Acórdão nº 444/06.4TBCNT-AC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | CATARINA GONÇALVES |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
Nos autos de insolvência referentes a F (…) S.A.
, o Sr. Administrador da Insolvência veio aos autos – em 18/10/2017 – informar ter procedido à venda do estabelecimento da Insolvente, juntando escritura pública celebrada em 17/06/2017, por via da qual vendeu à N (…) – S.A. nove imóveis, bem como o estabelecimento industrial sito (…), x (...) , em actividade e composto pela universalidade do seu acervo imobilizado corpóreo e incorpóreo, bem como pelos trabalhadores. Tal venda foi efectuada pelo preço global de 660.042,00€, ficando estabelecido que a adquirente pagaria, em prestações, o valor de 100.000,00€, sendo que a parte restante do preço seria compensada pela assunção por parte da adquirente de todas as responsabilidade e direitos dos trabalhadores.
Mediante requerimento apresentado em 20/04/2018, a credora P (…) S.A., alegando ter tomado conhecimento do teor do contrato de compra e venda pela notificação das contas apresentadas pelo Sr. Administrador que lhe foi efectuada em 09/04/2018, veio arguir a nulidade da venda dos bens imóveis por violação do disposto nos arts. 164.º, n.ºs 2 e 3, e 161.º, n.º s 1 e 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, e consequente nulidade de todos os actos subsequentemente relacionados com a liquidação dos imóveis.
Alegou para tanto, e em resumo: que é credora da Insolvente pelo valor de 1.217.520,20€, estando o seu crédito garantido por hipoteca constituída sobre os imóveis que identifica e que foram vendidos e relativamente aos quais o seu crédito veio a ser graduado para ser pago após os créditos dos trabalhadores; que, não obstante ser sido ouvida sobre propostas de venda anteriormente apresentadas – designadamente pela N (…) – às quais se opôs, não mais teve conhecimento de qualquer outra diligência, tendo vindo a tomar conhecimento, em momento posterior, da venda efectuada; que, em momento anterior, havia aceitado a venda pelo preço de €550.035,00 no pressuposto de que existia a situação de potencial conflito com a Massa Insolvente de M (…) relativamente à propriedade dos bens imóveis com as descrições 01(...) e 11(...) , do concelho da x (...) e caso aquele preço fosse depositado na sua totalidade a favor da massa insolvente; que, sem que a Requerente tivesse sido informada, a venda veio a ser efectuada em condições diferentes daquelas que havia aceitado e com condições de pagamento relativamente às quais havia manifestado expressamente a sua oposição, o que configura omissão de formalidade imposta por lei com relevância para a decisão e que determina nulidade; que, além do mais, a alienação do estabelecimento comercial da sociedade insolvente, onde se incluem os bens imóveis hipotecados, constitui um acto jurídico de especial relevo para o ora processo de insolvência que, como tal, carecia de consentimento prévio da comissão de credores e não resulta dos autos que tal consentimento tenha sido prestado.
A N (…) S.A, respondeu, dizendo, em resumo, que as condições negociadas e acordadas foram comunicadas à P (…), na sua dupla qualidade de credora e de membro da comissão de credores; que a P (…) sempre teve conhecimento das circunstâncias do negócio e nunca declarou ser sua intenção accionar o mecanismo previsto no nº 3 do artigo 164º do CIRE; que sempre esteve de boa-fé, gozando de uma legítima expectativa de que os seus direitos se encontram legalmente protegidos e que, além do mais, está precludido o prazo para arguição de qualquer (eventual) nulidade.
O I (…) veio informar que, apesar de ter sido notificado pelo Sr. Administrador sobre o consentimento a prestar, enquanto membro da comissão de credores, relativamente à venda do bem imóvel, respondeu nos termos do documento que anexa; que essa resposta pressupunha um esclarecimento prévio que nunca foi dado e que, por essa razão, não deu o seu consentimento prévio à proposta de aquisição do estabelecimento.
O Sr. Administrador veio pronunciar-se, dizendo: que a venda foi concretizada, respeitando o disposto no artigo 164º e sem que a P (…)tenha manifestado qualquer vontade no cumprimento do n.º 3 do art. 164.º e que deu cumprimento ao disposto no art. 161.º do mesmo diploma, tendo a comissão de credores concordado com o apresentado, por silêncio ou concordância.
Na sequência desses factos, foi proferida decisão que, julgando procedente a invocada nulidade, declarou nula a venda em questão.
Inconformada com essa decisão, a Massa Insolvente de F (…) S.A.
veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) A P (…), S.A. apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: A N (…) S.A.
veio também interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) A P (…), S.A.
apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: (…) ///// II.
Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações das Apelantes – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: • Saber se é (ou não) tempestiva a arguição de nulidade; • Saber se foram omitidas as formalidades impostas pelos artigos 161º e 164º do CIRE – o que se reconduz a saber se a venda foi realizada sem o consentimento da comissão de credores e sem que a credora com garantia real tivesse sido informada da venda projectada – e se essa omissão corresponde a nulidade processual que deva determinar a anulação da venda; • Analisar, se tal se revelar necessário, a circunstância de a venda efectuada ter sido negociada e concretizada em estreita ligação com a venda de um outro imóvel integrado numa outra massa insolvente, bem como a circunstância de a adquirente (N (…)) ter actuado de boa-fé e ter efectuado investimentos com base na expectativa criada com a concretização do negócio cuja anulação lhe causará prejuízos, apurando a eventual relevância dessas circunstâncias para efeitos de verificação da irregularidade processual e consequente anulação da venda.
///// III.
Na 1ª instância, foram considerados os seguintes factos, aditando-se a negrito outros factos que resultam dos documentos juntos aos autos: 1. F (…), S.A. foi declarada insolvente a 31 de Março de 2006.
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O Banco (…), S.A. apresentou a sua reclamação de créditos pelo montante global de €1.217.520,30.
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Para garantia do bom pagamento e liquidação de todas e quaisquer obrigações e/ou responsabilidades assumidas e/ou a assumir pela sociedade F (…) perante o Banco, até ao limite de €1.080.000,00, acrescido dos respectivos juros e despesas, até ao montante máximo de €1.439.100,00, foi constituída uma hipoteca voluntária sobre os seguintes bens imóveis: - Sete prédios rústicos, situados em y(...) , freguesia e concelho de x (...) , inscritos na respectiva matriz sob os artigos 412.º, 411.º, 415.º, 420.º, 416.º, 417.º e 419.º e descrito na Conservatória de Registo Predial da x (...) sob os n.ºs 2001, 793, 795,866, 1864, 1967 e 2000, respectivamente; - Prédio urbano, composto de terreno destinado a aparcamento situado em Estrada Nacional Número 1, em y(...) , da freguesia e concelho de x (...) , inscrito na matriz sob o artigo 00(...) .º e descrito na Conservatória de Registo Predial da x (...) sob o n.º 11(...) .
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Os referidos bens imóveis foram apreendidos para a massa insolvente.
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O crédito reclamado pelo Banco (…), S.A. foi reconhecido pelo administrador da insolvência nos termos reclamados e garantido por hipoteca sobre os referidos bens imóveis.
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A 15 de Dezembro de 2006, os credores da insolvência deliberaram a aprovação do plano de insolvência elaborado e apresentado pelo Administrador de Insolvência.
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A 15 de Março de 2007 foi proferida sentença de homologação do plano de insolvência, a qual foi objecto de recurso de apelação pelas Credoras (…) 8. A 6 de Novembro de 2012, foi proferido acórdão que revogou a sentença de homologação do plano de insolvência.
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A 9 de Julho de 2013, foi determinado o prosseguimento do processo para liquidação do activo, com eventual alienação do estabelecimento comercial da insolvente.
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A 28 de Outubro de 2013, a P (…), S.A. requereu a sua habilitação como cessionária, em substituição do Banco (…), S.A., tendo sido proferida sentença de habilitação em 29 de Novembro de 2013.
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No dia 20 de Dezembro de 2013, a P (…) S.A., enquanto credora hipotecária, bem como os membros da comissão de credores, foram notificados pelo Exmo. Senhor Administrador de Insolvência de uma proposta de aquisição do todo o activo da insolvente pela sociedade L (…)t, Lda. pelo montante de €840.000,00.
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A 15 de Janeiro de 2014 a P (…) opôs-se à aceitação desta proposta.
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A 20 de Maio de 2014, a credora P (…), S.A., bem como os membros da comissão de credores, tiveram conhecimento pelo Sr. Administrador da insolvência da existência de uma potencial situação conflituante relativamente à propriedade de um bem imóvel descrito na CRP da x (...) sob o n.º 01(...) , registado em nome de (…), o qual confronta o bem imóvel descrito na CRP da x (...) sob o n.º 11(...) .
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Em resposta datada de 9 de Junho de 2014, a P (…)S.A. informou o Sr. Administrador que era contra a transmissão da propriedade do imóvel descrito na CRP da x (...) sob o n.º 01(...) para a massa insolvente da F (…) Lda.
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A 24 de Novembro de 2015, a Credora P (…), S.A. foi notificada de uma proposta de aquisição do estabelecimento comercial da sociedade insolvente, bem assim como do bem imóvel pertencente a (…), pelo montante global de €550.000,00.
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A 4 de Dezembro de 2015, a credora P (…), S.A. informou o Senhor Administrador de Insolvência que aceitava a proposta de €550.000,00 apresentada pela sociedade comercial N (…) S.A., desde que o montante de €250.000,00 fosse entregue no processo de insolvência de (…) 17. A 4 de Fevereiro de 2016, a credora P (…) S.A., bem como os membros da comissão de credores, foram notificados do anúncio com o valor mínimo de venda do estabelecimento industrial da F (…) .A., pelo valor base de €647.100,00, onde se inclui os bens imóveis...
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