Acórdão nº 21/17.4T8SEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução28 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório a) O autor instaurou a presente ação declarativa contra a Ré alegando que celebrou, por escrito, um contrato de arrendamento com F (…) marido da Ré, tendo por objeto o rés-do-chão do prédio urbano que identifica na petição.

    O marido da Ré faleceu no dia 8 de julho de 2003, tendo a Ré acordado com o Autor manter-se na habitação, sendo a renda mensal atual de 157,00 euros.

    Sucede que o Autor se opôs à renovação do contrato o que comunicou à Ré através de carta registada.

    A Ré recusa-se a sair do locado e daí o recurso a tribunal, peticionando a condenação da Ré a restituir-lhe o locado livre de pessoas e bens; o pagamento de 1.256,00 euros de indemnização pela não entrega atempada do locado; o valor em dobro da renda por cada mês de atraso, e respetivos juros, e ainda uma quantia a título de sanção compulsória por cada dia no atraso da entrega do locado.

    A Ré contestou argumentando que adquiriu o direito ao arrendamento por transmissão por morte e que a declaração de oposição à renovação do contrato não foi eficaz porque, por um lado, o Autor pretendia antecipar os seus efeitos e, por outro, as partes passaram a comportar-se na relação contratual como se de um contrato de duração ilimitada se tratasse, quer ainda porque a Ré se encontra protegida por lei em razão da sua idade e em face do lapso de tempo de duração do contrato.

    No final foi proferida a seguinte decisão: «Nos termos e pelos fundamentos expostos, decido julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: a) Condeno a R. (…) na entrega do locado – a saber, rés-do-chão do prédio descrito na Conservatória do registo predial de (...) sob o n.º (...)001 e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo (...) 0002 - livre de pessoas e bens ao A. J (…), no estado em que o recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato; b) Condeno a R. (…) a pagar ao A. J (…) uma indemnização com vista ao ressarcimento dos danos causados pela não entrega atempada do locado, correspondente ao dobro do valor da renda em vigor em 30 de Setembro de 2016, por cada mês decorrido entre esta data (30.10.2016) até ao momento da efectiva restituição do locado, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento de cada uma das prestações que compõem a indeminização, a liquidar ulteriormente e à qual deverá ser descontado o valor pago pela R. a título de renda desde 01 de Outubro de 2016.

    1. Absolver a Ré dos restantes pedidos contra si deduzidos pelo Autor.

      Custas pela R. – artigo 527.º do C.P.Civil».

    2. A Ré recorre desta decisão, tendo concluído do seguinte modo: «1ª) O objecto do presente recurso cinge-se a matéria de Direito, tendo a Ré concordado com a sentença recorrida no que toca à matéria de facto dada como provada; 2ª) dentro da matéria de Direito, falta-lhe interesse em agir para recorrer da sentença na sua totalidade, uma vez que não se sente com forças para permanecer no locado, atento o clima de grave hostilidade, que a obriga a fazer um uso muito limitado e constrangedor das partes comuns do locado que partilha com o Autor; 3ª) pretendendo entregar o locado ao Autor o mais rapidamente possível, não tem interesse em recorrer da sentença no que respeita à protecção ao inquilino idoso que o RAU veio determinar e que em nosso entender o NRAU só retirou aos contratos cuja transição para o NRAU foi entretanto promovida pelos senhorios; 4ª) prende-se assim o objecto do presente recurso com a (in)validade e (in)eficácia da denúncia feita pelo senhorio através da carta junto aos autos, por um lado; e a interpretação feita, do disposto nº 2 do artigo 1045º do C. Civil, por outro; ou seja, com a violação do nº 3 do artigo 1055º do C. Civil, por um lado; e com a violação do nº 2 do artigo 1045º do C. Civil por outro, que em nosso modesto entender ocorreu na sentença recorrida; 5ª) pretende a recorrente que este Venerando Tribunal se pronuncie sobre aquelas duas questões e nada mais; 6ª) com efeito, a Ré convenceu-se que o senhorio ao denunciar o contrato para 1 de Agosto de 2016, ou seja, para dois meses antes do termo da quinta renovação, o não denunciou válida e eficazmente, tendo o contrato continuado a renovar-se no dia 1 de Outubro de 2016; 7ª) como de resto o Tribunal a quo, fez constar da sentença recorrida, a Ré ficou com « a expectativa de permanecer no locado que vem ocupando há muitos anos » cfr. sentença recorrida a fls. 5 in fine; 8ª) ora tal expectativa não é compatível com o argumento de que a Ré ao abrigo do disposto do artigo 236º do C. Civil tenha ficado vinculada a uma declaração de vontade diferente da plasmada na carta; 9ª) a Ré ficou convencida de que a denúncia era inválida e ineficaz, por violação do disposto no nº 3 do artigo 1055º do C.Civil; 10ª) daí que em seu humilde entender se tenha convencido que o contrato se renovaria no dia 1 de Outubro de 2016, sem prejuízo da protecção especial aos inquilinos com idade superior a 64 anos, e a habitar por mais de trinta anos no mesmo locado; 11ª) em momento algum, se convenceu de que tinha de restituir o locado até 30 de Setembro de 2016, sob pena de se constituir em mora nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1045º nºs 1 e 2 do C.Civil 12ª) pois ao ficar com a expectativa de permanecer no locado, não podia ter ficado com a expectativa de ter de o restituir sob pena de pagar a renda em dobro; 13ª) a sentença recorrida vem assim ferida da nulidade da contradição insanável dos fundamentos de Direito em que a decisão assentou, prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC; 14ª) pois como acima se referiu, tendo o Tribunal a quo, ficado convencido que a Ré tinha a expectativa de permanecer no locado, não podia ao mesmo tempo, considerar que esta tinha interpretado a carta como determinante da obrigação de restituir o locado em 30 de Setembro de 2016; 15ª) a Ré nunca considerou a denúncia válida e eficaz daí que tenha ficado convencida que o contrato se renovaria como efectivamente, se renovou em 1 de Outubro de 2016; 16ª) em momento algum representou que se constituiria em mora por não restituir o locado; 17ª) por tudo quanto se deixou alegado, deverá o contrato de arrendamento sub judice, considerar-se automaticamente renovado em 1 de Outubro de 2016, pelo período de cinco anos; 18º) e em consequência disso, ser a Ré absolvida do pedido de indemnização previsto no artigo 1045º do C.Civil; 19º) sem prescindir, e caso Vossas Excelências venham a entender que o contrato não se chegou a renovar, deve a indemnização pela mora na restituição do locado, considerar-se integralmente paga, com o pagamento atempado das rendas em singelo até à efectiva entrega do locado ao Autor; 20º) em virtude de o nº 2 do artigo 1045º do C. Civil se referir à mora no pagamento da indemnização prevista no nº1 e não à mora na restituição do locado; 21º) devendo manter-se a decisão recorrida no que respeita à absolvição da Ré do pedido de condenação em sanção pecuniária compulsória; 22º) finalmente, a política proteccionista dos inquilinos com mais de 64 anos, e sobretudo dos que se mantêm a habitar o mesmo locado há mais 30 anos, vem de longe, e com a aprovação no mês em curso da proposta de alteração ao NRAU, integrada na chamada Nova Geração de Políticas da Habitação ( NGPH ), tem feito emergir expectativas legítimas aos inquilinos naquelas circunstâncias, que merecem uma tutela do Direito mais abrangente, que não se fique pelo simples texto dos artigos em vigor; 23º) na mesma linha, o Tribunal Constitucional, através do Acórdão nº 297/15 considerou inconstitucional e consequentemente desaplicou os preceitos...

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