Acórdão nº 46369/17.9YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução26 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A... (Sucursal da S.A. Francesa A... ), com domicílio na (...) , apresentou requerimento de injunção contra B...

, com domicílio na (...) , o qual, atenta a remessa à distribuição, foi convolado para acção especial de cumprimento de obrigações pecuniárias ao abrigo do D.L. n.º 269/98, de 01.09, peticionando a autora o pagamento da quantia de € 7.118,80, correspondente ao capital de € 5.817,50, a juros de mora no valor de € 948,30, a outras quantias no montante de € 200,00 e a € 153,00 relativos a taxa de justiça paga.

A autora alegou, em síntese, ter concedido, no exercício da sua actividade, um financiamento ao réu, mediante o reembolso em prestações mensais e sucessivas, que o réu, desde 07.03.2016, não efectuou mais nenhum pagamento, o que lhe conferiu o direito de resolver o contrato e exigir as prestações vencidas acrescidas de juros moratórios e das prestações vincendas, e que o valor de € 200,00 se refere a despesas administrativas com a recuperação da dívida.

O réu deduziu oposição, invocando a ineptidão do requerimento de injunção e admitindo ter contratado com a autora uma concessão de crédito, nunca tendo possuído um contrato legível, contrato esse que consubstancia um contrato de adesão, com cláusulas previamente redigidas pela autora que nunca foram explicadas pela autora ao réu, pelo que se devem ter por excluídas do contrato, contrato esse nulo, nada devendo o réu à autora.

Notificada para o efeito, a autora aperfeiçoou a petição inicial, alegando dedicar-se ao financiamento da aquisição a crédito de bens e serviços, tendo celebrado, no exercício da sua actividade, com o réu, no dia 17.12.2007, um contrato de concessão de crédito em conta corrente, no valor de € 10.000,00, depositado na conta (...) indicada pelo réu, o qual assinou, sem prévia negociação do clausulado, o original do contrato que junta como Doc. n.º 1, remetido à autora preenchido e a que foi atribuído o número interno (...) e onde constam os encargos em caso de incumprimento, as consequências da falta de pagamento, procedimento e prazo de livre revogação do contrato, condições de reembolso e respectivas condições, seguros, tendo todas as cláusulas, custos, condições e termos sido devidamente explicados ao réu, o qual recebeu mensalmente os extractos de conta remetidos pela autora, caso contrário teria o réu posto o contrato em crise em fase muito anterior.

Mais alegou que o valor financiado deveria ser reembolsado pelo réu em 94 prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de € 170,00 cada, caso o réu não aderisse ao seguro facultativo, que iria acrescer às restantes quantias na prestação a liquidar, sendo a TAEG aplicável a este crédito de 15,20%, tendo o réu efectuado pagamentos apenas até 07.03.2016, na sequência do que, além de vários contactos telefónicos estabelecidos, a autora procedeu ao envio de quatro missivas para a morada do réu, uma datada de 31.05.2016 com a integração em Y (...) , outra datada de 16.06.2016 referente à extinção do Y (...) , outra a 01.11.2016 a interpelar este ao pagamento e outra datada de 01.12.2016 referente à resolução contratual por incumprimento definitivo.

* Foi proferido despacho saneador, no qual se indeferiu a arguida excepção de ineptidão da petição inicial.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, no decurso da qual se ordenou a rectificação do artigo 16.º da petição inicial, passando a constar da mesma a quantia de 10.000,00 € e finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 47 a 54 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se julgou a presente acção improcedente, com a consequente absolvição do réu do pedido, ficando as custas a cargo da autora.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida, imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 83), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1.

Tal como resulta da prova gravada em audiência de discussão e julgamento (cfr. Acta de audiência de discussão e julgamento de 18/01/2018, CD: minutos 12:42:21), o R., ora apelado, esteve presente na sala onde ocorreu a audiência de discussão e julgamento, “ab initio”, tendo assistido ao depoimento da testemunha C... , pelo que, quando foram requeridas as declarações de parte do R., por parte da sua Ilustre mandatária, logo a mandatária da A. Se opôs, dado que o R. tinha assistido ao depoimento da testemunha por si indicada, sendo que, mesmo assim, o Tribunal admitiu que a parte prestasse declarações.

  1. O R., que assistiu à audiência de discussão e julgamento “ab initio”, pôde preparar e compor o guião que presidiu às suas declarações, fazendo-o de forma preordenada e em condições que permitiram uma “manipulação” do acervo probatório recolhido em audiência.

  2. Ora, as concretas virtualidades probatórias das declarações de parte são radicalmente diversas consoante a parte tenha, ou não, assistido à produção de prova que precedeu as suas declarações no final da audiência, poi caso a parte tenha assistido à restante produção de prova – como sucedeu “in casu”, serão menores – em termos objetivos - as possibilidades da parte prestar declarações com atributos propiciadores do seu convencimento e atendibilidade.

