Acórdão nº 98/07.0TBFAG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A Freguesia de A....
, no concelho de ...., intentou acção declarativa, na forma sumária, contra B....e C....
, ali residentes, pedindo: Que se declare “que o prédio identificado em 1º da PI pertence em propriedade comunitária plena e exclusiva às populações da freguesia de A....”; e Que se condenem os RR. “ a demolir os muros referidos em 8º e 9º”, “ a remover a calha de ferro referida em 11º e a porteira de ferro referida em 12º”, “a repor o caminho público referido em 2º, 14º a 17º, conforme se encontrava anteriormente às obras por eles realizadas”, “a arrancar e remover todas as plantações referidas no artigo 20º” e “a pagar, a título de indemnização pelos prejuízos causados, quantia a liquidar em execução de sentença”.
Alegou, em resumo, que os povos da freguesia de A...., concelho de ...., utilizam colectivamente, desde tempos imemoriais, para apascentação de gados, para produção e corte de matos e lenhas e para extracção de barro, o terreno, composto por pinhal e mato, com a área de 15.844,67 m2, sito e denominado Baldio do D....
; terreno cuja administração, não se encontrando constituída nem a assembleia de compartes nem o conselho directivo, vem sendo feita pela Junta de Freguesia.
Ora – continua a A. – confrontando tal terreno/prédio baldio pelo sul e poente com um prédio rústico dos RR., construíram estes na totalidade da estrema norte do prédio baldio um muro e, perpendicularmente à referida estrema norte, um outro muro, tendo, entre os topos dos muros, colocado uma porteira de ferro, assim tapando a totalidade da estrema norte do prédio baldio.
Mais referiu que, existindo no limite do prédio baldio um caminho público para passagem de pé e carro também para o baldio, os RR. arrancaram o seu leito numa extensão de 10 metros para nascente.
Os RR. contestaram, invocando a falta de personalidade da A; e negando ser “baldio” o terreno em que construíram os muros e ser público o caminho a que a A. se refere.
A A. respondeu à excepção.
Foi proferido despacho saneador – em que, sem censura, foi julgada improcedente a excepção dilatória invocada – organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa, instruído o processo e realizada a audiência, após o que o foi proferida sentença, em que se concluiu do seguinte modo: “ (…) julgo a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: a) reconhece-se que o terreno sito na freguesia de A...., concelho de ...., denominado Baldio do D...., (…) se encontra instituído como baldio a favor das populações da freguesia de A...., concelho de ....; b) condena-se os réus a demolir os muros referidos em 13 e 14 dos factos provados; c) condena-se os réus a remover a calha de ferro referida em 16 dos factos provados e a porteira de ferro identificada em 17 dos factos provados; d) condena-se os réus a repor o caminho público referido em 6, 7, 19 a 26 dos factos provados repondo-o como estava antes da sua actuação referida em 25 dos factos provados; e) condena-se os réus a arrancarem todas as plantações referidas em 27 e 28 dos factos provados.
No mais, julga-se a acção improcedente.
(…)” Inconformados com tal decisão, interpuseram os RR. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente improcedente.
Terminam a sua alegação com as seguintes conclusões: 1 – Os baldios são terrenos possuídos e geridos por uma comunidade local formada pelo universo dos compartes, moradores numa ou mais freguesias, ou parte delas, que segundo os usos e costumes têm direito ao seu uso e fruição.
2 – Não se provou que o prédio identificado na al. A) dos Factos Assentes fosse usado e fruído pelas populações da freguesia das A.... nem colectivamente nem comunitariamente, nem com consciência ou ânimo do uso e fruição comunitários (resposta aos quesitos 5º, 7º D)).
Pelo que o prédio aludido não pode ser qualificado como baldio.
3 – Daí decorre que os pedidos sobre a demolição de muros, remoção do portão e acessórios ( calha e batentes), arranque de plantações – al. b), c) e e) da Decisão também não podem ser procedentes.
4 – O caminho (que não se provou compactado nem visível – resposta ao quesito 26º da Base Instrutória) não pode ser classificado de público.
Não resultaram provados factos demonstrativos de que desde tempos imemoriais estivesse no uso directo, imediato do público e servisse um fim público.
(Respostas ao dito quesito nº 26 (principalmente) e aos quesitos 7, 8, 26 a 30, 56 e 57 da Base Instrutória.
5 – A decisão violou, entre outros, os artigos 1º nº 1, 2 e 3 da lei 68/93 de 4.09 e jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça – Assentos de 19.04.1989, de 10.11.1993 e de 15.06.2000.
6 -Deverá ser substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente e sem custas, por a Autora Junta de Freguesia a ter configurado como de baldios – art.º 32º, nº 2 da citada Lei.
E só no caso das conclusões supra não serem procedentes: 7 – A fundamentação das respostas aos números da Base Instrutória não satisfaz a exigência do art.º 653º nº 2 do C. P.C.
8 – Pelo que os autos devem ser remetidos à 1ª instância nos termos e para os fins do art .º 712º, nº 5 do C.P.C.
A A. respondeu, sustentando, em síntese, que não violaram a fundamentação da decisão de facto e a sentença recorrida quaisquer normas adjectivas e substantivas, pelo que deve ser mantida a sentença nos seus precisos termos.
Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
* II – Fundamentação de Facto 1 – Na freguesia de A...., concelho de ...., existe um prédio denominado Baldio do D...., não inscrito na matriz predial respectiva, mas participado no Serviço de Finanças de ...., e não descrito na Conservatória do Registo Predial de .....
2 – No dia 19 de Junho de 1957, mediante escritura lavrada no Cartório Notarial de ...., E...
e mulher F....
, venderam a G....
, casado, residente e natural de A...., que lhes comprou, entre outros, o seguinte prédio: Uma terra de mato e centeio com oliveiras, no sítio do ...., limite da freguesia de A...., que confronta a nascente com o baldio, do norte com ...., do poente com o caminho e do sul com Herdeiros de D. .....
3 – Na escritura de partilhas da herança de G...., de 30-04-1993, outorgada no Cartório de ...., tal prédio dos réus foi identificado como “terra de batatas, com oliveiras, um pinhal, e uma pastagem, sito no ...., limite da dita freguesia de A...., com a área de dezassete mil duzentos e vinte metros quadrados, que confronta do sul com herdeiros de .... e do Poente com B”.
4 – O terreno referido em 1 confronta do norte com Estrada e ...., do sul com os réus e outro e do nascente com herdeiros de .... e outros e do poente com os réus e outros.
5 – Desde tempos imemoriais e há mais de 20, 30, 40, 50, e 100 anos, algumas pessoas da freguesia de A.... têm utilizado o prédio rústico identificado em 1.
6 – Para apascentação de gados, produção e corte de matos e lenhas, extracção de barro e por passagem em caminho nele existente, para passagem a pé e carro, de forma ininterrupta, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, com exclusão de outrem e na convicção de que tal terreno era explorado por outros habitantes da freguesia das A.....
7 – O caminho referido em 6, inicia-se na estrema norte, junto à Estrada Municipal, com o sentido norte-sul, numa extensão de várias centenas de metros até ao campo de futebol, entroncando noutro caminho que liga a Fonte ....à .....
8 – Não está constituída assembleia de compartes, nem conselho directivo quanto ao prédio referido em 1.
9 – A sua administração tem sido efectuada pela Junta de Freguesia de A.....
10 – O prédio rústico composto por terra de batata com oliveiras, pinhal e pastagem, sito ao ...., freguesia de A...., concelho e comarca de ...., que confronta do norte e nascente com o prédio identificado em 1, é pertença dos réus.
11 – Constando da matriz que confronta do norte com ...., do nascente com ...., do sul com herdeiros de .... e do poente com António Nunes, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 493.
12 – Os réus efectuaram obras no seu prédio.
13 – Os réus, na estrema norte do prédio identificado em 1, paralelamente à estrada Municipal e no prédio que é “propriedade” das populações da freguesia de A...., Baldio do D...., construíram um muro de altura variável, sendo que na parte mais baixa...
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