Acórdão nº 187/10.4T2AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Setembro de 2013
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório Comboios de Portugal, EPE, com sede na Calçada do Duque, n.º 20, em Lisboa, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra a A..., S. A.
, com sede na Rua (...), em Lisboa, e contra B..., S. A.
, com sede em (...) Espanha, pedindo que as rés sejam solidariamente condenadas a pagar-lhe a quantia de € 216.818,25, acrescida de juros de mora devidos, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Alegou, em síntese, que, no dia 28.12.2006, o comboio (Alfa Pendular) n.º 132, de sua propriedade, embateu num “obstáculo” que lhe surgiu na linha do norte, na zona de Cacia, Aveiro, “obstáculo” que veio a ser identificado como sendo um tampão de choque que havia caído de um vagão do comboio de mercadorias n.º 64132, composto pelas locomotivas n°s 2551 e 2556, de sua propriedade, e por 21 vagões vazios, propriedade da ré B... e alugados à ré A...; o que – queda do tampão de choque – aconteceu pelo mau estado de conservação do vagão de que caiu; resultando de tal embate diversos prejuízos, cujo ressarcimento peticiona.
As rés contestaram autonomamente.
A ré A..., invocando a incompetência territorial do Tribunal, e por impugnação, alegando desconhecer a generalidade da factualidade alegada pela autora, refutando a responsabilidade civil que lhe é imputada.
Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
Requereu ainda a intervenção acessória provocada da C...
Companhia de Seguros, S.A., para quem transferiu a responsabilidade civil emergente dos riscos da sua actividade.
A ré B..., invocando a excepção de prescrição, por ter sido citada quando haviam decorrido mais de três anos sobre a data do acidente que originou os prejuízos que a autora pretende ver ressarcidos; e impugnando a essencialidade dos factos alegados pela autora, por os desconhecer, refutando a responsabilidade que lhe é imputada, acrescentando que o vagão 83 71 9305016-3 foi objecto de várias acções de manutenção e de revisão de todos os seus componentes, quer antes da entrega à A..., quer posteriormente, nas datas previstas com vista a obter a competente e necessária autorização do Instituto Nacional do Transporte Ferroviário (INTF) para poder circular na rede ferroviária nacional, e que a peça (tampão de choque) só pode ter-se soltado do seu encaixe em virtude de má utilização do vagão, em manobras ou em circulação, que originasse a quebra do anel de segurança do tampão.
Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido Replicou a autora, pronunciando-se sobre as excepções invocadas pelas rés e pugnando pela sua improcedência.
Admitida a intervenção acessória provocada, veio a C... – Companhia de Seguros, S.A.
apresentar a sua contestação, alegando ignorar por completo a factualidade atinente ao acidente e sustentando, em resumo, que não é a ré A... responsável por qualquer dos danos alegadamente sofridos pela Autora, quer a título de responsabilidade civil extracontratual, quer a qualquer outro título, inexistindo por isso qualquer obrigação de indemnizar da sua parte.
Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de incompetência territorial e se relegou para a sentença a apreciação da excepção de prescrição; tendo-se em tudo o mais julgado a instância regular, estado em que se mantém.
Foi organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa, instruído o processo e realizada a audiência, após o que a Exma. Juíza de Circulo proferiu sentença, concluindo a sua decisão do seguinte modo: “ (…) A) – Julga-se a acção improcedente, por não provada, quanto à ré “ A..., S. A.”, absolvendo-a do pedido; B) – Julga-se a acção procedente, por provada, quanto à ré “ B..., S. A.” e, em consequência, condena-se a pagar à autora a quantia global de 216.818,25 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento. (…)” Inconformada com tal decisão, interpôs a R. B... recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que não a condene no montante indemnizatório de € 91.830,32 pela imobilização do Alfa “pelo facto desse quantitativo não corresponder ao dano emergente do acidente dos autos, que não foi alegado nem provado” (…) Quanto assim se não entenda deve o eventual dano, que a A. não alegou nem provou, ser julgado e quantificado em decisão ulterior, para ela se remetendo o respectivo julgamento e fixação. Quando ainda assim se não entenda, deve o referido montante ser reduzido, nos termos expostos, pelo menos, na quantia de 30.240,00€ correspondente ao valor, calculado segundo o mesmo critério, correspondente a 288 horas em que o Alfa sinistrado sempre estaria inactivo, dentro do período de 872 horas, por determinação da A. e por conveniência de serviço.” Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. Restrito o objecto do presente recurso à indemnização arbitrada pelo Tribunal pela imobilização do Alfa n°. 132, para reparação das avarias sofridas no acidente dos autos, a aqui Recorrente começa por afirmar que o montante de 91.830, 32€, no qual foi condenada, além de ilegal, é manifestamente injusto para ela e locuplatórico para a A.
