Acórdão nº 2444/17.0T8ACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Janeiro de 2023
Magistrado Responsável | FERNANDO MONTEIRO |
Data da Resolução | 10 de Janeiro de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: AA intentou ação contra BB, pedindo: Declarar-se a que a Autora é proprietária do Imóvel Identificado em 1º deste Petitório; b) Reconhecer-se que a Norte do Imóvel da Autora não existe qualquer servidão de Passagem; c) Reconhecer-se que a Propriedade do Réu, a sul, é servida por caminho, o qual dá acesso à Via Publica; d) Condenar-se o Réu a Abster-se de usar qualquer terreno da A. para aceder à sua propriedade; e) Condenar o Réu a repor a rede de divisória no local onde a mesma se encontrava, no limite da propriedade da Autora, ou em alternativa ao pagamento da quantia de 790,59€ a titulo de danos patrimoniais; f) Condenar o Réu abster-se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização por parte da A, do seu pleno direito de propriedade; (…)».
Mais requereu fosse apensado aos presentes autos o procedimento cautelar n.º 1381/17.....
Para tanto, a Autora alega, em síntese: É dona do imóvel identificado no artigo 1.º da petição inicial, propriedade que lhe adveio por compra, em 27/07/2016, prédio esse que, em tempos, juntamente com outros terrenos contíguos (incluindo o que é hoje do réu), pertenceram todos a CC e mulher.
A Autora procedeu à demarcação do mesmo, na sequência do que o Réu lhe manifestou estar obrigada a ceder-lhe passagem para o imóvel deste, que fica nas traseiras do imóvel da autora.
O Réu intentou contra a Autora (e outra) procedimento cautelar, no qual, com inversão do contencioso, esta foi condenada à restituição provisória da posse ao réu do caminho/servidão descrito na factualidade aí indiciada.
O prédio do Réu tem, como sempre teve, acesso à via pública, a sul da sua propriedade.
Após o deferimento da providência, o réu retirou a rede de vedação mandada colocar pela Autora, o que causou à autora danos patrimoniais, correspondentes ao custo com a sua colocação, no montante global de €790,59 (cimento no montante de €65,56 e materiais de vedação no valor de €725,03).
O Réu apresentou contestação, sustentando, em síntese: Os 3 prédios em causa nestes autos confrontam entre si e, anteriormente, pertenceram todos a CC e mulher.
Aquando da construção do edifício (armazém para indústria), implantado no prédio misto hoje pertencente ao Réu, esses anteriores proprietários estabeleceram um caminho de passagem desse prédio para a via pública (Estrada Nacional n.º ...), numa extensão de cerca de 50 metros de comprimento e largura média de 3 a 4 metros, através de parte do terreno de cada um dos prédios hoje pertencentes à autora e à outra requerida no procedimento cautelar, perfeitamente demarcado, em duro, calcada com trilho próprio de circulação de viaturas e hoje em parte alcatroada, o que foi feito, pelo menos, em 1993, ano da inscrição na matriz do prédio urbano hoje pertencente ao réu, para que desse prédio se acedesse diretamente à via pública.
O réu, seus amigos e colaboradores, bem como os anteriores proprietários e os então arrendatários desse armazém, sempre utilizaram esse caminho para acesso e saída deste prédio do réu, de e para a via pública, a pé, de automóvel e em veículos motorizados, o que sucedeu desde há mais de 20 anos, sem a oposição de quem quer que seja, à vista de todas as pessoas, na convicção de estarem a usar de direito próprio.
No dia 25 de Março de 2017, a autora, através de pessoas não concretamente identificadas, uma das quais a sua mãe, que é sua procuradora, e a outra requerida no procedimento cautelar, através de pessoa que se intitulou como seu genro, colocaram nesse caminho um bloco de pedra e vedações com paus de madeira e rede ovelheira, impedindo, assim, o réu de entrar por esse caminho para o seu prédio e de daí sair ou retirar a sua viatura de marca ..., com a matrícula XU-..-.. que ali se encontrava e aí permaneceu. Ficou impedido de utilizar essa viatura desde 01/03/2017. Só tendo passado a utilizar-se desse veículo após o dia .../.../2017, data em que dali retirou tal bloco de pedra, vedações e rede, atuando em cumprimento do decretado na sentença proferida em sede do procedimento cautelar. Para o efeito, desembolsou a quantia de €1.950,01.
