Acórdão nº 71/11.4T2ILH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelJORGE ARCANJO
Data da Resolução10 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO 1.1.- Os Autores – A… e mulher L…, C… e mulher M… – instauraram na Comarca do Baixo Vouga acção declarativa, com forma de processo sumário, contra a Ré – I...

Alegaram, em resumo: O acesso ao pátio dos prédios urbanos dos Autores e da Ré faz-se por um caminho comum, constituído em Setembro de 1968, com 7 metros de largura.

Em Fevereiro de 2010 a Ré obstruiu o caminho com a colocação de painéis de rede e canteiro, impedindo a sua utilização pelos Autores, tendo ainda colocado um barracão em terreno dos Autores, impedindo a abertura das tampas das fossas, causando-lhes prejuízos.

Pediram cumulativamente a condenação da Ré:

  1. A reconhecer que os 1ºs AA são donos do prédio identificado no art.1º petição; b) A reconhecer que os 2ºs Réus são donos do prédio identificado no art.3º da petição; c) A reconhecer que o acesso ao pátio do prédio dos 1ºs AA e ao prédio dos 2ºs AA se faz por um caminho de consortes que, partindo da Rua de Santa Teresa, termina no prédio pertencente aos 2ºs AA.

  2. A reconhecer que o caminho tem uma largura de cerca de sete metros desde a Rua de Santa Teresa até à esquina norte-poente do prédio dela e de, no mínimo, três metros desde a referida esquina até ao prédio dos 2ªs AA..

  3. No prazo de 8 dias, após o trânsito em julgado da sentença, retirar os painéis de rede, flores e plantas que colocou no caminho e em frente à porta de acesso ao pátio do prédio dos 1ºs AA, a repor o puxador da porta, a retirar o barracão, os animais e objectos colocados sobre o terreno e as fossas dos 2ºs AA, limpando o local por forma a que possam ter acesso.

  4. A pagar-lhes uma quantia a título de indemnização pelos prejuízos causados a liquidar em execução de sentença.

    Contestou a Ré, defendendo-se por excepção e impugnação e em reconvenção pediu a condenação:

  5. Dos Autores a reconhecer que a Ré é a proprietária do prédio descritos nos arts.29 e 30; b) Dos 1ºs AA a taparem a porta que abriram para o logradouro do prédio da Ré e removerem as instalações construídas no pátio do seu prédio e retirarem dali as garrafas de gás.

    Responderam os Autores e pediram a condenação da Ré como litigante de má fé, em multa e indemnização.

    No saneador afirmou-se a validade e regularidade da instância.

    1.2. - Os Autores, em articulados superveniente pediram a condenação da Ré:

  6. A demolir a garagem que implantou sobre as fossas dos 1ºs AA, limpando o local, por forma a que possam a elas ter acesso.

  7. A pagar aos 1ºs AA, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000,00, a crescida de juros, à taxa legal, desde a notificação.

  8. A pagar aos 2ºs AA, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000,00, e a título de danos patrimoniais a quantia de € 63,05, a crescidas de juros, à taxa legal desde a notificação.

    1.3. - Realizada audiência de julgamento foi proferida sentença que decidiu: a). Absolver a Ré da instância relativamente aos pedidos de declaração do direito de propriedade dos Autores (formulados nas alíneas a) e b) ); b) Absolver os Autores da instância relativamente ao pedido do direito de propriedade da Ré (formulado em a)) no que respeita à habitação identificada nos arts.24 e 29 da contestação (correspondentes à alínea H) dos factos assentes); c) Declarar como logradouro comum a área de terreno que, com a forma quase triangular e cerca de 50m2, é limitado pela frontaria da casa da ré, pelo alçado da casa dos primeiros autores, pelo caminho que dá acesso à casa dos 2ºs autores e que termina quase com a forma de bico junto à Rua de Santa Teresa, bem como caminho de consortes o beco que, partido daquela Rua, confina com o logradouro e segue, rente à casa da ré pela direita, até ao prédio dos 2ºs AA.

  9. Condenar a Ré a, no prazo de oito dias, retirar os painéis de rede, as plantas e vasos de flores que colocou no logradouro, quer os colocados em frente à porta de acesso ao pátio da casa dos 1ºs AA, quer os que mantém rente ao caminho de consortes; e) Condenar a Ré a, no prazo de oito dias, repor o puxador da porta de acesso ao pátio da casa dos primeiros autores pelo logradouro; f) Absolver a Ré do demais peticionado; g) Julgar improcedente a reconvenção e absolver os Autores dos pedidos.

  10. Condenar a ré como litigante de má fé no pagamento de multa que se fixa em 7UC, bem como no pagamento de uma indemnização aos autores correspondente ao reembolso das despesas que os obrigou a suportar com a lide, incluindo os honorários do mandatário.

  11. Custas da acção a cargo dos autores e da ré, na proporção de 1/12 e 1/4, respectivamente (considerado a condenação em 2/3 dos autores pela absolvição parcial da instância).

    Custas da reconvenção a cargo da ré.

    1.3. - Inconformados, a Ré e Autores recorreram de apelação.

    1.3.1.- Recurso da Ré – Síntese das Conclusões: ...

    Contra-alegaram os Autores.

    1.3.2. - Recurso (subordinado) dos Autores – Síntese das Conclusões: ...

    Contra-alegou a Ré no sentido da improcedência do recurso dos Autores.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – O objecto dos recursos: A falta de interesse em agir e absolvição da instância Nulidade da sentença Impugnação de facto (arts 1, 5, 11, 12, 14, 15, 28, 29, 38, 39 a 43 e 48 da BI) A propriedade do caminho ou logradouro (compropriedade ou propriedade exclusiva da Ré) O pedido reconvencional (demolição da porta aberta pelos 1ºs A

    1. O pedido indemnizatório dos Autores A litigância de má fé da Ré A repartição das custas.

    2.2. – Os factos provados: … 2.3. - 1ª QUESTÃO (Impugnação de facto) O Tribunal da Relação pode reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar a decisão de 1ª instância, apenas nas situações previstas nas alíneas a), b) e c) do nº1 do art.712 do CPC.

    A Ré/Apelante, alegando erro na apreciação da prova, impugnou as respostas aos quesitos 1, 5, 11, 12, 14, 15, 28, 29, 38, 39 a 43 e 48 da BI.

    Conforme fundamentação, o tribunal, após haver explicitado o sentido dado à designação de “logradouro” e de “caminho”, justificou a convicção na conjugação e pormenorizada análise crítica da prova documental, depoimentos de parte, testemunhal e inspecção judicial ao local.

    A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (art.655 do CPC) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que na formação da convicção do julgador não intervém apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.

    Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, as suas reacções imediatas, o sentido dado à palavra e à frase, o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerando em torno da testemunha, o modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo contribuindo para a formação da convicção do julgador, dialecticamente construída.

    Contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.

    O que se torna necessário é que no seu livre exercício da convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção do facto como provado ou não provado, possibilitando, assim, um controle sobre a racionalidade da própria decisão.

    De resto, a lei determina a exigência de objectivação, através da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (art.653 nº2 do CPC).

    Nesta perspectiva, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

    Conforme orientação jurisprudencial prevalecente, o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve, por isso, restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e na avaliação da respectiva credibilidade tem que reconhecer-se que o tribunal a quo, pelas razões já enunciadas, está em melhor posição.

    Ouvida a gravação da prova testemunhal (produzida em audiência), verifica-se, em síntese, duas versões...

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