Acórdão nº 2952/08.3TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDO OLIVEIRA AZEVEDO
Data da Resolução06 de Março de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães RELATÓRIO H.. e M.., no Tribunal Judicial de Barcelos, 2º Juízo Cível, interpuseram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra Ma.. e N.., todos melhor identificados nos autos, peticionando que seja judicialmente reconhecido o incumprimento do definitivo do contrato-promessa de trespasse, declarada a perda do sinal prestado pelos réus, ordenada a restituição definitiva à sua posse do estabelecimento comercial, e a condenação dos RR a pagarem-lhes a quantia de 14.598,00 €, a título de indemnização pelos prejuízos causados.

Fundamentaram-se, em síntese, que: a) por documento particular, datado de 12.07.2007, prometeram trespassar aos RR, pelo preço de 50.000,00 €, e estes prometeram aceitar, o estabelecimento de que são proprietários instalado na fracção autónoma que melhor identificam na petição inicial, estabelecimento esse que funciona em local arrendado mediante o pagamento de uma renda mensal de 500,00 €; b) segundo o mesmo acordado tal preço seria pago em quatro prestações, conforme melhor consta também no contrato oferecido aos autos constante de fls. 12 a 16 do apenso, pelo que a data prevista para a outorga do contrato definitivo seria 01.09.2009; c) os RR procederam apenas ao pagamento da primeira prestação e deixaram de pagar a renda ao senhorio, estando em dívida as rendas desde Junho de 2008, o que os obrigará a desembolsar a quantia de 2.250,00 €; d) os RR que recusam a entrega do estabelecimento, têm determinado a perda de clientela e a consequente redução da facturação diária, o que corresponde a um prejuízo, nos últimos 5 meses, de 11.500,00 € e para além de delapidarem bens fizeram desaparecer outros; e) perderam completamente interesse na celebração do contrato definitivo, para além dos RR quando prometeram a restituição do estabelecimento para Março de 2008, declararam peremptoriamente não estarem mais interessados na aquisição do mesmo, sendo que declaração categórica da intenção de não celebrar o contrato prometido constitui incumprimento definitivo do contrato-promessa; e, f) em virtude de procedimento cautelar no dia 05.08.2008, foi dado cumprimento a mandado para restituição provisória da posse do estabelecimento comercial.

Citados, os RR contestaram, alegando em súmula, que: a) havendo anomalias existente em alguns dos equipamentos e inundação da cozinha retiveram o pagamento da segunda mensalidade; b) os AA, contrariando a obrigação que tinham assumido, recusaram-se a pagar as obras necessárias para a obtenção da competente licença de utilização para o referido estabelecimento comercial, o que impossibilitou o cumprimento do contrato-promessa; e, c) para além disto, negaram, parcialmente, os factos alegados na petição inicial, designadamente afirmando que pagaram as rendas até ao fim do mês de Julho de 2008.

Ainda com estes factos e aduzindo a obrigação de restituição da quantia de 5.000,00 € recebida aquando a assinatura do contrato, os montantes pagos por si em artigos para o estabelecimento nos dias 2 e 5 de Agosto de 2008, sendo que neste segundo dia ficaram desapossados da casa e com todo o artigo por comercializar, no montante de 706,51 €, e a expectativa de realizarem naquele mês de Agosto, deduzidas as despesas, um montante aproximado de 7.500,00 €, deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos AA a reconhecerem que por culpa deles não se realizaram obras, com a consequente não obtenção da licença, e a pagarem-lhes a quantia de 13.206,51 €.

Os AA replicaram, mantendo a sua posição inicial e respondendo à reconvenção.

Foi elaborado despacho saneador, nessa oportunidade tendo havido lugar à selecção da matéria de facto assente e da base instrutoria, do que não houve reclamações.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, altura em que foi dada resposta à matéria de facto constante da dita base e não tendo havido também reclamações.

Depois proferiu-se sentença, assim, julgando-se a acção não procedente e a reconvenção parcialmente procedente, em consequência, absolveram-se os RR dos pedidos e condenaram-se os AA a pagarem aos RR a quantia de 5,000,00 €, ordenando a restituição definitiva aos primeiros da posse do estabelecimento comercial, bem como absolvendo-se os mesmos do demais peticionado pelos RR.

Inconformados, desta sentença vieram os AA recorrer, recurso que foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, imediatamente e com efeito meramente devolutivo (fls 296).

Das respectivas alegações os AA extraíram as seguintes conclusões: 1- Discordam os apelantes da resposta «Provado» que o Tribunal de 1ª instância deu à matéria dos quesitos 26º, 29º e 30º, os quais versavam sobre a alegada recusa de os apelantes fazerem as obras a que se tinham comprometido, segundo o contrato-promessa de trespasse que haviam celebrado com os apelados.

2- O depoimento da testemunha A.., que o Mmº Juiz a quo reputou de isento e objectivo, não foi de forma alguma isento e esteve muito longe de ser objectivo.

