Acórdão nº 968/09.1TBCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução10 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]: I – Relatório 1. A (…), por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe foi movida por B (...), deduziu a presente oposição, pedindo que a mesma seja julgada procedente e, em consequência, seja declarada a nulidade do contrato de crédito e, por isso, seja restituída à executada tudo quanto esta pagou à exequente no âmbito do contrato de financiamento, ou seja, €1.674,98; seja declarada a inexigibilidade da livrança junta aos autos como título executivo; e seja julgada extinta a instância executiva.

Para o efeito alegou, em síntese, que: Celebrou com a exequente um contrato de financiamento para aquisição a crédito da viatura da marca Mercedes Benz, modelo SL 500, matrícula (...)UG; A livrança dada à execução foi entregue em branco, apenas com a assinatura da executada para garantia do cumprimento do contrato de crédito; Sucede que a executada jamais recebeu o bem financiado, nem qualquer outro veículo, mas não obstante, procedeu ao pagamento de 9 prestações à exequente, no montante de 1.297.22€; A não entrega do bem financiado tem como consequência a não exigibilidade da prestação devida, sob pena de representar um locupletamento sem causa da exequente, à custa do empobrecimento da opoente; O referido contrato de crédito enferma de nulidade, porque não foi entregue à executada o respectivo original ou cópia aquando da respectiva celebração – artigo 6/2 e 8 do DL 359/91 de 21.09, nulidade que se estende à livrança dada à execução, razão pela qual a mesma não constitui título executivo válido.

  1. A exequente contestou, alegando que o contrato em causa foi celebrado em triplicado, pelo que a executada ficou com uma cópia do mesmo e, por outro lado, que a falta da entrega do bem em nada afecta o contrato de mútuo em causa, porquanto foi a executada quem escolheu o vendedor do mesmo, pelo que a alegação da executada de que não recebeu o veículo e que o contrato deve ser declarado nulo, só por má fé se compreende, devendo a mesma ser condenada em conformidade.

  2. Foi elaborado despacho saneador (fls. 32), dispensando-se a fixação da base instrutória, atenta a simplicidade da causa.

  3. Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, após o que a matéria de facto foi respondida nos termos constantes do despacho de fls. 115 e 116, não merecendo qualquer reclamação.

  4. Seguidamente foi proferida sentença que julgou procedente a oposição e determinou a extinção da execução.

  5. Inconformada com esta decisão a Exequente/Oponida interpôs o presente recurso de apelação que finalizou com as seguintes conclusões: «A) – A douta sentença a quo, posta em crise no presente recurso, decidiu pela procedência da oposição à execução, porquanto a exequente não provou, como lhe competia, que entregou um exemplar do contrato de mútuo no momento da sua assinatura à executada, pelo que a douta sentença, estribada no facto de não ter sido entregue o exemplar de uma cópia do contrato à executada, concluiu que este contrato ficou ferido de uma nulidade, em face do exposto no n.º 1 do art.º 6.º e art.º 7, ambos do DL 359/91, de 21.09, declarando a nulidade do contrato de mútuo subjacente à emissão da livrança dada à execução, deixando assim esta última de valer como título executivo; B) A exequente aquando da dedução da contestação à oposição juntou aos autos cópia do contrato de financiamento para aquisição a crédito com o n.º 90336584, o que fez sob o documento n.º 1, tendo aquele mesmo contrato aposta a data de 19 de Julho de 2007.

    1. Como daquele mesmo contrato fazia parte integrante – pois estava anexado o documento lavrado no Cartório Notarial da Mealhada em 27.07.2007 – o acto de reconhecimento Notarial da assinatura presencial da executada, a exequente juntou o mesmo documento em audiência de julgamento, sendo que tal junção tardia se deveu a lapso da exequente que não o juntou aquando da dedução da contestação.

    2. Aquela junção tardia foi, aliás, objecto de aplicação de multa por parte da Meritíssima Juiz, pese embora o documento ser parte integrante do contrato, dado que, como se pode constatar o mesmo contrato está rubricado pelo Notário em questão.

    3. A junção de tais documentos, o contrato em si e o acto de reconhecimento notarial da assinatura da executada não foram impugnados por esta.

    4. Naqueles dois documentos é constatável que o contrato tem a data de 19 de Julho de 2007, data em que o mesmo foi entregue à executada e o reconhecimento da sua assinatura ocorreu no dia 27 de Julho daquele mesmo ano.

    5. O contrato, documento particular, foi objecto de reconhecimento presencial da assinatura da executada, tendo o valor probatório previsto no art.º 376.º, n.º 1 do Código Civil, que remete para o art.º 375.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, tendo assim tal documento o valor atribuído à denominada prova plena, e isso decorre do art.º 371.º também do Código Civil.

    6. Existindo prova plena só em face de alegação e prova da sua falsidade é que o valor de tal documento soçobraria, sendo certo que tais documentos não foram impugnados pela executada, sendo assim de relevar a natureza e a sua força probatória, legalmente definida.

