Acórdão nº 438/11.8TBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2013

Data10 Setembro 2013
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra I- RELATÓRIO A- Os AA., P (…) e B (…), intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra Construções “C (…) Lda.”, pedindo a condenação desta a pagar-lhes: a) A quantia de 6.729,77€ (seis mil setecentos e vinte e nove euros e setenta e sete cêntimos), relativa às despesas de reparação do veículo; b) A quantia de 7.481,29€ (sete mil quatrocentos e oitenta e um euros e vinte e nove cêntimos), relativa ao período de tempo que esteve sem veículo automóvel; c) A quantia de 3.362,00€ (três mil trezentos e sessenta e dois euros), a título de taxa de justiça paga e demais encargos com o processo; d) A quantia de 20.000,00€ (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos.

Para tanto alegaram, em síntese, que no dia 11 de Junho de 2009, pelas 12:00 horas, na EN 230, sentido S. João do Monte, Águeda, ocorreu um acidente de viação, em que foi interveniente o veículo do autor P (...), de matrícula (...) ZA, na altura tripulado pela autora B (…), o qual seguia no sentido de marcha S. João do Monte/Águeda; quando ao descrever uma curva para a direita no sentido S. João do Monte - Águeda, e devido à existência de uma grande quantidade de areia no pavimento, numa distância de 200m, proveniente de uma pedreira que ali se encontra, propriedade da Ré, o veículo entrou em despiste acabando por ir embater num muro de vedação, despiste esse que se ficou a dever à referida grande quantidade de areia que se encontrava no asfalto sem que existisse no local no qualquer tipo de sinalização a alertar para a existência dessa areia no pavimento, para a existência da dita pedreira, ou, ainda, para a entrada e saída de viaturas da mesma, acidente esse que ficou a dever-se unicamente a culpa da R. que, ao não proceder à limpeza da areia existente na estrada, violou, grosseira e culposamente, as mais elementares normas estradais e rodoviárias; em consequência do acidente resultaram danos materiais no veículo do autor, quer na parte frontal da viatura, quer na parte traseira da viatura, a qual foi sujeita várias a reparações que importaram na quantia de 6.729,77€; até estar reparado o referido veículo esteve paralisado durante 12 meses, sendo que o mesmo era utilizado pela Beatrice Marion, para se deslocar para o trabalho e para levar as filhas do Autor e da condutora à escola, pelo que, em consequência da privação do mesmo, tiveram que pedir um carro emprestado a um amigo, até aquele estar reparado, sendo que, se tivesse que recorrer a uma rent a car pelo período de paralisação do veículo o A. teria que pagar a quantia de 7.481,29€ (sete mil quatrocentos e noventa e um euro e vinte e nove cêntimos; para tratar de assuntos relacionados com o processo, tiveram de se deslocar 3 vezes ao escritório do seu mandatário em Tondela tendo para tanto suportado custos que se avaliam em 250,00€; para instaurarem o competente processo judicial tiveram que pagar taxa de justiça no valor de 612,00€, sendo que as despesas que ainda terão com este processo estimam-se em valor nunca inferior a 2.500,00€; aquando do acidente a Autora/condutora seguia com as filhas de ambos os AA. na viatura, uma com 9 anos e outra com 2 anos, tendo a autora e as suas filhas ficado em estado de choque, tendo sido transportadas ao Hospital Cândido de Figueiredo em Tondela, por questões de precaução e para avaliar o real estado de saúde das mesmas e, não obstante não terem lesões físicas, a verdade é que ficaram traumatizadas com o sucedido e ainda hoje têm pesadelos do acidente, tendo ainda a autora entrado em estado depressivo muito grave e por isso recorrido a ajuda médica; a R. foi interpelada pelo mandatário dos autores para proceder ao pagamento dos prejuízos decorrentes do acidente em causa e nada disse, nem diligenciou no sentido de resolver amigavelmente o sinistro.

B- Citada regularmente, contestou a Ré invocando a sua ilegitimidade, fundamentando tal excepção no facto de como proprietária de uma pedreira onde se extrai pedra e não areia, não ter tido conhecimento de qualquer acidente, nem tendo sido sancionada por qualquer autoridade; por impugnação, defendeu-se aduzindo que, a ser verdade que existia no local do acidente areia, o que não concede, sempre a autora mulher deveria ter o cuidado necessário para apenas imprimir ao veículo a velocidade que permita a qualquer momento desviar-se de um obstáculo, de outra viatura parada na via, de piores condições do piso, como a existência de areia, água, óleo, etc, pelo que o acidente sempre se ficou a dever única e exclusivamente a culpa da Autora mulher, que circulava com excesso de velocidade para as condições do piso no local, não sendo, por conseguinte, ela (Ré) responsável pela ocorrência do acidente e pelo prejuízos dele resultantes; caso assim se não entenda, alega que sempre os danos e prejuízos alegados pelos Autores se mostram completamente infundados, injustificados e ilegais.

