Acórdão nº 1977/08-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelGOUVEIA BARROS
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: Por despacho do Senhor Secretário de Estado das Obras Públicas de 23 de Julho de 2002, publicado no D.R.II Série, nº183, de 9 de Agosto de 2002, foi declarada a utilidade pública da expropriação, com carácter de urgência, de uma parcela de terreno com a área de 6.901m2 a destacar de um prédio rústico pertencente a J. M. P. e outros, necessária à execução do sublanço Fafe-Basto da obra da A7/IC5/IC25, pelo Instituto das Estradas de Portugal (actual E. P.- Estradas de Portugal, S.A.).

Tendo-se frustrado a expropriação amigável, promoveu a expropriante a constituição de arbitragem que, por acórdão (embora assinado por apenas um dos três árbitros) junto a fls 6 a 11, fixou a indemnização em €86.219,53 a favor dos expropriados.

Adjudicada à expropriante a propriedade da parcela expropriada e notificadas as partes da decisão arbitral, requereram os expropriados a expropriação total do prédio, pretensão que foi deferida sem ter merecido qualquer oposição.

Na sequência de tal decisão foi elaborado novo laudo arbitral que fixou o valor do prédio expropriado no montante de €90.041,76.

Da decisão arbitral recorreram os expropriados para pugnar pela fixação da indemnização no montante de €264.000,00, sendo que desse valor €203.993,56 são atinentes à parcela (6.901m2) e os restantes €60.006,80 respeitam às duas parcelas sobrantes do prédio, abrangidas pela expropriação total, tendo posteriormente ampliado aquele primeiro valor para €339.807,00 (fls 442).

A expropriante defendeu a confirmação do valor fixado na decisão arbitral.

Realizadas as diligências instrutórias julgadas pertinentes e cumprido o disposto no artº64º do Código das Expropriações, foi proferida sentença fixando em €207.210,30 (duzentos e sete mil, duzentos e dez euros e trinta cêntimos) a indemnização pela expropriação total do prédio.

Inconformados com o decidido, recorrem a expropriante e também os expropriados, estes subordinadamente, para defender a alteração da sentença, invocando para tal as seguintes razões com que encerram a respectiva alegação: Da expropriante: 1.° O Acórdão de Arbitragem é qualificado, pela jurisprudência, como uma decisão jurisdicional, porquanto, face aos factos presentes nos autos e tratando-se de uma expropriação total após despacho fls. 179, se a área inicialmente expropriada corresponde a 6.901 m2 e as áreas correspondentes às partes sobrantes a nascente e a poente com a área total de 539m2 (parte sobrante a nascente) mais 382m2 (parte sobrante a poente) perfazem o total de 921 m2, então não pode a área total do prédio corresponder a 8.931 m2; 2º Requer-se por isso a anulação da sentença quanto à fixação da área total expropriada e a área das partes sobrantes, pois, a área real e efectivamente expropriada do prédio expropriado é de 7.822m2; 3.° Caso o Tribunal ad quem assim não entenda, requer-se, nos termos do artigo 712.°, n.°5 CPC, que o Tribunal a quo se pronuncie sobre se a presente expropriação é ou não total e, nos termos do artigo 712.°, n.°4 CPC, que seja realizada medição da área total do prédio, da parcela e das partes sobrantes, para aferir do real e efectivo objecto do presente processo expropriativo, pois subsistem dúvidas fundadas e objectivas que atolhem e periclitam (sic) o juízo probatório realizado pelo Tribunal a quo; 4.° O perímetro urbano do aglomerado urbano de Gandarela não coincide com o âmbito espacial da circunscrição administrativa da freguesia de Gandarela; (…) 9.° A parcela integra uma freguesia de um concelho do interior do País, sendo notório o fenómeno da desertificação, não constituindo a freguesia de Gandarela e muito menos Celorico de Basto um pólo urbano que se configure numa força agregadora e de crescimento urbano; 10.° Não há dados sociológicos que fundamentem qualquer movimento de crescimento urbano, a não ser a realidade urbanística de meados da década de 90 e dos PDM de primeira geração, que previam um crescimento irreal e desmesurado das cidades.

11.° Se mesmo nesses, é o caso do PDM de Celorico de Basto em vigor, uma área da parcela não integrava perímetro urbano, é tamanha desfaçatez que por parâmetros e fundamentos ilusórios se arrogue à mudança a curto prazo; 12.° Tendo o PDM sido aprovado a …. e a DUP emanada em 2002 e não tendo nesse período sido objecto de qualquer alteração ou revisão do PDM, nem aprovado o Plano de Urbanização, nem sido requerido a desanexação à Carta da RAN, quais os elementos que permitem inferir tal conclusão de que a delimitação da RAN seria alterada a curto prazo? Não há nenhum.

