Acórdão nº 1168/07.0PBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelLUIS RAMOS
Data da Resolução09 de Dezembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra Por sentença proferida nos autos supra identificados, decidiu o tribunal condenar o arguido J, como autor de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artº 86.º, n.º 1, al. c), 3.º, n.º 3, da lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

Inconformado com o decidido, o arguido interpôs recurso no qual apresentou as seguintes conclusões (transcrição): B1: De uma leitura atenta da sentença recorrida, extrai-se que o M.mo Juiz a quo entendeu, grosso modo, dar como provada a matéria de facto dada como provada, com base no depoimento da testemunha M e dos agentes policiais A e D B2: Ora, no que tange ao depoimento da testemunha MJ cabe referir que a mesma é hostil ao recorrente porquanto crê que foi alvo de uma suposta agressão, cujo autor/instigador teria sido o recorrente, e cuja causa será o presente processo - agressão esta objecto de pretenso, porquanto não há prova documental que corrobore tal afirmação, processo a correr no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu.

B3: Sucede que vigora no nosso ordenamento jurídico o Princípio da Presunção de Inocência, consagrado no artigo 32º da C.R.P., pelo que até ao trânsito em julgado de uma decisão que confirme o que a testemunha referiu em sede de Audiência de Julgamento não poderia o M.mo Juiz a quo fazer menção dos mesmos, nomeadamente referir que as testemunhas, supostamente, foram alvo de pressões e destarte descredibilizar os seus depoimentos, credibilizando a testemunha M, única, no seu entender, que teve coragem de assumir a verdade.

B4: Mais a mais os depoimentos desta testemunha não são corroborados por qualquer outro meio de prova válido.

B5: Mais, as declarações dos agentes policiais A e D não podem ser valoradas porque se tratam de uma meio de prova proibido e, destarte, violadoras do disposto nos artigos 125.°, 126.° 356.º, n. ° 7, todos do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P.

B6: Com efeito, as mesmas vieram, em sede de Julgamento referir que as testemunhas L e AJ lhes tinham dito, quando chegaram ao local, nomeadamente que o recorrente havia discutido e ameaçado com uma arma de fogo o primeiro e, B7: O artigo 356.°, n. ° 7 veda a possibilidade de os órgãos de policia criminal virem, em sede de Audiência de Julgamento reproduzir o que quaisquer "pessoas" lhes tenham dito antes ou depois da abertura formal do inquérito, dentro ou fora do processo e independentemente do motivo de ausência da pessoa na Audiência.

B8: Padece, pois, a douta sentença recorrida de nulidade, porquanto valorou meios de prova proibidos, em clara violação dos artigos 125.°, 126.° 356.°, nº 7, todos do C.P.P. e artigo 32.° da C.R.P.

B9: Por conseguinte, deverá a decisoao recorrida ser revogada e substituida por outra que considere, nesta parte, nulos os depoimentos das testemunha A e D B10: Mais a mais, o Douto Julgador, interpretou erradamente o artigo 356.°, n. ° 7 do C.P.P. ao valorar os depoimentos dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com início às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) na parte em que os mesmos reproduzem o que lhes foi dito pelas testemunhas L e AJ.

B11: Na verdade, entende o recorrente que tais depoimentos, na parte em que reproduzem o que as testemunhas lhes referiram quando chegaram ao local, não deveriam ter sido considerados e por isso estão feridos de nulidade, não podendo ser considerados para decidir da matéria de facto dada como provada.

B12: Estão, assim, violados os artigos 129.° e 356.°, nº 7, todos do C.P.P. E artigo 32.° da C.R.P., pelo que é nula a sentença nos termos do disposto no artigo 379.°, n. ° 1, alínea c) do C.P.P.

B13: Na vã tentativa de tornear a questão do artigo 356.°, nº 7 o M.mo Juiz a quo enveredou pela figura do depoimento indirecto para valorar as declarações dos agentes policiais.

B14: Apesar de não concordar com esta solução, porquanto o legislador, para as declarações prestadas pelos órgãos de polícia criminal, em sede de Julgamento, criou um artigo específico, sempre se dirá que, ainda assim, as declarações por aqueles prestadas são nulas.