Conclui pedindo que seja considerada parte ilegítima e, em consequência, absolvida da instância, ou, caso assim se não entenda, seja a acção julgada improcedente por não provada, com a sua consequente absolvição do pedido.

C- Na réplica que apresentaram os autores pugnaram, em síntese, pela improcedência das excepções invocadas pela Ré.

D- Foi elaborado o despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade da Ré, e foram fixados os factos assentes e a base instrutória, que não sofreram qualquer reclamação.

E- Procedeu-se ao julgamento que decorreu com observância do legal formalismo, não tendo a decisão sobre a matéria de facto sofrido reclamações.

F- Proferida sentença veio nela a decidir-se a parcial procedência da mesma, e, em consequência, a condenar a Ré Construções “C (…), Lda.”: I- A pagar ao Autor P (…) as seguintes importâncias: a) a quantia de € 6.729,77 (seis mil, setecentos e vinte e nove euros e setenta e sete cêntimos), alusiva às despesas de reparação do veículo; b) a quantia de € 7.481,29 (sete mil quatrocentos e oitenta e um euros e vinte e nove cêntimos), a título de indemnização pela privação de uso do veículo; c) a quantia de € 712,00 (setecentos e doze euros), a título de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

II - a pagar à Autora B (…) a quantia de € 10.000 (dez mil euros), a título de ressarcimento por danos não patrimoniais sofridos.

III - Absolver a Ré do demais peticionado.

G- Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpor recurso de tal sentença, cujas alegações rematou com as seguintes conclusões: (…).

H- Contra-alegaram os AA. pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção do decidido na sentença.

- Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso ( Arts. 684º, nº 3, 685º-A e 660º, nº 2, do CPC ), são as seguintes as questões a decidir: I- saber se foi incorrectamente julgada a matéria de facto.

II- saber se, com a alteração da matéria de facto no sentido pretendido pela recorrente, deverá a acção improceder na totalidade; Se assim não for, III- saber se é devida indemnização pela privação do uso do veículo e, na afirmativa, se essa indemnização deve fixar-se em € 10,00 € diários; IV- saber é devida indemnização à A. mulher por danos de natureza não patrimonial e, na afirmativa, se essa indemnização deverá ser fixada em € 500,00.

III – FUNDAMENTAÇÃO A) De Facto Na 1ª instância veio a ser considerada provada a factualidade constante da sentença recorrida parte da qual veio a ser posta em causa pela recorrente, impondo-se, pois, antes de mais, apreciar o erro de julgamento que a respeito de parte dela vem invocado no presente recurso. Por via do presente recurso a apelante impugna a decisão da matéria de facto, insurgindo-se a esse respeito contra o facto de a 1.ª instância ter considerado provada a matéria vertida nos quesitos 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21 e 22, por entender que tal matéria, ao contrário do decidido, deveria ter sido considerada não provada em face dos elementos de índole testemunhal e documental que foram carreados para os autos, a cuja indicação procede e em relação aos quais faz a respectiva análise crítica. No que tange à impugnação da decisão de facto proferida em 1.ª instância rege o Art. 712.º do C.P.C.

Segundo F. Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, pág. 127, resulta de tal preceito que «...o direito português segue o modelo de revisão ou reponderação...», ainda que não em toda a sua pureza, pois, segundo o mesmo autor comporta as excepções que refere em tal obra.

Já sobre os recursos de reponderação, ensina o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, in Estudo Sobre o Novo Processo Civil, pág. 374, que os mesmos «...satisfazem-se com o controlo da decisão impugnada e em averiguar se, dentro dos condicionalismos da instância recorrida, essa decisão foi adequada, pelo que esses recursos controlam apenas - pode dizer-se - a “justiça relativa” dessa decisão».

Tendo ocorrido no caso em análise a gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, nos termos do disposto no citado Art.º 712.º n.º 1 al. a) e n.º 2 do C.P.C, pode este tribunal da Relação alterar a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, desde que, em função dos elementos constantes dos autos ( incluindo, obviamente, a gravação ), seja razoável concluir que aquela enferma de erro.

Do preâmbulo do Dec. Lei 329/95, de 15.12, que instituiu no nosso processo civil a possibilidade de documentação da prova, decorre que esta se destina à correcção de erros grosseiros ou manifestos verificados na decisão da matéria de facto, quanto aos pontos concretos da mesma, ou seja, “a criação de um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria...

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