Acórdão nº 957/03 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelVIRGÍLIO MATEUS
Data da Resolução04 de Dezembro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM O SEGUINTE: I- Relatório: a). No dia 18-3-2003, A...

e B..

.requereram providência cautelar contra C...

e D..

., em cujos autos, no dia 31-3-2003, foi produzida prova pessoal e logo proferida decisão de deferimento, autorizando busca, recolha de registos e apreensão de material (informático) que se mostrasse ter sido usado indevidamente, isto é, que constituísse cópias e ou processamento idêntico ao módulo e procedimentos usados pelos requerentes. Foi ainda ordenado que se recorresse à ajuda do perito da ASSOFT (associação portuguesa de software) Pedro B. A. N. Lopes.

No dia 7-4-2003 foi realizada a providência, presidida pela M.ma Juiz e na presença, designadamente, do dito perito e autoridade policial, com início na sede da Ferticentro, mas, como aí foi dito pelo sócio Paulo Alves que os computadores estavam sim na SCSI L.da, a diligência prosseguiu nas instalações desta, onde a SCSI pôs à disposição os computadores da Ferticentro (vd. auto de busca de fls. 104 e seg.). Segundo o mesmo auto, o Engº Pedro Cruz, sócio da SCSI declarou que os computadores foram recebidos em 4-4-2003. Na busca foram identificados vários computadores e, em relação a um deles, com o nº de série 014144647, foram apreendidos ficheiros intitulados Babe, ficheiros que foram gravados em dois CD, depois selados e juntos aos autos (ibidem).

Nos mesmos autos foi incorporado, a fls. 110/129, o relatório apresentado pelo dito perito e cuja elaboração terminou a 15-5-2003.

b). Entretanto, aos 21-4-2003, os mesmos A... e B...instauraram a presente acção ordinária contra C... e D..., alegando: O A. é um médico ginecologista com formação diferenciada na Finlândia, onde residiu durante 10 anos e exerce actualmente a actividade médica e científica. Em 1996, o A. desenvolveu na Finlândia, na sua empresa XtremeSolutions AY, um programa de computador que incluía uma base de dados (Babe), direccionado para o tratamento estatístico dos dados associados aos tratamentos específicos de infertilidade.

O A. tem implementado ao longo dos anos o programa Babe, que passou a incluir mais módulos, como o de facturação, marcação de consultas, diário médico, resultados de espermogramas e armazenamento de células em laboratório, sendo o único autor destes módulos.

O A. introduziu e implementou uma nova versão do programa original Babe, adaptado para Português, na AVA Clinic de Lisboa.

O programa Babe 3.0 é um programa informático original de base de dados fundamentado no programa e ferramenta comercial "File Maker Pro", tendo-se tornado, com a entrada do A. para a A. AVA Klinikka da Finlândia em 1998, um exclusivo desta empresa e das suas associadas AVA Klinikka de Turku e posteriormente AVA Clinic, Cuidados Médicos L.da., pois o A. cedeu-lhe a exploração dos seus direitos patrimoniais.

Anteriormente, em 1997, tinha já sido comercializada pela empresa do A., a XtremeSolutions AY, uma versão inicial com um só módulo, pelo valor de Euros 12 000,00 (Doze mil Euros).

Este programa foi introduzido em Portugal, na AVA Clinic de Lisboa, pelo A., seu autor e sócio da A. Ava Klinikka da Finlândia, com o consentimento desta, gerindo o A. a clínica em Lisboa desde o seu início.

Não existe em Portugal nenhum programa deste género, embora haja uma enorme necessidade deste tipo de software, configurado para a área específica da infertilidade, o que tem manifestamente contribuído para tornar mais competitiva a Ava Clinic.

O Babe é constituído por vários módulos: "Appointment" (Marcação de consultas e de procedimentos médicos e cirúrgicos), "Register" (Registo de dados pessoais dos doentes), "Diary" (Diário da descrição do médico dos actos terapêuticos e planeamentos), "Prescription" (Receitas médicas), "Sperm" (Esperma - resultados do espermograma), "Invoice" (Factura), "ART" (Assisted Reproductive Technologies — técnicas de reprodução medicamente assistida, ou seja, dados dos tratamentos específicos de infertilidade), "LabStore" (Armazenamento de embriões e esperma), entre outros.

Cada um destes módulos surge como um bloco independente dos outros, estando todos relacionados entre si.

O programa é único nas suas particularidades mesmo a nível mundial e é um elemento fundamental da gestão de toda a clínica e um factor de enorme valorização, pela facilidade de uso e adaptação específica à área a que é destinado.

E principalmente pelo facto de ter sido produzido, desenvolvido e adaptado por um especialista, tendo em vista as necessidades concretas da clínica e o seu uso indispensável para a realização de investigação clínica.

O R. C..., celebrou um contrato de trabalho com a AVA Clinic de Lisboa a 21 de Junho de 2000, tendo em vista o exercício da sua actividade de biólogo. Aquando do ingresso no quadro da AVA Clinic de Lisboa, o R. recebeu formação altamente especializada no tratamento da infertilidade, quer na AVA Clinic de Lisboa, quer na sua congénere na Finlândia.

Esta formação foi-lhe ministrada desde o seu ingresso, uma vez que o R. não tinha qualquer tipo de experiência na área da fertilização humana, não existindo em Portugal qualquer outro local que ministre esta formação específica nas suas várias vertentes, formação que incluiu também a apresentação do programa Babe e o seu uso como parte vital de todo o funcionamento da AVA Clinic.

O R. foi incluído no quadro permanente da AVA Clinic de Lisboa em 2.1.2000, tendo-lhe sido atribuída a posição de chefia do laboratório, onde trabalhavam na totalidade dois biólogos.

O R. acabou por apresentar em 20.12.2001, uma carta rescindindo o contrato de trabalho.

Nessa data, o A. Cândido Manuel Soares Tomás, verificou que do computador do laboratório, que não foi utilizado após a saída do R., tinha sido tentada uma cópia dos módulos do Babe, uma vez que encontrou no caixote do lixo do computador files do tipo "Temp", que assim o indicavam.

A rescisão do contrato de trabalho com a AVA Clinic de Lisboa, apresentada pelo R., foi aceite em Dezembro de 2001.

A R. FertiCentro desenvolve as mesmas actividades que a AVA Clinic.

Em Outubro de 2002, um casal paciente da AVA Clinic e residente na área de Coimbra, recorreu aos serviços da R. FertiCentro, para a realização de um exame de esperma que lhe tinha sido solicitado.

Posteriormente, o casal dirigiu-se à AVA Clinic para proceder aos tratamentos necessários e levou consigo o relatório do exame realizado na R. FertiCentro, em Coimbra.

Depois de lhe ser apresentado o exame, o médico da AVA Clinic, o Dr. Paulo Manuel Lemos Monteiro Vasco, referiu ao casal que não seria necessário o exame impresso e introduziu os dados no programa Babe, de forma a ter acesso a esse exame e a todos os dados dos doentes em causa.

Isto porque todos os exames realizados na AVA Clinic são também registados, de forma a estarem disponíveis através do programa Babe, nos termos anteriormente descritos.

O relatório que é apresentado no final do espermograma da AVA Clinic, é automaticamente introduzido em todos os relatórios, bastando para tal premir uma tecla e através do programa Babe, o relatório é automaticamente introduzido nestes termos, só sendo alterado caso seja necessário, por não ser o adequado ao caso concreto.

A apresentação dos espermogramas nos termos em que o faz a AVA Clinic não é corrente nem obrigatória, sendo que várias outras clínicas realizam o mesmo exame, recorrendo a campos e elementos informativos diferentes que os permitem distinguir com facilidade.

Os espermogramas da AVA Clinic e da A. AVA Klinikka na Finlândia são os únicos, a título meramente exemplificativo, que apresentam do lado direito, os "valores de referência de acordo com as novas recomendações da WHO, 1999", nenhum outro espermograma recolhido apresenta estes valores de referência, à excepção do exame da R. FertiCentro, que os apresenta exactamente com a mesma configuração.

A apropriação e a utilização em causa incluem o acesso ao código do programa, com violação da password e alteração de formatação do layout nos locais onde se encontrava o logotipo e o nome AVAClinic, sendo substituídos pelos da R. FertiCentro.

O espermograma da R. FertiCentro apresentado como Doc. 7 junto ao processo de procedimento cautelar não especificado, tem o número 105, o que significa que houve acesso à password mestre que permite alterar a numeração de base do programa.

Significa também que o programa já terá sido utilizado pelos RR. para, pelo menos, 105 casos.

E significa inclusivamente que poderá ter sido usada a base de dados da AVA Clinic, com acesso indevido a milhares de casos, tantos quantos esta base de dados comporta Entretanto o R. abriu oficialmente em Coimbra uma clínica denominada “D...”, congénere da Ava Clinic.

Durante a busca acompanhada pelos Peritos Pedro Almeida e Nelson Lopes, procedeu-se à análise de dados nos computadores LG - Multimediasystem, com o n.º de série 014144794, LG - Multimediasystem, com o n.º de série 014144656, LG - Multimediasystem, com o n.º de série 013427656 e num computador sem identificação, constatando-se a inexistência de qualquer ficheiro relativo ao requerido. No computador LG - Multimediasystem, com o nº de série 014144647, foram apreendidos ficheiros em Word e em ambiente operativo "File Maker Pro" designados pelo criador como "BABE".

Abertos os ficheiros, verificaram os peritos que as suas chaves de acesso eram exactamente iguais às chaves de acesso do programa original Babe, da titularidade dos AA., que se encontra depositado junto da ASSOFT, nomeadamente "Tejo" e "vinte e quatro doze".

Os nomes "Dr. Cândido Tomás" e "AVA Clinic" foram encontrados nestes mesmos ficheiros apreendidos.

Ao tempo não foi possível encontrar registos nos computadores da utilização propriamente dita dos ficheiros em "File Maker Pro", tendo sido elaboradas cópias dos seus layouts, designadamente dos mapas e relatórios, utilizáveis em Word.

No entanto, foi igualmente constatado pelos peritos que acompanharam a diligência que seria impossível encontrar quaisquer registos nos termos requeridos no âmbito da...

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