Acórdão nº 589/09.9TBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I MS (…) e marido AS (…) residentes (…) Vale da Torre e MC (…) residente em (…) França, instauraram a presente ação com processo sumário contra MP (…) e JL (…), residentes (…) Amadora, pedindo que: a) Se declare que as AA. são donas e legítimas possuidoras de cada uma das parcelas que identificam e, os RR. condenados a reconhecerem tal direito; b) Seja declarado que a parcela de terreno pertença da Ré se encontra onerada com uma servidão de passagem a pé e de carro, a favor das parcelas dos Autores, com as características que enunciam na petição inicial; c) Sejam os RR. condenados a restituir às AA. a posse de tal faixa de terreno – servidão – por forma a possibilitar a passagem pela mesma, a pé e de carro com as características descritas na p.i., devendo para o efeito serem obrigados à sua custa a retirar as pedras e não estacionarem veículos automóveis; d) Condenarem-se os Réus a absterem-se de praticar atos que perturbem a posse e o uso de tal servidão de passagem; e) Declarar-se que a parcela de terreno pertença da Ré se encontra onerada com uma servidão legal de aqueduto com as características assinaladas na petição inicial e a favor da parcela 3 da A. Maria da Conceição.

f) Condenarem-se os Réus a absterem-se de praticar atos que perturbem a posse e uso de tal servidão de aqueduto, suportando a passagem e colocação de canos e tubos idóneos ao transporte da água para o aproveitamento das agriculturas das AA. nas suas parcelas.

Para tanto, alegam em síntese que, as autoras são irmãs da Ré MP (…) e que são donas e legítimas possuidores de 3/16, 3/8 e 3/16 de um prédio rústico sito na Sangrinha, freguesia de Lardosa, concelho de Castelo Branco.

Tal prédio foi adquirido, em comum, na proporção de ¾ pelo pai das mesmas por sucessão por morte dos seus pais, DV (...) e AJ (...), sendo que o restante ¼ era pertença de MDV (...), residente que foi em Vale da Torre.

Sucede que os referidos ¾ foram também adquiridos, em comum, pelas Autoras e pela Ré e pelo irmão destas, J (…), por sua mãe M (…), por sucessão por morte do pai e marido, A (…).

Já depois da morte deste, mas ainda em vida da sua mãe, que veio a falecer há 24 anos, procederam à partilha e consequente divisão material dos ¾ de tal prédio, na proporção de ¼ para cada uma deles ((…)), o que fizeram mediante a colocação de marcos, construção de paredes em pedra solta e com aproveitamento de cômoros naturais.

Em razão das operadas divisões, há mais de 25 anos que as Autoras, a Ré e o irmão destas, possuem cada um a sua parcela de terreno, como prédios distintos uns dos outros, à vista de toda a gente, deles tirando todo o proveito e rendimento, designadamente colhendo a azeitona, amanhando e semeando a terra, semeando batatas, ocupando os edifícios, de forma pacífica, contínua e de boa-fé, sem oposição de quem quer que seja, considerando, assim, as referidas parcelas adquiridas por usucapião.

Acontece que, entretanto, J (…) vendeu a sua parcela à irmã MC (…).

Para servir os ¾ de tal prédio, foi construído pelos pais das Autoras e da Ré, um caminho que atravessa o mesmo, tendo início na estrada, fletindo no sentido noroeste e com cerca de 3 metros de largura.

É, e era, por essa faixa de terreno que as Autoras, a Ré, seus pais e irmão transitavam, há mais de 60 anos, ininterruptamente, fazendo passagem a pé e de carro de burro, fazendo o transporte de estrume, azeitona, ferramentas agrícolas, primeiramente com animais e mais tarde com trator agrícola e veículos automóveis.

À vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja, Ora, nenhuma das parcelas, cujas confrontações descreve na p.i., tem acesso à estrada nacional, que lhes fica a sul, ou a qualquer caminho público, razão pela qual os pais das AA. e R., tiveram de construir o caminho supra referido.

Servidão, essa, que tem início junto à EN, atravessando primeiramente um prédio de terceiro, depois a parcela 1 (pertença da MC (…), por a haver adquirido a seu irmão), desenvolvendo-se junto à sua estrema poente e norte, atravessando depois a parcela 2 (pertencente à Ré) a cerca de 5 m da sua estrema norte e a parcela 3 (pertencente igualmente à A. MC (…)), passando em frente da construção rural e terminando na parcela 4 (pertencente à A. MS (…)).

O Réu JL (…) é filho da Ré e, por conseguinte, sobrinho das Autoras.

Os Réus com intenção de privar os Autores de fazer uso daquela servidão colocaram, há cerca de 10 meses, pedras no seu leito e na parcela de terreno que lhes ficou a pertencer, estacionando ainda veículos automóveis de forma a impedir a passagem pela mesma.

Desde então que os Autores deixaram de fazer passagem e trânsito por tal servidão.

