Acórdão nº 2585/18.6T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

Relatório P. V.

veio propor contra X - Creche, Jardim de Infância, Lda., a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 16.958,39 € (dezasseis mil novecentos e cinquenta e oito euros e trinta e nove cêntimos), acrescida dos juros vincendos até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que foi sócia e gerente da ré, tendo em 10-12-2015 cedido a quota e renunciado à gerência. Durante o período em que foi sócia e gerente da ré, em diversas ocasiões, emprestou dinheiro à ré conforme cópias de documentos que junta, que esta ainda não devolveu apesar de por diversas vezes interpelada.

A ré deduziu contestação através da qual impugnou os factos alegados pela autora. Como questão prévia, solicitou a apensação da ação n.º 2557/18.0T8VRL a correr os seus termos no J2 do Juízo Local Cível de Vila Real, através da qual a autora pede a condenação do atual sócio gerente da ré a pagar-lhe a quantia de 5.000,00 € relativa à transmissão da quota da sociedade. Mais alegou, no essencial, que se é verdade que, em alguns momentos, a autora efetuou entregas de quantias monetárias à ré, também é verdade que se encontra ressarcida de todos os pagamentos, conforme documento de cessão de quotas e renúncia à gerência. Alegou, ainda, que nunca foi interpelada para pagamento de qualquer quantia e impugnou os documentos apresentados pela autora. Conclui pela condenação da autora como litigante de má fé.

A autora apresentou articulado de resposta (ref.ª citius 1874855), opondo-se ao pedido de apensação de ações, responde à matéria de exceção e ao incidente de litigância de má fé deduzido pela ré, requerendo, por seu turno, a condenação da ré como litigante de má fé.

Findos os articulados, foi desatendida a requerida apensação de ações, dispensada a audiência prévia e proferido saneador, com fixação do objeto do processo e enunciação dos temas da prova, o qual não foi objeto de reclamações.

Realizou-se a audiência final, após o foi proferida sentença julgando a ação improcedente, absolvendo a ré do peticionado pela autora, mais julgando improcedentes os pedidos de condenação como litigantes de má-fé e deles absolver a autora e a ré.

Inconformada com a sentença proferida dela apelou a autora, pugnando no sentido da revogação da sentença, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1.ª – A Douta decisão recorrida pronunciou-se pela improcedência total da acção e esteve subjacente a esta decisão o entendimento por parte do Tribunal a quo de que a Apelante não terá demonstrado os factos constitutivos do direito por si alegado, onerando-a com o ónus da prova, desde logo, com o ónus de demonstrar a existência de um ou mais contratos de empréstimo feitos à Ré, e assim provar que entregou o dinheiro à Ré, que estava obrigada à sua restituição; 2ª – Em respeito pelo que consta na motivação da Douta Sentença recorrida, esteve na génese da decisão de improcedência proferida essencialmente, dois aspetos, a saber:

  1. O facto de o Tribunal a quo ter considerado que “A. C.” à data da subscrição dos documentos 3 a 7 juntos com a p.i., que titulam a dívida/mútuo não era gerente da Ré, não tinha poderes para a vincular com a sua assinatura; b) O ónus da prova que o Tribunal a quo entendeu que impendia sobre a Apelante, fundamentando-o no facto de a mesma estar processualmente obrigada a provar a existência do mútuo, por ser um facto constitutivo do direito alegado; 3ª – Uma vez que existiu a gravação dos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento é possível a impugnação da decisão quanto à matéria de facto, nos termos do disposto no artigo 640º do C.P.C., com a inerente reapreciação da prova quanto à matéria de facto e com a consequente alteração da decisão proferida relativamente à matéria de facto, implicando a modificação da mesma, quer pela ampliação da matéria de facto provada, quer pela redução/alteração da matéria de facto não provada, em relação a concretos factos identificados na Douta Sentença recorrida, alteração que se pretende, conforme melhor resulta da motivação de recurso; Designadamente, pela reapreciação do depoimento prestado pelas testemunhas S. M. e H. C., registadas através do sistema de gravação digital, disponível na aplicação informática CITIUS em uso nos tribunais, na audiência de julgamento realizada, no dia 14/04/2021, cuja audição se revelar pertinente para a descoberta da verdade material, na medida em que a respetiva apreciação impõe decisão diferente daquela que foi proferida pelo Tribunal a quo.

    1. – No que concerne à modificação da matéria de facto, a mesma passará pelo seguinte: a) A alteração/ampliação dos factos constantes da matéria de facto provada, devido a erro notório na apreciação da prova, uma vez que a prova documental em que se sustentou o Tribunal a quo, (certidão permanente do registo comercial da Ré) revela uma factualidade diferente daquela que o Tribunal deu como provada, estão em causa os factos constantes da douta sentença recorrida, vertidos nos pontos 2, 3 e 9 que se encontram integrados entre os factos considerados «PROVADOS» que deverão sofrer uma alteração na respetiva redação, conforme melhor resulta da motivação de recurso, para a qual se remete; b) Pela ampliação da matéria de facto provada, passando a incluir dois novos factos, que foram incorretamente julgados como não provados, trata-se dos factos identificados nos pontos 1 e 2 do elenco dos factos “não provados” que deverão ser eliminados de entre os factos não provados para passarem a integrar os factos provados; consequentemente, deverá ser ampliada a matéria de facto provada, com a inclusão de novos factos, designadamente, com a factualidade vertida nos factos não provados 1 e 2, conforme melhor descrito na motivação do presente recurso; 5ª – No que concerne ao aspeto mencionado na alínea a) da conclusão anterior, o raciocínio do Tribunal a quo constitui um erro notório na apreciação da prova que terá estado subjacente à opção do Tribunal a quo ao considerar que “A. C.” à data dos factos alegados na p.i. não seria gerente da Ré. Ora, a forma de obrigar qualquer sociedade comercial, que contempla o exercício da gerência, extrai-se exclusivamente da análise da certidão permanente da sociedade comercial em apreço, no caso concreto, da Ré, que foi junta aos autos (cfr. doc. 1 junto com a p.i.).

      Da análise da certidão permanente junta aos autos resulta, com meridiana evidência, que o referido “A. C.” é e sempre foi, gerente da Ré, o que se verifica desde a data da constituição da sociedade comercial, nunca tendo renunciado à gerência, ou cessado funções de gerência.

    2. – Refere-se que para além da certidão da conservatória do registo comercial não ter merecido a devida análise por parte do Tribunal a quo, na medida em que, ao contrário do que aí é declarado, A. C. sempre foi gerente da Ré e esta é a realidade societária que encontra reflexo no identificado documento, a redação do facto provado 9 da douta sentença é a transcrição, ipsis verbis, do artigo 40º da contestação da Ré, que contraria os averbamentos vertidos na certidão permanente da Ré, sendo o único meio de prova idóneo para demonstrar sobre quem recai a nomeação de gerente e quem detém o exercício da gerência, conforme melhor se desenvolveu na motivação de recurso, além do mais, com transcrição do teor da certidão permanente.

    3. – É aliás o que decorre da análise da certidão da conservatória do registo comercial da Ré junta como documento 1 com a p.i., a fls. 91, donde, de forma inequívoca da AP 2/20080701 – constituição de sociedade, designação de membro(s) de órgão(s) social (ais), na parte respeitante aos “SÓCIOS E QUOTAS” está averbada a nomeação de “A. C.” como gerente, nomeação que existe desde a constituição da sociedade, funções que sempre exerceu de forma ininterrupta, não existindo nenhum averbamento na referida certidão que ateste uma cessação de funções ou até uma renúncia à gerência. Pelo que, o teor dos factos provados 2, 3 e 9 estão incompletos, não retratam com rigor a realidade registada na Conservatória do Registo Comercial em relação à sociedade Ré.

    4. – Também, não obstante resultar da motivação da Douta Sentença recorrida, erradamente, que “A. C.” não era gerente na data em que a Apelante invoca a existência dos empréstimos, reforçando a tese que vingou na decisão proferida, certo é que este facto não integra nem a matéria de facto considerada provada, nem a considerada não provada, sendo de presumir que tal factualidade está implícita na redação dada aos factos provados 2, 3 e 9 da douta sentença recorrida, que assim se impugnam, que deverão ser objeto de ampliação da matéria de facto vertida nos referidos pontos, nos termos melhor explicitados na motivação de recurso.

    5. – No que a esta concreta factualidade diz respeito, existe um erro notório na apreciação da prova, desde logo, na apreciação da certidão permanente da sociedade Ré, emitida pela Conservatória do Registo Comercial e junta aos autos, que serviu para formar a convicção do Tribunal a quo, conforme é expressamente mencionado na fundamentação de facto. Este erro na apreciação da matéria de facto condicionou de forma determinante a decisão proferida, que se encontra em manifesta contradição com o teor da certidão do registo comercial da Ré, cujo conteúdo é oponível a terceiros, faz fé pública quanto aos factos aí averbados.

      Incompreensivelmente o Tribunal a quo extraiu um facto (o A. C. não era gerente da Ré) que não encontra qualquer reflexo em NENHUM documento junto aos autos.

      E, muito menos resulta da certidão do registo comercial da Ré, pelo contrário, o que resulta é que o “A. C.” SEMPRE foi gerente da Ré e desde 19/11/2009 a sua assinatura era OBRIGATÓRIA para obrigar a sociedade Ré.

    6. – Os factos provados 2, 3 e 9 da Douta Sentença recorrida, factualidade objeto de impugnação com o...

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