Acórdão nº 1445/11.6TBCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução18 de Dezembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...

, com os sinais dos autos, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe moveu “Banco B..., S.A.

”, também id. nos autos – para haver dele (e dos restantes executados, executados “C...

, Lda.”, D...

, E...

[1], F...

e G...

– para haver dele a quantia de € 49.911,47 (sendo € 49.727,59 de capital e o restante montante de juros vencidos e I. Selo) e juros vincendos – veio deduzir oposição à execução, alegando, em síntese e no que aqui interessa: A inexistência de convenção válida para o preenchimento da livrança (por falta de identificação, no pacto de preenchimento, do locatário, dos avalistas, da locadora, e, bem assim, do número do contrato de locação financeira) “dada” à execução, por si subscrita e entregue em branco; sendo certo, acrescenta, que as cláusulas/parágrafos constantes do pacto preenchimento da livrança em branco, a admitir-se a sua existência, não lhe foram comunicadas, nem lhe foi explicado o seu teor, devendo as mesmas, por via disso, serem consideradas nulas, enquanto cláusulas contratuais gerais, padronizadas, inseridas sem prévia negociação individual.

A actuação em abuso de direito do banco exequente, ao executar a livrança decorridos 12 anos sobre a sua subscrição e entrega (segundo o oponente, um avalista não pode permanecer eternamente “amarrado” a uma operação que avalizou).

Concluiu pois pela procedência da oposição e pela extinção da execução em relação a si.

Contestou o exequente, sustentando, em síntese, que ao executar a livrança exequenda não agiu em abuso de direito e que comunicou e explicou ao oponente o conteúdo das cláusulas/parágrafos do pacto de preenchimento da livrança exequenda, tendo este aceite, integralmente e sem reservas, o plasmado em tal pacto.

Concluiu pela improcedência da oposição.

Foi proferido despacho saneador, que declarou a instância totalmente regular, estado em que se mantém; e em que se julgou improcedente a invocada excepção peremptória de abuso de direito e a, segundo o oponente, nulidade do aval prestado pelo executado/oponente, prosseguindo a oposição para a outra questão suscitada e ainda controvertida.

Seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória, foi designado dia para a realização da audiência, após o que o Exmo. Juiz proferiu sentença em que julgou “procedente a presente oposição à execução, e, em consequência, (…) declara-se extinta a execução de que estes autos de declaração constituem apenso, no que respeita ao executado/oponente A....” Inconformado com tal decisão, interpôs o exequente recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que julgue a oposição totalmente improcedente.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. Na douta decisão recorrida, entendeu o meritíssimo Juiz a quo. julgar procedente a oposição à execução, deduzida por A..., e declarar extinta quanto a este a execução instaurada pelo ora Recorrente por considerar, em suma, que as cláusulas do referido pacto de preenchimento nas quais se prevê o preenchimento da livrança se consideram excluídas do mesmo por força da omissão dos deveres contratuais de comunicação e informação das referidas cláusulas contratuais de adesão, o que determina a inexequibilidade da dita livrança relativamente ao Oponente.

  1. Salvo o devido respeito, na prolação da douta sentença, o Meritíssimo Juiz a quo. não terá tido em consideração que o título executivo nos presentes Autos é uma livrança, avalizada pelos ora Recorridos - e não um contrato de financiamento -, pelo que, a responsabilidade dos obrigados cambiários para com o portador do título, pelo pagamento da quantia inscrita na livrança, é materialmente autónoma em relação ao contrato oportunamente celebrado, que lhe esteja subjacente.

  2. Em matéria de títulos de câmbio regem os princípios jurídicos da incorporação, da literalidade, da abstracção e da autonomia, cujo alcance é sobejamente conhecido e comummente aceite no nosso ordenamento jurídico.

  3. Tendo sempre presentes aqueles princípios jurídicos, concluímos que a extensão e modalidade do direito incorporado na livrança vale exclusivamente em conformidade com o teor do próprio título, ou seja, o que releva é tão só o que está exarado no título e não o que foi convencionado na relação subjacente à subscrição da livrança. O mesmo é dizer que a existência, validade e persistência da obrigação cartular definida na livrança, não pode ser posta em causa com auxílio de elementos exteriores ao título.

