Acórdão nº 981/2002.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelHÉLDER ROQUE
Data da Resolução10 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: A...

, sociedade dinamarquesa, com sede em X..., Dinamarca, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra B...

, com sede na Rua Y... , Leiria, e C...

, com sede na Avenida Z..., pedindo que, na sua procedência, a ré B... seja condenada a pagar à autora a quantia de 427 502,12 euros, acrescida de juros de mora, desde a citação até integral cumprimento, alegando, para o efeito e, e síntese, que funcionários desta ré danificaram, por negligência, as hélices de uma turbina eólica, donde lhe advieram prejuízos, de natureza patrimonial e não patrimonial, cujo quantitativo ascende ao montante do pedido formulado.

Na sua contestação, a ré B... concluiu pela improcedência da acção, alegando, para tanto, que a culpa pelos danos causados nas hélices das turbinas foi, exclusivamente, dos funcionários da autora, enquanto que, em via reconvencional, pediu a condenação desta, no pagamento da quantia de 70 465,15 euros, acrescida de juros de mora, em virtude dos estragos ocasionados na grua e da não satisfação pela autora de facturas respeitantes a outros serviços posteriores.

Por seu turno, a ré “C...”, na sua contestação, em sede de impugnação, alegou que a culpa pelos danos causados nas hélices da turbina foi, exclusivamente, dos funcionários da autora, enquanto que, em via de defesa por excepção, invocou que os direitos que a autora pretende fazer valer contra a ré se extinguiram por caducidade.

Na réplica, a autora defende que o pedido reconvencional deve ser julgado improcedente, por se verificarem os pressupostos da excepção de não cumprimento do contrato, concluindo, igualmente, pela não verificação das excepções invocadas.

Finalmente, na tréplica, a ré B... termina como na contestação-reconvenção, defendendo ainda que a petição inicial deve ser considerada, totalmente, improcedente por não provada, bem como a contestação da autora ao pedido reconvencional por si formulado.

A sentença julgou a acção, parcialmente procedente, e, em consequência, condenou a ré B... a pagar à autora a quantia de €35750,20 (trinta e cinco mil setecentos e cinquenta euros e vinte cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efectivo pagamento, e ainda o que se fixar, em sede de liquidação, pelos custos suportados com a aquisição das hélices e com o pagamento aos funcionários que as substituíram, absolvendo-a, porém, da restante parte do pedido.

Por outro lado, condenou a ré “C...” a pagar à autora a quantia de €32175,18 (trinta e dois mil cento e setenta e cinco euros e dezoito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a sua citação e até efectivo pagamento, e ainda o que se fixar, em sede de liquidação, pelos custos suportados com a aquisição das hélices e com o pagamento aos funcionários que as substituíram, deduzida de 10%, a título de franquia, absolvendo-a, contudo, da restante parte do pedido.

Em relação ao pedido reconvencional, a sentença julgou-o, parcialmente procedente e, em consequência, condenou a autora a pagar à ré B... a quantia de €43550,67 (quarenta e três mil quinhentos e cinquenta euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 14 de Janeiro de 2003 e até efectivo pagamento, absolvendo, porém, a autora da parte restante do pedido.

Desta sentença, ambas as rés interpuseram recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões: A - A RÉ B...: 1ª - Da matéria dada como provada, constante nos factos considerados provados a fls. 2 a 7, da douta sentença, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos, não resulta a condenação da apelante B... por negligência.

  1. - Não há prova nos autos que torne possível ao tribunal a quo determinar a culpa por negligência dos funcionários da apelante B..., segundo o critério utilizado do bom pai de família. Ao decidir como decidiu o douto tribunal a quo violou os arts. 483° e 487° n°1 e 2 e 500° n°1 todos do CC.

  2. - Tendo em conta a matéria considerada como provada a douta sentença do tribunal a quo deve ser alterada e em consequência absolvida a apelante B....

  3. – A culpa da produção do acidente provem da cadeia de comportamentos dos funcionários da autora prévios ao acidente expressos nos quesitos considerados provados, a saber: 4o, 5o, 6o, 42°, 43°, 44°, 48°, 50°, 51°, 52°,53°,55°,57°,58°,59°. 61°, 62°, 64°, 65°, 69°, 74°, 79°, 81°, 82° e 101°, dado que, lhes era exigido um dever de cuidado inerente ao facto de serem técnicos de torres eólicas, estarem a trabalhar com máquinas de enormes dimensões e perigosidade (facto este notório e do conhecimento geral do cidadão comum) conhecedores do modo de funcionamento das torres eólicas e suas componentes.

  4. – Ficou provado que os funcionários da autora não empregaram as providencias e cautelas necessárias e exigidas pelas circunstâncias a fim de prevenir e evitar o acidente, conforme se observa pela leitura atenta dos quesitos 4o, 5o, 6o, 50°, 52°, 53°, 62°, 64°, 65°, 69°, 74°, 81°, 82°, 101°.

  5. - "A diligência há-de ser apreciada pelo confronto da conduta do agente com aquela que teria o bom pai de família que dispusesse de idênticas qualificações culturais e profissionais e que se encontrasse em situação semelhante à do agente, assumindo, assim, a maior relevância a fixação ou apuramento da condição de sujeito" (in nota n° 31 do art 487° do CC anotado de Abílio Neto, Ed.11° pp. 396).

  6. - Da matéria dada como provada não se determina que os funcionários da apelante B... tivessem conhecimentos (qualificações culturais e profissionais) para agir de modo diferente em face das circunstâncias do caso em concreto.

  7. - Os funcionários da apelante B..., técnico comercial (Jorge Campos) e o manobrador de grua (Hugo) - cfr. acta da audiência de julgamento datada de 8 de Fevereiro de 2006, não possuem qualificações técnicas, culturais, e profissionais susceptíveis de lhes ser exigido que agissem do seguinte modo: "indagar junto dos funcionários da Autora antes de esticar a lança da grua se o podiam fazer com segurança", 9ª - Não existe matéria de facto provada que sustente a seguinte fundamentação da sentença (fls 13 da Sentença) "no meu entender, o bom pai de família perante as hélices em rotação só esticaria a lança da grua ao nível dessas hélices depois de se certificar que não existia qualquer perigo ou risco de colisão", e acrescenta "daí que, alegando a Ré que os seus funcionários não sabiam o modo de funcionamento da turbina, deviam estes, antes de esticarem de modo a lança indagar junto dos funcionários da autora se o podiam fazer com segurança”.

  8. - Não ficou provado quando é que foi esticada a lança da grua, se antes, durante ou depois dos funcionários da autora terem ligado o aerogerador, o qual esteve ligado durante um hora (das 15 horas até às 16.15) sem qualquer ocorrência (5o, 6o, 42°, 50°, 45º, 47°, 48°, 50°, 51°, 52°, 53°, 55°, 57°, 58°, 59°, 61°), 11ª - Não existe prova nos autos, ao contrário do considerado pelo tribunal, que sustente a afirmação feita na fundamentação a fls. 11 e 12 da sentença “a turbina só foi posta a funcionar no modo de produção de energia depois de os empregados da Ré terem desmontado os contrapesos e de terem recolhido a lança da grua (resposta ao quesito 79°) "nem tão pouco quando é que os funcionários da Ré recolheram a lança, e quando é que a estiram novamente, se antes, durante ou depois dos funcionários da autora terem colocado em funcionamento o turbina do aerogerador (cfr. 42°, 43°, 44°, 45°, 47°, 48°, 50°).

  9. - O quesito 79° só tem o mérito de provar que "no dia 3 de Setembro de 2001, a Ré B... fez a desmontagem dos contrapesos e recolheu a lança da grua, trabalhos que tiveram início cerca das oito horas da manhã''.

    Não pode o tribunal a quo retirar deduções e fundamentar a sua decisão em matéria de facto considerada não provada.

  10. - A autora não fez prova de que os funcionários da apelante B... tiveram um comportamento negligente/ilícito, a qual lhe incumbia - "o ónus da prova da ilicitude do facto danoso cabe ao lesado" ( cfr. art 487° n°1 e in Almeida Costa, CJ, 1985, 2o -19).

  11. - A negligência, de acordo com a matéria de facto provada, provem da sequência de comportamentos dos funcionários da autora anteriores ao acidente, expressos nas respostas aos quesitos dados como provados - 4o, 5o,6o,42°,43°,44°, 48°, 50°, 51°, 52°, 53°, 55°, 57°, 58°, 59°, 61°, 62°, 64°, 65°, 69°,74°,79°,81°,82°, 101° - os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos.

  12. - Resultaram provados factos demonstrativos dos comportamentos negligentes dos funcionários da autora, causadores do acidente, nomeadamente: os funcionários da autora, antes e depois de ligarem a turbina e colocarem as pás em rotação, verificaram que os funcionários da ré B... estavam no local a desmontar a grua e que a grua e os seus componentes estavam no local (52°), junto ao aerogerador (53°), não esperaram que a ré terminasse os trabalhos de desmontagem da grua e seus componentes e saísse do local da obra (69°), afastaram-se do local para mais de 150 m (5o e 6o 62°) ao ligarem a turbina as pás rodam conforme a direcção do vento (50°, 51°, 55°, 57°, 58°, 59°), durante a montagem do equipamento inerente ao funcionamento da grua e durante a substituição dos transformadores a autora tinha as pás da turbina desligadas, (101°), os funcionários da autora são conhecedores do modus operandi da sua actividade (cfr. acta da audiência de julgamento de 08.02.06 junta a fls....).

  13. - Ficou ainda provado que a grua estava a 10 metros da torre (53°), que estava no local no dia do acidente a ser desmontada desde as 8 horas da manhã (69°e81°), tendo o acidente ocorrido às 16 h e 15 m (5o e 6o), sem ainda terem terminado os trabalhos de desmontagem da grua, com os funcionários da ré B... no local (69° e 81o), 17ª - A autora deu causa ao acidente, os funcionários da autora não agiram com a diligência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT