Acórdão nº 3472/08.1TBVIS-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2010

Data18 Maio 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. Na comarca de Viseu (2º juízo cível) correm (desde 17/10/2008) os autos de processo comum de execução (autuados sob o n.º 3472/08.1TBVIS), para pagamento de quantia certa, instaurados pelo exequente, Banco A....

, contra os executados, B.... e sua mulher C....., baseados (como título) num contrato de mútuo (incumprido pelos últimos, na qualidade de mutuários, em relação ao primeiro, como mutuante).

  1. Citados para o efeito, vieram aqueles executados deduzir oposição à referida execução (por apenso à mesma) pedindo, a final, que seja declarada a nulidade do sobredito contrato de mútuo que serve de base à mesma, bem como ainda do contrato de associação a que se encontra coligado e, em consequência, declarar-se extinta a execução e a penhora realizada nos autos de execução, e seja ainda ordenada a restituição aos executados das importâncias que lhes foram ali penhoradas, e, por fim, a exequente sancionada nos termos e na medida do estabelecido no artigo 819 do CPC e ainda condenada a mesma a restituir-lhes a importância de € 342,00 que indevidamente deles recebeu com base em tal contrato.

    Para o efeito, os executados/opoentes alegaram, em síntese, o seguinte: O aludido contrato de mútuo que se serve de base à execução teve como intermediária a sociedade comercial com a firma D....

    , mas que também usa e se apresenta com o nome “D....”.

    Sociedade essa que, oferecendo-lhes produtos e serviços, apresentou aos opoentes um contrato de associação ao “ D....”, com vista à aquisição de um cartão de descontos, também designado por cartão turístico. E para comportar os encargos com a aquisição desse cartão foi apresentado aos oponentes o sobredito contrato de mútuo (que também vieram a outorgar).

    Porém, tais contratos foram celebrados em circunstâncias anómalas e ilícitas, que determinam a sua nulidade.

    Na verdade, a executada, no dia 4/8/2007, foi contactada (via telefone) por um colaborador do referido “ D....” anunciando-lhe que tinha sido contemplada com um prémio e que, para recebê-lo, deveria comparecer ainda nesse dia, acompanhado do seu cônjuge, no hotel que lhe foi indicado.

    Ali chegados, com tal propósito, foi-lhes então, pelo referido colaborador do dito “ D....”, apresentado um cartão de crédito que oferecia um crédito de € 4.000,00 descontos em viagens e em compras realizadas em supermercados. Foram ainda informados que poderiam desistir a todo o momento de tal cartão e que seriam reembolsados de 20% das importâncias que houvessem pago.

    Perante a pressão a que foram sujeitos, por mais de 3 horas, acabaram os executados/opoentes por subscrever os documentos que lhe foram apresentados, todavia, fizeram-no sem o domínio pleno da sua vontade e também não foram esclarecidos sobre os documentos que assinavam e as obrigações neles constantes.

    Que o contrato de associação que lhes foi entregue foi integralmente preenchido pelo colaborador da sociedade D.... e não se encontra subscrito pelos opoentes e nenhum esclarecimento lhes foi feito sobre o respectivo conteúdo, o mesmo ocorrendo com o contrato de mutuo dado à execução, já que lhes foi apresentado junto com muitos outros papéis, não o preencheram e não foram informados sobre o seu conteúdo nem as obrigações nele constantes, tendo sido subscrito pelos opoentes antes das cláusulas gerais enunciadas no verso de tal contrato, sendo que tão só em 21/08/2007 receberam uma cópia desse contrato (de mútuo).

    Posteriormente, e na sequência de diligências que encetaram com vista a informar-se sobre o teor daqueles contratos que assinaram, ficaram a saber que, ao contrário do que lhes fora dito, a aquisição do sobredito cartão não lhe conferia todos aquelas benefícios ou direitos que lhes fora dito serem por ele contemplados.

    Tomaram só então consciência de que tais contratos eram contrários à sua vontade, e para os quais não foram devidamente informados e esclarecidos.

    Para pagamento das obrigações assumidas com a celebração do dito contrato de mútuo, chegaram a entregar ao exequente (que financiou a aquisição do referido cartão) a quantia de € 342,00, correspondente ao reembolso das três primeiras prestações acordadas.

    E daí a formulação do petitório acima enunciado.

