Acórdão nº 358/10.3T2ILH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução19 de Outubro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. L (…), S. A., intentou, na Comarca do Baixo Vouga[1], o presente procedimento cautelar comum contra J (…), pedindo a apreensão do veículo automóvel com a matrícula ....ZP, sua propriedade.

Alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade de locação e de gestão de veículos automóveis celebrou com o requerido, em 02.3.2005, o contrato de aluguer e de gestão de veículo sem condutor a que se refere o documento de fls. 20; nos termos do referido contrato, realizado no âmbito do contrato-quadro de aluguer e de gestão de veículos reproduzido a fls. 21 e que entrou em vigor em 02.3.2005, o requerido, pelo gozo do dito veículo, obrigou-se a pagar-lhe, por um período de 48 meses, os respectivos alugueres/serviços mensais e sucessivos, no valor de € 635 cada, o que incumpriu a partir de Setembro de 2009, inclusive; não tendo sido pago o débito emergente do contrato (alugueres/serviços vencidos entre Setembro de 2009 e Junho de 2010), comunicou ao requerido, por carta datada de 21.7.2010, que resolvia o mencionado contrato, tendo a resolução operado a 31.7.2010; solicitou o pagamento dos alugueres e serviços vencidos na pendência do contrato, e a restituição do veículo automóvel locado, o que foi recusado pelo requerido.

Referiu ainda, designadamente, que a utilização de uma viatura deprecia-a e diminui-lhe o valor; o mero decurso do tempo, independentemente da sua utilização, também faz diminuir o valor da viatura, do que resulta prejuízos irreparáveis para a requerente; existe o risco de o requerido abandonar o veículo ou de não proceder à sua devida manutenção; pode presumir-se do incumprimento do requerido que esteja incapacitado de cumprir com as suas demais obrigações, tudo, razões que justificam a urgência da apreensão judicial da viatura nos termos do art.º 381° do CPC, existindo fundado receio da requerente poder vir a sofrer uma lesão grave e dificilmente reparável no seu direito sobre o referido bem, até à propositura e na pendência da acção de condenação para a sua restituição; não sendo o mesmo restituído desde já à requerente, deverá então, pelo menos, ser ordenada a não utilização do mesmo pelo locatário.

A Mm.ª Juíza, ao abrigo do disposto no art.º 234°- A, n.º 1, do CPC[2], na redacção conferida pelo DL n.º 303/07, de 24.8, indeferiu liminarmente a pretensão da requerente, por considerar não preenchidos, e nem sequer alegados, todos os pressupostos da providência requerida, sobretudo, o requisito da lesão grave e de difícil reparação.

Desta decisão, destaca-se o seguinte excerto, com diversas referências jurisprudenciais: (…) O incumprimento pelo requerido das prestações pecuniárias acordadas no contrato de locação, não faz aumentar o risco de deterioração física e de desvalorização comercial do veículo (...) A requerente continua a ter direito aos alugueres do veículo até à sua efectiva restituição (...).

Por outro lado, em relação às consequências para a requerente da eventual ocorrência de sinistros com o veículo locado que, também eventualmente, não terá seguro automóvel (...) por se tratarem de meras hipóteses ou suposições, e não de factos concretos tradutores de um perigo real e certo, não podem ser tomadas em conta (...)“, sendo certo que a requerente tem possibilidade de verificar e controlar a existência de contrato de seguro válido nos termos do contrato celebrado (…).

Com efeito “a detenção do veículo pelo requerido não é susceptível de causar à requerente lesão grave e irreparável, tanto mais que esta continua a ter direito aos alugueres não pagos até à restituição, seja a título de prestação contratual devida até à caducidade (arts. 406º e 1038°, al. a) do Cód. Civil), seja a título de indemnização pelo atraso na restituição, desde a caducidade até à efectiva entrega (art. 1045° do Cód. Civil). Quanto à eventual deterioração culposa da viatura locada, ela está acautelada nos termos gerais (arts. 1043° e 1044° do Cód. Civil), sendo certo que tal risco existe, desde o início do contrato alegado e com a natural circulação desse veículo.

(...) A lei não dispensa a requerente da prova dos factos constitutivos do `periculum in mora´, e este não se retira automaticamente da circunstância de a requerente ser proprietária do veículo, de dele se encontrar privada, e de o mesmo se poder depreciar, sendo certo que aquela poderá vir a ser ressarcida em sede própria pelos prejuízos causados (...)“ (…).

(…) para o deferimento da providência cautelar pretendida de apreensão do veículo identificado nos autos, necessário seria verificar-se, em concreto, o preenchimento de todos os pressupostos de tal providência, o que, como vimos, manifestamente não sucede sequer em sede de alegação, devendo indeferir-se liminarmente a pretensão da requerente.

Desta decisão recorreu a requerente que, mantendo o peticionado, formulou as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - Foi celebrado entre as partes um contrato denominado contrato de aluguer de veículo sem condutor e de gestão de veículos pelo período de 48 meses.

2ª - A requerente cedeu o gozo do veículo ao requerido, mediante o pagamento de uma renda mensal.

3ª - O requerido deixou de pagar as rendas acordadas, não obstante continuar a deter o veículo e a dele usufruir.

4ª - Por força da conduta do requerido, a requerente procedeu à resolução do contrato nos termos previstos na Condições Gerais do mesmo.

5ª - O requerido continua a circular com o veículo e a usufruir do veiculo apesar de ter deixado de pagar as rendas devidas, não dando qualquer resposta às várias solicitações que lhe foram feitas para devolver o veículo, impossibilitando dessa forma a requerente de efectuar qualquer outro negócio com a viatura de que é proprietária.

6ª - É do conhecimento geral que os veículos automóveis estão sujeitos a uma rápida depreciação comercial e deterioração pelo mero decurso do tempo, ao que acresce o risco sério de, em face do veículo se encontrar em circulação, a requerente vir a ser responsável pela consequências devidas de um eventual sinistro automóvel em que o veículo possa ser envolvido.

7ª - É legitimo fazer-se um juízo, com alguma certeza e probabilidade séria, de que a situação em exame consubstancia uma lesão grave e de difícil reparação do direito que assiste à requerente, de ver-se restituída do bem que lhe pertence em exclusivo e que está inibida de o exercer.

8ª - A providência cautelar em apreço é a mais adequada para...

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