13.° O PDM assume um carácter normativo eficaz e vinculativo face a entidades públicas ou privadas, conformando materialmente e concretamente o uso, ocupação e transformação do solo legalmente admissíveis e por consequência concretiza e densifica o conteúdo do direito de propriedade, desempenhando para tal 4 funções: inventariação da realidade urbanística, conformação do território, conformação do direito de propriedade do solo e gestão do território; 14.° O Regime da RAN qualifica-se como uma restrição legal ao uso do solo; 15.° Não sendo incompatível nem oponível ao Regime da RAN a construção de estradas, desde que se assegure proporcionalidade da actuação e prossecução ao interesse público; 16.° Por isso prescreve o artigo 9.° do RJRAN excepções, restritas e balizadas pelo sub-princípio da necessidade, ao fim e uso agrícola que se impõe, não automaticamente, mas após concreta ponderação do caso; 17º Considerar a possibilidade de compensação e ressarcimento dos expropriados com base numa avaliação do solo classificado como apto para construção pelo simples facto de a parcela integrar zona de RAN e ser objecto de uma expropriação, implica reconhecer aos expropriados uma pretensão e direito arbitrário e discriminatório face aos demais proprietários não expropriados de prédios contínuos e no concelho de Celorico de Basto integrantes da RAN; 18.° Apesar de contígua à zona da RAN, o facto de existir uma área da parcela em perímetro urbano, esta não oblitera a classificação e o regime de condicionantes; 19.° Pois o alargamento do perímetro urbano e reclassificação do solo é a título excepcional e restritivo, conforme resulta dos artigos 9.°, n.°3 e 13.°, n.°3 e 72.°, n.°2, ai. b), 3 e 4 RJIGT); 20.° A dimensão do princípio da igualdade e sua garantia no âmbito do uso, ocupação e transformação do solo é concretizada pelo plano urbanístico.

21.° O plano enquanto instrumento de ordenação do espaço visa racionalizar a ocupação, uso e transformação do solo, sendo através dele que se assegura a igualdade imanente ao plano e igualdade transcendente ao plano, quer na sua vertente de igualdade perante os encargos públicos, quer na sua vertente de igualdade de oportunidades urbanísticas; 22.° A DUP em nada altera as condicionantes de uso do solo anteriormente existentes e que ao considerarmos a possibilidade de compensação neste momento pelo simples facto de a parcela integrar zona de RAN, colocamos o expropriado numa posição de favor arbitrária e injustificada quando em comparação com a situação concreta dos titulares dos prédios contínuos integrantes em RAN e que não foram expropriados; 23.° Não ficou, por isso, demonstrado minimamente a possibilidade de edificação na parcela.

24.° Não se fundou, nem justificou qualquer potencial construtivo da parcela, porquanto a realidade jurídica da parcela em termos de uso e ocupação decorre de um opção administrativa racional e vinculativa que fixa em concreto o uso e ocupação agrícola de uma determinada área do prédio, estabelecendo, assim, a fronteira entre solo urbano e solo rural; 25.° É por isso claro e objectivo que a ocupação construtiva na parcela não constitui o seu aproveitamento económico normal; 26.° Não há qualquer alteração do uso e ocupação do solo, por força da expropriação, que ponha em causa as suas aptidões agrícolas e respectiva vinculação situacional do solo integrado em RAN, pelo que o solo da parcela tem de ser classificado nos termos do artigo 25º, n°3 CE – solo para outros fins; 27.° Classificar em sentido contrário implica e significa uma violação directa e ostensiva, dos artigos 23°, n°1, n°5, 26°, n°1 do CE, bem como se funda numa interpretação inconstitucional do artigo 25°, CE que implica a violação do princípio da igualdade, princípio da proporcionalidade e princípio da justa indemnização, bem como os artigos 13°, n°1,18°,n°2 e 62°, n°2 CRP; 28.° Deve, por isso, a parcela ser classificada como «solo para outros fins» e aferido o seu valor nos termos do artigo 27° CE; 29.° Não se encontra preenchida a hipótese legal do artigo 26°, n°12 CE; 30.°Tutelar abstractamente qualquer expropriado para além do fim visado pelo preceito legal – isto é protegê-lo, contra classificações dolosas pelas entidades públicas no “mau” uso do seu poder discricionário na realização das opções de plano – equivaleria a uma...

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