Acórdão nº 655/06.2TBCMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelMANSO RAÍNHO
Data da Resolução19 de Janeiro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª Secção Cível da Relação de Guimarães: MA intentou, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Caminha, acção com processo na forma ordinária contra SR e marido LR, mas a quem a Autora atribuiu outro nome, na realidade o nome do pai da Ré) e contra MT e marido AT, peticionando a condenação solidária dos demandados no pagamento da quantia de €145.818,89, acrescida de juros de mora, e ainda na quantia mensal de €1.250,00, desde Setembro de 2006, acrescida de juros.

Alegou para o efeito, em síntese, que é titular de um estabelecimento comercial instalado em prédio dos Réus, e de que faz parte o direito ao arrendamento sobre o local. Sucede que por falta de obras que o locado e o prédio em geral necessitavam, obras essas da responsabilidade dos Réus, a Autora encerrou temporariamente o locado em 1998. Por força das condições do locado e do encerramento temporário, a Autora deixou de apurar no seu comércio aquilo que normalmente apuraria. Aos Réus compete reparar tal prejuízo.

Contestaram os Réus, concluindo pela improcedência da acção.

Disseram, muito em síntese e vistas as contestações de forma conjugada, desconhecer e impugnar a existência de quaisquer deficiências no locado, impeditivas do seu desfrute nos termos alegados pela Autora. Impugnaram, outrossim, a existência de prejuízos para a Autora. Mais deduziram reconvenção, peticionando a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no encerramento do locado desde 1998 e no não pagamento das rendas em devida forma. Ainda pediram que se declarasse extinto o contrato por caducidade derivada da perda da coisa locada.

A Autora replicou, concluindo pela improcedência dos pedidos reconvencionais.

Seguindo o processo seus termos, veio a final a ser proferida sentença que julgou improcedente a acção e parcialmente procedentes as reconvenções, sendo declarado resolvido o contrato de arrendamento e a Autora condenada a despejar o local.

Inconformada com o assim decidido, apela a Autora.

Da sua alegação extrai as seguintes conclusões: 1ª.- O presente recurso incide sobre matéria de facto e matéria de direito.

  1. - A prova (documental) junta aos autos demonstra o conhecimento efectivo que os R.R. possuíam do estado do locado e das obras de que este necessitava, pelo que se impõe a alteração da douta decisão proferida quanto à matéria de facto, bem como a ampliação da mesma.

  2. - A recorrente pretende ver sindicada por esta Veneranda Relação a decisão proferida pelo Mmo. Juiz “a quo” quanto à matéria de facto levada aos quesitos 3º, 5º e 39º da base instrutória.

  3. - Quanto ao quesito 3º (dado como não provado), os elementos de prova de fls. 27, 28, 29 e 136 dos autos impunham decisão diversa.

  4. - Tais concretos meios probatórios atestam que os R.R. requereram em 13/09/2001 à Câmara Municipal de Caminha (CMC), e junto do processo de obras n.º 362/94, que lhes fosse passada e enviada “certidão do AUTO DE VISTORIA realizado no r/ch do prédio urbano sito na Rua Conselheiro Miguel Dantas, n.º … - Caminha - Proc. n.º 3….” 6ª.- O auto de vistoria requerido, porque à data não havia outro, é o de fls. 22 e 23 dos autos, que se reporta à vistoria realizada ao arrendado no dia 29/11/1994 - vd. alíneas G) e H) dos Factos Provados.

  5. - Ou seja, já nessa data, tinham os R.R. conhecimento não apenas de que corria termos pela CMC um processo de obras tendo por objecto o imóvel dos autos, como também de que esse prédio tinha sido já objecto de uma vistoria pelos serviços municipais.

  6. - E com a recepção desse auto de vistoria ficaram os R.R. na posse do douto despacho a que se refere a alínea I) dos Factos Provados, que se encontrava inserto naquele auto (vd. fls. 23 dos autos).

  7. - Impõe-se a este Venerando Tribunal o dever de sindicar a douta decisão recorrida, nos termos do artigo 712º, n.º 2 do CPC, respondendo ao quesito 3º da base instrutória nestes (ou semelhantes) termos: “Provado apenas que em 13/09/2001 as R.R. requereram à Câmara Municipal de Caminha, no âmbito do processo de obras n.º 362/94, que lhes fosse passada e entregue certidão do auto de vistoria referido nas alíneas G), H) e I) dos Factos Provados.” 10ª.- Acaso se entenda que essa resposta extravasa ou excede aquilo que é perguntado, sempre imporá proceder-se ao aditamento à matéria de facto assente do teor dos referidos documentos de fls. 27, 28 e 29 (conjugados com o de fls. 138), ou, considerando tratar-se de matéria controvertida e carecida de prova, o seu apuramento em novo julgamento para que a A. (recorrente) possa produzir sobre a referida matéria a respectiva prova - cfr. artigos 712º, n.º 4, in fine, e 650º, n.º 2, alínea f), do CPC.

  8. - Quanto ao quesito 5º da base instrutória, a douta decisão quanto a ele proferida está em manifesta contradição com o ofício de fls. 628 dos autos (vd. alínea b) desse ofício), do qual decorre que a Ré “SR foi notificada, nos termos legais, para a realização da vistoria em 06.02.2003, pelas 14h30, informando-se a mesma da possibilidade de indicação de peritos até à véspera da vistoria (ofício 357/SO/SV, a fls. 29)”.

  9. - O facto de o parecer referido em O) dos Factos Provados ter mandado repetir as notificações expedidas ao proprietário do imóvel por preterição de formalidades legais não implica que a notificação a que se refere o ofício de fls. 628 tenha sido omitida, mas que, tendo sido efectuada, não observou as formalidades previstas na lei.

  10. - O documento de fls. 628 dos autos impõe a alteração da resposta dada ao quesito 5º, de modo a que dele passe a constar que: “Provado apenas que a Ré SR foi convocada para essa vistoria.” 14ª.- Ao responder ao quesito 39º da base instrutória, o Mmo. Juiz “a quo” deu apenas como provado o que consta das alíneas F) a O) da matéria assente e nas respostas aos quesitos 3º a 7º da matéria controvertida, que nada dizem a respeito do que efectivamente se perguntava.

  11. - Há nos autos elementos probatórios que permitem responder a esse quesito, concretamente a notificação de fls. 328 e 329 dos autos, com data de 15/06/2001, recepcionada pela Ré SR em 18/06/2001 (fls. 320), documentos não impugnados pelos R.R., quer quanto ao seu conteúdo, quer quanto à sua genuinidade.

  12. - Através dessa notificação, a A. deu conhecimento à Ré SR e demais herdeiros dos vícios que afectavam o locado, da necessidade de realizar obras que os debelassem, do encerramento do estabelecimento comercial que funcionava no locado face ao estado de degradação do imóvel e dos prejuízos que os apontados vícios causavam no comércio da Autora.

  13. - Impõe-se, naturalmente, uma nova resposta ao quesito 39º da base instrutória, consentânea com os documentos de fls. 328, 329 e 330 dos autos, nestes ou semelhantes termos: “Provado que a Autora informou a Ré SR, por carta registada (com A/R) datada de 15/06/2001, recebida em 18/06/2011.” 18ª.- Antes de se debruçar sobre o pedido de resolução invocado pelos R.R., o Mmo. Juiz “a quo” tinha que começar por indagar da tempestividade do exercício desse direito pelos senhorios.

  14. - Não consta da matéria de facto em que data tomaram os R.R conhecimento do encerramento do locado pela A.

  15. - Há nos autos elementos inequívocos que permitem a este Venerando Tribunal responder à matéria de facto que não foi conhecida pela 1ª instância, nos termos do artigo 712º, n.º 1 do CPC, na redacção aqui aplicável, concretamente o citado documento de fls. 328 e 329 dos autos, no qual a A. informou os R.R de que mantinha o estabelecimento encerrado “já que não pode abri-lo ao público no estado de total degradação em que se encontra”.

  16. - Face ao documento de fls. 330 dos autos, constata-se que a Ré SR foi notificada desse documento em 18/06/2001.

  17. - O encerramento do locado foi confirmado aos R.R. pelo ofício da CMC de 24/10/2001, a fls. 193 dos autos, documento este que foi junto aos autos pelos próprios R.R.

  18. - Por se tratar de matéria indispensável para a boa decisão da causa, deve ordenar-se a ampliação da matéria de facto, aditando aos Factos Provados o teor dos documentos de fls. 328, 329 e 330 dos autos, nos termos do citado artigo 712º, n.º 1 do CPC, inserindo-se aí uma nova alínea, com o seguinte ou semelhante teor: “Os R.R. tomaram conhecimento do encerramento do estabelecimento que funcionava no locado com a recepção da notificação de fls. 328, 329 e 330 dos autos, ocorrida em 18/06/2001”.

  19. - Ou considerando tratar-se de matéria controvertida e necessitada de prova, deve ordenar-se o apuramento desses factos em novo julgamento em novo julgamento para que a A. (recorrente) possa produzir sobre a referida matéria a respectiva prova cfr. artigos 712º, n.º 4, in fine, e 650º, n.º 2, alínea f), do CPC.

  20. - Assim fixada (estabilizada) a matéria de facto (para o caso de não se ordenar a repetição do julgamento), impõe-se fazer agora a aplicação do direito a esses factos.

    Da caducidade: 26ª.- Tendo os R.R. tomado conhecimento do encerramento do estabelecimento que funcionava no locado em 18/06/2001 (fls. 330), o prazo de caducidade previsto no artigo 65º, n.º 1 do RAU, começou a correr no dia seguinte e terminou no dia 19/06/2002.

  21. - O direito dos R.R. em despejar a A. com fundamento no artigo 64º, n.º 1, alíneas d) e h) do RAU só foi exercido judicialmente com o oferecimento da sua contestação nestes autos, ou seja, em 3/10/2006, quando aquele direito já se tinha extinguido por caducidade.

  22. - À mesma conclusão se chega se reportamos o conhecimento dos R.R. à recepção do ofício de fls. 193 dos autos ou à data da realização da vistoria a que se referem as alíneas Q) e R) dos Factos Provados, realizada em 6/06/2005, na qual os R.R. fizeram-se representar pelo seu perito (vd. resposta ao quesito 7º e fls. 79 a 81 dos autos).

  23. - A caducidade é apreciada oficiosamente e pode ser alegada em qualquer fase do processo - cfr. artigo 333º do CC.

    Sem prescindir, Da não verificação dos pressupostos previstos no artigo 64º, n.º 1, alínea h) do RAU: 30ª.- Está assente que em 29/11/1994, o prédio apresentava os vícios...

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