Acórdão nº 423/14.8TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução15 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Proc.423/14.8TBCBR I - Relatório 1. S (…), residente em ..., demandou C (…), residente em Coimbra, por si e na qualidade de legal representante/liquidatário da sociedade por quotas S (…), LDA, com sede em Coimbra, através de acção declarativa, pedindo seja o réu condenado a indemnizá-la nos valores abaixo descriminados, acrescendo juros à taxa legal até efectivo pagamento: 1) na quantia de 12.750 €, correspondente a lucro cessante quanto aos vencimentos a receber até Maio de 2015; 2) na quantia de 4.275,76 €, a título de remunerações devidas e não pagas pela sociedade liquidada; 3) na quantia de 6.709,50 € correspondente ao montante subsidiado pelo IEFP e por ela injectado na sociedade; 4) na quantia de 20.000 € a título de danos morais pela privação do seu posto de trabalho e projecto criativo ; 5) na quantia de 10.000,00 € a título de danos morais pelas ofensas ao seu bom nome e reputação; 6) na devolução dos bens identificados no doc nº 6 da p.i. - sua propriedade e que ficaram no activo da sociedade, aquando do inopinado encerramento levado a cabo pelo réu.

Alegou, em suma, que ambos constituíram uma empresa, e no âmbito de projecto de criação do próprio emprego, com aprovação do IEFP, constando ela como sócia maioritária, gerente e trabalhadora, e o réu sócio minoritário, sem qualquer função, e sendo atribuída à sociedade um subsídio referente ao valor de prestações de desemprego a si atribuídas. Tendo para a sua instalação, em local pertença do R, e que este arrendou à sociedade, e de modo a obviar a maior dispêndio, cedido materiais seus a tal sociedade que possuía da anterior actividade, conforme doc. 6. Surgiram desavenças no casal, com cessação de relação amorosa e saída da autora de casa, e consequente hostilidade e agressões psicológicas no local de trabalho. O réu desencadeou actos para afastamento da autora da empresa, impondo dois aumentos de capital, com recurso a pressão psicológica e ameaças, por forma a tornar-se sócio maioritário da sociedade e decidir o futuro como lhe aprouvesse. Interpelou a sociedade para pagamento de rendas apesar de parte delas estarem pagas por via desse aumento. Depois em frente de clientes e fornecedores disse “esta empresa vai fechar, é a ultima vez que entras aqui”. No dia seguinte deparou-se com a fechadura da loja mudada, sendo por ele impedida de entrar, e desde então não podendo exercer actividade como gerente e trabalhadora, não lhe prestando o réu contas, nem comunicando os fundamentos da dissolução ou liquidação da sociedade. Recebeu convocatória para assembleia de sócios a ter lugar para deliberar sua própria destituição e participação criminal, bem como com a finalidade de dissolução da sociedade, aprovação de contas e nomeação de liquidatário, vindo o réu a declarar em acta que teria de ser dissolvida a sociedade por a actividade não ser suficientemente lucrativa para fazer face a despesas, responsabilidades bancárias e custos de exploração. Nesse mesmo dia constituiu nova sociedade com o filho, detendo 98% do capital, com a mesma sede e objecto, ainda sem aquela estar liquidada e utilizando o imobilizado e produtos daquela, e sem, até à propositura da acção, ter prestado contas da liquidação, levada a cabo contra vontade expressa da autora. E assim ficou autora impedida de trabalhar, e sem direito a subsídio de desemprego, face ao compromisso assumido de manter seu posto de trabalho por 3 anos, deixou de receber as remunerações e subsídio de Férias e de Natal expectável durante esse período, nem recebeu remunerações vencidas, subsídio de Natal e Férias. Está obrigada a devolver à S. Social o montante subsidiado pela mesma. Vive de ajuda de familiares e amigos e bem assim de instituições de solidariedade e teve de vender veículo e tem filha menor a cargo, passando humilhação extrema. Sofreu grave depressão, crises de ansiedade, dependência de medicação, sendo medicada e acompanhada em psiquiatria.

