Acórdão nº 5083/21.7T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ CRAVO
Data da Resolução28 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO Nos presentes autos de providência cautelar de entrega judicial (1) (art. 21º do DL 149/95 de 24-06, com a redacção dada pelo DL 30/2008, de 25-02), em que figuram como requerente Caixa ... – Caixa ... , Crl, e requeridos X Curtumes, Lda.

, Massa Insolvente de X Curtumes, Lda.

, P. J.

e S. M.

, nos termos e com os fundamentos que constam do requerimento inicial, concluiu aquela a final pela entrega do tear industrial melhor identificado na petição inicial.

Examinadas as provas produzidas, sem audiência da parte contrária, foi determinada a entrega do bem móvel Equipamento para Industria do Calçado e respetivos documentos.

*Notificada da decisão, nos termos dos arts. 627º e ss. do CPC, e inconformada com a mesma, apresentou a requerida Massa Insolvente de X Curtumes, Lda.

, representada pelo seu administrador Dr. J. B. recurso de apelação, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: I.

Por falta de motivação e de fundamentação factual proveniente da falta análise crítica das provas e por falta de fundamentação legal, deve a decisão de que se recorre ser declarada nula e ser revogada e substituída por outra que aprecie criticamente as provas carreadas para os autos e fundamente a matéria de facto dada como assente e fundamente do ponto de vista do Direito a decisão proferida, ao abrigo do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. b) do C.P.Civil.

II.

Por falta de cumprimento do requisito legal de alegação na p.i. de que a requerente que tenha procedido ao pedido de cancelamento do registo da locação financeira em causa nos autos, previamente à dedução da presente providência cautelar, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 21.º da referida Lei 149/95 deveria a presente providência ter sido julgada improcedente. Pelo que, deve a decisão de que se recorre ser revogada e substituída por outra que julgue a providência requerida improcedente.

III.

O requisito do “periculum in mora” para o decretamento da providência não é de verificação automática. O Tribunal tinha que ter conhecido, apreciado e declarado a verificação e existência de tal requisito. Ainda assim, IV.

O certo é que não se mostra alegada na p.i., nem provada, na decisão de que ora se recorre, factualidade concreta, suficiente para permitir concluir pela provável existência de lesão grave e dificilmente reparável no direito da requerente, susceptíveis de preencher o requisito do periculum in mora. Ou seja, não ficou demonstrada a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo.

Acresce que, V.

sem prescindir do que se disse, a lesão que a requerente pretende prevenir cautelarmente advém dos alegados prejuízos inerentes à demora na entrega do bem com a inerente consequência de não poder utilizá-lo, e inerentes ao agravamento do seu estado de conservação, com perda de valor comercial. Sucede que, o risco de depreciação e até perda do bem em causa nos autos é um risco próprio do contrato de aluguer em causa nos autos, que encontra, para a requerente, o seu equivalente ou contrapartida no pagamento da indemnização a que se refere o n.º 6 da cláusula 12.ª do contrato, por incumprimento contratual, não podendo servir de fundamente ao decretamento da providência requerida. Pelo que, por falta de verificação do requisito legal deve a decisão recorrida ser revogado e substituída por outro que julgue improcedente o procedimento cautelar de entrega judicial de bem requerido. Acresce ainda que, VI.

E sem prescindir de tudo quanto se disse, o certo é que a aqui recorrente deve ser considerada parta ilegítima nos presentes autos, porquanto: a) o objeto que era prosseguido pela aqui recorrente, ora insolvente, era a indústria de curtumes e a venda de peles.

  1. A máquina objecto do contrato em causa nos autos não era destinada objecto desenvolvido pela sociedade ora insolvente, ou seja, não era destinada ao curtume de peles, tratando-se, sim, de máquina de fazer sapatos.

  2. Tal equipamento para indústria de calçado não se encontrava nas instalações onde a insolvente prosseguia a sua actividade e, como tal, o Administrador de Insolvência não o viu e, naturalmente, não o apreendeu a favor da massa insolvente. Pelo que, não está na disponibilidade da Massa insolvente que, por esse motivo, não o pode entregar.

  3. A Massa Insolvente desconhece o paradeiro do referido equipamento de calçado a que se reporta o contrato de locação financeira em causa nos autos, tudo conforme consta dos principais de autos de insolvência e do apenso de qualificação de insolvência, cuja apensação dos presentes autos àqueles se requer. Pelo que, deve a aqui recorrente ser declarada parte ilegítima nos presentes autos e deles ser absolvida.

    VII.

    A decisão de que se recorre violou o disposto no art.º 21.º, n.º 1 e 2 da Lei 149/95, e o disposto nos arts. 381.º, 387 e 607, n.º 4 do C.P.Civil.

