Acórdão nº 524/13.0TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução12 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra “A..., L.da” com sede na Rua (...) , intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra a “B..., L.da”, com sede na x(...) e C.... e mulher D...

, residentes na (...) , pedindo a condenação dos réus a pagarem-lhe a quantia de 77.644,52 €, a título de danos patrimoniais, a de 2.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de 5%, ao ano, desde o trânsito em julgado da sentença, nos termos do disposto no artigo 829.º, n.º 4, do Código Civil.

Para tanto alegou ter adquirido à 1.ª ré, pelo preço de 50.000,00 €, já paga, por contrato de trespasse, o estabelecimento de café, cervejaria e restaurante, que gira sob a designação de “ Pizzaria E... ”, com alvará de licenciamento n.º .../88, emitido pela Câmara Municipal de k(...), em 20/01/1998.

O estabelecimento assim adquirido pela autora destinava-se à restauração, mais propriamente Pizzaria e era já conhecido, principalmente pela população estudantil, com boas perspectivas de negócio.

Como condição da efectivação do negócio, a autora tinha em vista efectuar obras de melhoramento no estabelecimento em causa, sendo indispensável para tal a construção de um forno a lenha, em substituição do existente, a gás, até porque este era pequeno e não reunia as condições de segurança necessárias e, ainda porque a autora tem como especialidade o fabrico de pizzas em forno a lenha e como tal é procurada pela sua clientela, razão pela qual, sem esta condição, nunca teria realizado o negócio.

Confrontada com tal exigência, a 1.ª ré afirmou inexistir qualquer problema quanto a isso e que, inclusivamente, já tinha conversado com o 2.º réu, na qualidade de proprietário e senhorio, não havendo qualquer entrave.

Na sequência do que, a autora, depois de reunir com ambos os réus e tendo equacionado a referida condição, celebrou um contrato de arrendamento com o 2.º réu.

No entanto, posteriormente e já depois de iniciadas as obras, a autora deslocou-se ao local a fim de serem respeitados os parâmetros legais exigidos para a sua actividade, tendo-se concluído que era necessário alterar as condutas de ar existentes, por as mesmas serem irregulares e não oferecerem condições de laboração de qualquer tipo de forno e não serem conformes com as exigências legais, oferecendo perigo para o prédio e seus moradores, o que tudo era do conhecimento dos réus.

Interpelados estes, nada fizeram, por o condomínio ter impedido as necessárias alterações ao nível das referidas condutas de ar, ficando a autora com um estabelecimento sem poder funcionar e encerrou-o, ficando com equipamentos que não podia usar e a pagar as prestações bancárias, por ter recorrido a empréstimo bancário.

Era interpelada pela clientela, quanto à situação criada, perdendo o preço pago e ficando com má imagem comercial.

A que acresce o facto de o 2.º réu ter começado a comercializar pizzas num outro estabelecimento que possui em k(...), sob o nome de “ Pizzaria E... ” e publicitando tal actividade na internet, o que, igualmente, causou prejuízos à autora.

Conclui a autora que, com o descrito comportamento, os réus violaram a boa fé contratual, quer antes quer depois da celebração do contrato, devendo-a indemnizar, nos termos peticionados.

Fundamenta a indemnização por danos não patrimoniais, nos problemas havidos com a instituição bancária a que recorreram, a frustração por não poderem abrir o estabelecimento e perda da clientela e desapontamento e transtornos sofridos.

Contestando, o réu C... , referiu que apenas teve conhecimento do contrato de trespasse celebrado pela autora, quando dele foi notificado nos termos do artigo 1039.º do CC, nunca tendo participado em quaisquer negociações tendentes à respectiva outorga.

Quanto ao demais, alega que enquanto explorou o estabelecimento em causa, nunca teve quaisquer constrangimentos relativamente ao seu funcionamento, bem como que nunca teve quaisquer conversas com os contratantes com vista à realização de quaisquer alterações no interior do estabelecimento, designadamente a instalação de um forno a lenha e que apenas após a realização do trespasse e a pedido da autora, celebrou com a mesma um novo contrato de arrendamento mas, em momento algum, autorizou a realização de obras, designadamente a construção do forno a lenha.

Obras que careciam de sua autorização e só delas teve conhecimento já depois do respectivo início, tendo alertado para a necessidade de as autorizar e informou que, em sua opinião, não era possível ali instalar um forno a lenha, o que a autora não acatou.