3- A testemunha não afirmou que o apelante se recusou a fazer ou a custear as obras. O que a testemunha afirmou – e é bem diverso! – foi que, nessa única reunião a que assistiu e em que participou, enquanto o apelante tentava receber a parte do preço do trespasse já vencida, o apelado tentou renegociar o preço do trespasse, pedindo uma baixa muito significativa no preço em troca de fazer ele próprio as obras.

4- É de exigir um maior cuidado na apreciação da prova, quando o tribunal está perante um único depoimento testemunhal, ainda por cima desacompanhado de outros meios de prova. Neste caso, com uma testemunha parcial, que está de relações cortadas com uma das partes, que tem interesse directo no estabelecimento em causa nos autos, que saltou de um lado para o outro, que de amigo duma parte passou a amigo da outra, de frequentador do restaurante dum, passou a frequentador confesso do restaurante do outro, não pode haver ingenuidade na análise do depoimento. O depoimento é claramente insuficiente.

5- Analisando o depoimento, vê-se que nunca a testemunha falou em que o autor haja afirmado que as obras não eram de sua responsabilidade. Também nunca a testemunha ouviu o autor dizer que não procedia ao pagamento das obras. Logo, o quesito 26 teria de ser considerado «não provado».

6- Quanto aos quesitos 29º e 30º, não se provou qual o fim da reunião e a única coisa que foi afirmada resulta em que a reunião visou a renegociação do preço do contrato-promessa.

7- E a atender ao depoimento da testemunha, provado terá ficado apenas que o autor não aceitou renegociar o preço em troca da desoneração da obrigação de fazer obras, pelo que devem os quesitos 26º, 29 e 30º ser considerados «não provados».

8- Os Réus/Recorridos já há muito que não cumpriam com as suas obrigações, tendo os mesmos deixado de pagar as rendas inerentes ao estabelecimento comercial - o que por seu turno, gerou a mora dos Réus/Recorridos.

9- Os Réus/Recorridos demonstraram vontade em resolver o contrato em causa.

10- O comportamento dos Réus/Recorridos levou à perda de interesse dos Autores/Recorrentes, no que diz respeito à celebração do contrato definitivo, pois, claramente, a demora do cumprimento por parte dos Réus/Recorridos fez desaparecer o interesse dos Autores/Credores nas prestações em falta, pelo que estamos perante o incumprimento definitivo dos Réus/Recorridos, de acordo com os artigos 441.º e 442.º do Código Civil.

11- As partes acordaram, no momento da celebração do contrato-promessa, nos prazos limite para o cumprimento das prestações inerentes ao mesmo; os quais não foram cumpridos pelos Réus/Recorridos, pelo que, perante o incumprimento definitivo, os Apelantes têm o direito de reter, para si, o valor pecuniário do sinal – EUR. 5.000,00 – de acordo com o n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil.

12- O comportamento dos Réus/Recorridos, nomeadamente desde Abril de 2008, determinou a perda de clientela do estabelecimento e a consequente redução da facturação diária, que acarretou graves prejuízos para os Autores/Recorrentes, que receberam um estabelecimento comercial de valor muito inferior ao valor que o mesmo tinha antes da celebração do contrato-promessa de trespasse constante nos autos.

  1. Face ao comportamento acima descrito, os Réus/Recorridos faltaram culposamente ao cumprimento das obrigações acordadas, tornando-se, pois, responsáveis pelos prejuízos que causaram aos Autores/Recorrentes.

  2. Logo, há que restabelecer o “status quo ante”, ou seja, as partes têm que ficar na posição que estariam caso não tivesse sido celebrado o contrato.

  3. Assim sendo, de acordo com a interpretação do n.º 2 do artigo 801.º e do artigo 442.º, ambos do Código Civil, à resolução do contrato-promessa cumula-se a indemnização pelos danos provocados no estabelecimento comercial a restituir.

  4. Assiste assim aos Autores/Recorrentes o direito de receberem o sinal no valor de EUR 5.000,00, bem como o valor a título indemnizatório pelos danos causados de EUR 14.598,00.

Terminam propugnando pela alteração das respostas à matéria de facto, considerando não provados os factos dos itens 26º, 29º e 30º, conforme supra exposto, e pela revogação da douta sentença recorrida.

Foram apresentadas contra-alegações, nas quais, se concluiu do seguinte modo: 1- Por um lado, a referida testemunha é o proprietário da fracção e consequentemente senhorio, tendo, sem hesitação, declarado as rendas em divida e no momento em que foram pagas.

2- Assistiu à reunião, informou pormenorizadamente o que ali se passou na presença do apelante, apelado e Eng. .. e até se prestou a também ajudar, esbarrando, porém, na irredutibilidade da posição do apelante em não custear as obras como tinha assumido.

3- Frequentou, outrossim, o estabelecimento de restaurante na gerência do apelado e apelante e este vê nesta frequência que revela imparcialidade, ingenuidade na análise do depoimento! 4- O incumprimento definitivo do contrato deveu-se ao...

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