  3. Assim é que, in casu”, o relato do R. foi visivelmente programado (cfr. Acta de audiência de discussão e julgamento de 18/01/2018, CD: minutos 12:43:26 a 13:01:51), rígido e excessivamente coerente, eivado de declarações oportunistas. Diversamente, se o R. não tivesse assistido à restante produção de prova, o guião já não seria tão trabalhado e rígido, tratando-se de um cenário em que a espontaneidade e autenticidade das declarações ainda teriam campo útil para emergirem.

  4. Estando a atuação do juiz colimada ao dever de gestão processual (Artigo 6), ao princípio da cooperação (Artigo 7.1.), ao dever de boa-fé processual (Artigo 8) e ao princípio da adequação formal (Artigo 547), não deveria ter deferido que o R. tivesse prestados declarações naquelas circunstâncias, sendo que, ao tê-lo feito, fere a prova que foi produzida em audiência de julgamento de nulidade, que aqui se argui, para os devidos e legais efeitos, com a necessária anulabilidade da audiência de discussão e julgamento.

  5. O presente recurso de apelação tem por objecto a reapreciação da matéria de facto, nomeadamente da prova documental e testemunhal apresentada nos autos e bem assim da matéria de direito.

  6. Face à prova, tanto documental, como a testemunhal, efectivamente produzida, a sentença de que ora se recorre, consubstancia uma solução que viola, claramente, os princípios jurídicos e bem assim os preceitos legais e inclusive o senso comum que, ao caso, necessariamente, terão que ser aplicados, razão pela qual nos parece ser a mesma além de injusta, irrazoável e não rigorosa na apreciação da prova.

    1. instaurou procedimento de injunção, agora transmutado numa acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos nos termos do Decreto-Lei no 269/98, de 01/09, contra o R., alegando, em síntese que, no exercício da sua actividade celebrou com o R. um contrato de concessão de crédito, cuja quantia mutuada acrescida dos juros remuneratórios e encargos devidos, seria reembolsada em prestações mensais e sucessivas, com vencimento no dia 1 de cada mês. Sucede que o R., desde o dia 07/03/2016, não efectuou qualquer pagamento relativo às prestações que tinham que liquidar relativamente ao contrato referido.

  7. Peticionou, assim, a A., a condenação do R. no pagamento da quantia de € 5.817,50, acrescida de € 948,30 de juros vencidos e de € 200,00, a título de despesas administrativas.

  8. O aqui apelado, sem razões válidas para se opor àquele requerimento injuntivo, devidamente citado, deduziu oposição, arguindo, em síntese e no que releva “in casu”, a nulidade do contrato de crédito por violação dos deveres impostos pelo art.º 6.º do DL 359/91, de 21/09, defendendo a exclusão de todas as cláusulas do contrato, por violação dos deveres de comunicação e informação consagrados nos art.ºs 5.º e 6.º da LCCG e pugnando pela declaração de nulidade do mesmo contrato, com a restituição de tudo o que por ela foi prestado, ao abrigo do disposto no art.º 8.º, alínea d), da LCCG, em conjugação com o art.º 289.º do Código Civil.

  9. Produzida e devidamente escortinada a prova, quer documental, quer testemunhal, em sede de audiência de discussão e julgamento, o Tribunal “a quo”, lavrando em manifesto erro da apreciação daquela prova, julgou a acção totalmente improcedente, pelo facto de, de acordo com o seu entendimento, ter concluído pela nulidade do contrato porquanto considerou que as condições gerais do contrato não foram comunicadas ao R. e, em consequência, considerou-as excluídas do contrato, nomeadamente a indicação da TAEG, das condições em que pode ser alterada a TAEG e das condições de reembolso do crédito, o que, com o devido respeito, que é muito, não corresponde à verdade, pois que, bastará analisar, devidamente, a prova documental e testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento “vide” depoimento escrito junto aos autos pela A.), para se concluir que a A., não só alegou, como demonstrou, à saciedade, que tais cláusulas, que constam da página 1 do contrato, foram devidamente comunicadas, a quem se identificou como sendo o R., sendo certo que a assinatura deste consta da página 2 do aludido documento.

  10. Salvo o devido respeito, a apelante entende que o Tribunal “a quo” fez incorrecta apreciação da prova produzida nos autos, quer a documental, quer a testemunhal, bem como uma inadequada interpretação e aplicação do direito aos factos, que constituem a causa de pedir nos autos.

    Donde, como acima já se aflorou, o presente recurso, ter, por objecto, por um lado, a decisão...

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