Acórdão nº 3355/03.1TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2007
Magistrado Responsável | SILVA FREITAS |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra Autora: A...
, com sede em Y...
, Leiria.
Réus: - B...
, casado, residente na Rua X...
; - C...
, solteira, residente na Rua X...
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**** A Autora, sob a alegação de que o Réu lhe não pagou o preço de um veículo automóvel que lhe vendeu e que a Ré, visando diminuir a garantia patrimonial do crédito do Autor, colaborou no registo da aquisição do veículo a seu favor, pediu a condenação dos Réus no pagamento de 24.309, 02 Euros, acrescidos de juros de mora à taxa de 10% ao ano desde a citação até integral pagamento.
Os Réus contestaram, concluindo pela improcedênc:ia da acção.
Para tanto, impugnaram a data da realização da venda, o preço da venda e os termos do pagamento do preço.
*** Após a prolação do despacho saneador, a instância manteve-se válida e regular.
*** Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida a sentença final em que a acção foi julgada improcedente e, em consequência, os Réus foram absolvidos do pedido.
**** A Autora, não se conformando com a sentença, interpôs recurso.
O recurso foi devidamente admitido como recurso de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
**** Em doutas alegações que foram apresentadas, a apelante formulou as seguintes Conclusões: A. Está provado que entre a recorrente e o primeiro recorrido foi celebrado um contrato de compra e venda de uma viatura ligeira de passageiros de marca Mercedes Benz, modelo C 250, Turbo Diesel, com a matrícula 75-31-NH.
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Está provado que a propriedade do referido automóvel encontra-se registada a favor da segunda Ré desde 28 de Agosto de 2002.
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O primeiro Réu pagou parte do preço acordado em dinheiro à Autora aquando do levantamento da viatura.
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Autora e primeiro Réu acordaram que o restante do preço da viatura seria substituído pela entrega de um pinhal e de um tractor.
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A tal acordo corresponde a figura da dação em cumprimento, nos termos do artigo 837.° do Código Civil.
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Ao assim não entender, o Mmo. Juiz a quo errou ao interpretar o negócio jurídico celebrado entre Autora e primeiro Réu, esquecendo-se de aplicar o princípio da impressão do destinatário consagrado nos artigos 236.° a 238.° do Código Civil, de acordo com o qual, na interpretação dos contratos, prevalecerá, em regra, a vontade real do declarante, sempre que for conhecida do declaratário ou, na falta desse conhecimento, aquele que seria apreendido por um destinatário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante (cf, por ex., Ac. do S.T.J., de 14/1/97, CJ. ano V, tomo 1, pág. 46, de 22/1/97, C.J. ano V, tomo 1, pág. 258).
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A obrigação por parte do primeiro Réu não se encontra extinta.
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Nos termos do artigo 798.° do Código Civil, o primeiro Réu é responsável pelo prejuízo que causou à Autora pelo não cumprimento da prestação (entrega do pinhal) a que estava obrigado.
I. Tal prejuízo mais não é do que o montante do preço do veículo que a Autora vendeu ao primeiro Réu, acrescido de juros legais para as operações comerciais desde a data da venda e entrega do referido veículo.
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Ao colaborar e participar na trama urdida pelo primeiro Réu, a segunda Ré violou a disposição legal que dispõe que pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor — artigo 601.º do Código Civil.
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Constituindo-se assim na obrigação de indemnizar a Autora pelos prejuízos causados — artigo 483.°, n.° 1, do Código Civil.
L. Prejuízo esse que se traduz, precisamente, no montante do preço da viatura.
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Pelo que, assiste à recorrente o direito de exigir o pagamento do preço do veículo dos autos de ambos os Réus, acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa legal para as operações comerciais, desde a citação e até efectivo e integral pagamento, tal como peticionado.
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Foram violados os artigos 236.° a 238.°; 483.°, n.° 1; 601.°; 798.°; 837.° e 874.° do Código Civil.
Nestes termos, deverão V. Exas. revogar a sentença recorrida, com o que farão a já costumada Justiça.
**** Em doutas contra-alegações que apresentaram, os apelados formularam as seguintes Conclusões:
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A A. não logrou provar qualquer facto por si alegado, designadamente o preço de venda do veículo e a responsabilidade pelo incumprimento da obrigação de pagamento por qualquer dos apelados pelo que a sentença não poderia condenar qualquer dos RR. no valor peticionado.
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Pelo contrário ficou provado que nenhum interesse mostrou até hoje no recebimento do pinhal e do tractor.
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A Apelante não pediu a condenação dos apelados na entrega do pinhal nem do tractor nem alegou ou logrou provar que tal entrega é impossível de realizar por culpa imputável aos apelados, do que resulta que a sentença não poderia condenar os RR. em tal entrega (art. 661.°, n.° 1, do CPC).
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Nenhuma culpa ficou demonstrada por parte dos RR., designadamente da Ré C....
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Pelo que a sentença só poderia decidir como decidiu absolvendo os RR. do pedido, o que faz com que o recurso tenha de ser declarado improcedente. Como é de Justiça.
**** Foram colhidos os vistos dos Ex.mos Juízes-Adjuntos, pelo que nos cumpre decidir.
**** Vejamos, em primeiro lugar, a matéria de facto que foi julgada provada peio Tribunal de 1.ª Instância: Matéria de Facto Assente:
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A Autora dedica-se ao comércio de viaturas automóveis, novas e usadas.
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No exercício da sua actividade, a Autora vendeu ao lº Réu uma viatura ligeira de passageiros, da marca Mercedes-Benz, modelo C 250, Turbo Diesel, de matrícula 75-31-NH.
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A propriedade do referido veículo automóvel encontra-se registada desde 28 de Agosto de 2002, a favor da 2ª Ré.
**** Respostas aos artigos da Base Instrutória: O negócio a que se alude em B) foi realizado em data não apurada de 2002, mas não depois de 14 de Junho desse ano (resposta ao quesito 1.º); O 1° Réu propôs à Autora pagar parte do preço do veículo através da entrega de um pinhal sito em Cerca, Santa Catarina da Serra (resposta ao quesito 3.º); Por isso, o 1º Réu e o Sr. A..., agindo em representação da Ré, deslocaram-se ao pinhal referido na resposta ao quesito 3º (resposta ao quesito 4.º); Mais acordaram Autora e 1º Réu que a escritura pública seria efectuada no prazo máximo de trinta dias (resposta ao quesito 5.º); Para pagamento do preço do veículo automóvel, foi acordada a entrega de um pinhal sito em Cereal, Santa Catarina da Serra, de um tractor e da quantia de 9.477, 16 Euros (resposta ao quesito 11. °); O 1º Réu entregou à Autora, no mesmo dia em que esta lhe entregou a viatura, a quantia de 9.477, 16 Euros (resposta ao quesito 12.º) Até hoje a Autora nunca demonstrou qualquer interesse ou disponibilidade para fazer a referida escritura pública (resposta ao quesito 17. º) **** Aos demais artigos da Base Instrutória foram dadas as seguintes respostas: Quesito 2.°: …pelo preço de 22.446, 00 €? Resposta: Não provado.
Quesito 6.°: O 1° Réu declarou então que a Autora poderia tomar imediatamente conta do terreno? Resposta: Não provado.
Quesito 7.°: Tendo de imediato, a Autora entregue a viatura ao 1º Réu, bem como os respectivos documentos — livrete e declaração de venda? Resposta: Não provado.
Quesito 8.°: Na semana seguinte, a Autora contratou os serviços de um homem com tractor para limpar o mato existente no pinhal em questão e quando tal trabalhador se encontrava a limpar o pinhal, apareceu alguém intitulando-se o verdadeiro dono do mesmo e expulsou-o dali para fora? Resposta: Não provado.
Quesito 9.°: Logo que recebeu da Autora os documentos da viatura, o 1° Réu dirigiu-se à Conservatória do Registo Automóvel e com a colaboração da 2a Ré, sua filha, registou a aquisição da propriedade do veículo a favor desta? Resposta: Não provado.
Quesito l0.°: O negócio de compra e venda da viatura em apreço nos autos, foi realizado no dia 4 de Abril de 2002? Resposta: Não provado.
Quesito 13.°: O terreno que o 1º Réu acordou dar em pagamento à Autora é 1/2 de um prédio rústico...
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