    * Também notificado da decisão e igualmente inconformado com a mesma, apresentou o requerido S. M.

    recurso de apelação, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: 1.

    A providência cautelar de entrega judicial prevista no artº 21º do DL n.º 149/95, de 24 de Junho só pode ser instaurada contra o Locatário.

    1. Da factualidade indiciada, resulta que o aqui Recorrente é parte ilegítima, pois que não é locatário já que não interveio no negócio efetuado como parte contratante, não participou posteriormente nas decisões tomadas pelo Senhor Administrador de Insolvência aquando da resolução contratual razão pela qual não se encontra assegurada a legitimidade ativa.

    2. A fundamentação de facto insuficiente, em termos tais que não permitam ao destinatário da decisão judicial a perceção das respetivas razões de facto, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto, o que conduz à sua nulidade.

    3. A fundamentação da decisão recorrida no que concerne à matéria de facto é de tal forma insuficiente que não permite percecionar quais as razões por detrás da decisão, designadamente nos pontos indiciados nos artºs 19º e 20º 5.

      A sentença recorrida é nula por falta de fundamentação, tendo violado o disposto no artº 607º nº 4 do CPCivil o que expressamente se invoca de acordo com o que prescreve o artº 615º nº 1 b) do mesmo diploma.

    4. A decisão proferida não fez correta interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis, havendo por isso violação do disposto nos artºs 21º do DL n.º 149/95, de 24 de Junho e 607º nº 4 do CPCivil.

      TERMOS EM QUE pelo exposto, pelo mérito dos autos e pelo que doutamente será suprido deve à Apelação ser concedida provimento, revogando-se a douta decisão recorrida, julgando-se, quanto ao Recorrente, improcedente a procedente providência cautelar, porque assim se fará J U S T I Ç A ! *Foram apresentadas contra-alegações pela recorrida Caixa ... – Caixa ... , Crl, que se encontram finalizadas com a apresentação das seguintes conclusões: 1 - A douta sentença recorrida prima pela sua justeza e pela sua completa e concludente fundamentação, observando todos os princípios, preceitos civis e processuais aplicáveis.

      2 - Os recursos interpostos carecem, pois, de qualquer fundamento de facto ou de direito.

      3 - Quanto ao alegado vício de falta de motivação e fundamentação, invocado pelos recorrentes, o mesmo não se verifica, pois, a motivação existe e encontra-se devidamente explanada na douta decisão.

      4 - Da decisão em crise, mais concretamente da “motivação” o Tribunal fundou a sua “convicção nos documentos juntos e no depoimento da testemunha P. L., colaborador da requerente”, o que, por si só, é suficiente uma vez não foi deduzida contestação e que tudo (ou quase tudo) quanto alegado pela reclamante na petição inicial tem suporte documental.

      5 - Aliás, todas as operações em que é parte a Caixa ..., como é o caso dos autos estão sempre devidamente documentadas e, como tal, logrou-se provar o essencial para o decretamento da providência cautelar de entrega judicial.

      6 - Ora, no caso dos autos, tendo-se provado (maioritariamente através de documentos) a existência do direito de propriedade da requerente sobre o bem objeto da providência, a efetiva celebração do contrato entre a requerente e requerida, o incumprimento daquele contrato por parte dos requeridos e que o Sr. Administrador da Insolvência optou pelo não cumprimento do contrato no processo de insolvência da empresa X não era possível, por legalmente inadmissível, julgar o procedimento improcedente.

      7 - O contrato de locação foi resolvido eficazmente, pelo que se impõe a entrega de um bem que é propriedade da requerente, propriedade essa que resulta da prova documental carreada para os autos e que os recorrentes não põem em causa.

      8 - Aliás, encontrando-se verificados os requisitos constantes do nº 1 do art. 21º do DL 145/95, mormente nas al.s i) cessação do contrato ii) não restituição do bem, é quanto baste para que o Tribunal decrete a providência.

      9 - Quanto ao “periculum in mora” a lei não exige que seja feita tal prova, resultando este implícito da natureza do contrato e da natural degradação dos bens locados, na pendência da acção principal, e até ao seu trânsito em julgado, por se tratar de uma providência cautelar específica do regime da Locação Financeira.

      10 - Os bens móveis (com excepção dos veículos automóveis, navios e aeronaves) não estão sujeitos a registo, pelo que não existe qualquer registo que pudesse/devesse ser cancelado no caso em apreço.

      11 - A lei também não exige o fundado receio de perda das garantias patrimoniais do crédito ou o perigo iminente de insatisfação do seu direito e, por isso, a Caixa ..., única proprietária do bem locado, não se encontra obrigada a invocá-los, como erradamente pretende fazer a recorrente Massa Insolvente.

      12 - Tem sido esse o entendimento da jurisprudência, o qual também tem merecido acolhimento...

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