Acórdão nº 2427/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães A e mulher B, residentes no lugar da ..., Viana do Castelo, vieram propor contra C e mulher D, moradores no lugar do ..., Ponte de Lima, e E, residente nesta última freguesia, no lugar do ..., a presente acção ordinária pedindo: - que se declare ter o 1.º Réu denunciado ilegalmente o contrato de cessão de exploração celebrado entre Autor e Réus; - que se declare ter o 1.º Réu violado culposa e unilateralmente tal contrato; - que se condenem os Réus a pagar aos Autores a quantia de € 18.578,88, a titulo de prestações vincendas desde o dia 1 de Janeiro de 2005 até ao termo do contrato (31 de Janeiro de 2009), acrescidas de juros legais, desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento; - que se condenem os Réus a pagar aos Autores a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros legais desde a citação até integral pagamento, a título de prejuízos resultantes da perda total do valor locativo e de trespasse do estabelecimento em causa em consequência do desvio ilícito da sua clientela para outro estabelecimento comercial construído e aberto pelo Réu; - que se condenem os Réus a pagar aos Autores a quantia de € 5.000,00, a titulo de danos morais, acrescidos de juros legais desde a citação até integral pagamento.

Os lºs. Réus deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos Autores no pagamento de € 2.340,51, acrescidos de juros legais desde a notificação do pedido até integral pagamento, para indemnizar as benfeitorias úteis por eles realizadas no estabelecimento.

Alegaram os autores, em síntese, a rescisão ilegal do contrato de cessão de exploração por parte do 1º réu, por falta de indicação de fundamentação na declaração rescisória que enviou ao autor marido; violação do contrato, pelo seu encerramento e criação dum outro estabelecimento a 300 metro que lhe retirou toda a clientela; e isto causou-lhe angústias, incómodos, que lhes afectou o sono, o comer e ficaram tristes e deprimidos.

O 1º réu, para fundamentar o pedido reconvencional alegou a realização de obras que aumentaram o valor do estabelecimento.

Foi realizada audiência de discussão e julgamento, dadas respostas à matéria de facto controvertida e prolatada sentença que julgou a acção improcedente e parcialmente procedente a reconvenção, condenando os autores a pagarem aos dois primeiros réus a quantia de 1.690,52 €.

Inconformados com o decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, formulando conclusões.

Houve contra-alegações que pugnaram pelo decidido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Das conclusões de recurso ressaltam as seguintes questões, a saber: 1 – Impugnação na vertente do facto 1.1– Dar como não escritas ou alterar de positivas para negativas as respostas dadas aos artigos 15, 16, 17 e 22 da base instrutória.

2 – Impugnação na vertente do direito 2.1 – Se a declaração resolutiva do contrato de cessão de exploração por parte do primeiro réu foi ilícita.

2.2 – Se houve violação do contrato por parte do primeiro réu quando encerrou, a 6 de Novembro de 2004, o estabelecimento e abriu outro a cerca de 300 m, retirando àquele toda a clientela e dela emergiram danos patrimoniais no montante de 50.000 €.

2.3 – Se o encerramento ilícito do estabelecimento causou aos autores danos morais calculados em 5.000 €.

2.4 – Se a prestação em dívida referente ao mês de Dezembro de 2004 foi peticionada.

2.5 – Se é devida apenas a indemnização de 1.105,60 €, pelas obras realizadas pelo primeiro réu, que exclui as respeitantes à instalação eléctrica, para as quais não tinha autorização.

Iremos conhecer das questões enunciadas.

1.1– Os autores pretendem que sejam declaradas não escritas ou alteradas de positivas para negativas as respostas aos artigos 15, 16, 17 e 22 da base instrutória. Fundamentam a sua posição na ilicitude da declaração resolutiva do contrato, por falta de fundamentação, isto é, por falta de alegação de factos concretos que integrem o conceito de falta de rentabilidade inserto na cláusula 8.ª do contrato, que foram alegados na contestação, mas que não deveriam ter sido inseridas na base instrutória, porque não fazem parte da fundamentação da declaração resolutiva. Por outro lado, dos documentos juntos aos autos não se apura o valor exacto, mas apenas por estimativa, do custo das mercadorias fornecidas ao estabelecimento para nele serem vendidas ou consumidas, cuja prova só pode fazer-se pela contabilidade do mesmo e pelos documentos que a suportam, e não por outros meios probatórios, inclusive por testemunhas.

O julgador, no que tange às respostas a estes quesitos, formou a sua convicção no depoimento da testemunha José Cunha, contabilista há 10 anos do 1.º réu, em vários documentos juntos aos autos, que depois duma análise crítica levou-o à conclusão que se fez prova suficiente, para dar as respostas positivas aos mesmos.

Estamos perante um julgamento em que não houve documentação da prova, em que a convicção do julgador se formou em vários elementos de prova, inclusive, depoimentos de testemunhas e de parte, pelo que a Relação não se encontra em pé de igualdade com o tribunal recorrido, pelo que não pode utilizar o disposto no artigo 712 n.º 1 al. a) do CPC, para reapreciar a matéria de facto em questão. Além disso, a contabilidade organizada duma empresa é um elemento de prova muito importante, mas de apreciação livre, e não vinculativo. Na verdade, a contabilidade é obrigatória para efeitos fiscais, e deve espelhar a realidade económica e financeira duma empresa, mas não funciona como um documento com força probatória plena, vinculativo. Pois, se o fosse, não estaria sujeita à fiscalização da administração fiscal, que a teria de aceitar como um dado adquirido. Daí que o julgador, para o caso em apreço, não estivesse apenas vinculado ao resultado da contabilidade, mas a todos os meios de prova permitidos que o levassem a formar, devidamente, a sua convicção. Em face disto, a Relação não irá reapreciar a matéria de facto impugnada.

Quanto às declarações resolutivas do contrato temos a dizer apenas que são relevantes para a interpretação da licitude ou não da resolução do contrato e nada mais. Pois, uma coisa é a eficácia das declarações, outra a matéria alegada na contestação e vertida na base instrutória. Porventura a sua análise jurídica no sentido de que não contêm os fundamentos de facto exigidos leve à irrelevância da matéria de facto vertida nos quesitos em discussão, com vista à decisão sobre o mérito da causa. Mas isso é uma questão de direito, que será discutida noutra sede e não aqui, no momento da fixação da matéria de facto impugnada.

Assim, não vamos alterar as respostas aos quesitos nem os considerar como não escritos, porque não há razões jurídicas para o fazermos.

Damos como assente a matéria de facto da decisão recorrida, que passamos a transcrever: A) - Por contrato celebrado em 15 de Janeiro de 2002, os Autores cederam ao Réu C a cessão de exploração de um estabelecimento comercial de talho, denominado “Talho ...”, situado no rés-do-chão do prédio urbano sito no lugar de ..., Viana do Castelo, inscrito na respectiva matriz predial sob o n.º145, de que são donos.

B) - A cessão de...

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