Perante a insistência da autora em instalar tal forno e a seu pedido, na qualidade de proprietário da fracção, colocou tal questão à apreciação do condomínio, sendo que os condóminos não autorizaram a realização das obras necessárias à colocação das condutas de ar no exterior do prédio, pelo que nenhuma responsabilidade tem no sucedido.

Mais refere nada ter a ver com o estabelecimento designado como “ U....”, que não é por nem detido nem gerido, nada lhe podendo ser assacado a tal título.

Pugna, em consequência, pela improcedência da acção.

Peticiona a condenação da autora por litigância de má fé, por, conscientemente, ter alterado a verdade dos factos.

Em face da dissolução da 1.ª ré, foram habilitados os seus sócios, F.... e G.... , os quais vieram apresentar contestação em que, em resumo (até porque veio a haver desistência do pedido quanto aos mesmos), impugnam a versão trazida aos autos pela autora, designadamente que houvesse sido abordada a necessidade de construção do forno a lenha e que as obras sempre teriam que ser autorizadas pelo senhorio, bem como que o estabelecimento reunia as condições necessárias para nele ser continuada a laboração até ali levada a cabo, desconhecendo a existência de quaisquer problemas com as condutas de ar.

Tendo sido a autora que deu início às obras, sem se certificar que eram respeitadas as condições técnicas para tal.

Concluem, alegando, que com a extinção da sociedade e efectuada a partilha do seu acervo, nada receberam, pelo que nada, podem pagar à ora autora, por se tratar de responsabilidade limitada.

Teve lugar a audiência prévia.

No seu decurso, foi proferido despacho de aperfeiçoamento, no sentido de a autora descrever as obras que efectuou e valores parcelares; pormenorizar os equipamentos adquiridos, gastos e perdas financeiras e enquadramento do pedido formulado a título de danos não patrimoniais, cuja causa de pedir é restringida ao 2.º réu.

Na sequência do que, a autora apresentou nova petição inicial, em que procede às correcções que lhe haviam sido determinadas, designadamente com a descrição das obras levadas a cabo, que computa em 17.315,00 €; gastos com a aquisição de equipamentos e mercadorias, que quantifica em 3.680,04 €; 725,70 €, com a limpeza, remoção e montagem do sistema de exaustão; 2.906,00 €, com pessoal que ajudou no período das obras, remodelações, limpezas e transporte de material; 1.830,99 €, em perdas de financiamento, juros e encargos bancários; 15.000,00 € de reforço de empréstimo, tudo no total de 93.147,73 €.

A título da indemnização pedida ao 2.º réu, peticiona a quantia de 3.500,00 € e a de 2.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, pelos fundamentos já antes expostos.

Em função do que, formula a autora, um pedido que ascende à quantia global de 98.647,73 €.

Os réus G.... e F.... , responderam, dizendo que a autora veio alegar outros e diferentes danos, o que não lho consente a estabilidade da instância, ampliando o pedido de forma ilegal. Ainda assim, impugnam a existência dos agora alegados danos.

Quanto ao mais reiteram o já anteriormente alegado acerca do modo como foi feito o negócio, pugnando pela improcedência da acção.

De igual forma se pronuncia o réu C... e acrescentando que a autora, quando abandonou o estabelecimento, removeu todos os bens susceptíveis de serem removidos e louças sanitárias e material eléctrico, tendo-se visto obrigado a recuperá-lo, com o que gastou a quantia de 3.338,48 €.

Impugna os danos agora alegados pela autora.

Na sequência da já alegada litigância de má por parte da autora, peticiona a condenação desta no pagamento de uma indemnização nunca inferior a 5.000,00 €.

Conforme requerimento de fl.s 269, a autora declarou desistir dos pedidos formulados contra os réus F.... e G.... , desistência que foi homologada por decisão de fl.s 271.

Procedeu-se a nova audiência prévia, na qual se admitiu a ampliação do pedido formulado pela autora e se fixou, em consonância, o valor da causa; se proferiu despacho saneador, julgando improcedente a invocada excepção de caso julgado, por ter sido intentada no Juízo de Paz, acção destinada a resolver o contrato de arrendamento sub judice e se enunciaram o objecto do litígio e os temas de prova, sem reclamações.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 330 a 353 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se decidiu o seguinte: “Por via do exposto, • absolvo o réu da instância relativamente ao subpedido de pagamento da quantia de € 2.000,00 (dois mil euros) a título de danos não patrimoniais; • no mais, na improcedência da acção, absolvo o réu do demais peticionado.

Declaro a improcedência do incidente de litigância de má fé, dele absolvendo a autora.

Custas pela autora.”.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida, imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 753), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: I Erro notório existe, quando usando um processo natural e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando...

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