  2. Recebida tal oposição e dela notificado, o exequente veio contestá-la.

    Para o efeito, e em sua defesa, alegou, em síntese, o seguinte: Que foi explicado aos executados que para aderirem aos serviços hoteleiros contratados e a outros benefícios, descontos, vantagens, regalias e acesso a produtos e serviços nas empresas que utilizam a marca “ D....” deveriam proceder ao pagamento integral, a pronto pagamento ou poderiam recorrer a um financiamento, tendo sido esta a sua opção. Foi então apresentado aos executados o contrato de mútuo que estes subscreveram, tendo entregue os respectivos documentos para o seu preenchimento.

    Que aos executados foi entregue a cópia de tal contrato e bem assim da declaração de revogação que dele faz parte integrante, tendo os mesmos sido devidamente informados e esclarecidos do seu teor (tendo, inclusive, sido, logo em 7/8/2007, contactados para o efeito pelo departamento de apoio ao cliente do exequente), pelo que os mesmos ficaram devidamente consciencializados não só das obrigações como também dos direitos decorrentes da assinatura de ambos os contratos, e nomeadamente do período de reflexão que as lei lhes concedia para poderem proceder à sua resolução.

    Os opoentes cumpriram o contrato até 15/11/2007 (pagando três das prestações mensais que foram estipuladas para reembolso à exequente da quantia que desembolsou para os executados adquirirem o dito cartão àquela outra sociedade).

    De qualquer modo, e face ao exposto, a agora invocada nulidade dos contratos, nomeadamente do mútuo, só pode configurar um verdadeiro abuso de direito por parte dos executados/opoentes, nulidade essa que, a ser declarada, sempre, todavia, imporia aos mesmos a obrigação de, à luz do artº 289 do CC, restituírem ao exequente todo o capital (€ 4.641,00) que o mesmo, em benefício e a pedido deles, entregou à sobredita sociedade.

    Termos, pois, em que terminou pedindo a improcedência da oposição, com a condenação ainda dos executados/opoentes como litigantes de má fé.

  3. No despacho saneador afirmou-se a validade e a regularidade da instância, tendo-se ali dispensado, a selecção da matéria de facto.

  4. Mais tarde, procedeu-se à realização do julgamento – com a gravação dos depoimentos prestados em audiência -, que terminou com a decisão que fixou a matéria de facto dada como provada.

  5. Seguiu-se a prolação da sentença, que, a final, julgou improcedente a oposição deduzida à execução.

  6. Não se conformando com tal sentença, os executados/opoentes dela apelaram.

  7. Nas correspondentes alegações que apresentaram de tal recurso, aqueles concluíram as mesmas nos seguintes termos: […………………………………………………] 8. Contra-alegou o exequente pugnando pela improcedência do recurso, com a manutenção do julgado.

  8. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir: *** II- Fundamentação A) De facto.

    Pelo tribunal da 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: […………………………………….] *** B) De direito.

  9. É sabido (entendimento que continua a manter-se com a actual a reforma introduzida pelo acima citado DL nº 303/2007 - artºs 684, nº 3, e 685-A, nº 1, da actual versão do CPC e aqui aplicável) que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se fixa e delimita o seu objecto.

    Importa também deixar, desde já, salientado que, tal como vem sendo dominantemente entendido, o vocábulo “questões” referido no artº 660, nº 2, do CPC, de que o tribunal deva conhecer, não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir (vidé, por todos, Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec.”, e Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.”).

    Ora, calcorreando as conclusões das alegações do presente recurso, verifica-se que a verdadeira e real questão que importa aqui solucionar traduz-se em saber se a execução que o exequente instaurou contra os executados/opoentes deve, ou não ser, declarada extinta, por virtude da nulidade contrato de mútuo que consubstancia o título lhe serve de base? Vejamos.

    Como vimos, o exequente baseia a execução que moveu contra os executados/opoentes com base num contrato de mútuo, reduzido a escrito particular, incumprido (na qualidade mutuários) pelos últimos, visando, essencialmente, aquele obter agora, por via dessa acção, o reembolso do capital mutuado.

    Da factualidade apurada (que não foi neste objecto de qualquer impugnação ou censura) resulta que nas circunstâncias de tempo, lugar e modo ali descritas, foi celebrado um acordo escrito, denominado de contrato de associação ao “ D....”, entre a Sociedade D.... – ., e os executados/opoentes, através do qual os últimos adquiriram à primeira um cartão (denominado “Cartão D....”) que lhes permitia ter acesso a determinados bens e serviços e beneficiar de descontos, tudo nos termos melhor descriminados em tal contrato.

    E foi para financiar a aquisição de tal cartão que, mas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo descritas na matéria de facto acima elencada como assente, que foi celebrado, entre...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT