Acórdão nº 9041/07.6TBBRG-AB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDO OLIVEIRA AZEVEDO
Data da Resolução06 de Março de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães RELATÓRIO No Processo de Insolvência de que estes autos são apensos, do 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Braga, proposto por Barclays Bank PLC, em 11.12.2007 (fls 246), requereu-se contra S.., Ldª, de que foram gerentes N.. e esposa M.. (fls 43 a 68), todos melhor identificados nos autos.

A Requerida, efectivamente, foi declarada insolvente, conforme teor de fls 246 a 257, que se dá aqui por reproduzido, ou seja, por sentença de 30.09.2008, transitada em julgado no dia 18.02.2009 e onde foi também declarado aberto o incidente pleno de qualificação de insolvência, nos termos do artº 36º, alª i) do CIRE (diploma a que pertencerão doravante os preceitos legais sem qualquer outra indicação).

Não se mostra que qualquer interessado tenha alegado o que tivesse por conveniente para efeito dessa qualificação, nos termos do artº 188º, nº 1.

Veio então a Administradora da Insolvência emitir parecer no sentido de que a insolvência deve ser considerada culposa, nos termos do artº 186º, nºs 1, 2 e 3, responsabilizando os citados gerentes, dizendo, em súmula: a gerência da Insolvente nos três últimos três exercícios económicos, à data da sentença que declarou a insolvência, foi exercida pelos mesmos; desde 2007 havia abandono de actividade, não obstante saberem que a Insolvente se encontrava despida praticamente de todos os seus activos não diligenciaram pela sua apresentação ao Tribunal, e a mesma não dispunha de encerramentos contabilísticos e fiscais relativos aos exercícios económicos dos anos anteriores, por falta de inventários; só lhe foi apresentado um Balancete Analítico do qual resultava a falta de conciliação de contas, existências na ordem de 6.887.767,16 €, mas só sendo apreendidos bens avaliados em 38.000,00 €, imobilizado com valor de 2.091.598,25 € mas do inventário da massa apresenta-se o valor de 136.473,00 €, o equipamento de transporte com o valor de 233.444,54 € mas apenas foram apreendidos veículos em estado de sucata, e o equipamento básico, composto por máquinas, com saldos de 853.362,83 €, do que nada foi apreendido; assim, o património/activo foi alienado ou dissipado, apenas permanecendo algumas existências e seis fracções urbanas de valores exíguos, arrendadas entretanto pela gerente, depois da data da sentença que declarou a insolvência, e cujos recebimentos revertiam a favor do seu filho; a Insolvente também não entregou quaisquer bens que havia adquirido em regime de leasing bem como máquinas objecto de contrato de aluguer relativamente ao qual o valor em dívida ascende a 1.028.253,66 €; os créditos reconhecidos ascendem a 5.939.601,82 € dos quais 2.625,699,41 € são referentes a impostos e coimas e 1483.225,51 € é crédito bancário; foi prosseguida uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência; e, nunca lhe prestaram qualquer colaboração nem as contas da Insolvente foram aprovadas e depositadas na Conservatória do Registo Comercial, sendo ambos favorecidos por toda esta situação.

Este parecer foi com vista ao Mº Pº, nos termos do artº 188º, nº 3, que pronunciou-se no mesmo sentido, pelo que, concluindo também, que “ … a insolvência dos autos deve ser qualificada como culposa e que, por lhe ser imputável uma conduta contrária à exigível no sentido de se furtar ao cumprimento das suas obrigações devem ser afectados pela qualificação da insolvência como culposa, os gerentes N.. e M..”.

Ordenou-se o cumprimento do disposto no nº 5 do artº 188º com a notificação da Insolvente e a citação dos mencionados N.. e M.. a fim de se oporem à qualificação da insolvência.

Foi dispensada a citação de N.., ao abrigo do artº 12º, nº 3.

Foi citada M...

Não foi deduzida qualquer oposição Foi proferido despacho saneador, dispensando-se a elaboração da base instrutória.