    7. A douta sentença não considerou sequer este documento, não relevou a sua natureza probatória, violando de forma grave o disposto nos art.ºs 371.º, 375.º e 376.º, todos do Código Civil.

    8. À executada foi entregue um exemplar do contrato, foi respeitado o disposto no art.º 6.º, n.º 1 do DL 359/91, de 21.09, pelo que ao decidir como decidiu violou ainda o disposto no art.º 7.º deste mesmo diploma.

    9. A executada teve um exemplar do contrato em seu poder.

    10. Teve assim todo o tempo e oportunidade de analisar as suas cláusulas, o seu conteúdo, reflectir sobre as obrigações decorrentes do mesmo contrato e em suma, pode aquilatar das responsabilidades e implicações que os termos do contrato lhe acarretariam para o futuro enquanto o mesmo vigorasse, caso não lhe pusesse fim antecipadamente mediante a resolução decorrente do período de reflexão.

    11. A douta sentença ao violar as regras de direito substantivo plasmadas nos diplomas supra referidos tem de ser revogada, porquanto põe em causa regras elementares da apreciação e valoração da prova, fazendo perigar a aplicação sã e escorreita da justiça.

    12. Não se trata a apreciação do valor dos documentos – o contrato e o acto de reconhecimento notarial da assinatura da executada – da formulação de meros juízos de carácter subjectivo, pois a decisão do julgador nestes casos está assente em matéria de facto, cujo valor probatório está já definido por lei, pelo que qualquer juízo subjectivo está de todo afastado e nem sequer se aplica neste caso, não havendo qualquer margem para ponderar entre um valor maior ou menor da prova em apreço: Prova Plena.

    13. A douta decisão em face do seu aquilatar é susceptível de recurso porquanto é nula, tal como decorre do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, atento ainda o disposto na alínea b) do n.º 2 do art.º 669.º também desta mesma lei adjectiva.

    14. Deve assim a douta sentença ora em crise ser revogada, por ser nula, e em seu lugar ser proferida sentença que declare improcedente a oposição à execução, prosseguindo os autos executivos a sua ulterior tramitação.

    TERMOS EM QUE, recebidas e apreciadas as alegações e corridos os demais termos do presente recurso, deve ser considerado procedente o mesmo e, em consequência, ser doutamente revogada a decisão recorrida, declarando-se improcedente a oposição à execução, Com o que se fará a costumada JUSTIÇA».

  6. Pela Recorrida foram apresentadas alegações que encerrou nos seguintes termos: «QUANTO A PROCEDÊNCIA DA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO COMUM EM FACE DA ALEGADA FALTA DE ENTREGA DO EXEMPLAR DO CONTRATO DE MÚTUO NO MOMENTO DA SUA ASSINATURA Não assiste razão a recorrente quando refere que ficou provado que a exequente entregou à executada o aludido contrato, porque, as suas alegações, por si só, não são suficientes para comprovar que foi entregue à executada um exemplar do contrato de financiamento, nem se pode retirar delas a conclusão que o documento ficou em poder da executada.

    Não ficou provado que o contrato foi entregue à própria executada porque esta assinou o contrato e reconheceu presencialmente a assinatura.

    O reconhecimento da assinatura não significa que foi entregue à executada um exemplar do contrato aqui em causa, mas apenas, que a assinatura da exequente foi reconhecida presencialmente.

    Aliás, esta questão do reconhecimento não tem relevância para o caso sub judice, pois a executada jamais pôs em causa a sua assinatura.

    Assim sendo, o recorrente não provou a entrega do exemplar do contrato de mútuo da sua assinatura, pois, no momento da assinatura do contrato, a executada não ficou em posse de nenhum dos documentos onde apôs a sua assinatura nos locais indicados para o efeito.

    Consequentemente, o contrato de mútuo deverá ser declarado nulo e a livrança dada à execução, é inexequível, i.é, não pode valer como título executivo.

    QUANTO A APLICAÇÃO DO DL 359/91 DE 21-09 AO CASO SUB JUDICE No contrato de crédito ao consumo, a não entrega de um exemplar ou cópia do contrato, no momento da sua celebração implica a nulidade do contrato.

    O DL 359/91 de 21-09 procura garantir a protecção dos direitos do consumidor, maxime, exigindo de forma imperativa, a entrega de um exemplar do contrato de crédito ao consumidor no momento da assinatura, sob pena de nulidade, uma vez que, só assim, ficaria assegurada a tutela do consumidor, nomeadamente, na possibilidade de revogação da declaração negocial referente ao contrato de crédito, durante o período de reflexão de 7 dias de forma a impedir a produção dos seus efeitos.

    Até porque, o contrato aqui em causa é um contrato de adesão, pelo que, as cláusulas têm um conteúdo pré-fixado por uma das partes.

    Ora se após a assinatura do contrato - não obstante ter sido reconhecida presencialmente, não for entregue ao consumidor - aqui executada – um exemplar do...

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