Acórdão nº 1793/09.5TBFIG-E.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Fevereiro de 2010

Data23 Fevereiro 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2.ª secção cível): * Recorrente…………………A (…) e esposa B (…) residentes na Rua (…) .....

Recorridos………………….Credores dos insolventes, identificados nos autos.

* I. Relatório:

  1. Os recorrentes A (…) e B (…) apresentaram-se à insolvência, invocando a insuficiência do activo para satisfazer todos os seus compromissos vencidos e vincendos.

    Pediram a exoneração do passivo restante, ao abrigo do disposto nos artigos 236.º, n.º 3 e 237.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante designado apenas por CIRE), alegando que preenchiam os requisitos legais previstos na lei.

    O tribunal apreciou este pedido e decidiu indeferi-lo, fundamentalmente por entender que a apresentação à insolvência ocorreu alguns anos após se ter completado o prazo de 6 meses para o insolvente se apresentar em juízo, previsto no artigo 238.º, n.º 1, al. d), do CIRE, contados a partir do momento em que caiu em situação de insolvência.

    Ponderou-se na decisão recorrida que a requerente encerrou a loja de pronto-a--vestir no ano de 2000 e, ainda que, «…para pagamento das dívidas do estabelecimento, o requerente marido procedeu, em 2002, à venda de alguns prédios rústicos, sendo que o produto desta venda não foi suficiente para proceder ao pagamento da totalidade das dívidas do estabelecimento comercial; o apartamento onde viviam foi penhorado e vendido num processo de execução fiscal; sobre o vencimento de €1280,00 auferido pelo requerente, passou a incidir uma penhora à ordem desse processo; os €700,00 que lhe sobram desse desconto são insuficientes para fazer, actualmente, face às despesas do agregado; a requerida alega não poder trabalhar e nada tendo sido alegado, em concreto, sobre esta impossibilidade, depreende-se que tal se deve ao facto de ter três filhos, como refere.

    Parece-nos, assim, poder afirmar que os requerentes já desde há vários anos que se encontram impossibilitados de cumprir as suas obrigações, estando em situação de insolvência pelo menos desde 2002, sem terem requerido a sua insolvência e o pedido agora em apreço».

    Foi ainda entendido pelo tribunal a quo que este atraso na apresentação à insolvência originou prejuízos para os credores devido ao avolumar dos seus créditos face ao vencimento de juros e pelo consequente avolumar do passivo global da insolvente, o que dificulta o pagamento dos créditos.

    Referiu-se também na decisão que os requerentes não se pronunciaram sobre as condições exigidas no n.º 4 do artigo 239.º do CIRE, ou seja, não declararam expressamente a sua disponibilidade para observar todas as condições aí exigidas.

    Por fim, argumenta-se no sentido de não se vislumbrar, face às alegações dos requerentes, que a curto prazo exista alguma perspectiva séria de melhoria da sua situação económica, pois a requerente diz que não pode trabalhar, por incapacidade física, o que implica que os credores não possam ter quaisquer expectativas de que venha a existir cessão do rendimentos dos requerentes a seu favor.

  2. Os recorrentes discordam do decidido e recorrem, em síntese, pelas seguintes razões: Em primeiro lugar, porque, contrariamente ao decidido, a situação de insolvência só surgiu em Junho de 2009.

    Com efeito, dizem, muito embora a requerente mulher tenha encerrado o estabelecimento comercial de pronto-a-vestir no ano de 2000, o requerente marido procedeu em 2002 à venda de alguns prédios rústicos e com o produto dos mesmos pagou parte das dívidas do estabelecimento comercial; o apartamento onde viviam foi penhorado e vendido num processo de execução fiscal; sobre o vencimento de €1280,00 auferido pelo requerente, passou a incidir uma penhora à ordem desse processo; os €700,00 que lhe sobram desse desconto são insuficientes para fazer, actualmente, face às despesas do agregado.

    Sempre pagaram todas as contas com maior ou menor dificuldade e previam poder contar com o dinheiro do vencimento da requerente mulher para continuarem os pagamentos.

    Foi só ao verificarem, em 28-06-2009, a impossibilidade da requerente mulher poder trabalhar, por incapacidade física, que ambos tiveram a noção que tinham ficado em situação de insolvência.

    Por outro lado, o CIRE só entrou em vigor em Setembro do ano de 2004.

    Até essa altura vigorava o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência (CPEREF) e nesta última legislação não existia o instituto de exoneração do passivo restante, nem a pessoa singular estava obrigada a apresentar-se à falência, como decorre do o disposto no artigo 6.º do CPEREF, só aplicável à empresa, pelo que, o aludido prazo de 6 meses não lhe é aplicável, na medida em que a nova lei, nos termos do artigo 12.º do Código Civil só dispõe para o futuro.

    Em segundo lugar, sendo certo que a exoneração do passivo tem como contrapartida a cessão do rendimento disponível do devedor, a inexistência de rendimento disponível no momento em que é proferido o despacho inicial, previsto no artigo 239.º do CIRE, não constitui fundamento, só por si, para se indeferir o pedido de exoneração do passivo restante.

    Em terceiro lugar, não existiu agravamento do passivo. As dívidas do casal são do tempo do negócio falhado da recorrente mulher e daí em diante não contraíram mais dívidas, antes pelo contrário, pois têm vindo a pagá-las, pelo que, se se entendesse, por hipótese, que os recorrentes se apresentaram à insolvência fora do prazo dos seis meses, então, ainda assim, a exoneração do restante passivo podia e devia ter sido deferida e admitida liminarmente, pois estão presentes os demais requisitos.

    Em quarto lugar, nenhum dos credores em assembleia se opôs ao pedido de exoneração do passivo restante, nem a administradora de insolvência, razão porque, sendo o direito concedido ou a conceder aos requerentes disponível, não deve o juiz substituir-se aos credores que não se opõem à concessão da admissão liminar da exoneração do passivo, com o argumento que o mesmo a ser concedido prejudicaria os credores.

  3. O objecto do recurso consiste, por conseguinte, nas questões enunciadas na alínea que antecede.

    1. Fundamentação.

    1. A matéria de facto relevante para a questão a decidir é esta: A requerente e o requerido contraíram casamento em 30 de Setembro de 1996.

    A requerente mulher em 1996 abriu uma loja de pronto-a-vestir na ...., que encerrou em 2000.

    Para pagamento das dívidas do estabelecimento o requerente marido procedeu, em 13 de Julho de 2002, à venda de alguns prédios rústicos.

    O produto da venda dos prédios rústicos não foi suficiente para proceder ao pagamento da totalidade das dívidas do estabelecimento comercial.

    O apartamento onde viviam foi penhorado e vendido...

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