Os autos prosseguiram com a realização de audiência de julgamento, na qual se decidiu sobre a matéria de facto, e proferiu-se sentença qualificando-se a insolvência da S.., Ldª, como culposa, ao abrigo dos artºs 186º, nºs 1 e 2, alªs a), d), h) e i) e 83º, nº 3, e, ao abrigo do artº 189º, nº 2 declaram-se a antiga gerente M.. e o sócio-gerente N.. afectados por essa qualificação e inibidos para o exercício do comércio durante o período de oito anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, determinando-se a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos por eles e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.

Desta sentença M.. e N.. recorrem (fls 178), recurso admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (fls 186 e 195).

Rematou-se as alegações com as seguintes conclusões: 1- A matéria de facto provada é insuficiente para o Tribunal ‘quo’ qualificar a insolvência como culposa com fundamento na alínea h) do n.º2 do artigo 186º do CIRE.

2- Nesta citada norma legal, o que está em causa é o incumprimento por parte dos administradores da obrigação de manter a contabilidade organizada, manter uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade, o que, no modesto entendimento da Recorrente, da factualidade provada, nada permite tirar essa conclusão.

3- No circunstancialismo provado, uma vez que a contabilidade não se mostra organizada mas foi facultado pelo TOC à Exma. Sr. Administrador de Insolvência um balancete analítico à data de Junho de 2007, não se pode dizer que existisse incumprimento em termos substanciais desse dever.

4- Sem prescindir, face à matéria de facto provada, sempre deveria a inibição aplicada à Recorrente ser determinada pelo mínimo legal de dois anos (artigo 189º, alínea c) do CIRE).

5- Não ficou provada qualquer actuação da Recorrente que seja flagrantemente reprovável ou altamente censurável, apta a causar ou a agravar a situação de insolvência.

6- Não ficaram provadas quaisquer condutas, por acção ou por omissão, da afectada Recorrente que tenham sido determinantes da declaração da insolvência, nomeadamente nada se provou sobre o circunstancialismo em que ocorreu o desaparecimento e/ou dissipação das existências e imobilizados identificados no balancete analítico de Junho de 2007, nem que a Recorrente tenha sido autora desses actos ou tenha de alguma forma neles participado.

7- Consta da factualidade provada que a Recorrente arrendou quatro das fracções apreendidas para a massa insolvente e que as rendas eram depositadas numa conta bancária cujo titular era o seu filho mas que tais actos foram praticados em data posterior à declaração da insolvência.

8- Não resulta dos Factos Provados que a eventual violação da obrigação de manter uma contabilidade organizada tenha sido causa da insolvência.

9- O dever de requerer a declaração de insolvência não foi incumprido pela Recorrente, na medida em que a insolvente deixou de ter viabilidade económica a partir de Agosto de 2007, por ser nessa altura que cessou a sua actividade, e a Recorrente renunciou à gerência a 05.10.2007, pelo que nessa altura ainda não tinha decorrido o prazo a que se reporta o artigo 18º, nº 3 do CIRE, para que se possa presumir que a mesma tinha conhecimento da situação de insolvência.

10- Por último, a Recorrente não violou o dever de colaboração, já que quando foi declarada a insolvência e solicitada a colaboração da Recorrente, esta não era gerente há mais de um ano, nem sequer sócia da insolvente.

11- Neste sentido, ao qualificar como dolosa a insolvência da “S.., Lda.” e ao declarar a ex-gerente, aqui Recorrente, inibida por oito anos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, a Sentença recorrida violou o disposto no artigo 186º e 189º do CIRE, artigo 12º do Código Civil.

Termina-se pretendendo que a sentença seja revogada e substituída por outra que não qualifique a insolvência como culposa com fundamento na alínea h) do nº 2 do artigo 186º do CIRE, assim como estabeleça à Recorrente o período de dois anos de inibição para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa.

O Mº Pº respondeu, aduzindo as seguintes conclusões: 1- No nº 2 do artº 186° do CIRE prevêem-se os casos em que a insolvência deve ser sempre considerada culposa.

2- Consagra-se, naquele nº 2 “uma presunção “juris et de jure”, inelidível por não admitir prova em contrário levando as diversas situações aí contempladas, de forma inexorável, à atribuição de carácter culposo à insolvência” - acórdão da Relação do Porto de 27/11/2007 in www.dgsi.pt.

3- Um dos casos em que a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT