Acórdão nº 306/17.0T8GRD-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução13 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A “L (…)”, doravante apenas designada por Liga, foi declarada insolvente por sentença de 24 de maio de 2017 já transitada em julgado (fls 32 e segs dos autos principais).

O presente incidente de qualificação de insolvência foi requerido pela credora “E (…) Lda”, cujo crédito de 7.442,03€ foi reconhecido e graduado como comum no apenso B.

Requereu o incidente (e afectação) contra os membros da Direção e da Mesa da Assembleia nos últimos três anos Alegou, em suma, que foi a responsável pela contabilidade da Liga até fins de janeiro de 2016 e que os elementos contabilísticos fornecidos por esta não espelhavam a realidade, sendo ocultados e distorcidos elementos que impediram a mesma de emitir as declarações fiscais devidas e que ficassem por encerrar os anos contabilísticos desde 2012.

Nem sequer foi informada da existência de um contrato de trabalho com a requerente da insolvência, sendo que esta própria chegou a emitir recibo de prestação de serviços em regime de avença, tendo havido distorção da realidade para gerar um crédito a favor da mesma e que fundamentou a p.i. de insolvência.

* Foi declarado aberto o incidente, por despacho de 8/08/2017 (fls 26).

* A fls 44 e segs, a Sra AI veio apresentar o parecer a que alude o art.º 188º nº2 do CIRE.

Em tal parecer conclui que a Liga não tinha contabilidade executada e contas prestadas desde 2012, por não ter sido habilitado o CC (contabilista certificado) com a documentação necessária o que não permitiu o conhecimento real da situação da devedora.

Para além disso a Direção desinteressou-se do projeto da Liga.

Entende que se mostram verificadas as alíneas b) e h) do nº 2 do art.º 186º do CIRE e que deverão ser afetados os membros dos órgãos sociais da administração da Liga.

* O Ministério Público acompanhou o parecer da Sra AI, no que respeita à verificação do requisito a que alude a alínea b) do nº 3 do artº 183º do CIRE.

* A fls 60 e segs, J (…) deduziu oposição dizendo que como Presidente da Mesa da Assembleia não pertenceu à administração da Liga, não podendo ser afectado com a qualificação da insolvência como culposa.

Sempre cumpriu com as suas obrigações legais e estatutárias.

Mas do que sabe, a situação de insolvência não foi provocada ou potenciada pela Direção, mas por factores externos como a diminuição de utentes e redução de apoios da segurança social e as questões da contabilidade ocorreram devido à própria requerente que criou conflitos com a Direção, exigindo documentos que não existiam já de Direções anteriores, recusando-se a entregar contas e a aceitar a sua substituição por outro profissional.

Contestou o Presidente da Direção, (…), dizendo que foi ele, embora residente em Lisboa, que por razões afectivas a x... investiu dinheiro próprio para a criação de um Centro de Dia de apoio a idosos, gerido pela Liga e que veio a ter o seu nome ((…)).

Com o passar dos anos, as Direções da Liga vieram a modificar os fins do prédio que construiu, destinando-o a Lar, embora nunca o legalizassem com tal.

Em 2013 aceitou assumir a Presidência da Direção, deixando claro que não tinha condições para exercer a gerência de facto, que nunca exerceu, embora se fosse inteirando do que se passava.

Tentou, em vão, fazer o saneamento financeiro da Liga.

Não teve qualquer culpa na insolvência, bem pelo contrário.

Os demais requeridos opuseram-se a fls 85 e segs, imputando as culpas da situação das contas à própria E (…).

O que levou à insolvência fora as irregularidades várias que se vinham sentindo das Direções anteriores e que foram denotadas no relatório inspectivo da Segurança Social de janeiro de 2013 onde se fizeram exigências que não foi possível satisfazer, não obstante os vários esforços e empenho da Direção que tomou posse em 2013 e que descreveram.

Foi proferido despacho sanedor, no qual se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelos requeridos A (…) e demais subscritores de tal contestação, fixado o objeto do litígio e os temas da prova – fls 176 a 178.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 335 a 348, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final, se decidiu julgar o incidente de qualificação como não provado e improcedente, com a consequente absolvição dos requeridos no pedido e qualificando-se a insolvência como fortuita, ficando as custas a cargo da requerente.