-
Este montante correspondente, sem tirar nem pôr, ao custo do investimento com aquisição de uma unidade Alfa Pendular excedentária indispensável para permitir a optimização da exploração do respectivo serviço público, não constitui um dano emergente do acidente dos autos, nem corresponde ao hipotético prejuízo sofrido pela A. com o sinistro.
-
O que consta da conclusão anterior é também a conclusão a que chegou o Tribunal (ver resposta ao quesito 28), a própria A. (ver itens 39 a 47 da petição Inicial) e as suas testemunhas, nomeadamente a testemunha citada supra. (Ver transcrições citadas na fundamentação deste recurso).
-
Na verdade a A. não alegou nem provou a existência de um dano que lhe tenha advindo da imobilização do Alfa 123; o que alegou foi um custo do investimento que ela tem de suportar permanentemente (quer haja acidentes quer não) para possuir um comboio Alfa excedentário, necessário para garantir a actividade normal da exploração ferroviária.
-
Tratando-se de um custo de investimento e não de um dano resultante do acidente dos autos ele não é indemnizável e muito menos, pela ora Recorrente. Pelo que, quanto a este pormenor, a Recorrente nada tendo a pagar à A., devia, por isso, ter sido absolvido de tal pedido.
-
Não faz realmente sentido e até grita à sensibilidade das pessoas que a Recorrente, mesmo que responsável pelo acidente, seja ou possa ser condenada a indemnizar a A. por um valor correspondente a um custo de investimento necessário à exploração da sua actividade mercantil, quando esse custo permanente e necessário nada tem a ver com o acidente dos autos.
-
Na verdade esse custo sempre constituirá encargo da A., quer os seus comboios tenham, ou não, acidentes, pelo que também inexiste qualquer relação de causalidade entre tal valor e o sinistro.
-
Mas ainda que assim não fosse, sempre a quantificação do montante arbitrado pelo Tribunal a tal titulo, nos parece ilegal e incorrecta, porquanto toma em conta as 872 horas que o Alfa esteve a reparar, como se de horas de produção real de proveitos do referido comboio, se tratasse, quando, toda a gente sabe, que, diariamente e, por decisão da A., o serviço de comboios Alfa paralisa a sua actividade lucrativa entre a meia noite e as oito horas da manhã de cada dia.
-
Pelo que, a admitir-se como legal tal indemnização, ela deveria ser reduzida, pelo menos, no montante de 30.240,00€ correspondente a 288 horas em que o referido comboio, dentro do período total de reparação (872 horas) sempre estaria imobilizado, por paralisação do serviço dos comboios Alfa, conforme determinação da A.
-
Não tendo a A. alegado nem provado o dano efectivo que lhe adveio da imobilização de comboio sinistrado, quer a titulo de lucros cessantes, quer a titulo de privação do respectivo uso, a indemnização pedida pela A., por força dessa imobilização, não pode nem deve ser-lhe arbitrada em nome da equidade, devendo antes ser relegada para decisão ulterior.
-
Efectivamente nada custava à A. alegar e provar os prejuízos que teve com a imobilização do Alfa sinistrado, recorrendo ao histórico da rentabilidade do comboio, maxime, alegando o numero de viagens que faz diariamente, o preço dos bilhetes e o numero habitual de passageiros, etc., como constitutivos do seu direito, contrapondo também...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO