Acórdão nº 1197/05.9 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2007

Data13 Novembro 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I- RELATÓRIO Por despacho do Sr. Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas, datado de 9 de Julho de 2002, publicado no DR n.º 173, de 29 de Julho de 2002, II série, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação dos bens imóveis e direitos a ele inerentes, necessários à execução da obra IP 2 – lanço Guarda –Belmonte – sublanço Guarda – Benespera – e reformulação do nó de acesso ao parque industrial da Guarda.

Entre esses imóveis está incluída a parcela de terreno identificada com o nº 0.04-A, com área de 8.599 m2, a destacar do prédio situado na freguesia da Sé - Guarda, concelho da Guarda, inscrito na matriz predial rústica, sob o artigo 1772, na Repartição de Finanças da Guarda, descrito na Conservatória do Registo Predial do mesmo concelho, sob o nº 1830/19921027 e inscrito em nome da expropriada, A Predial da Corredoura Lda, pela inscrição G 1.

Não foi possível a expropriação amigável, pelo que a entidade expropriante, E.P. - Estradas de Portugal E.P.E. (que sucedeu ao Instituto das Estradas de Portugal), organizou o respectivo processo e enviou-o ao Tribunal Judicial da Guarda, onde foi autuado como expropriação litigiosa.

O Mº Juiz adjudicou à expropriante a propriedade sobre a parcela em questão.

A expropriada recorreu da decisão arbitral que fixou a indemnização em €13.800,00, pedindo que se fixe o valor total da indemnização devida em €150.000,00.

A expropriante respondeu e apresentou recurso subordinado, sustentando que deverá ser fixado como justo valor a indemnizar o montante de €8.984,98.

Proferiu-se despacho a admitir os recursos da expropriada e expropriante.

Nomeados os peritos, procedeu-se à avaliação, tendo sido apresentados dois laudos, com as respectivas respostas aos quesitos, sendo: - um subscrito pelos peritos designados pelo tribunal e pela expropriante, que considerou dever fixar-se a indemnização de €27.603,00, valor que inclui o montante de € 517 relativo a benfeitorias; - outro pelo perito designado pela expropriada, que considerou dever fixar-se a indemnização de €413.568,00.

A expropriada apresentou reclamação quanto às respostas.

Foram apresentadas alegações pela expropriada, que procedeu ainda à ampliação do pedido, requerendo que a indemnização seja fixada em valor nunca inferior a €413.568,00, “actualizado nos termos do art. 24º C.Exp.” e pela expropriante.

Proferiu-se sentença, que fixou a indemnização devida pela expropriação da parcela aludida “em 27.603€ (vinte sete mil seiscentos e três euros) (o valor da indemnização é actualizado pelo índice de preços no consumidor, fornecido pelo I.N.E., a partir de 9 de Julho de 2002 - data da declaração de utilidade pública (art ° 24.° do Cód. Das Exprop.) - e até efectivo pagamento)”.

A expropriada recorreu, pedindo a revogação da sentença e que seja fixada a indemnização de €413.568,00, actualizada “nos termos do art. 24º do C. Exp.”.

Apresenta alegações, formulando, em síntese, as seguintes conclusões: 2ª e 3ª - A sentença apenas apurou alguns dos factos que devem ser ter-se como provados, mas, para além deles, foram alegados outros, descritos sob o nº III, que devem ser declarados assentes pela 2ª instância; 4ª e 5ª - A grande disparidade de valores de avaliação no processo resulta substancialmente da diferente classificação da parcela expropriada, por parte dos Srs. Peritos, uma vez que os peritos do tribunal e da expropriante consideram a parcela expropriada como solo “apto para outros fins” e o perito da expropriada como solo “apto para construção”; 6ª e 7ª - O laudo conjunto apresentado pelos Srs. Peritos designados pelo Tribunal e pela expropriada, em que se baseou a sentença recorrida, fixou a indemnização com base no entendimento de que o solo não é apto para construção, mas para outros fins, sendo que os Srs. Peritos não forneceram ao tribunal – apesar do que este lhe ordenou –, cálculos auxiliares para a decisão judicial, pelo que o tribunal não tem, neste campo, qualquer ajuda de tais peritos; 8ª - A sentença recorrida considerou o solo como “apto para outros fins” só com base nos factos dados como assentes e sem atender aos demais invocados pela expropriada e que também devem ter-se como provados, fixando o valor por adesão apenas aos factores de cálculo apresentados dos peritos do tribunal e expropriante; 11ª - No entanto, estão preenchidos todos os requisitos para a classificação da parcela expropriada como terreno “apto para construção”, em ordem a que seja avaliado como tal, sendo que o facto de um terreno estar incluído na Reserva Ecológica Nacional (REN), porventura como tal considerado também num PDM, como é o caso, não lhe retira a natureza de terreno apto para construção se nele convergirem alguns dos essenciais requisitos para o solo dessa natureza; 12ª a 14ª - Perante a manifesta inconstitucionalidade do art° 24°-5 do CExp. de 91, o legislador do CExp. de 99 suprimiu essa norma de modo que passaram a existir duas normas fundamentais: uma, a do art. 25º - 3, manteve a do Cód. de 91 (então art° 24°- 4 de 91); outra inovou em relação ao Cód. de 91, a do nº12 do art° 26°, que está integrada também num artigo que se reporta ao “cálculo do valor do solo apto para construção” e contém um conjunto de princípios que servem de orientadores para esse cálculo; 15ª - No caso concreto, a definição da área como REN e o PDM são posteriores à titularidade da propriedade por parte da expropriada; 16ª - Deste modo, se ainda hoje se pretender que, por força da classificação em zona de REN no PDM da Guarda da Parcela 0.04A, agora expropriada, deve esta ser classificada dentro da categoria de «solo para outros fins», que não o de «para construção», isso resultaria de uma interpretação do art° 25°-3 CExp. 99 manifestamente inconstitucional, até porque equivaleria a atribuir-se-lhe, por si só, uma interpretação equivalente à manutenção da revogada norma do art° 24°-5 do CExp. de 91; 17ª - Ou isso resultaria de uma interpretação restritiva do art° 26°-12 CExp. 99, ao não considerar equivalente, ou equiparado a «zona verde e de lazer» a que provém da sua classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN, quando a razão de ser da norma é exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação também inconstitucional daquela norma; 18ª - Ou isso resultaria de uma interpretação restritiva do mesmo art°26°-12 CExp. 99, ao não admitir que nela se contém a referência a solos (ora expropriados), que, estando incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser retirados, por natureza e para o fim da expropriação, para a construção de uma infra-estrutura ou equipamento público como é uma estrada, tal como o é a VICEG – Via de Cintura Externa da Guarda, assim sendo também feita uma interpretação inconstitucional daquela norma; 19ª - E, em qualquer dos casos, ocorreria violação dos princípios do direito de propriedade, da justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade; 21ª - O que releva é, precisamente, que o expropriante teve de obter, sempre, a desclassificação do terreno da REN para nele poder construir aquilo que nele constrói, no caso uma estrada; 22ª - Assim não entendendo, a sentença deu aos arts. 25º, nº3 e 26º - 12 uma interpretação inconstitucional, em violação dos princípios acima referidos; 24º a 28º - Sem prescindir, a simples comparação entre as plantas das 1ª e 2ª expropriação permite aquilatar que a parcela ora expropriada é contígua à 1ª, existindo ambas na mesma Quinta da Rasa, sendo o fim das expropriações o mesmo; 30ª - Só pelo facto de ter sido previamente destacada a primitiva parcela 0,04 (soma das 0,04 e da 0,04S) é que a parcela agora expropriada não confina a Norte com a mesma EM 351, mas sim a Norte com o IP2, entretanto construído sobre a primitiva parcela 0,04; 33ª - Não pode impor-se à expropriada o excessivo e injusto ónus de ver separar o seu terreno em várias Parcelas para o efeito de ser vítima de variação de valores: na primeira obtendo a avaliação como “solo apto para construção”, na segunda, actual, a avaliação como “solo apto para outros fins”; 34ª a 37ª - Obter uma avaliação e fixação de indemnização pela expropriação que lhe é favorável, através de facto que ela mesma e só ela criou – não procedeu à expropriação de parte da Quinta da expropriada de uma só vez, fazendo recair sobre a expropriada as consequências da imprevisão, do lapso ou de mera casualidade na construção de uma infra-estrutura –, seria também, não só “venire contra factum proprium”, como agir com verdadeiro abuso de direito e com locupletamento à custa alheia; 38ª e 39ª - Deste modo, o solo só pode ser avaliado como “apto para construção”, verificando-se todos os índices do art. 25º, nº1, a) e nº2 do C Exp; 42ª e 43ª - Quer a decisão arbitral, quer o laudo conjunto, a que a sentença aderiu, não contêm contas definitivas para a avaliação da parcela como “solo apto para construção”, pelo que o tribunal só tem como credível o laudo do perito da expropriada, aí encontrando o valor correcto da indemnização; 46ª - Assim não decidindo, a sentença violou os arts. 1º, 25º-3, 26º-12 do C.Exp.; 47ª - E os princípios consagrados no art. 62º- 1 e 2, 13º e 266º da CRP; 48ª - E os arts. 6º e 6º A do C.P.Adm. e 334º do C.Civ., “no uso interpretativo dos cit. Arts. 1º, 25º -3 e 26º-12 do C. Exp.; 49ª - Com o inerente desrespeito do art, 268º da CRP-2 “e o imanente princípio constitucional da boa fé da Administração”; A expropriante não apresentou alegações.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTOS DE FACTO O tribunal de 1ª instância considerou assente a seguinte factualidade: 1 - A utilidade pública da expropriação da parcela foi reconhecida por despacho do Sr. Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas, de 9 de Julho de 2002, publicado no D.R. nº 173, Série II, de 29 de Julho de 2002, que reconheceu a urgência da expropriação e a autorização da posse administrativa imediata; 2 - Em 20/08/2002, realizou-se a vistoria...

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