815: Com efeito, se é certo que o M.mo Juiz a quo chamou a depor as testemunhas Ildirectas", L e AJ - como legalmente se lhe impunha, também o é que não valorou os seu depoimento.

B16: Ora, nesta sede, havendo contradição de depoimentos deve ser valorado aquele referente à testemunha “directa" - depoimento de uma testemunha que percepcionou directamente os factos - porquanto essa é que é a ratio da prova testemunhal. Cfr a este respeito Manzini in Il Trattato di Procedura Penal".

B17: Conclui-se, pois, que o depoimento indirecto tem caracter excepcional e visa sobretudo trazer a depor a juizo a testemunha que viu/ ouviu os factos pois o que interessa para a verdade material são os factos concretos e não o que se ouviu dizer.

B18: Ao considerar, em caso de contradição, os depoimentos das testemunhas Ilindirectas", in casu, aqueles prestados pelas testemunhas para dar como provada a matéria dada como provada, incorreu a sentença recorrida, em nulidade.

B19: Nesta confluência, foram violados os artigos 125.° e 129.°, ambos do C.P.P. e 32. ° da C.R.P.

B20: O recorrente pretende demonstrar o seu dissidio no que tange à matéria de facto dada como provada nos autos - por manifesta ausência de prova, contradição na prova testemunhal, erro na apreciação da prova ou não apreciação da prova - que, por não se encontrar individualizada lhe cumpre transcrever: "No dia 14 de Outubro de 2007, pelas 4h50m, no interior do estabelecimento denominado "Bar Clássico", sito na Rua João Mendes, em Viseu, o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa.

Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.

Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, nº U479944, calibre 9 mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9 mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.

O arguido não é titular de licença de uso e porte de arma e sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.

O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. ".

B21: Contudo, por considerar que os meios probatórios submetidos à apreciação do Tribunal impunham assunção fáctica inelutavelmente diversa, o recorrente, em cumprimento do disposto no artigo 412º, n. o 3, al. c) do C.P.P., passa a transcrever a matéria de facto dada como provada que, no seu entender, reputa incorrectamente julgada: “(..) o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso da qual lhe fez o anuncio do uso de uma arma de fogo contra a sua pessoa.

Tendo sido chamada ao local a PSP, o arguido, ao aperceber-se a sua presença, fugiu apressadamente em direcção às casas de banho, onde escondeu, na antecâmara daquelas e no interior de um cesto, a arma de fogo que trazia consigo.

Tal arma foi sujeita a exame pericial, tendo-se verificado tratar-se de de uma pistola, da classe B), da marca Sic Sauer, n. o U479944, calibre 9 mm, com um carregador com a capacidade para 15 munições do mesmo calibre, no valor de 250,00. No seu interior, a pistola continha o carregador municiado com 13 munições de calibre 9 mm e, na câmara, mais uma munição do mesmo calibre.

(..) sabia que a pistola que tinha consigo era capaz de disparar munições com o projéctil de calibre 9 mm, que era capaz de provocar a morte de pessoas contra quem fosse usada e que não lhe era permitido detê-la.

O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. ".

B22: Relativamente a este concreto trecho – (…) o arguido dirigiu-se a L, porteiro desse estabelecimento, encetou com ele discussão de conteúdo não concretamente apurado e no decurso do qual lhe fez o anúncio de uma arma de fogo contra a sua pessoa” o Tribunal a quo entendeu dá-lo como provado com base nas declarações dos agentes policiais A (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:47:10, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) e D (depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 12.05.2010, com inicio às 15:56:32, gravado no sistema em uso no Tribunal conforme resulta da Acta de sessão de Audiência de Julgamento, ficheiro 20100512161747_183816_65353) que acorreram ao local após a suposta discussão e de fogo perpetrada pelo recorrente.

B23: Contudo, como já adrede expendido estas declarações dos agentes, porquanto se limitaram a reproduzir o que as testemunhas lhes disseram, são um meio de prova proibida nos termos do disposto nos artigos 125.°, 126. ° e 356.°, n. ° 7 do C.P.P. e artigo 32. ° da C.R.P., se tivermos em conta que se tratam de declarações proibidas, B24: Ou, caso se...

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