Acórdão nº 445/09.0T2OBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Setembro de 2010

Data21 Setembro 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes abaixo-assinados da segunda secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1. Relatório A 09 de Junho de 2009, no Juízo de Família e Menores de Oliveira do Bairro, da Comarca do Baixo Vouga, M C (…) instaurou acção declarativa sob forma ordinária contra M L (…) e M H (…) pedindo que se declare que é filha de J D (…), com todas as consequências legais, requerendo ainda produção antecipada de prova pericial em ordem a determinar a sua filiação biológica.

Em síntese, a autora alegou ter nascido a 18 de Março de 1949, sendo registada como filha de M R (…), então solteira, ficando a sua paternidade omissa. Porém, seu pai é J D (…), falecido a 23 de Dezembro de 2008, no estado de casado com M L (…), tendo deixado uma filha de nome M H (…), pois que namorou com a mãe da autora durante cerca de sete anos, com ela mantendo relações de cópula completa durante os primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precederam o seu nascimento, não tendo a mãe da autora mantido relações sexuais com qualquer outro homem nesse período. Alega ainda que o falecido J D (…) sempre afirmou e reconheceu ser o pai da autora e que era reputado pai da autora por todas as pessoas que o conheciam, tendo-a tratado por “filha linda”, justificando a não perfilhação da autora por pressões de sua mulher e filha.

Efectuada a citação de ambas as rés para os termos da acção, apenas a ré M L (…) contestou invocando a caducidade do direito da autora, alegando que fundando a autora a sua pretensão em posse de estado, a acção teria que ser proposta dentro do prazo de um ano a contar da data da cessação do tratamento da autora como filha pelo pretenso pai, pelo que teria que alegar factos nesse sentido até nove meses antes da morte do indigitado pai, sendo certo que este adoeceu em Junho de 2007 e desde essa data até ao seu óbito a autora não o visitou, nem perguntou se precisava de alguma coisa, impugnou a generalidade da factualidade articulada pela autora, opôs-se à realização de prova pericial antecipada e concluiu pela total improcedência da acção.

A autora replicou pronunciando-se pela improcedência da excepção peremptória arguida pela contestante.

A 05 de Janeiro de 2010, foi proferido despacho a dispensar a realização de audiência preliminar, proferiu-se despacho saneador tabelar e conhecendo-se especificamente da excepção peremptória de caducidade suscitada pela contestante escreveu-se: “Considerando: Que a Autora, M C (…), nasceu no dia 18/03/1949, com paternidade omissa (fls. 27); Que a mesma desde muito jovem tem conhecimento que o investigado J D (…)s era o seu pai, com o qual chegar a falar por várias vezes pedindo-lhe a perfilhação; e que a presente acção foi proposta no dia 09/06/2009 (fls. 18); Visto o disposto no artigo 1817º, nº 1 e 3, al. c) do C. Civil, na redacção atribuída pela Lei nº 14/2009, de 01 de Abril, aplicável ex vi art.º 1873º, do mesmo compêndio legal, mostra-se caduco o prazo legal para a propositura da presente acção, o que consubstancia uma excepção peremptória de direito material, de conhecimento oficioso, conducente à absolvição das Rés do pedido – artºs 279º, 296º, 298º, nº 2, 328º, 329º, 331º, nº 1 e 333º, nº 1, todos do C. Civil, e 493º, nºs 1 e 3 e 496º, ambos do C.P. Civil.

Pelo exposto, pela verificação da excepção peremptória de caducidade, absolvo as Rés do pedido.

” Inconformada com esta decisão, M C (…) interpôs recurso de apelação contra a mesma, oferecendo as seguintes conclusões: “1)- Este recurso visa evitar erro judiciário e encontrar a solução justa, que só pode ser a que não deixe esta filha, a Recorrente, sem poder demonstrar inequivocamente, que e para todos os efeitos legais, filha de J D (…) 2)- Como a sentença reconhece, a Recorrente nasceu em 18-03-1949, tem desde muito jovem conhecimento de que o investigado era seu pai, com o qual chegou a falar por várias vezes, pedindo-lhe a perfilhação – e que à acção de investigação foi proposta em 9-06-2009, menos de seis meses após o falecimento do investigado seu pai J D (…), em 23 de Dezembro de 2008.

3)- A sentença atribui a paternidade – era seu pai – e recusa à filha Recorrente, que documente essa realidade – que constitui oposição entre os fundamentos e a oposição – nulidade de sentença do arte 668, nº 1, al c) do C.P.C.