Além disso, na parcela que a Autora MC (…) adquiriu ao irmão, existe um poço que represa águas que ali nascem e que desde sempre os seus pais se aproveitaram delas, para regar os ¾ do referido prédio, transportando-a através de canos e tubos, ao longo da servidão de passagem, à beira do seu leito e junto da construção rural, por detrás desta.

Os pais das Autoras e da Ré adquiriram a água e a servidão de a encanar através de tubos nos mesmos modos de aquisição que as parcelas de terreno, considerando-os, assim, também adquiridos por usucapião.

Acontece, porém, que os Réus obrigaram as Autoras a retirar os canos com a ameaça de, não o fazendo, os cortarem.

A Autora MC (…) necessita de transportar tal água da parcela onde nasce para a parcela 3, também sua pertença, que é de sequeiro, atravessando, como sempre sucedeu, desde há mais de 60 anos, como já faziam os seus pais, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição ou constrangimento, sabendo que não causavam prejuízo.

A Autora MS (…)e marido também dela se aproveitavam, por empréstimo da irmã, para regar a parcela 4 que lhes pertence.

Estão as Autoras privadas do uso de tal água, para rega das suas parcelas, por a não poderem transportar através da parcela da Ré, não tendo outro lugar por onde o fazer.

Contestando, alegou a Ré MP (…), em síntese, que as partilhas apenas foram realizadas após a morte da mãe, há cerca de 22 anos.

Tais partilhas tiveram como mediador e avaliador (…) e foram concretizadas mediante o acordo de todos os herdeiros.

Refere que a si coube-lhe o prédio inscrito na matriz predial sob o artigo 1236, sito na Sangrinha, Vale da Torre, freguesia de Lardosa, concelho de Castelo Branco, com a área de 2491m2, onde existe uma habitação com dois pisos, cinco divisões, área de implantação de 45m2 e bruta de 90m2, e mais o caminho privado aqui em discussão.

Há 22 anos que habita a referida casa. O prédio que coube em partilhas à Ré encontra-se encravado. Para acesso a esse prédio os pais das AA e R. fizeram esse caminho.

Porém, o mesmo foi realizado somente para acesso à habitação.

Além desse acesso, existia e existe um caminho público, por onde pais e avós das Autoras e Ré faziam acesso ao prédio, semeando e amanhando a terra.

Caminho público esse que se situa no Lugar do Vale da Torre, tendo início no mesmo lugar, com orientação de SE a NO, virando ligeiramente a SO, virando novamente para NW, por fim tem duas ramificações.

O referido caminho público passa pelas estremas a poente (…) e Autora MS (…) pelo que o prédio desta não está encravado.

Só em 1981, os pais das Autoras e da Ré construíram uma habitação tendo passado aí a residir.

Habitação essa que agora pertence à Ré e para o qual foi constituído o referido caminho privado.

O caminho a que as Autoras se referem é o público, esse sim, usado para o transporte de azeitona, estrumes, ferramentas agrícolas.

O caminho privado é usado pela Autora MC (…) sem que a Ré se oponha, pois foi o acordado em partilhas, mas já se opõe a que a Autora MS (…) passe pelo caminho.

Ficou acordado que o caminho privado serviria os prédios da Ré e J (…) prédio vendido a MC (…), pois estes não tinham acesso a caminho público.

Foi também acordado que a Autora MC (…) para aceder ao seu prédio o faria por um caminho existente na parcela da Autora MS (…) Porém, a Autora destruiu parcialmente o caminho existente, lavrando-o e semeando-o.

Já no que concerne aos poços refere que os pais tinham 3 poços dispersos, retirando a água conforme precisavam, usando picota para regar, poços esses que são pertença das Autoras.

A Autora Madalena tem um poço no seu prédio.

A Autora Conceição tem dois poços, situados um em cada um dos seus prédios.

Pelo que os tubos e canos foram um expediente da Autora para continuar a incomodar a Ré e se assim fosse também a Ré teria direito a água, o que não aconteceu, nem ficou acordado em partilhas.

A Ré não tem água no seu prédio, para a ter teve de recorrer ao abastecimento público.

O que de facto ficou acordado nas partilhas foi que J (…) e a Ré MP (…) ficavam com o caminho privado.

A Autora MS (…) e MC (…) iriam servir-se do caminho público.

Também ficou combinado que cada herdeiro usava a água que tinha nas suas terras.

A final pede que a ação seja julgada improcedente e a Ré absolvida do pedido.

Também o Réu JL (…) contestou.

Alega, em síntese, a sua ilegitimidade, por não ser proprietário de qualquer parcela em causa na ação.

Os Autores responderam, pugnando pelo indeferimento da ilegitimidade e rejeitando a natureza pública do caminho indicado pela Ré.

No despacho saneador foi julgada improcedente a exceção de ilegitimidade passiva do Réu.

Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, com inspeção ao local, após o que foi proferida sentença que julgou a ação procedente, por provada, e, consequentemente, declarou que os Autores são donos e legítimos possuidores das seguintes parcelas de terreno: [Parcela I – com as seguintes confrontações: norte: António José Domingos Eusébio, sul: Manuel Fernandes e Maria Patrocínio, nascente: R. MP (…), poente: António José Domingos Eusébio –...

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