  4. Os princípios da autonomia e da abstracção impõem uma necessária independência entre a obrigação cartular e o negócio subjacente ao título cambiário. Ou seja, a relação comercial subjacente está, por defeito, fora da obrigação cambiária.

  5. O art. 17.º da LULL dispõe que as pessoas accionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores.. Assim, podemos concluir que a obrigação cambiária é, só por si, vinculante, sendo inoponíveis ao portador de boa fé, quaisquer vícios que possam ter ocorrido na relação subjacente à criação do título cambiário. Face ao exposto, não pode o avalista vir opor ao portador de boa fé, a nulidade da obrigação cambiária, uma vez que tal não resulta da própria livrança.

  6. O avalista criou, junto do portador do título, uma obrigação autónoma e independente relativamente ao avalizado e ao próprio contrato subjacente, responsabilizando-se, directamente, pelo pagamento do título dado à execução. O aval continua a ser uma obrigação de garantia, mas de natureza especial, porquanto a obrigação do avalista é independente da do avalizado, mantendo-se, ainda que a mesma seja nula por qualquer razão que não seja um vício de forma. (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/01/1965, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 147, Xpág. 245).

  7. A livrança, realizando uma função cartular, constitui não só prova do direito, mas também o próprio fundamento do direito invocado.

  8. A obrigação do avalista é acessória e autónoma da do avalizado, pois o próprio aval consubstancia uma verdadeira obrigação cambiária autónoma. O avalista, mais do que responsabilizar-se pela pessoa por quem dá o aval, assume, também, a responsabilidade abstracta, objectiva e incondicional do pagamento.

  9. Face ao exposto, e salvo o devido respeito por opinião contrária, ao julgar procedente a oposição deduzida, com base na ineficácia da livrança relativamente aos Oponentes, por força da nulidade das cláusulas do pacto de preenchimento que estão subjacentes ao preenchimento da livrança (mercê da omissão dos deveres de informação e comunicação que impendiam sobre o Banco Exequente), o Meritíssimo Juiz a quo. violou os princípios jurídicos aplicáveis em matéria de títulos cambiários atrás referidos, e os arts. 17.º e 32.º da LULL.

  10. Sem prescindir, e por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que o Oponente era sócio da sociedade subscritora, pelo que, pelas regras da experiência comum, não é crível que quem se apresenta como sócio de uma sociedade comercial – como é o caso do oponente e ora recorrido – desconheça o significado e as consequências da aposição da sua assinatura num título de crédito, em concreto na livrança que consubstancia o título executivo Respondeu o executado/oponente, defendendo a bondade do decidido e que a sentença deve ser mantida na íntegra.

    Dispensados os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

    * II – Fundamentação de Facto São os seguintes os factos dados como provados.

  11. O “Banco B..., S.A.” instaurou acção executiva comum (1445/11.6TBCBR), contra os executados “ C..., Lda.”, D..., A..., E..., F...e G..., com vista à cobrança coerciva de um crédito no valor de € 49.911,47 (quarenta e nove mil novecentos e onze euros e quarenta e sete cêntimos). (cf. requerimento executivo dos autos principais, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) – ponto A) da matéria assente.

  12. Por decisão judicial proferida nos autos principais de execução, já transitada em julgado, o tribunal declarou extinta a instância quanto às executadas E... e F..., em face de desistência da instância perpetrada pelo exequente. - ponto B) da matéria assente.

  13. No processo executivo de que estes autos de oposição constituem apenso, foi pelo exequente “Banco B..., S.A.” dada à execução um impresso tipo livrança, tendo como local, data de emissão, data de vencimento, importância e valor, respectivamente, Coimbra, 15.11.1999, 17.10.2011, € 49.727,59 e titulação de contrato de locação financeira n.º502126, podendo ler-se nela escrito “no seu vencimento pagarei/emos por esta única via de livrança ao Banco B... ou à sua ordem a quantia de quarenta e nove mil setecentos e vinte e sete euros e cinquenta e nove cêntimos”, figurando como subscritor a sociedade executada “ C..., Lda.” (cf. título executivo dos autos principais, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) –...

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