4)- E sem referência a quaisquer outros factos ou razões que não sejam as afirmações transcritas na conclusão 2ª, decide sem justificação, mostrar-se caduco o prazo legal para a propositura da acção, o que consubstancia excepção peremptória, na redacção atribuída pela Lei 14/2009 – disposto no arte 1817 nº 1 e 3 c) do Código Civil.

5)- Ignora ou omite os factos alegados designadamente os sumariados nestas alegações sob as alíneas “a a z”, e “A a D”.

6)- E até esqueceu a referência à conduta da Ré, impedindo a Autora de visitar o pai e que este lhe deu o dinheiro suficiente para a reparação do automóvel acidentado. Deste modo, 7)- O Juiz do Tribunal a quo desprezou toda a matéria de facto que, como consta da petição, provaria que a Autora foi, ao longo de toda a sua vida reputada e tratada como filha pelo investigado seu pai e reputada como filha pelo público.

8)- A Autora não duvidava, como ninguém nas suas condições duvidaria que existisse perfilhação ou, pelo menos, documento escrito em que o pai declarasse, sem margem para dúvidas, a sua paternidade – e mantém esse convencimento, com a fundada suspeita de que a Ré é que terá feito com que o documento mesmo que existisse não aparecesse.

9)- É efectivamente verdade que o investigado é pai da Autora, que requereu perícia pelo I.M.L. de Coimbra, ou pelo IPATIMUP, (Universidade do Porto) que demonstrasse a paternidade biológica (que o investigado é o pai da Autora).

10)- O Tribunal informou-se do que era necessário para poder realizar-se a Perícia Hematológica – e por não ser impossível fazê-la sem a colheita de órgãos no cadáver do investigado é que se manteve a admissão da Perícia, mas sem carácter de urgência.

11)- E o Exame ou Perícia admitidos foram dispensados – o que era necessário deixou de o ser – mas decidiu-se que essa paternidade existia, e considerou-se provada a caducidade.

12)- Esqueceu-se que a data do nascimento da Autora a acção podia ser proposta em vida do pretenso pai ou dentro do ano posterior à morte (arte 37 do Decº nº 2 de 24-12-1910).

13)- Sumariou-se e transcreveu-se a evolução dos textos constantes da Lei, do Código de 1967, do de 1977, da Lei nº 21/98, do Acórdão do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade do nº 1 do arte 1817 e a Lei 14/2009 de 1 de Abril) e em todos há possibilidade que se mostrou verificada segundo a matéria constante da petição que o juiz do Tribunal a quo não quis considerar e que determinariam que a acção fora atempadamente proposta por verificadas condições que previstas na Lei ampliavam o prazo da propositura da acção e destruíram o entendimento, sem base, da sentença recorrida.

14)- Mesmo segundo a lei 14/2009, a acção foi proposta no prazo permitido e a investigante só teve conhecimento de que não estaria perfilhada após a morte de seu pai, que prometera perfilhá-la e só após a morte deste é que também não foi encontrado o documento com a declaração da sua paternidade, sempre afirmada e que se pensa que existirá 15)- Sempre a Autora gozou de posse de estado – nome, tratamento e fama tal como se deixaram descritos e evidenciados. Assim.

16)- Até a mãe do investigado tratava a Autora por neta – e as sobrinhas deste por prima – e tanto ele se considerava pai que até dinheiro lhe deu para pagar reparação do automóvel e mesmo a seguir à sua morte as pessoas vieram apresentar pêsames a Autora pelo óbito do pai.

17)- O direito à identidade e a investigar a paternidade, com as possibilidades fornecidas pela evolução da ciência, cada vez mais justificam a recusa da limitação temporal do direito à propositura da acção de investigação. Assim, 18)- A sentença é nula até mesmo por o Juiz se não ter pronunciado sobre questões que devia apreciar.

” A recorrente termina as suas alegações pedindo a revogação da sentença, com a declaração de inverificação da caducidade e o prosseguimento dos autos para conhecimento do pedido formulado na petição inicial.

A recorrida ofereceu contra-alegações em que concluiu que sendo a causa de pedir da acção a posse de estado, a mesma deveria ter sido proposta até um ano após a cessação da posse de estado, não tendo a autora alegado factos que integrem o tratamento da autora por parte do indigitado progenitor no lapso temporal ocorrido entre 18 de Março de 2007 e 23 de Dezembro de 2008, pugnando...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT