.
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A saber, a obrigação do Fundo é a de assegurar/garantir os alimentos devidos a menores e não o de substituir a obrigação alimentícia que recai sobre o obrigado a alimentos.
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Ora, a obrigação legal de prestar alimentos é diferente da obrigação judicial de os prestar, sendo que só existe obrigado judicial desde que o tribunal o defina como devedor de alimentos, isto é o condene em determinada e quantificada prestação alimentar.
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Sendo indubitável que a letra da lei aponta no sentido de que o FGADM apenas garante o pagamento dos alimentos judicialmente fixados.
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O que efectivamente sucedeu, uma vez ter sido fixada como pensão de alimentos devidos ao menor da causa a serem pagos pelo progenitor no valor de 125,00 (cento e vinte cinco euros), que em situação de devedor faltoso e preenchidos os requisitos exigidos por Lei se encontra a ser tal prestação satisfeita pelo FGADM.
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Como refere o douto Acórdão da Relação de Évora – Proc. 638/02-3ª Secção de 27-05-02, “os alimentos a pagar pelo Estado têm a natureza de uma nova prestação social, com características peculiares, ao nível dos respectivos pressupostos de exigibilidade, de início de cumprimento, de fixação do respectivo valor e da sua manutenção, no duplo aspecto do seu carácter intrinsecamente transitório e de dever ser feita prova periódica de verificação dos mesmos pressupostos”.
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A responsabilidade do FGADM é, assim, residual, uma vez que a satisfação do pagamento das prestações alimentícias incumbe em primeira mão aos pais e só quando tal é inviável é que intervém o Estado, assumindo tal pagamento e desde que preenchidos os requisitos cumulativos exigidos por Lei.
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Ora, a prestação a satisfazer pelo FGADM, atenderá ao regime geral aplicável à generalidade das acções, começa a vencer-se após o trânsito em julgado da decisão judicial que fixa o seu montante.
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No caso em apreço fixado inequivocamente em €125,00 (cento e vinte cinco euros).
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Admitir o contrário, face ao que anteriormente foi referido, seria iludir o espírito da Lei, abrindo a porta à desresponsabilização dos obrigados a prestar alimentos, por saberem, a priori, que o Estado supriria as suas faltas.
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O Estado somente se substitui ao obrigado enquanto este não iniciar ou reiniciar o cumprimento da sua obrigação e pelo valor fixado para esta.
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Esta prestação é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos, e, para a sua fixação, é necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último.
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É que o FGADM não garante o pagamento da prestação de alimentos não satisfeita pela pessoa judicialmente obrigada a prestá-los, antes assegurando, face à verificação cumulativa de vários requisitos, o pagamento de uma prestação de um montante por regra equivalente.
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O momento da verificação da impossibilidade de o progenitor satisfazer a obrigação a que estava vinculado é, assim, o da decisão judicial que julgue procedente o incidente de fixação da obrigação do Estado em substituição do devedor originário.
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O legislador não sentiu necessidade de as incluir na garantia prestada. Pelas mesmas razões, que não sentiu necessidade de garantir a totalidade da prestação a que o requerido está obrigado. A diferença – se houver – entre a prestação a cargo do requerido...
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