O réu contestou, e, em síntese, refutou qualquer responsabilidade na condição clínica da autora, pois já era anterior à relação havida entre ambos. Que a quantia recebida do IEFP foi usada não para a sociedade mas para a A. pagar a sua quota no capital social da sociedade, tendo ele pago a sua parte do seu bolso. Que a sociedade estava falida e passava cheques sem cobertura, assinados pela autora, vendo-se obrigado a pagar dívidas com dinheiro próprio de outra sociedade que detém e a nova sociedade que constituiu contraiu empréstimo para pagar divida contraída pela empresa junto da CCAM. A sociedade só não foi dissolvida porque tem dívidas e não tem dinheiro para as pagar. Ele e a sociedade é que são credores da A. Além do mais, a autora retirou produtos e apoderou-se de vendas efectuadas e de dinheiros recebidos e levou da sociedade para outro estabelecimento onde passou a trabalhar uma determinada marca de produtos utilizados. A A. era a gerente de facto e dava formação, prestando serviços de cosmética, mas o dinheiro decorrente não entrou em caixa. Apesar de a A. sair de casa, não houve desavenças, continuando ambos a almoçar quase todos os dias. O reforço de capital destinou-se a pagar algumas das dívidas decorrentes da má gestão da A. e não para as rendas da loja. A sociedade foi à ruina porque os produtos encomendados entravam na loja e eram facturados, tinham de ser pagos e não constavam da caixa nem do inventário. Havia serviços prestados e funções exercidas na loja pela A., mas nunca entrou com um cêntimo. Usava produtos que abria e tornava a fechar e depois não tinham venda. A A. é que engendrou a saída da sociedade, levando marcas, telefones com os contactos da clientela e dinheiro de dois dias de caixa, com o argumento de que a loja já não abria. A constituição da nova sociedade visou alienar os poucos produtos que restavam, pois a A. depois de assinar a acta de dissolução, recusou dar forma legal, tendo aqueles validade limitada. Deduziu reconvenção, onde peticionou a condenação da A. a indemnizar a sociedade em dissolução e o réu … na quantia total de 30.469,95 €, e condenada a indemnizar ainda o ora R. na quantia de 10.000 € a título de danos morais, com juros legais desde a notificação. Há bens da relação anexa em falta na loja e na contabilidade, tendo a A. ainda tentado eliminar do computador muitos destes produtos, ainda restando folhas representativas, tendo o técnico informático conseguido resgatar ou extrair tais eliminações. A A. com a sua conduta levou à acumulação de um prejuízo de 10.251,68 € e 20.218,27 €, vendo-se o réu obrigado a dispor do seu dinheiro pessoal para fazer face a tais dívidas e a contrair empréstimos em seu nome e no de outra sociedade que detém, sendo bombardeado por bancos, fornecedores sobre a falta ou atraso de pagamentos, pedir moratórias e dinheiro, factos geradores de stress, sofrimento e angústia. Conclui pela improcedência da pretensão e consequente absolvição do pedido, com as legais consequências.

A A. replicou, refutando as imputações a si feitas e sublinhando que o R. sempre teve acesso à loja, era presença constante na mesma, fazendo o caixa e efectuando de seguida os depósitos. Que a empresa tinha 3 anos para recuperar o investimento. As acções de formação destinavam-se a promover a loja e seus produtos e resultavam na venda facturada de produtos necessários à formação das clientes, acrescendo o valor retido à cliente e entregue directamente às formadoras contratadas, sendo elas que emitiam os certificados directamente à formandas. Os kits e materiais usados na formação eram vendidos pela sociedade mediante factura/venda a dinheiro, sendo a maior parte facturado a consumidor final, entrando em caixa o dinheiro das formações. Os produtos que abria eram “tester” para mostrar às clientes. Ademais cerca de 17 360 € de produtos figuram no balancete na conta a receber, como tendo sido vendidos à BRU, sociedade fundada pelo R. antes de liquidar a sociedade de ambos. O R. adquiriu as instalações da loja e sede da sociedade e da sociedade subsequente com recurso a crédito, em nome pessoal, pelo que só a ele cabe o pagamento da dívida inerente. Que o alegado pagamento de fornecedores e outras dívidas está contemplado com o aumento de capital, no montante de 13 608 €, estando compensado, não podendo de novo ser exigido. De acordo com o balancete, ainda existem quotas não liberadas de C (…). A representação exclusiva da marca Peggy Sage acabou por ser transmitida à empresa P (…), da qual a A. não é sócia nem gerente, apesar de o R. ter encetado negociações para que se transferisse para a nova sociedade que criou.

* A final foi proferida sentença que julgando parcialmente procedente a acção e reconvenção decidiu: 1. Condenar o R. no pagamento à A. da quantia de remunerações devidas e não pagas pela sociedade em liquidação no valor de 2.250 €, acrescida de 5.000 € a título de danos morais pela privação do seu posto de trabalho e projecto criativo, e na quantia de 1.000 € a título de danos morais pelas ofensas ao seu bom nome e reputação, num total de 8.250 €, do mais o absolvendo; 2. Condenar o R. na devolução à A. dos bens da sua propriedade e que ficaram no activo da sociedade, aquando do inopinado encerramento levado a cabo pelo R.; 3. Condenar a A. reconvinda, para efeitos de conta de liquidação, no pagamento à sociedade da quantia de 3.000 €, do mais a absolvendo; * 2. A A. recorreu, concluindo que: (…) 3. O R. também recorreu subordinadamente, tendo formulado as seguintes conclusões: (…) 4. Inexistem contra-alegações de ambas as partes.

II – Factos Provados a. Por Procedimento Simplificado Empresa na Hora, em 31 de Maio de 2012, S (…) e C (…), constituíram a sociedade por quotas denominada “S (…) LDA, com o número de pessoa colectiva (…).

  1. A referida sociedade tinha inicialmente o capital social de 11.804,00 €, distribuído por duas quotas, uma quota no valor nominal de 6.804,00 € pertencente a S (…) e uma quota no valor nominal de 5.000,00 € pertencente a C (…) c. A sede social do...

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