Acórdão nº 390/12.2T2AND-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução10 de Dezembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 29.8.2012, na Comarca do Baixo Vouga, AM (…) e mulher MF (…), e JA (…) e mulher SC (…), intentaram a presente acção popular, ao abrigo do art.º 52º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da Lei n.° 83/95, de 31.8,[1] contra MM (…), pedindo que esta seja condenada: - A reconhecer que é público o trato de caminho referido nos art.ºs 13º a 26º da petição inicial (p. i.) e, de qualquer forma, a reconhecer que os AA. têm o direito a circular livremente pelo referido caminho, utilizando-o, designadamente, para circular entre a Rua das Portelas, a Rua do Lagar e a Rua das Quintas Novas e vice versa, bem como para aceder, a pé, de tractor, carro agrícola ou qualquer outro veículo motorizado, aos seus prédios identificados nos art.ºs 1º e 2º da p. i..

- A repor, no imediato, o tracto de terreno afecto a tal caminho que obstruíram com a colocação de dois pilares em cimento e uma barreira metálica colocada na horizontal com um sinal de trânsito proibido ao meio.

- A abster-se no futuro de praticar outros actos que de alguma forma constituam acto de apropriação referido caminho público, ou que por qualquer forma dificulte ou impeça o acesso dos AA. aos indicados prédios, que lhes pertencem.

- E a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, o valor de € 50 por cada dia ou fracção que decorra, uma vez proferida a sentença em 1ª instância, sem que se mostrem removidos os pilares em cimento e a barreira metálica ali colocados pela Ré e restituído todo o tracto de terreno em que assenta o caminho.

Alegaram, em resumo: são proprietários dos prédios aludidos nos art.ºs 1º e 2º da p. i., que confrontam com o caminho público referido nos art.ºs 13º a 26º da p. i.; a Ré, que se arroga dona do prédio rústico mencionado no art.º 43º da p. i., em Agosto de 2011, decidiu mandar construir dois pilares em cimento e neles colocar uma barreira metálica na horizontal, impedindo desta forma os AA. e todos os utentes do caminho público de nele circularem, com carros agrícolas, tractores e outros veículos motorizados, como sempre fizeram, impedindo, designadamente os AA., de acederem ao seu prédio, como sempre fizeram; os AA. e outros proprietários de terrenos que utilizam o caminho público em questão e outros moradores do lugar de Albergaria-a-Nova, Branca e povoações vizinhas, procuraram junto da Junta de Freguesia da Branca a resolução deste assunto - alcançar a retirada da barreira metálica, por forma a repor o caminho público à utilização da população, como sempre esteve, sem recorrer à força física ou à via directa - tendo elaborado um “abaixo-assinado”, datado de 01.9.2011, referido no art.º 56º da p. i., que foi enviado às respectivas Autarquias Locais, que nada fizeram, e ao Ministério Público de Albergaria-a-Velha.

A Ré contestou, impugnando a generalidade dos factos e concluindo pela improcedência da acção; requereu a intervenção principal provocada de MP (…) como associado dos AA.; e deduziu pedido reconvencional de condenação dos AA. (e chamado) a reconhecerem o direito de propriedade da Ré sobre o prédio identificado nos autos e a absterem-se da prática de qualquer acto lesivo desse direito, bem como a pagarem-lhe a indemnização que se vier a liquidar “em execução de sentença” pelos danos patrimoniais provocados em virtude da instauração da presente acção e uma indemnização em montante não inferior a € 3000 a título de “danos morais e não patrimoniais”.

Para o efeito aduziu, nomeadamente:

  1. A fundamentar o pedido de intervenção principal: o tracto de terreno em causa abrange parcialmente o prédio rústico da Ré (aludido nos art.ºs 8º a 10º e 68º da contestação) e um prédio rústico propriedade do indicado MP (…); a querela que esteve na origem da instauração dos presentes autos iniciou-se precisamente entre a Ré e o MP (…), mentor e principal interessado no objecto da presente acção (será quem mais beneficiará com a sua procedência, pelas razões mencionadas nos art.ºs 4º e 6º e seguintes do correspondente arrazoado) e que, em conjunto com AA., tem vindo a colocar em dúvida a propriedade da Ré.

  2. Quanto ao mais e, em síntese: é falso tudo quanto se afirma na p. i. no sentido de fazer crer que a Rua das Quintas Novas se prolonga atravessando o prédio da Ré e bem assim, o prédio a poente do desta, propriedade de MP (…), até confluir na Rua do Lagar; os AA. pretendem com a presente acção desapossar ilegitimamente a Ré da sua propriedade, invocando um hipotético interesse colectivo, que bem sabem não existir, para desse modo satisfazer interesses pessoais e subjectivos; os AA. com a sua conduta ilícita e culposa causam à Ré um prejuízo material equivalente ao valor patrimonial dos encargos que a mesma terá que suportar até ao final da presente acção para fazer face à defesa do seu direito propriedade, bem como os danos não patrimoniais decorrentes do aduzido sob os art.ºs 90º e seguintes da contestação.

Replicando, os AA. invocaram a inadmissibilidade da pretendida intervenção principal e da reconvenção, concluindo pela sua absolvição da instância reconvencional e como na p. i..

Na tréplica, a Ré concluiu nos termos da contestação/reconvenção.

Pronunciando-se sobra a admissibilidade da reconvenção e o dito pedido de intervenção principal, a Mm.ª Juíza a quo proferiu o seguinte despacho: - “ (…) Fundamenta tal pedido [reconvencional] nos incómodos e despesas que lhe originam a pendência da presente acção judicial, pedindo a condenação dos Autores no pagamento de indemnização de € 7 500,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.

Nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 274º do CPC, a reconvenção é admissível "a) quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa; b) quando o réu se propõe obter a compensação ou tornar efectivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida; c) quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o Autor se propõe obter." Nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 274º do CPC, "Não é admissível a reconvenção, quando ao pedido do réu corresponda uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor, salvo se a diferença provier do diverso valor dos pedidos...

".

No caso dos autos, além de os pedidos formulados pelos Autores seguirem as especificidades da acção prevista na Lei 83/95 de 31/08 (como a inexigência de preparos - art. 20°, n.° 1; a recolha de provas por iniciativa do Juiz - art. 17°; a atribuição do efeito suspensivo aos recursos mesmo nos casos em que, nos termos gerais, esse efeito não deva ser atribuído - art. 18°, n.° 2), também os fundamentos invocados para dedução do pedido reconvencional formulado pela Ré não integram nenhuma das hipóteses previstas no n.º 2 do art.º 274º do CPC, nomeadamente, não emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa.

Além disso, consistindo a presente acção numa acção popular, que tem subjacente aos interesses a defender o facto de os mesmos dizerem respeito a interesses difusos, não se concebe que, tratando-se de uma acção mediante a qual se reconhece aos cidadãos, ´uti cives´, o direito de promover, individual ou associadamente, a defesa tais interesses colectivos, se discuta, por via reconvencional, a tutela de interesses individuais, ´uti singuli´, do Réu.

Termos em que não admito o pedido reconvencional deduzido.

* (…) Nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 325º do CPC qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com direito de intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária, dispondo-se no n.º 3 do mesmo artigo que o autor do chamamento alega a causa do chamamento e justifica o interesse que, através dele, pretende acautelar.

No caso dos autos, o interesse na intervenção deste terceiro visa a sua condenação em sede reconvencional, visto, de acordo com a Ré, ser o mentor da presente acção, sendo tal intervenção justificada processualmente nos termos do...

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