Inconformada com a sentença proferida, dela interpôs recurso a requerente, E (…), recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo – (cf. despacho de fl.s 416), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: (…) Contra-alegando, o MP, em 1.ª instância, defende a improcedência do recurso, com o fundamento em que a prova produzida foi bem apreciada e a situação que conduziu à falência da requerida se verificou em situação anterior à tomada de posse da Direcção composta pelos aqui requeridos e, ainda, porque a falta de contabilidade organizada e de apresentação de contas, se iniciou com a anterior Direcção e a visada (os seus Membros) em nada contribuiu para a situação de insolvência, dado que a situação da insolvente era do conhecimento geral da comunidade.

Contra-alegando, os requeridos (…) peticionam a rejeição do recurso de facto, por a recorrente não ter indicado, por referência aos assinalados pontos incorrectamente julgados, quais os meios de prova em que se fundamenta; assim não sendo, que a prova foi bem apreciada e devendo manter-se a decisão recorrida, com o fundamento em que a situação de falência em que caiu a insolvente, não se ficou a dever a questões/problemas de contabilidade, mas sim à falta de recursos financeiros que permitissem a legalização da valência de lar que, já se verificava antes da tomada de posse da Direcção, de que faziam parte os ora requeridos.

Acrescentam, que embora se verifique a falta de contabilidade organizada e a não prestação de contas, nunca existiu uma contabilidade fictícia, nem qualquer irregularidade, com o objectivo de ocultar a sua real situação financeira.

Contra-alegando, o requerido M (…), com fundamentos coincidentes com os dos demais recorridos, pugna pela rejeição do recurso de facto e no mais, estribando-se nos fundamentos exarados na sentença recorrida, defende a improcedência do recurso, mantendo-se aquela.

Como resulta do relatório que antecede, a ora recorrente parece pretender colocar em causa a decisão recorrida, no tocante à fixação da matéria de facto dada como provada, (embora, nos termos que constam das suas conclusões, acima transcritas, nada se refira quanto a tal).

No entanto, no que apelida de “Introdução” às alegações de recurso, refere que alguns itens da matéria de facto foram incorrectamente apreciados (em termos que mais à frente se mencionará).

Mas, se é essa a sua intenção, fá-lo em termos que acarretam a que se conclua que, o recurso, no que à matéria de facto respeita, não está conforme aos ditames legais aplicáveis, pelo que desde logo, em sede de questão prévia, importa apreciar a questão da rejeição do recurso de facto, com o fundamento em a recorrente não ter cumprido o disposto no artigo 640.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, al. a), do CPC (no que seguiremos de perto o por nós já decidido, em anteriores Apelações).

De acordo com este preceito, em caso de impugnação da matéria de facto e se trate da reapreciação de provas gravadas, sob pena de rejeição, deve o recorrente indicar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com exactidão as passagens da gravação em que se funda e, disposição inovadora, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Ora, como resulta da acta da audiência de julgamento, procedeu-se à gravação dos depoimentos prestados, no sistema de gravação digital em aplicação informática, em uso no Tribunal recorrido.

Assim, nos termos do disposto no supra citado artigo 640.º, o recorrente, em caso de recurso sobre a matéria de facto, para além da indicação dos concretos pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados, tem de indicar, com exactidão, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, as passagens da gravação em que se funda o mesmo, bem como a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

A recorrente, cf. alegações e conclusões apresentadas (sendo que estas, como consabido e adiante se referirá, é que delimitam os termos do recurso), cf. fl.s 201 v.º e 202 e 204 a 206, limita-se a referir o seguinte: “Nesta senda, consideramos que devem ser qualificados como não provados os seguintes factos que a douta sentença considerou provados, sumariando-se o motivo que melhor se exporá nos pontos seguintes: 1. Ponto 9 - “Nos primeiros dias de mandato os Requeridos aperceberam-se de imediato, da complexa situação em que se encontrava a Liga” Houve uma transação de um membro da direção – a tesoureira, pelo que havia pleno conhecimento da situação antes da data apontada, pelo que este argumento não deverá ser considerado.

  1. Ponto 10 - “Envidaram esforços para resolver os problemas da Liga e assegurar o seu funcionamento” .

    Não houve colaboração com o Contabilista Certificado para regularização da contabilidade, não houve pedido de redução de coimas, não foi apresentada defesa à aplicação da tributação autónoma, não houve investigação para descobrir o paradeiro de quantias de dinheiro avultadas e quando o Requerido M (…) se predispôs a sanear financeiramente a Liga dos Amigos de x... , os restantes membros desistiram do desiderato, tendo este requerido acabado por se desinteressar igualmente do projeto.

  2. Ponto 16 - “Desde que a Direção fez diversos contactos escritos, (…) com vista...

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