Em reconvenção, pede o reconhecimento da servidão predial que onera os prédios das autoras e a condenação solidária delas a pagar-lhe tal quantia de €1.950,01, bem como a quantia de €1.200,00, pelo prejuízo da privação do uso da viatura durante o período de tempo da respetiva imobilização.
Foi apensado o procedimento cautelar e foi ordenada a apensação a estes autos, primeiramente instaurados, do processo n.º 2445/17...., instaurado pela autora DD contra o mesmo réu.
O pedido desta é idêntico, relativo ao seu prédio, impugnando a existência do direito de passagem através de uma servidão constituída a favor do prédio do réu.
Entretanto, a Autora AA informou ter vendido o seu prédio em causa na acção a EE e mulher FF.
Foi depois admitida a intervenção destes adquirentes daquele imóvel.
Os chamados fizeram seus os articulados das autoras a que se associaram.
Realizado o julgamento, foi proferida a seguinte sentença: Declarar que os autores chamados são legítimos proprietários do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...61, freguesia ...; Declarar que a autora DD é legítima proprietária do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...51, freguesia ...; Declarar que os referidos imóveis dos autores não estão onerados com qualquer servidão de passagem em benefício do prédio do réu, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...65, freguesia ...; Declarar que esse prédio do réu, a sul, é servido por caminho, que dá acesso à via pública; Condenar o réu a abster-se de usar os terrenos dos autores para aceder à sua propriedade, bem como a abster-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização, por parte dos autores, do seu pleno direito de propriedade; Absolver o réu do demais peticionado.
Julgar as reconvenções totalmente improcedentes, por não provadas e, nessa conformidade, absolver todos os autores dos pedidos reconvencionais.
* Inconformado, o Réu recorreu e apresenta as seguintes conclusões: (…) IV – No processo está em causa, como também no presente recurso, o reconhecimento ou não da existência de uma servidão de passagem em favor do prédio pertencente ao Recorrente (descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 4365), no qual se encontra implantado um armazém/oficina, servidão essa que onera os prédios pertença das Recorridas até alcançar a via pública, a denominada Estrada nacional nº ..., a qual assume a configuração, extensão, largura e comprimento referenciados nos autos.
V – A sentença recorrida, a nosso ver, padece de erro de julgamento, de facto e de direito, e no que se refere à matéria de facto impõe ao ilustre tribunal “ad quem” uma reapreciação da prova testemunhal produzida e gravada em audiência de julgamento, o que se pretende com o presente recurso, e isto porque o depoimento das testemunhas prestado, referenciado de forma desenvolvida nas alegações do recurso, impõe que se dê por assentes factos que foram dados por não provados, e que permitem concluir pela existência de uma servidão de passagem em favor do imóvel do Recorrente/Réu e que onera os prédios das Recorridas/Autoras, servidão essa constituída a partir de 1993 pelo então proprietário de todos os três prédios, CC.
VI – Com efeito no segmento da sentença respeitante aos Factos não provados sob o item 1 … VII - E acrescenta-se na sentença, sob o item 2, respeitante a Factos não provados … VIII – Sucede é que do depoimento prestado pelas testemunhas em audiência de julgamento, referenciado no corpo das presentes alegações, se impõe uma conclusão totalmente oposta, ou seja, que esses factos, referenciados sob o nº 1 e sob o nº 2, dos não provados, sejam antes dados como provados.
IX – A Mma. Juiz “a quo” fez, pois, uma errada apreciação da prova testemunhal e também da prova pericial contextualizada no relatório pericial junto aos autos...
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